Importância da suplementação protéica de bovinos de corte a pasto em diferentes épocas do ano

A suplementação protéica de animais em pastejo é uma ferramenta que permite corrigir dietas desbalanceadas, melhorando o ganho de peso vivo, a conversão alimentar, e por conseqüência diminuir os ciclos produtivos da pecuária de corte (Peruchena, 1999).

Poppi & Mclennan (1995) afirma que a habilidade de se alterar a composição corporal dos animais mantidos a pasto depende da obtenção de alta relação energia/proteína, em relação aos nutrientes absorvidos. O simples aumento dos teores protéicos do material ingerido não é uma garantia de maior suprimento intestinal de proteína por unidade de matéria seca ingerida, ou maior quantidade de proteína absorvida. Tal eficiência no aproveitamento da fração protéica dependeria da disponibilidade de energia para os microorganismos ruminais utilizarem a amônia oriunda da proteína degradada.

Acredita-se que em condições de pastagens tropicais, durante o período de secas, ocorra tanto deficiência de proteína degradável no rúmen (PDR), quanto de proteína não degradável no rúmen (PNDR). Com isso, haveria necessidade de adição de fontes de proteína pouco solúveis, quando da suplementação de animais recebendo dietas à base de forragens de baixa qualidade. Porém, as concentrações de PDR devem ser primariamente consideradas na suplementação protéica, para se obter a máxima degradação da forragem no rúmen (Bandyk et al., 2001).

Segundo Elgersma, et al., (2001), a inclusão de PDR em dietas com forragem de baixa qualidade, melhora a digestibilidade da fibra e aumenta a ingestão de matéria seca diária dos animais. Foram observados melhores resultados no desempenho dos animais com inclusão de PDR, tanto em dietas à base de feno de baixa qualidade, como com 79.5% de milho quebrado (Shain et al., 1998).

Segundo Minson (1990) o nível mínimo de PB na forragem, para que não ocorra diminuição da ingestão voluntária, é de 7%. Dois problemas devem ser considerados em relação à proteína de forragens tropicais: um seria os baixos teores, o outro a considerável degradabilidade ruminal da mesma. Desta forma deve-se considerar as fontes de PNDR como fatores nutricionais limitantes para ruminantes em crescimento sob pastejo.

As características de degradação e a qualidade da fonte protéica fornecida aos animais são de extrema importância. A utilização de fontes protéicas de menor degradação ruminal, vai proporcionar maior quantidade de proteína no intestino, mas isso não assegura melhora no desempenho, sendo esse dependente do valor biológico da fonte protéica utilizada. A simples substituição na dieta de PDR por PNDR, poderá causar uma deficiência PDR, afetando os microorganismos ruminais e diminuindo a degradabilidade da porção fibrosa da dieta (Santos et al. 1998).

Albro et al. (1993) ao comparar diversas fontes protéicas (soja integral, soja crua, soja extrusada ou farelo de soja) na suplementação de bovinos consumindo feno, observaram aumento na digestibilidade da matéria seca, e que os ganhos médios diários e a eficiência alimentar, dobraram em relação ao grupo controle, não sendo constatadas diferenças entre as fontes. Porém, nos animais recebendo soja extrusada observaram-se tendências de melhor desempenho, o que provavelmente foi devido as maiores quantidades de PNDR.

Em bovinos de corte pastejando várias espécies de gramíneas, recebendo suplementação protéica com substituição gradativa da fonte protéica degradável no rúmen por fontes protéicas não degradáveis, observou-se aumento linear no ganho de peso diário (Karges et al., 1992). Os autores concluíram, que o ganho de peso adicional promovido pela proteína de baixa degradação ruminal indica que a síntese de proteína microbiana não foi suficiente para satisfazer as exigências em proteína metabolizável.

Em trabalho semelhante, (Ramos et al., 1998) observaram o desempenho de novilhos em crescimento pastejando Cynodon spp. no período das secas, substituindo 100%, 50% e 0% de uréia, por 0%, 50% e 100% de fontes protéicas naturais (farinha de sangue, farelo de coco ou farelo de soja). Obtiveram aumentos lineares nos ganhos de peso vivo para suplementos com farinha de sangue (1,11 e 1,21 kg/animal/dia) e farelo de coco (1,05 e 1,21 kg/animal/dia), não havendo resposta para os suplementos com farelo de soja (1,01 e 1,00 kg/animal/dia) em relação ao grupo recebendo apenas uréia (0,97 kg/animal/dia). Concluíram que, animais pastejando forragens de baixa qualidade, eram deficientes em PNDR.

Knaus et al. (1998) trabalhando com novilhos da raça holandesa em gaiolas metabólicas, concluíram que com níveis crescentes de uma mistura balanceada de três fontes, com proporções de 0, 2.5, 5 e 7.5% da PB em PNDR, houve melhora na digestibilidade, balanço e eficiência da utilização do nitrogênio para bovinos de corte em crescimento. Apesar de não terem obtido diferença estatística para ganho de peso, os autores relataram que a diferença numérica foi de 770g/dia para 1315 g/dia.

Mbongo et al (1994) suplementaram 16 novilhos Belmont Red (272 kg) com quatro níveis de caseína tratada com formaldeído: 0,150, 300 e 500 g de PB/dia. Os animais foram mantidos em pastagens de Setaria anceps (13% de PB; 63,5% de FDN) durante 14 semanas e apresentaram ganhos de peso de 862, 1112, 1030 e 852 g, respectivamente. As duas melhores respostas representaram um acréscimo de 29 e 19% sobre o lote controle. Provavelmente, o efeito negativo do mais alto nível de oferecimento da caseína seja devido ao gasto energético necessário para transformação da amônia em uréia, processo indispensável para eliminação do excesso de nitrogênio nos mamíferos.

Bandyk et al. (2001) avaliaram o efeito da suplementação de PDR ou PNDR, na ingestão e digestão da matéria orgânica de dietas com forragens de baixa qualidade, e observaram que ambas aumentaram a ingestão. Os aumentos foram de 62 e 28% respectivamente, para PDR e PNDR, em relação ao grupo controle. Os autores concluíram que se deve priorizar a inclusão de PDR, e o excesso de proteína em relação às exigências dos microorganismos ruminais, passe e seja absorvido no intestino delgado.

Segundo Poppi & Mclennan (1995) existem poucas informações sobre o quanto a proteína é limitante no período das águas para forragens de climas tropicais, e que são pouco efetivas as suplementações de forragens de alta qualidade. Porém, ao lançar mão de suplementos com altas quantidades de proteína, pode-se obter melhores respostas em ganho de peso.

Andrade & Alcalde (1995) citaram trabalhos onde foram utilizadas suplementações de verão com fontes protéicas menos degradáveis no rúmen, como a farinha de carne, com acréscimo de cerca de 300 g no ganho de peso. Os autores ainda sugeriram, baseando-se em outros trabalhos, a utilização estratégica das fontes de proteína, usando-se fontes menos degradáveis no período das águas e de fontes degradáveis no período das secas.

Ruas et al. (2000), avaliaram a suplementação protéica (40,8% PB) para vacas de corte durante o período das águas, e observaram aumento na ingestão diária de matéria seca e nos ganhos de peso das fêmeas recebendo suplementação em relação às não suplementadas.

Zervoudakis et al., (2001) utilizando novilhos cruzados e suplementação energético/protéico (20% PB) à base de milho e farelo de soja ou farelo de trigo e farelo de soja, não observaram diferenças no desempenho dos animais suplementados e não suplementados mantidos em pastagens de Brachiaria decumbens. A falta de resposta à suplementação nesse trabalho provavelmente se deve às altas disponibilidades de forragem e aos níveis de PB, que foram de 7000 Kg/ha e 9 % PB, respectivamente. Isso permitiu que os animais selecionassem uma dieta com níveis adequados de nutrientes.

Karn (2000), avaliou o desempenho de novilhos de corte durante cinco anos consecutivos e observou melhores respostas para suplementação energética em relação à suplementação protéica durante o período das águas. O autor citou que, a resposta à suplementação está diretamente relacionada à disponibilidade e qualidade da forragem, e que provavelmente a quantidade de proteína das pastagens atingem os níveis exigidos pelos animais no período das águas.

Alguns aspectos do suprimento protéico para animais em pastagens no período vegetativo, permitem identificar uma relação entre a transferência da proteína ingerida e a matéria orgânica fermentável no rúmen. As perdas de proteína ou transferência incompleta da proteína dietética para o intestino ocorreriam quando a relação entre teor protéico e matéria orgânica fermentável (MOF) excedesse 210 g de proteína bruta (PB)/ kg de MOF. O valor de 210 g de PB/ kg de MOF poderia ser utilizado para identificar situações nas quais ocorreriam perdas significativas de nitrogênio. Uma relação de 160 g de PB/kg de MOF, já seria o suficiente para ocorrer passagem de proteína para o intestino. Vale lembrar que estas relações foram obtidas para pastagens temperadas.

Referências bibliográficas

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  1. Harold Ospina Patino disse:

    Considero que não podemos seguir utilizando índices tão simplistas, tais como PDR ou PB para avaliar as complexas relações que ocorrem no rúmen e no metabolismo dos animais durante a utilização do N.

    O uso maciço destes índices tem feito com que existam atualmente no mercado suplementos proteinados que não se preocupam com a otimização do ambiente ruminal para digestão da fibra das forragens.

    A maioria destes suplementos vende simplesmente quantidade de N sem se preocupara quanto dele será utilizado pelo animal e as implicações energéticas desta ineficiência.

    A formulação de suplementos é mais do que simplesmente uma questão de quantidade.

    Estamos precisando entrar urgentemente na era da nutrição de precisão.

  2. Fernando Carlos Moraes Vilela disse:

    Gostaria de mais informações sobre qual porcentagem (das duas no mesmo concentrado) de proteína PDR e PNDR seria mais viável para engorda a pasto.

  3. André Alves de Souza disse:

    Olá Fernando,

    Em relação às proporções de PDR e PNDR em suplementos, devemos pensar na maximização da proteína microbiana. Com isso, sabemos que a produção de proteína microbiana está ao redor de 12,5% do NDT total, portanto, a PDR do suplemento deve ser de 12,5% do NDT do suplemento.

    Exigência de PDR (%MS) = 0,125 x %NDT
    Exemplo: um suplemento com 70% de NDT tem a necessidade de 8,75 % de PDR na MS.

    Pensando somente em proporções, o suplemento deve proporcionar na dieta final estimada, até 30% da PB em nitrogênio não protéico (uréia).

    Espero ter ajudado, e me coloco à disposição se mais dúvidas surgirem. É assunto que demandaria muito mais informações no esclaracimento. A propósito, estou finalizando o material do curso de suplementação de bovinos a pasto, em que irei enfocar esse e outros pontos fundamentais da suplementação a pasto. As inscrições iniciarão no site em feveiro e o curso tem início em março.

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