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‘Inércia’ contra mudança climática pode custar US$ 24 bi a setor de carnes

Os planos para neutralizar as emissões de carbono ainda são tratados no mundo corporativo como uma adaptação das empresas de carnes à demanda dos consumidores. Mas, à medida que a crise climática se intensifica, esses planos fazem ainda mais sentido se estiverem encaixados em uma estratégia de preservação de margens, de salvação dos negócios e, no fim das contas, da remuneração dos acionistas.

Alguns fatores relacionados às mudanças do clima já aparecem em análises de risco de instituições financeiras e consultorias, como o impacto sobre o preço dos grãos e das taxas de carbono. Agora, os investidores fizeram as contas e chegaram a uma estimativa para as perdas potenciais no segmento de carnes: US$ 23,7 bilhões até 2030.

Essa é a projeção de perdas no lucro antes de depreciação e amortização (Ebit) às quais as companhias do setor estão sujeitas caso não mudem seu modelo de negócios — o cenário “business as usual”, elaborado pela iniciativa FAIRR, que reúne gestores e investidores responsáveis por US$ 70 bilhões em ativos no mundo todo.

O grupo elaborou um indicador de risco climático, e o cálculo foi feito com base nas premissas do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) em seu cenário sobre “o meio do caminho” que o mundo pode tomar em relação à mitigação de gases-estufa, o SSP2.

O IPCC trabalha com cinco cenários de rumos que o mundo pode tomar em relação ao clima. O SSP2 refere-se a um caminho em que o desenvolvimento econômico não seja tão ruim, nem com grandes níveis de nacionalismo ou desigualdades, mas com progresso desigual.

Nesse horizonte de “business as usual”, as perdas financeiras estimadas pela FAIRR devem estar concentradas mais em algumas empresas. E as que devem arcar com a maior parte do ônus são as brasileiras Marfrig e Minerva, além da australiana Australian Agricultural Company (AACo), na hipótese de não mudarem seu modelo de produção até o fim desta década.

Aumento de custos

Os efeitos das mudanças climáticas tendem a elevar os custos da Minerva e da AACo em 22% entre 2020 e 2030. Já os custos da Marfrig relacionados ao clima devem subir 19% no mesmo período.

A maior parte dessa pressão de custos deve vir das taxas de carbono – uma discussão já avançada na Europa, e ainda em seus passos anteriores nos Estados Unidos e outros países. Esses custos adicionais deverão se refletir diretamente sobre as últimas linhas dos balanços: a Marfrig pode perder US$ 1,9 bilhão na década – quase metade do lucro líquido da companhia no ano passado. Já a Minerva pode perder US$ 897 milhões até 2030 – acima do lucro do último ano –, e a AACo, US$ 83,6 milhões, mais da metade de seu lucro em 2022.

Na média das empresas de carnes, o aumento dos custos decorrentes das mudanças climáticas deve ser de 9%, sendo 5% por alta dos preços das rações e 4% por taxas de carbono. Nas empresas da América do Norte — onde os confinamentos dominam a criação dos bois e há, com isso, mais demanda por ração —, o impacto tende a ser de 12% a 16% sobre os custos de produção entre 2020 e 2030.

Longo prazo

Os investidores também traçaram uma projeção de mais longo prazo. Uma paralisia das empresas de carnes na questão climática ou a falta de efetividade de suas ações pode tirar-lhes US$ 37,9 bilhões até 2050.

Nesse caso, as taxas de carbono tendem a superar o impacto financeiro da ração mais cara, com um impacto de 8% sobre os custos de produção. A inação no longo prazo deve afetar não apenas a América do Norte, mas também a América Latina.

Embora seja a companhia potencialmente mais afetada, a Marfrig também é reconhecida hoje pelos investidores globais como uma das empresas que mais têm adotado ações para enfrentar seu impacto ambiental com o plano Marfrig Verde Mais. Na análise da FAIRR, a medida exata dos esforços da companhia tende a mitigar 5,69 pontos percentuais de seus aumentos de custo. Como resultado, a elevação dos custos, que seria de 19% na década, pode passar a ser de 13,6%. No fim das contas, o que o cálculo mostra é que quem se esforça mais perderá menos.

“O relatório recomenda que as companhias conduzam suas próprias análises de cenário climático detalhadas e coloquem estratégias de mitigação de risco em ação. Elas também devem reconhecer o custo inerente associado à produção de carne, um alimento de altas emissões em um mundo onde o carbono provavelmente vai ser taxado, e reduzir sua exposição diversificando a produção para proteínas alternativas de baixo carbono sem carne”, defendeu a FAIRR.

O que diz a Marfrig

Sobre o relatório, a Marfrig afirmou, em nota, que “realiza ações robustas para reduzir os riscos climáticos provenientes de sua produção” e que, por isso, “lidera a mitigação desses riscos, conforme aponta o relatório da FAIRR”.

A companhia citou suas iniciativas para neutralizar suas emissões e afirmou que, “mesmo com a complexidade e extensão territorial da atividade pecuária no Brasil, apresenta resultados concretos e auditáveis em sustentabilidade”. A Marfrig monitora hoje todos os seus fornecedores diretos, 73% dos indiretos na Amazônia e 72% no Cerrado.

O que diz a Minerva

Em resposta ao relatório da FAIRR, a Minerva também mencionou suas iniciativas de sustentabilidade. A companhia monitora todos os seus fornecedores diretos no Brasil e no Paraguai e está prestes a alcançar esse patamar no Uruguai. Na Colômbia, o monitoramento passa dos 80%, e na Argentina, chega a 90%.

Para monitorar os fornecedores indiretos, a companhia usa a ferramenta Visipec na Amazônia. A seus fornecedores diretos, ela fornece o aplicativo SMGeo Prospec, para que eles também monitorem os seus próprios fornecedores de gado.

Fonte: Valor Econômico.

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