Por Liliane Suguisawa1
Estudos demonstram que a característica mais importante na avaliação da qualidade de carne é a maciez. Cor, textura, suculência, aparecem como critérios de avaliação apenas quando o quesito maciez foi atingido. Há inúmeros fatores que afetam a maciez da carne bovina, compreendendo desde a raça do animal, até os manejos pré e pós-abate. A quantidade de espessura da gordura subcutânea (ECG) é fundamental no processo pós-abate, pois evita o encurtamento das fibras musculares, denominado “cold-shortening”; o escurecimento e o enrijecimento da carne de animais abatidos com menos de 3 mm de gordura de cobertura.
Tudo parecia indicar que a marmorização da carne não influía intensamente na palatabilidade ou na maciez da carne. Porém, estudos no Canadá demonstraram que a partir do momento que a Associação de Certificação das Carcaças (Canadian Beef Grading Standards) tirou a marmorização do critério de classificação das carcaças, houve menor aceitabilidade das carnes pelo mercado consumidor, o que poderia ser atribuído principalmente ao aumento do abate de animais com apenas 4 a 6 mm de ECG (em 1982 eram 40% e em 1987 passaram a ser 60% das carcaças).
Vários estudos foram conduzidos tentando avaliar a importância da marmorização na palatabilidade da carne e chegou-se a conclusão que esta influência poderia variar de 7, 12, 14 a 33%, dependendo da situação. Com isto em 1992, a marmorização foi novamente introduzida como critério de avaliação pela Associação Canadense de classificação de carcaças.
Porém há uma enorme controvérsia sobre as quantidades mínimas de ECG e marmorização como parâmetros de seleção para proporcionar carnes de alta palatabilidade. Como a ECG é a característica que pode ser predita nos animais ainda vivos, por escores visuais ou ultra-som, se avaliado a importância e a relação desta para determinação de carnes com marmorização assegurada e palatabilidade, se tornará simples uma pré-avaliação (predição) da qualidade das carcaças antes do abate, auxiliando o produtor a determinar o ponto ótimo para o animal ser abatido, desde que este esteja enfocando a produção de carne para mercados especiais.
Mercados especiais são aqueles que prezam a qualidade e pagam pela padronização da mesma. No Canadá e Estados Unidos, a maioria dos consumidores consideram o grau de marmorização da carne no momento da compra. Porém com as novas tendências de alimentação “light”, houve uma substancial redução na preferência por carnes com alto grau de marmorização.
Um experimento com 293 animais (113 novilhos e 186 novilhas) das seguintes composições genéticas: 1/2 e 3/4 Charolês, Simental, Romagnolla, Limousin, Chianina, Marchigiana, e Murray-Grey, de 11 a 15 meses de idade, submetidos a 255 dias de confinamento com ração de alto concentrado, foi delineado para avaliar a influência da ECG e da marmorização da carne na palatabilidade e aceitabilidade do consumidor canadense. As carcaças possuíam em média 270 kg e as amostras para obtenção da ECG, maciez e grau de marmorização da carne foram obtidas entre a 12a e 13a costelas.
Tabela 1. Influência do Grau de Marmorização na qualidade da carne
A única relação existente entre ECG x marmorização, é de que carcaças com traços de marmorização tem menos ECG do que carcaças com modesta marmorização. Porém a falta de uma diferença expressiva na relação entre níveis de marmorização e palatabilidade, leva-nos a entender que a maciez de uma carne não está sendo altamente influenciada pelo seu nível de gordura intramuscular (marmoreio).
Este dado é de extrema importância para o Brasil, onde cerca de 80% da pecuária baseia-se em animais zebuínos, com menor predisposição genética para deposição da gordura de marmoreio.
Tabela 2. Influência da Espessura da Gordura Subcutânea na qualidade da carne
Pode-se observar que não há grandes variações na palatabilidade da carne quando a ECG é inferior a 8 mm, e não há nenhum incremento da mesma quando a ECG é superior a 12 mm. O fato é que 90% da carne proveniente de carcaças com pelo menos 7,6 mm de ECG são muito aceitáveis, e que não há grandes diferenças na palatabilidade quando a ECG é inferior a este valor.
Como a relação entre a medida de marmorização e a ECG com palatabilidade é considerada baixa, conclui-se que apenas uma pequena quantidade de marmorização e pelo menos 8 mm de ECG proporcionam aos consumidores canadenses carnes com 90% de aceitabilidade. Assim, pode-se utilizar estas medidas como parâmetros de seleção de carcaças com qualidade superior, sem que haja necessidade de nenhuma intervenção das carcaças no processo post mortem objetivando melhorias na qualidade de carne.
Em relação a pecuária nacional, a constatação de que a marmorização influi em até no máximo 33% na maciez e palatabilidade de uma carne, e que a deposição de quantidades de ECG maiores que 7,6 mm não se mostra muito vantajosa no critério de qualidade, torna apto a utilização da base Zebuína do nosso rebanho para a produção intensiva de carne, já que estes apresentam comportamento intermediário entre animais de origem continental e britânica, com deposição variável de ECG e menor marmorização na carne.
No entanto, é válido ressaltar que há inúmeros outros fatores que comprometem a maciez e a palatabilidade, além da ECG e da marmorização da carne bovina, e que o exato entendimento de como a raça Nelore se comporta em relação a todos estes efeitos, e que nos auxiliará a controlar os problemas que afetam a maciez da carne dos Zebuínos e com isto, colocar a pecuária nacional em destaque.
Referências bibliográficas
CAMPION, D. R.; CROUSE, J. D; DIKEMAM, M. E. Predictive value of USDA beef quality grade factors for cooked meat palatability. Journal of Food Science, v. 40, p. 1225-1228, 1975.
JEREMIAH, L. E. The influence of Subcutaneous Fat Thickness and Marbling on Beef – Palatability and Consumer Aceitability. Food Research International, v. 29, n.5-6, p. 513-520, 1996.
L´ HIRONDELLE, P. J.; MARTIN, A.H. Evaluation of methods of measuring tenderness on raw and cooked beef muscle. Canadian Journal of Animal Science, v. 55, p. 519-525, 1975
_________________________
1Liliane Suguisawa é doutoranda em Nutrição e Produção Animal – UNESP/Botucatu