Sabe-se que o fenótipo ou o valor observado/medido de uma dada característica é dependente do potencial genético do indivíduo e do ambiente no qual é produzido. Esta é uma simplificação extrema do que ocorre biologicamente, o que significa dizer que a genética e o ambiente influenciam de forma aditiva e independente o fenótipo. O efeito de um genótipo sobre sua performance depende das condições ambientais a que está sujeito, ou, de outra perspectiva, mudanças ou melhorias no ambiente só serão frutíferas se o genótipo responder a elas. Então, um terceiro componente a ser considerado na fórmula básica do melhoramento genético é a interação genótipo-ambiente. Avaliar e considerar a interação genótipo-ambiente em Programas de Melhoramento tanto no sentido de detectar a significância como no de utilizá-la na seleção predizendo e otimizando os ganhos de acordo com os diferentes sistemas de produção pode trazer vantagens econômicas significativas.
Fernanda V. Brito, Vânia Cardoso, Roberto Carvalheiro, Luiz Alberto Fries, Carlos D. Ortiz Peña, Mário Luiz Piccoli, Vanerlei M. Roso, Flávio Schenkel e Jorge L.P. Severo 1
Interação genótipo-ambiente
Sabe-se que o fenótipo ou o valor observado/medido de uma dada característica é dependente do potencial genético do indivíduo e do ambiente no qual é produzido. Esta é uma simplificação extrema do que ocorre biologicamente, o que significa dizer que a genética e o ambiente influenciam de forma aditiva e independente o fenótipo. O efeito de um genótipo sobre sua performance depende das condições ambientais a que está sujeito, ou, de outra perspectiva, mudanças ou melhorias no ambiente só serão frutíferas se o genótipo responder a elas. Então, um terceiro componente a ser considerado na fórmula básica do melhoramento genético é a interação genótipo-ambiente.
Formalmente, a interação genótipo-ambiente pode ser definida como a mudança de desempenho relativo de um caráter de dois ou mais genótipos medidos em dois ou mais ambientes. “Genótipo”, na genética clássica, significa o conjunto de genes de um indivíduo, porém, estendendo a definição para grupo de indivíduos, também se entende por genótipo raças, linhagens, composições raciais, etc. Já o “ambiente” abrange uma ampla gama de variáveis que podem ser agrupadas em fatores como: regiões geográficas, sistemas de manejo, tipo de alimentação, época de produção, etc.
Avaliar e considerar a interação genótipo-ambiente em Programas de Melhoramento tanto no sentido de detectar a significância como no de utilizá-la na seleção predizendo e otimizando os ganhos de acordo com os diferentes sistemas de produção pode trazer vantagens econômicas significativas. Atualmente existem diferentes abordagens para tratar este assunto, o que será apresentado a seguir.
Determinando a significância da interação genótipo-ambiente
Situações envolvendo interação genótipo-ambiente podem ser avaliadas através do cálculo de correlação genética: a performance de uma característica nos dois ambientes é considerada como duas características diferentes as quais estão geneticamente correlacionadas. Esta é a abordagem clássica proposta por Falconer em 1952 e seguida até hoje em muitos trabalhos de identificação da presença de interação genótipo-ambiente. Assim, foi proposto que ocorre interação significativa quando a correlação for menor do que 0,80, consistindo um balizador para as conclusões.
Outras metodologias baseadas nesta mesma linha da estatística são amplamente utilizadas para a determinação da significância da interação genótipo-ambiente. Mais recentemente, modelos bayesianos também estão sendo utilizados nas análises possibilitando obter-se estimação probabilística da correlação genética.
Sensibilidade ambiental e normas de reação
Falconer, em 1990, definiu sensibilidade ambiental como a extensão das modificações no fenótipo causadas pelos distintos ambientes, ou de outra forma, a reação dos indivíduos aos diferentes ambientes. Os diferentes graus de sensibilidade ambiental definem genótipos com maior ou menor estabilidade. Em plantas, a característica estabilidade é estudada amplamente e selecionada visando genótipos de alta produção e robustos às variações ambientais.
Na produção animal, este conceito vêm sendo discutido e considerado através das “normas de reação”, definidas como sendo a variação dos fenótipos produzidos por um genótipo como uma função contínua da variação ambiental. O método estatístico utilizado para se obter as normas de reação é a regressão aleatória, considerada uma nova ferramenta para melhorar a qualidade das avaliações genéticas.
Utilizando normas de reação obtidas através de regressão aleatória um estudo com dados da raça Angus, mostrou que touros importados têm maior resposta nos sistemas de produção mais intensivos e que linhagens selecionadas no Brasil são mais robustas às variações ambientais.
Porém, uma limitação importante desta metodologia são as altas exigências computacionais, o que poderia inviabilizar a técnica para avaliações nacionais ou de programas de melhoramento genético de grande porte.
Adequando o genótipo aos diferentes ambientes através do cruzamento
O cruzamento entre animais de raças com diferentes aptidões aliado a um processo de seleção é o caminho mais curto para se obter desempenhos favoráveis nos diversos ambientes e sistemas de produção. Porém ainda são poucos os trabalhos que fornecem informações completas sobre os efeitos aditivos e não aditivos, tanto diretos como maternos, sobre o desempenho destes animais nos diferentes ambientes de produção.
No Brasil, dada a dimensão continental e a existência de importantes programas de melhoramento genético animal, está sendo possível avaliar os diversos componentes que afetam a produção, inclusive os componentes de interação genótipo-ambiente, considerando como genótipo as diferentes composições raciais obtidas do cruzamento entre Bos Taurus e Bos Indicus. Resultados como estes já estão sendo utilizados em programas de avaliação genética de bovinos produtos de cruzamento entre as raças Nelore e Hereford e Nelore e Angus.
A Figura 1 revela a forte influência do efeito aditivo materno e da heterose sobre a característica Ganho Médio Diário do Nascimento até o Desmame. Pode-se observar, entre os genótipos e latitudes considerados, a vantagem da utilização de animais cruzados nas maiores latitudes, onde suas mães são melhores adaptadas, quanto aos seus desempenhos até a desmama.
Figura 1. Ganho Médio Diário do Nascimento até a Desmama (GMDND) para gerações estabilizadas de animais cruzados (Hereford=0; Nelore=1) em diferentes latitudes
Figura 2. Ganho Médio Diário da Desmama até o Sobreano (GMDDS) para gerações estabilizadas de animais cruzados (Hereford=0; Nelore=1) em diferentes latitudes
Além da expressão reduzida deste efeito nas demais latitudes, em função da interação menos favorável entre estes componentes, o efeito da epistasia direta, também expresso completamente nos animais F2 contribuiu para o menor crescimento/ganho destes animais. A expressão da epistasia materna completa pelas fêmeas F2 fez com que os ganhos nos animais da geração F3 fossem reduzidos ao seu ponto mínimo em todas as latitudes, mantendo-se as diferenças nos níveis de produção, enquanto que os ganhos a partir da geração F4 estabilizaram-se.
Estes resultados indicam que a maior proximidade de regiões temperadas aumentam os benefícios da utilização de cruzamentos, em termos de crescimento até a desmama, em relação ao uso em regiões próximas do Equador, onde, exceto para a primeira geração de cruzamento, os animais zebuínos puros mostraram melhores desempenhos do que as demais gerações de cruzamento.
As mudanças em GMDDS ao longo das gerações, nas diferentes latitudes, podem ser observadas na Figura 4. O efeito da heterose direta e suas interações positivas com os efeitos de latitude fizeram com que os animais F1 alcançassem melhor desempenho em todas as latitudes, apesar dos efeitos negativos da complementariedade direta, de suas interações com latitude e das interações efeito aditivo x latitude.
Na geração F2, com a redução pela metade da expressão do efeito de heterose e com a manifestação completa dos efeitos negativos da epistasia e de suas interações com latitude, os desempenhos em GMDDS foram bastante reduzidos em todas as latitudes. A partir da geração F3, os valores de GMDDS estabilizaram-se um pouco acima dos observados para os animais F2, porém continuaram, em todas as latitudes, próximos ao do Nelore. Estes resultados indicam que, para esta característica, os maiores benefícios da realização de cruzamentos são verificados na primeira geração, sendo bastante reduzidos posteriormente.
Figura 3. Ganho Médio Diário do Nascimento à Desmama (GMDND) das gerações parental (Nelore), F1, F2, F3 e F4 na formação de um Braford ½ em diferentes latitudes
ALBUQUERQUE, L.G. Regressão aleatória: nova tecnologia pode melhorar a qualidade das avaliações genéticas. In: V SIMPÓSIO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE MELHORAMENTO ANIMAL, 2004, Pirassununga, SP. Proceedings… Pirassununga, SP, 2004.
CARDOSO, F. CAMPOS, L.T., CARDELLINO, R.A. Caracterização de interação genótipo-ambiente no ganho pós-desmama de bovinos Angus via normas de reação. In: 42ª REUNIÃO ANUAL DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE ZOOTECNIA. Goiânia, GO, Brasil. Proceedings… Goiânia, GO. CD-ROM.
CARDOSO, V. Direcionando acasalamentos para maximizar a média do valor genotípico de uma futura safra. Jabiticabal: Universidade Estadual Paulista, 2004. 101 p. Tese (Doutorado) – UNESP, 2004.
PÉGOLO, N.T. Interação genótipo-ambiente e sensibilidade ambiental em características de crescimento em bovinos de corte. Botucatu: Universidade Estadual Paulista, 2005. Tese (Mestrado) – UNESP, 2005
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1Equipe GenSys
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Prezada Equipe do GenSys,
Se o fenótipo ou o valor observado/medido de uma dada característica é dependente do potencial genético do indivíduo e do ambiente no qual é produzido, qual seria a correlação do componente ambiental com a condição de conforto individual no grupo/lote no qual o animal dispõe para expressar sua potencialidade.
Sabe-se que em situações de estresse, a primeira reação do bovino é parar ou diminuir sua alimentação e manter baixas ingestões de água.
Dada a variabilidade de manejos nos diversos sistemas de produção desde os que são a pasto com suas inúmeras variações aos em confinamentos, seria de grande importância avaliar os diversos componentes que afetam a produção, incluindo os componentes de sociabilidade e interação entre os animais agregados em lotes.
Atenciosamente,
José da Rocha Cavalcanti
Resposta da autora:
Caro Sr Cavalcanti,
É um prazer falar com o Sr novamente.
Classificar os diversos tipos de ambiente não é uma tarefa fácil, pois existem inúmeros fatores envolvidos, como o Sr. mesmo menciona.
Para complicar ainda mais existem as múltiplas interações entre todos estes fatores o que torna praticamente impossível estudar os diferentes tipos de interação genótipo-ambiente. Assim, pode-se não conseguir medir exatamente o valor de uma correlação como a do tipo que o Sr. comenta, mas se este fator (sociabilidade) for preponderante para o resultado produtivo naquele ambiente, a seleção “dentro” de ambiente se encarregará de evidenciar estes genótipos favoráveis.
A questão toda fica a cargo de como lidar com o uso de material genético proveniente de diversos tipos de Programas de Melhoramento Genético (seleção global). Assim, espero estar, se não respondendo totalmente sua pergunta, pelo menos contribuindo para uma maior discussão a respeito deste assunto.
Atenciosamente,
Fernanda V.Brito
Caros amigos do Genesys,
Penso eu,na minha pouca ciencia a respeito, que ao inves tentarmos estudar todos os fatores que influenciam a produtividade dos bovinos, talvez nao seria melhor identificarmos os individuos que melhor se sobresaem dentre os seus contemporaneos e disseminarmos sua genetica, visto que se em um grupo de animais que estao sob as mesmas condicoes de ambiente,manejo,etc, existem sempre os que se destacam mais, penso eu ser este o caminho para melhoramento genetico.Fica aqui meu questionamento.
Grato,
Hildomar SAntos
Prezado HILDOMAR SANTOS,
A informação dos animais relativa a seus contemporâneos é primordial para exercermos melhoramento (progresso genético). Entretanto, se usássemos apenas ela, estaríamos despresando a possibilidade de diferenças no mérito genético médio dos animais de diferentes grupos. Além disso, o uso de outras fontes de informação (ex. parentesco) auxilia a predizer o mérito genético de forma mais acurada.
Atenciosamente,
Equipe GenSys