Estamos entrando na entressafra, momento bem delicado para os pecuaristas, afinal as forragens começam a decrescer em produção e aspectos nutricionais, podendo chegar a menos de 4% de proteína bruta (PB) na matéria seca (MS) entre os meses de junho a agosto. Existem alternativas para que não ocorra o famoso "boi sanfona", aquele que perde o que ganhou de peso durante a safra. Uma delas seria o confinamento ou semi-confinamento desses animais, ou seja, fornecer dietas que supram as exigências em PB, energia e minerais da categoria animal. A fonte de PB economicamente mais atrativa seria a utilização de fontes de nitrogênio não protéica, como a uréia.
Estamos entrando na entressafra, momento bem delicado para os pecuaristas, afinal as forragens começam a decrescer em produção e aspectos nutricionais, podendo chegar a menos de 4% de proteína bruta (PB) na matéria seca (MS) entre os meses de junho a agosto. Em muitas regiões do nosso país a estiagem acarreta sérios transtornos econômicos, pois interferem diretamente sobre o desempenho animal, principalmente relacionado ao ganho de peso.
Existem alternativas para que não ocorra o famoso “boi sanfona”, aquele que perde o que ganhou de peso durante a safra (gráfico 1). Uma delas seria o confinamento ou semi-confinamento desses animais, ou seja, fornecer dietas que supram as exigências em PB, energia e minerais da categoria animal. A fonte de PB economicamente mais atrativa seria a utilização de fontes de nitrogênio não protéica, como a uréia.
Gráfico 1. Ganho de peso a pasto durante o ano
A intoxicação ocorre por excesso de ingestão em animais adaptados ou pequenas quantidades em não adaptados, ou ainda, ingestão da uréia na forma líquida, o famoso “sopão de uréia”, isto ocorre devido aos veranicos durante a entressafra em sistemas de suplementação com uréia em cochos livres de coberturas e sem escoamento de água.
Deparados com o excesso de risco de perder o animal o proprietário muitas vezes adota uma postura que uréia é muito perigosa e não a emprega na sua propriedade. Conseqüência: desempenhos reduzidos na entressafra ou ameaçados por falta de informação.
Se por um lado podem ocorrer quadros de intoxicação, por outro a uréia é extremamente barata e trás muitas vantagens, do ponto de vista produtivo, pois melhorar o consumo de MS (normalmente pasto seco) aumenta a absorção e conversão alimentar do volumoso ingerido. Porém nessas horas vêm a seguinte pergunta: “Mas e a adaptação? Tem que ser reiniciada caso ocorra interrupção no consumo ou fornecimento?”
Fizemos um experimento e detectamos que a adaptação é extremamente necessária, porém em animais que nunca receberam ou consumiram uréia na vida, mas caso tenham sido alimentados com dietas contendo níveis de uréia e ocorra uma interrupção, por até 20 dias, os animais não precisam sofrer uma readaptação necessitando de doses maiores para que se intoxiquem.
A uréia ingerida chega ao rumem no qual é degradada pelas bactérias ruminais em amônia (NH3) – forma tóxica -, amônio (NH4) e energia, alcalinizando o meio ruminal. Fisiologicamente, o NH4 e a energia são convertidos em proteína bacteriana, porém já o NH3 é absorvido atingindo a corrente sanguínea onde é novamente metabolizado pelo fígado em uréia, convertendo em músculo (carne) e excretado na forma de NH4 pela urina e fezes do animal.
Em casos de intoxicação, por ingestão excessiva, as bactérias do rumem não dão conta de converter a uréia em proteína bacteriana deixando livre grande parte do NH3 no rumem e esta é rapidamente absorvida, por ser lipossolúvel, pela corrente sanguínea intoxicando o animal.
Contudo, a uréia em contato com liquido se transforma em NH4 e este no rumem é reduzido em NH3, causando quadros super agudos de intoxicação quando ingeridos na forma líquida devido ao excesso de NH3 livre no rumem, conseqüentemente, maior absorção e maior concentração circulante no organismo.
A sintomatologia é de origem nervosa já que o NH3 é lipossolúvel sendo depositado em grande quantidade no cérebro. O animal intoxicado apresentará sialorréia (não deglutição da saliva devido à paralisia da faringe), hiperestesia, desidratação, taquipnéia e taquicardia, nistagmo (movimentos oculares), incoordenação motora, quadros de tremores musculares evoluindo para convulsão e morte.
Para diagnosticar este quadro é importante saber o manejo alimentar, doses utilizadas de uréia na dieta total, problemas de misturadores, sintomatologia e tempo de fornecimento durante o dia uma vez que animais com fome comem rapidamente e em grandes quantidades.
Em quadros de intoxicação quando surgem os primeiros tremores musculares e o tratamento é empregado a cura é de 80%, entretanto quando o animal já apresenta sinais de convulsão a morte é de 100%. Para tal, alguns autores indicam como tratamento a retirada do conteúdo ruminal ou ingestão forçada de água gelada, conduto é difícil arrumar grandes quantidades de água gelada além de retirar boa parte do líquido ruminal de muitos bovinos intoxicados, uma vez que a dieta é fornecida em lotes e não individualmente. A água gelada ou retirada do liquido ruminal reduzem a absorção do NH3, mas o que foi absorvido e atingiu a corrente sangüínea faz com que o animal apresente intoxicação sistêmica. Nestes casos, é imprescindível a assistência de um médico veterinário para resolução do quadro sistêmico.
Para prevenir “surpresas” em bovinos alimentados com uréia são indicadas algumas medidas, como:
-Seguir o período de adaptação em animais que nunca receberam a uréia;
-Fornecer quantidades recomendadas prescritas por técnicos;
-Cobrir cochos contra chuvas e fazer furos para que a água escoe, não empossando;
-Ter “kit” de vinagre ou ácido acético 4% na fazenda para tratamento de emergência, pois estes se ligam a amônia no rumem transformando-a em NH4 que é hidrossolúvel, diminuindo assim sua absorção pela parede ruminal.
Lembre-se: quadro de intoxicação por uréia tem cura quando tratado no começo dos sintomas, mas é mais importante o tratamento sistêmico que o local, muitas vezes é este que vai ser fundamental para a vida do animal.
Referência Bibliográfica:
SANTOS, N.V.M. Eficiência da desintoxicação de amônia em bovinos adaptados ou não com uréia dietética e submetidos a diferentes períodos de privação. Tese de doutorado. Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP:São Paulo, 2005.
KITAMURA, S.S. Intoxicação por amônia em bovinos e ratos: o desempenho renal na desintoxicação e o emprego de tratamentos alternativos. Dissertação de mestrado. Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP:São Paulo, 2002.
ORTOLANI, E.L. Informações pessoais. 2008.
RADOSTITS, O. M.; GAY, C. C.; BLOOD, D. C.; HINCHCLIFF, K. W. Clínica veterinária: um tratado de doenças dos bovinos, ovinos, suínos, caprinos e eqüinos. 9. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2002. 1737 p.
14 Comments
Excelente o artigo sobre como prevenir intoxicação por uréia.
Muito importante essa matéria, visto que muitos produtores fazem ao contrário, levando o seu proprio rebanho a beira da morte, exagerando a quantidade de uréia, esta de parabens a equipe de profissionais, pela excelente matéria, fazendo com que muitos pecuaristas observem bem seus procedimentos nas fazendas, e sempre que possivel estejam aparados por médicos veterinários, pois são esses que estarão ao seu lado para indicar, contra-indicar a uréia no seu rebanho.
Um grande abraço.
Tenho uma pequena dúvida: a diluição da uréia para suplementação de N não proteico é recomendada?
Banhar a cana triturada ou outra fonte de forrageira. “Se a uréia em contato com liquido se transforma em NH4 e este no rumem é reduzido em NH3, causando quadros super agudos de intoxicação quando ingeridos na forma líquida devido ao excesso de NH3 livre no rumem, conseqüentemente, maior absorção e maior concentração circulante no organismo.”
Prezado José Brígido Pereira Pedras Júnior.
Obrigado pelo elogio. Qualquer dúvida que possa surgir me coloco a disposição.
Atenciosamente,
Thales
Assunto de extrema importancia e muito bem esclarecido! Parabens!
Gostaria de implementar a informação sobre o uso de ureia que quando associada a uma fonte de enxofre na proporção de 10:1 (10 partes de ureia para 1 parte de enxofre), aliada com uma fonte de energia ( milho, milheto ou sorgo triturados), pode melhorar a conversão alimentar dos bovinos.
Um forte abraço.
Prezado David de Castro Lima,
Realmente muitos produtores desconhecem o assunto e quando aplicam acabam errando na dosagem, favorecendo quadros de intoxicação associado ao futuro preconceito contra este fabuloso ingrediente na dieta. O aparo de profissionais adequados é extremamente importante em sistemas intensivos de produção, uma vez que somos aptos a indicar dietas e corrigir possíveis intercorrencias nos fortificando no meio produtivo.
Obrigado pelas colocações e elogios.
Forte abraço.
Thales
Prezado Rodrigo Cáceres
O rúmen ter um forte potencial redutor em seu meio, o que muitas vezes nos coloca em situações delicadas frente a este tipo de suplementação. Por ocorrer essa redução de NH4 para NH3, a NH3 não é convertida em proteína microbiana e sim absorvida mais acentuadamente entretanto quando fornecemos uréia em grão essa redução fica “mais lenta” em relação a forma liquida. O problema está quando o animal bebe esta água com grandes concentrações de NH4.
A diluição da uréia é indicada sim, pois fornecemos em pequenas proporções da dieta total do rebanho e não conseguiríamos obter uma mistura homogênia sem que esta fosse diluída.
Espero ter esclarecido sua dúvida.
Thales
Gracias por la orientación. Si el ganadero no protege de la lluvia la sal mineral proteinada con úrea, puede tener bajas inmediatas que el personal a cargo confunde con otras dolencias si no está debidamente capacitado. HAce poco padecí de estos efectos, agradezco nuevamente por el artículo.
Gostaria de saber como é feito essa adaptação dos animais e qual o máximo que deve ser fornecido de uréia.
Meus parabéns pelo assunto exposto pois é de muita importância.
Prezado José Rodolfo Reis de Carvalho.
Primeiramente gostaria de agradecer os elogios pelo artigo.
A adaptação deve ocorrer por 15 dias com 0,5% de uréia e aumentando 0,5% a cada semana posterior a adaptação até atingir a dosagem desejada. O máximo de uréia fornecida vai depender de como será fornecida, categoria animal ou como será formulada, normalmente a dosagem de uréia é de:
*35% da proteína bruta da ração;
*1% total da matéria seca (MS);
*1,5% MS da forragem;
*3% MS do concentrado;
*30% da mistura mineral.
Espero ter ajudado, no mais me coloco a disposição para eventuais dúvidas.
Sucesso.
Thales.
Um excelente artigo, muito bom, coisas que demorei quase dois meses para entender, consegui entender lendo esse artigo.
Um abraço e minha respeitosa gratidão pelo artigo, obrigado!
Prezado Renildo Rocha,
Fico feliz pelos elogios. Realmente fiz um artigo de fácil leitura e compreensão.
Obrigado pelas palavras!
Caso tenha eventuais dúvidas, pode me procurar!
Sucesso em sua carreira!
Forte abraço,
Thales
A uréia de adubação pode ser usada no trato animal? Qual o risco de residual na carne para consumo?
massa de soja ao passar do tempo pode estragar isto tras mal ao animal de corte