Louis Orenga é presidente do CIV, Centre d’Information des Viandes, da França. Ele concedeu essa entrevista ao BeefPoint durante o Salon International de l’Agriculture em Paris na semana passada.
Falou sobre o trabalho de informação que o CIV vem desenvolvendo desde 1987. Segundo Louis, esse é um trabalho de longo prazo e focado na transparência e veracidade das informações. É interessante notar que muito dessa experiência vem do fato de terem vivido várias crises, como a da doença da vaca louca em 96 e 2000.
O objetivo do CIV não é aumentar o consumo de carne, mas sim munir o consumidor de informações corretas e verdadeiras, para que possa decidir da maneira que deseje.
BeefPoint: Como os produtores franceses vêem o CIV?
Louis Orenga: Temos um apoio importante dos criadores, que são uns dos nossos financiadores. O criador sabe que a atividade pecuária é de longo prazo e nosso trabalho também é de longo prazo e busca a perenidade dessa atividade. Não é um trabalho de promoção de uma marca, de uma empresa, mas sim a informação do produto, da carne. É com isso que o produtor trabalha, com o produto em si, por isso essa identidade.
BeefPoint: O senhor poderia explicar um pouco o trabalho do CIV e diferenciar Informação de Promoção?
LO: Em crises como a da “vaca louca” aqui na Europa é preciso fornecer informações ao consumidor, quando temos esse tipo de problema, só propaganda não funciona.
Nossa estratégia tem sido mostrar a verdade; se temos um problema não o escondemos, mas sim mostramos que ele existe e tudo o que estamos fazendo para resolvê-lo.
No auge da crise da EEB o consumo de carne bovina caiu 40% em relação ao nível normal. Hoje está apenas 5% abaixo do que era esperado para consumo em 2002, se não tivéssemos esses problemas.
Outros países como Alemanha, Itália e Grécia continuam com um consumo entre 10 e 20% menor que o esperado. Minha explicação para isso é que não conseguiram informar o consumidor de forma eficiente.
BeefPoint: Como o senhor explica o retorno do consumo na França?
LO: Na França, hoje, acredito que o problema da segurança alimentar da carne bovina está resolvido. Existe confiança por parte do consumidor de que comer carne é seguro. A transparência é muito importante, é fundamental para se conseguir a confiança desse consumidor.
Outro ponto que temos trabalhado bastante é a questão do equilíbrio alimentar. Mostramos que é muito importante ter uma alimentação balanceada para se ter uma vida saudável. E damos argumentos precisos das razões da carne vermelha estar incluída nessa dieta balanceada.
BeefPoint: Porque divulgar cortes e receitas de carne?
LO: A cada dia, mais e mais jovens compram produtos prontos. São fáceis de se comprar, preparar, comer.
Escolher entre cortes é difícil, pois o consumidor não conhece os nomes, não sabe como diferenciar cada corte e qual sua melhor utilidade ou forma de preparo.
Os produtos industrializados têm muita propaganda, temos que divulgar mais sobre nosso produto, para não perdermos a concorrência. Um ótimo exemplo é a pizza congelada, concorre com a carne, pois ao comer uma pizza você deixa de comer um bife e é muito fácil de ser preparada, não tem segredo.
Precisamos reeducar o consumidor para que conheça os cortes e para que saiba cozinhar cada corte da melhor maneira, a fim de ter um prato saboroso.
É bom lembrar que nosso trabalho tem sempre objetivos de longo prazo.
BeefPoint: O senhor poderia explicar mais sobre os desafios que o CIV vive hoje?
LO: Hoje, nos mercados dos países industrializados, há um problema seríssimo de desequilíbrio alimentar, de obesidade.
É injusto culpar o consumo de carne vermelha por esses problemas. Nos últimos 20 anos o número de obesos aumentou 4 vezes e o consumo de carne só diminuiu. O grande problema é a desinformação ou informações falsas.
Hoje, na França, quanto mais “informado” for o consumidor, maior a tendência de acreditar que carne vermelha faz mal à saúde. Existem inúmeros executivos que estão diminuindo o consumo de carne vermelha por acreditarem que melhorarão sua saúde.
Nosso público alvo é aquele consumidor que gosta de carne vermelha, mas está na dúvida e está pensando em parar de comer pois pensa que não é saudável ou não é seguro.
Temos que informar de maneira muito consistente esse consumidor e deixá-lo escolher. Se alguém não quer comer carne porque não aprecia seu sabor, não há problema. Nosso objetivo é informar da melhor maneira. A escolha é por parte do consumidor. Tem funcionado bem assim.
BeefPoint: Como o consumidor francês vê a carne hoje? Qual o posicionamento que o CIV busca?
LO: Ainda existem algumas questões em relação ao sistema de criação e à qualidade do produto.
A maior tendência de consumo na Europa hoje é a procura por alimentos naturais e por produtos tradicionais.
A carne é um produto extremamente natural e tradicional, mas o consumidor não sabe disso! Precisamos informá-lo que a carne se adequa muito bem à esse estilo de vida.
O consumidor de hoje procura produtos que têm todos os atributos da carne vermelha, mas parece estar cego, pois na maioria das vezes não consegue perceber que a carne oferece exatamente o que ele procura.
Outro exemplo muito claro é a busca por produtos magros ou ligth. A carne vermelha pode ser extremamente magra.
A grande busca do consumidor de hoje é por fazer uma escolha correta. Ele deseja estar de consciência tranquila. Não quer agredir o meio ambiente com suas escolhas e deseja produtos seguros e saudáveis para ele e sua família.
Precisamos informar os atributos da carne para permitir que essa escolha seja feita baseada em fatos reais, não em falsa ciência.
BeefPoint: Um dos objetivos do CIV é aumentar o consumo de carne vermelha, de roubar espaço do frango?
LO: Não queremos aumentar o consumo. Queremos apenas informar a verdade sobre nosso produto e deixar o consumidor tomar decisões baseadas nessas informações.
Nosso objetivo é manter o consumo, que nos últimos 25 anos caiu 20% na França. Hoje, consumimos em média 15 kg de carne bovina, 30 de suína, 22 de frango, 4,5 de vitelo e 4,5 de cordeiro por ano per capita.
BeefPoint: Nas ações do CIV há uma busca pelo contato direto com o consumidor. Porque esse caminho alternativo, e não apenas a publicidade tradicional?
LO: Não adianta apenas publicar artigos e comprar anúncios em revistas, TV´s e jornais. O grau de informação que precisamos passar para termos algum resultado é bem maior do que esses meios permitem. É claro que fazemos um pouco de ações “tradicionais” como artigos e anúncios.
No Salão da Agricultura de Paris por exemplo, treinamos 1250 pessoas por dia e distribuímos mais de 350 mil folhetos durante toda a feira.
Esse contato direto tem um efeito multiplicador e outro indireto. O multiplicador se deve ao fato de quem interage conosco nessas feiras e eventos geralmente é formador de opinião e está buscando informações. Está querendo entender, faz perguntas e presta bastante atenção. A mensagem é transmitida de forma eficiente. Com isso essa mensagem tende a ser retransmitida mais vezes.
Já o efeito indireto ocorre pois quem é incrédulo, ou não acredita que a carne é saudável, ou tem um preconceito, sofre um choque de credibilidade quando montamos um evento como Village de la Viande, quando montamos um stand numa cidade e ficamos alguns dias tendo atividades com crianças e adultos e convidamos toda a comunidade. Mesmo quem não vai, fica com uma impressão de que somos sérios e temos informações consistentes para mostrar. Isso também é bastante positivo.
BeefPoint: O senhor tem algum conselho para o Brasil, para o SIC?
LO: O consumidor é receptivo e gosta de receber informações e publicidade. É possível de se trabalhar isso de maneira bem sucedida, mas isso não é suficiente.
Precisamos explicar nosso sistema de produção. A carne vermelha é consumida há milhares de anos. Temos que trabalhar com uma visão dentro desse contexto, de longo prazo.
Precisamos aceitar os problemas e ser transparentes antes de tudo. O ponto de partida é ter a visão do consumidor.
BeefPoint: Qual é o próximo passo do CIV? Qual o próximo desafio?
LO: Nosso próximo desafio é mostrar para o consumidor, para o cidadão médio, que a pecuária de corte e a própria carne vermelha são pontos importantes para o equilíbrio social, ambiental e nutricional de nosso país.
Para saber mais acesse:
www.civ-viande.org
www.sic.org.br