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Mitos e verdades sobre irrigação de pastagens. 1. Disponibilidade de água

Uma das palestras apresentadas no último Simpósio sobre Manejo da Pastagem, organizado pela FEALQ e realizado na ESALQ/USP em setembro de 2003, foi sobre irrigação de pastagens (Balsalobre et al., 2003). A irrigação de pastagens tem sido motivo de discussão há vários anos. Entretanto, foi nos anos 90 que esse assunto se tornou mais evidente.

Os bons resultados divulgados sobre os primeiros sistemas irrigados de produção animal colocavam este empreendimento como negócio de grande viabilidade econômica. Passada essa fase inicial de euforia, no entanto, faz-se necessária uma análise mais abrangente do uso da irrigação em áreas de pastagens. Esse foi o objetivo de Balsalobre et al. (2003) durante o Simpósio sobre Manejo de Pastagens da ESALQ/USP. Nos próximos artigos desta série, os principais aspectos abordados durante esta apresentação serão discutidos, procurando esclarecer questões como: De que forma a irrigação de pastagens deve ser inserida no sistema de produção? Quais os locais mais adequados para a adoção de técnicas de irrigação? A irrigação de pastagens poderá solucionar o problema de estacionalidade de produção?

    1- Disponibilidade de água para irrigação

Um dos aspectos abordados por Balsalobre et al. (2003) foi com relação à disponibilidade de água para irrigação. Um relatório divulgado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO, 2003) aponta a água como o motivo da próxima crise mundial. A demanda tem aumentado enquanto que os suprimentos de água de qualidade têm diminuído, de tal forma que, em 20 anos, a média de água por habitante deve reduzir para um terço.

A UNESCO recomenda que cada habitante tenha à sua disposição 1000 m3 de água por ano. O Brasil possui 18% das reservas de água doce do mundo, o que significa, em média, 34.000 m3 de água por habitante/ano. A distribuição da água dentro do território nacional, no entanto, é irregular. Um habitante das regiões Sul, Sudeste e Nordeste possui cerca de 6.000 m3 de água por ano, enquanto que um das regiões Centro-Oeste e Norte possui 200.000 m3. Na região Nordeste, onde a disponibilidade de água é mais crítica, há uma oferta média de 3.600 m3/habitante.ano. Ainda assim, esse valor é 3,6 vezes maior do que o recomendado pela Unesco.

No Quadro 1 são apresentados os indicadores nacionais de irrigação no ano de 1998. No Brasil, a área irrigada foi estimada em 2,9 milhões de ha, que representa apenas 6% da área agrícola total (Cristofidis,1999, citado por Manzatto et al., 2002). Apesar disso, em 2000, a área irrigada foi responsável por cerca de 16% da produção agrícola e 35% do valor dos produtos agrícolas no Brasil. No Quadro 3 é possível observar também que, apesar da maior parte dos solos aptos à irrigação estarem localizados na região Norte, as maiores áreas irrigadas atualmente encontram-se nas regiões Sul e Sudeste.

Quadro 1: Indicadores da irrigação no Brasil no ano de 1998.


Embora a área irrigada seja relativamente pequena diante do potencial, estas estão concentradas em alguns centros, o que provoca o exagero de, em um país com grande disponibilidade de água doce, ocorrer falta de água para a população de algumas cidades. Esses dados indicam a necessidade de uma política de uso da água para irrigação no sentido de direcionar locais passíveis de serem irrigados e com a definição de que culturas podem ser plantadas. A produção de carne em áreas irrigadas não deve ser priorizada, pois exige muita água por unidade de produto quando comparada com outras culturas agrícolas (Quadro 2).

Quadro 2- Necessidade de água para a produção de alguns alimentos (m3 de água/kg de produto).


Com a intenção de educar o consumidor a melhorar a eficiência no uso da água, São Paulo poderá vir a ser o primeiro estado a cobrar pelo uso da água, pois a Política Estadual de Recursos Hídricos, através da Lei 7663/91, que cria o Sistema Integrado de Gerenciamento de Recursos Hídricos -SIGRH- prevê isso. A cobrança incidirá sobre a utilização da água por qualquer um e para qualquer uso, inclusive os irrigantes, sendo esse mais um item que deve ser computado no custo de sistemas irrigados.

Comentário dos autores: Os dados apresentados por Balsalobre et al. (2003) mostram que, apesar da disponibilidade de água no Brasil ser elevada, a água é um recurso estratégico e sua utilização no país deve ser planejada com muito critério. Isso exige uma ação ampla do governo em conjunto com a sociedade, onde se busque indicar as áreas críticas, estabelecer normas para a utilização da água e desenvolver campanhas de esclarecimento do público. Essa preocupação com a preservação do recurso água não significa que a irrigação de pastagens deva ser proibida… significa apenas que este é um ponto importante e que deve ser levado em consideração, tanto para um planejamento do país e das regiões estratégico quanto para o planejamento das propriedades rurais.

Balsalobre, M.A.A.; Santos, P.M.; Maya, F.L.A.; Penati, M.A.; Corsi, M. Pastagens Irrigadas. In: Peixoto, A.M.; de Moura, J.C.; Pedreira, C.G.S.; de Faria, V.P. Simpósio sobre Manejo da Pastagem, 20. Anais. Piracicaba, 2003.
Manzatto, C.V.; Freitas Júnior, E. D.; Peres, J.R.R. Uso Agrícola dos Solos Brasileiros. Rio de Janeiro: EMBRAPA. 2002. 174p.
UNESCO. Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura. Water for People Water for Life. www.unesco.org. 2003.

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