A qualidade da forragem, em sistemas irrigados, e o desempenho animal foram temas abordados por Balsalobre et al. (2003a). Como mencionado no primeiro artigo desta série, os dados divulgados na década de 90 sobre sistemas irrigados de produção animal indicavam excelentes resultados, inclusive de desempenho animal. Estas informações, no entanto, precisam ser analisadas de forma crítica a fim de gerar parâmetros técnicos que possam ser utilizados para a análise e elaboração de projetos.
Estresse hídrico de curto período (veranicos) pode promover melhoria na qualidade da forragem, pois aumenta a digestibilidade da MS e reduz a relação haste/folha (Vough & Merten, 1971; Halim et al., 1989). A explicação para isso é que em estresse hídrico há uma redução do ritmo de crescimento da planta e com isso acúmulo de solutos (nutrientes) nas células, o que melhora sua qualidade. Por outro lado, períodos prolongados de estresse hídrico podem promover o aumento da espessura de células do esclerênquima (Paciullo et al., 1999), reduzindo o ataque de microorganismos no rúmen (Wilson & Mertens, 1995).
A qualidade nutricional do capim Tanzânia irrigado foi avaliada durante o Projeto CAPIM (Caracterização e Avaliação de Pastagens Irrigadas e seu Manejo, desenvolvido pela ESALQ/USP e financiado pela FAPESP) em Piracicaba-SP (Balsalobre et al., 2003b). Amostras simulando o pastejo do capim Tanzânia irrigado sob três resíduos pós-pastejo foram coletadas ao longo de um ano e analisadas para a determinação da composição protéica e dos carboidratos, e das frações protéicas e de carboidratos. O teor de NDT foi calculado. Não foi encontrada diferença entre os tratamentos ao longo do ano. Os maiores teores de FDN (68,3 a 64,5%) e de FDA (34,9 a 33,2%) ocorreram no período de primavera/verão. A lignina apresentou maiores proporções no inverno (4,7 a 4,1%). O NDT variou entre 55,3 e 59,3%. O teor de PB apresentou tendência de aumento ao longo do ano, variando de 11,3 a 15,6%. Os teores de nitrogênio não protéico variaram entre 18,2 e 28,8%, sendo menores para os pastejos de primavera/verão. A menor qualidade da planta foi entre julho e setembro.
Os resultados obtidos por Balsalobre et al. (2003b) mostram que há variação na qualidade da forragem ao longo do ano, tanto da parte protéica como dos carboidratos. No entanto, deve-se ressaltar que a qualidade da planta em áreas irrigadas apresenta-se com menores alterações que em pastagens de sequeiro.
O consumo do capim Tanzânia por animais Nelore castrados também foi avaliado durante o Projeto CAPIM. Em média, durante a primavera o consumo de capim Tanzânia foi de 61,31 g MO/KgPM, enquanto que, para o período de verão e outono foi, respectivamente, de 77,10 e 75,20 g MO/KgPM (Balsalobre, 2002).
Os consumos obtidos associados à qualidade nutricional da forragem permitiram ganhos entre 300 e 700 g/cabeça.dia (Penati, 2002). A simulação dessas dietas no programa de Cornell indicaram ganhos de peso da ordem de 450 a 650 g/cabeça.dia (Balsalobre et al., 2003a).
Comentário: A divulgação de resultados de desempenho animal de 1 kg/animal.dia ou mais, tem sido relativamente comum quando se trata de sistemas de produção irrigados. Os resultados discutidos por Balsalobre et al. (2003a) indicam uma expectativa de ganho de peso 0,3 e 0,7 kg/animal.dia. Níveis de desempenho animal de 1 kg/animal.dia ou mais, normalmente, são obtidos em períodos curtos de avaliação, principalmente com animais que apresentam ganho de peso compensatório (animais que sofreram alguma restrição alimentar anteriormente). A adoção de parâmetros como este no momento da análise e elaboração de projetos deve ser feita com bastante cuidado, pois o risco deste índice não ser atingido é bastante elevado, o que pode inviabilizar o projeto como um todo.
Referências:
BALSALOBRE, M. A. A. Valor alimentar do capim Tanzânia irrigado. Piracicaba, SP: ESALQ, 2002. Tese (Doutorado em Agronomia) – Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”/Universidade de São Paulo.
BALSALOBRE, M.A.A.; SANTOS, P.M.; MAYA, F.L.A.; PENATI, M.A.; CORSI, M. Pastagens Irrigadas. In: Peixoto, A.M.; de Moura, J.C.; Pedreira, C.G.S.; de Faria, V.P. Simpósio sobre Manejo da Pastagem, 20. Anais. Piracicaba, 2003a.
BALSALOBRE, M.A.A.; CORSI, M.; SANTOS, P.M.; VIEIRA, I.; CÁRDENAS, R.R. Composição química e fracionamento do nitrogênio e dos carboidratos do capim-Tanzânia irrigado sob três níveis de resíduo pós-pastejo. Revista Brasileira de Zootecnia, v.32, n.3, p.519-528, 2003b.
HALIM, R.A.; BUXTON, D.R.; HATTENDORF, M.J.; CARLSON, R.E. Water stress effects on alfalfa forage quality after adjustment for maturity differences. Agronomy Journal, v.81, p.189 – 194, 1989.
PACIULLO, D.S.C.; MATTOS, J.L.S.; GOMIDE, J.A.; QUEIROZ, D.S.; SILVA, E.A.M. da. Proporção de tecidos espessura da parede celular em espécies de braquiária, cultivadas sob diferentes níveis de umidade do solo (compact disc). In: REUNIÃO ANUAL DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE ZOOTECNIA, 37., Porto Alegre, 1999. Anais. Porto Alegre: SBZ, 1999.
PENATI, M.A. Estudo do desempenho animal e produção do capim Tanzânia (Panicum maximum Jacq.) em um sistema rotacionado de pastejo sob irrigação em três níveis de resíduo pós pastejo. Piracicaba. Tese (Doutorado) – Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, Universidade de São Paulo. 2002.
VOUGH, L.R.; MARTEN, G.C. Influence of soil moisture and ambient temperature on yield and quality of alfalfa forage. Agronomy Journal, v.63, p.40 – 42, 1971.
WILSON, J.R.; MERTENS, D.R. Cell wall accessibility and cell structure limitations to microbial digestion of forage. Crop Science, v.35, n.1, p.251 – 259, 1995.