O mercado consumidor de carne bovina livre de resíduos químicos é a nova meta de criadores de gado de corte no Brasil. Por enquanto, a carne livre de substâncias químicas abastece o mercado europeu, com índice de crescimento de 25% ao ano.
A carne orgânica como alternativa de renda foi o tema abordado ontem pelo presidente da Associação Brasileira de Produtores de Carne Orgânica, Homero Figliolini, durante o segundo dia de palestras do I Encontro Internacional dos Negócios da Pecuária (Enipec), que termina hoje no Centro de Eventos Pantanal, em Cuiabá, Mato Grosso.
Desde seu surgimento no País, há três anos, este sistema alternativo de manejo bovino, que consiste no emprego de técnicas pouco usuais para criação extensiva de animais, como o uso da homeopatia e da fitoterapia (medicação à base de plantas), fez surgir nos cerrados brasileiros o “boi orgânico”.
Para a formação de um rebanho orgânico, é preciso, antes de mais nada, estar enquadrado no sistema de rastreabilidade bovina. O sistema de “rebanho orgânico” respeita e preserva as características mais sensíveis do meio ambiente, pois o pasto não recebe adubação e nem tratamento com herbicidas. O processo de cria, recria, engorda e abate é feito por meio de um manejo rotativo, que proporciona o descanso do pasto por 30 dias.
O calendário de vacinação é respeitado. Vermífugos, pesticidas, hormônios e carrapaticidas são substituídos por medicamentos homeopáticos e fitoterápicos administrados junto com o sal mineral. “No caso de medicação convencional, como antibióticos, o número do gado medicado vai para a central que processa as informações contidas no chip (certificadora). O animal é retirado do lote e fica afastado do rebanho por um prazo duas vezes maior que o recomendado pelo laboratório”, explica Figliolini.
Custos
A adoção do sistema de “boi orgânico” pode onerar em cerca de 20% os custos para o produtor se comparado ao rebanho tradicional. “Mas a produtividade e o valor de compra desta carne, um pouco superiores, garantem lucro para o produtor”, afirma o presidente da Associação.
Até agora, apenas duas remessas de carne brasileira de origem orgânica foram exportadas, representando cerca de 100% do total produzido no País. Em Mato Grosso, há cerca de 40 mil bovinos “orgânicos”, em fazendas do grupo Carrefour em Tangará da Serra e em Juruena.
A produção do rebanho orgânico no Brasil, com cerca de 200 mil cabeças em processo de rastreabilidade, segue normas criadas pela União Européia, que, até 2003, permitem que um bezerro de até oito meses possa ser recriado e engordado nas normas orgânicas. Em 2008, o bezerro só poderá ser adotado pelo sistema se for filho de vaca orgânica.
“Nelore natural” chega ao Estado
“Nelore Natural, Boi de Capim, Carne Saudável”. Essa é a proposta que a Associação dos Criadores de Nelore do Brasil está divulgando no Enipec, por meio do Programa de Qualidade Nelore Natural. A iniciativa prevê a garantia da qualidade da carne final que chega ao consumidor, monitorando todas as etapas da cadeia produtiva: desde a criação, passando pela indústria e varejo. O Mato Grosso é o segundo Estado a receber a iniciativa, que existe há cinco meses em Rondônia, e onde 30 mil animais já foram abatidos de acordo com os padrões exigidos.
O gerente executivo da associação, Eduardo Pedroso, explica que o objetivo do programa é incentivar o consumo da carne de nelore, transformando-a numa espécie de grife. Por isso, as iniciativas da entidade incluem cursos de receitas para donas de casa e degustações de pratos preparados por chefes de cozinha internacionais, como Paulo Ramos, que há mais de 30 anos atua no setor.
“Não existe carne de primeira e carne de segunda. Existe o boi de primeira e o boi de segunda”, comenta o chefe, detalhando que na Europa vários pratos são preparados a partir do músculo bovino, peça com pouca aceitação pela classe média brasileira.
Para fazer parte do módulo 1 do Programa de Qualidade Nelore Natural, o produtor é submetido a um termo de responsabilidade, com quesitos a serem cumpridos. O gado deverá, por exemplo, comer exclusivamente capim e sal. Somente suplementação vegetal é aceita, e, dessa preocupação, vem o nome “boi de capim”.
Para abate, o nelore natural deve ter menos que três anos, pesar entre 16 e 19 arrobas, e ter cobertura de gordura de três a oito milímetros. Esta medida faz com que a cobertura funcione como um isolante térmico, o que resulta em fatias mais macias de carne. “Isso tudo o produtor já sabe. Não precisamos ensinar ao pecuarista como criar o gado. É preciso apenas adaptá-lo às exigências do mercado”, acredita o gerente da associação. Em São Paulo, o “Nelore Natural” de Rondônia está sendo vendido pela rede de supermercados Andorinha.
Investimento
Quem se interessou pelo sistema de criação orgânico precisa estar pronto para desembolsar uma grande quantia para investimento. A rastreabilidade é princípio fundamental e, para um rebanho de cerca de 2 mil cabeças, o processo de certificação demanda R$ 5 mil.
“Também será necessário investimento em consultoria. Os insumos são um pouco mais caros do que os convencionais, mas o consumo é menor, o que equilibra o custo. O retorno está garantido para o produtor”, analisa Homero Figliolini. Para a implantação do chip, a relação é de cerca de US$ 3 (ou R$ 7) por cabeça. O chip foi criado e é vendido pela Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias (Embrapa).
Quem quiser apenas certificar a origem do gado, sem pretensões de exportação, poderá apenas certificar o rebanho por meio da marcação a ferro quente, que custa R$ 1 e mais R$ 3 a cada auditoria da Embrapa.
“Um animal, em média, sofrerá cerca de três auditorias durante sua vida”, explica o pesquisador da Embrapa, Pedro Paulo Pires. Para minimizar o impacto desta adequação, o chip pode ser reutilizado por até cinco vezes. “O produtor entrega o chip usado à certificadora e recebe um outro no lugar”, esclarece Pires.
Fonte: Diário de Cuiabá/MT (por Marianna Peres e Joanice Pierini Loureiro), adaptado por Equipe BeefPoint