Eduardo Rabelo1
Uma das poucas coisas que se tem unanimidade no Brasil é quem foi o melhor jogador de futebol.
Ninguém contesta o reinado de Pelé. Goleiros do mundo todo sucumbiram mais de mil vezes diante da genialidade, habilidade, técnica, competência e dom de marcar gols do Rei. E, apesar desse currículo todo, o único dos filhos de Pelé, que além do seu patrimônio financeiro, tentou herdar o trono do pai nos gramados, não passou de um limitado goleirinho. Isso mesmo: o mais temido carrasco dos goleiros só conseguiu “produzir” um insignificante goleiro, que nunca foi convocado para defender as cores nacionais, e só jogou no glorioso “Peixe” de outrora, o Santos Futebol Clube, porque seu pai é quem é. E quando Edinho resolveu precocemente pendurar as chuteiras, digo, as luvas, nem um dos milhares de fiéis e apaixonados torcedores do “Peixe” sentiram sua falta.
E por que tem gente que teima em acreditar que filho de peixe sempre será um peixinho?
Qual é o tradicional fazendeiro que não levou o primogênito para passear pelas verdejantes pastagens, sentadinho na cabeça do arreio, quando a criança ainda nem conseguia equilibrar a própria cabeça em cima do pescoço, na esperança de que ele fosse “tomando gosto pela coisa!”.
O sempre bem intencionado fazendeiro que pegou boi a unha e enfrentou onça a tapa para expandir os seus roçados e engordar o patrimônio da família, fica cego de vontade para que pelo menos um de seus pimpolhos leve adiante a sua saga de empresário rural bem sucedido. Mas infelizmente nem sempre é assim que as coisas acontecem. Se, eventualmente alguns herdeiros conseguem manter a tradição de sucesso agrário, o que não faltam são os casos, já tradicionais em todo o Brasil, onde os jovens Príncipes do gado, tão logo assumem as rédeas dos negócios da família vêem os seus castelos cercados de aroeira e arame liso, virar poeira numa velocidade galopante, justamente porque genialidade, habilidade, técnica, competência e dom não são hereditários. Os torcedores do Santos que o digam.
Portanto, prezados papais pecuaristas, antes de entregarem seu rico patrimônio de porteira fechada ao pimpolho, submeta-o a um teste básico.
Procure saber se ele tem vocação.
Certifique-se que o fato dele – o herdeiro – ter largado tudo, eventualmente até os estudos, com o discurso de “… vou ajudar meu pai na fazenda…” é uma opção verdadeira, fruto de uma vocação inadiável, pensada, de um jovem e promissor empresário que acredita no setor primário do agribusiness; e não é a falta de opção de um malandro preguiçoso, que em vez de se preparar nos bancos acadêmicos para enfrentar a competitividade crescente do mundo moderno, preferiu se esconder debaixo das asas do papai e curtir a sombra e água fresca da fazenda.
Procure saber se ele tem capacidade administrativa.
Dê a ele – ao herdeiro – pequenas responsabilidades com a devida liberdade de ação no dia a dia da fazenda e deixe-o se virar. Estabeleça, por escrito, qual é a data e quais são os resultados mínimos que você aceita da empreitada que está sendo dada a ele. Faça isso repetidas vezes e em áreas diferentes da empresa – recursos humanos, financeira, mercadológica, produção – e lembre-se: quem não consegue administrar uma parte, que dirá o todo!
Procure saber se ele tem empregabilidade.
Pesquise nos quatro cantos do mundo e tente realmente encontrar algum outro empresário rural que pagaria ao seu promissor herdeiro o mesmo que você está pagando, com as mordomias de carro, casa, etc. e tal, a troco dele desempenhar o mesmo trabalho que está desempenhando na sua fazenda. Se encontrar, então ele tem empregabilidade, e você não estará subsidiando mais uma vez as aventuras de um playboy rural.
Se após os 03 testes você continuar acreditando que o seu filho tem futuro como empresário rural, vá em frente, solte as rédeas do garoto. Pois, nem sempre filho de peixe é peixinho. Às vezes é tubarão…
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1 Veterinário, Produtor Rural e Consultor Sebrae-GO
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Lendo seu artigo começei a analisar a história de minha família. Venho de uma família que sempre foi de fazendeiros há 8 ou mais gerações. Meu 5º avô, meu tataravô, meu bisavô, todos ótimos fazendeiros, fizeram a fortuna da família. Meu pai herdou várias fazendas e perdeu várias fazendas. Sobrou uma… a que eu herdei com dívidas e desorganizada e tive que fazer um empréstimo no banco para pagar os empregados! Lendo seu artigo percebi que ele não era um “peixinho” e eu, que nunca fui levada na boléia de nenhum cavalo e nunca fui incentivada a ser uma fazendeira (justamente por ser mulher), acabei descobrindo que era uma “peixinha”, pois apesar de pegar um bonde andando e fora do trilho, consegui por a fazenda para frente e hoje vivo muito bem com o que ela produz. Realmente para ser fazendeiro tem que ter vocação, e não apenas vontade de colocar bota e montar num cavalo.