A disposição dos administradores públicos em incentivar a implantação de novas usinas de beneficiamento de cana é compreensível. Mas não se pode admitir que o entusiasmo em torno do "ouro verde" prejudique o desenvolvimento de setores que também possuem peso inegável na balança comercial, como a pecuária. Nos últimos dez anos, a exportação de carne bovina saltou de US$ 500 milhões para US$ 3 bilhões. Mas a contrapartida governamental para estimular o setor ficou aquém do esperado.
A indústria sucroalcooleira do Brasil vive dias de exuberância e expectativa ímpares. Graças à tecnologia utilizada na produção do etanol, o país ganhou prestígio e despertou o interesse de países desenvolvidos na busca por soluções que diminuam o impacto causado pela poluição na atmosfera. Mas a febre em torno do biocombustível pode trazer conseqüências desastrosas ao setor agropecuário.
Com a perspectiva de que os investimentos estrangeiros vão aumentar consideravelmente nos próximos anos, muitos fazendeiros já pensam em trocar o gado pela cana-de-açúcar, num movimento sem paralelos que pode ter reflexos irreparáveis ao setor pecuarista, sobretudo no interior do Estado de São Paulo.
A disposição dos administradores públicos em incentivar a implantação de novas usinas de beneficiamento de cana é compreensível. Mas não se pode admitir que o entusiasmo em torno do “ouro verde” prejudique o desenvolvimento de setores que também possuem peso inegável na balança comercial, como a pecuária.
Nos últimos dez anos, a exportação de carne bovina saltou de US$ 500 milhões para US$ 3 bilhões, o que permitiu alcançarmos o topo do ranking mundial, com cerca de 20% do mercado, com taxas de crescimento anual em valor (24%) e volume (31%). Mas a contrapartida governamental para estimular o setor ficou aquém do esperado, já que os produtores registraram aumento do custo efetivo de produção de 31% e um acúmulo de perdas que levou os preços da mercadoria ao menor patamar dos últimos 50 anos.
O contrasenso na aplicação de recursos não se limita ao estímulo à cana-de-açúcar. Nos últimos anos, o governo federal destinou milhões de reais para fazer a reforma agrária, em doses inversamente proporcionais ao que foi gasto com a pecuária. O investimento é justo e ameniza a situação difícil de milhares de famílias que vivem em situação de miséria. Mas de nada adianta se não houver o fortalecimento de outras atividades no campo.
A posição privilegiada da pecuária nacional ainda não sensibilizou as autoridades, ao contrário do que ocorre com a cana. Até 2014, nossa liderança no comércio de carne bovina deve ser ainda maior, já que o consumo aumentará consideravelmente, uma tendência que se acentua com o passar dos anos, ao mesmo tempo em que o número de produtores cairá consideravelmente, sobretudo por causa da redução do espaço para a atividade. Nesse sentido, o cenário que se apresenta diante de nossos olhos é fantástico, indicando que somente seis players permanecerão produzindo carne bovina – Brasil, Austrália, Canadá, Argentina, Índia e Nova Zelândia.
Sem investimentos para a implantação de um rigoroso controle de vigilância sanitária, o produtor eficiente viverá ameaçado de ver seu produto rejeitado pela irresponsabilidade de quem não se preocupa em prevenir o surgimento de focos de febre aftosa. Desde 2000, a União Européia determinou a adoção de controles severos na rastreabilidade do gado. Mas ainda hoje o Brasil tem dificuldades para se enquadrar dentro dessas exigências.
As outras mazelas enfrentadas pelo setor são comuns à maioria dos empresários brasileiros, como o câmbio, a política de juros altos e as dificuldades impostas pela lei. Se hoje controlamos um quinto do mercado mundial com todas essas dificuldades, imagine qual seria nossa parcela se houvesse maior seriedade em torno dessas questões.
Enquanto isso, o estímulo à produção de etanol segue a todo vapor, incentivando o capital estrangeiro, com especial atenção para áreas localizadas em São Paulo. Aos poucos, os pequenos produtores alugam suas terras em troca de bons ganhos na colheita da cana. Se o governo estadual não agir rápido, corre o risco de ver essa indústria migrar para regiões como o Vale do São Francisco, no oeste baiano, e os estados de Goiás e do Tocantins. Vai entregar, de bandeja, uma parcela importante da arrecadação tributária e ainda terá de explicar ao consumidor o porquê do inevitável aumento de preços.
O empresário do campo não pode ficar refém da produção de etanol, principalmente porque está comprovado que existe vida além do mar de cana-de-açúcar vislumbrado por nossas autoridades. Se essa insistência se intensificar, a situação do setor pecuarista deve se agravar. Sem dinheiro para desenvolver tecnologia e ampliar a produção, o gado bovino nacional pode começar a gerar desconfiança nos mercados estrangeiros. Se canalizarmos a energia somente em torno da cana-de-açúcar, estaremos regredindo, numa espécie de retorno à monocultura dos tempos do Império. Um retrocesso que pode custar caro.
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Caro Nelson Pineda,
Esta invasão já chegou a Goiás e nós estamos perplexos com tanto investimento no setor, moro numa região praticamente de pecuária a um século e estamos vendo tudo que foi criado ir embora num passe de mágica, sim concordo com você estamos reféns do capital estrangeiro, mais o que o governo federal está criando com este incentivo ele pagará o custo mais tarde porque já passamos isso nos primórdios de nossa colonização, ai será que nós iremos ter mais impostos para pagar o prejuízo ou o governo da conta de bancar?
O que nós já vimos é que a 25 anos atrás os usineiros não tinham créditos para nada, e hoje são donos da verdade e heróis
Achei muito bom o comentário feito neste artigo. Ele retrata a realidade atual do setor. Só espero que o assunto chegue até o ouvido das autoridades competentes.
Ao meu ver, se tudo continuar indo por este caminho, à médio e longo prazo acredito que talvez o rebanho brasileiro até não diminua, mas mude de estados, concentrando mais ao norte. Em contrapartida, no estado de São Paulo ficaram os confinamentos e semi-confinamentos de gado, devido a riqueza de subprodutos da indústria que se revertem em ração animal.
Tenho propriedade que fica no município de Nova Independência, 43 km de Andradina, onde várias usinas estão sendo construídas, sendo que uma delas a 2km de minha propriedade. Em poucos meses minha propriedade será uma ilha de pastagem rodeada por um mar de cana, pois sou um dos únicos pecuaristas q ainda não cedeu as vantagens atuais desta cultura. Por quanto tempo isso vai durar, não sei!
Senhores não se pode resistir aos tempos e as novas tendências, a pecuária sofrerá um ajuste de oferta e um deslocamento que na minha opinião além do norte será também para o nordeste. No final será bom para quem for para a cana ou milho ou outras oleaginosas, mas será ótimo também para quem ficar na pecuária ou por opção ou por falta de oportunidade de mudar. No Brasil cabe tudo sem mais desmatamento.
José Luiz Ferreira de Oliveira
Parabéns ao Sr. Nelson Pineda por mais este comentário sobre a realidade brasileira da cana de açúcar e a pecuária.
Nós pecuaristas estamos na dúvida para onde iremos, pois a pecuária não mais remunera o criador (custos altos de produção e não valorização da arroba nos últimos 10 anos) e a cana rende mais economicamente por hectare do que o gado.
Aqui no Tocantins a tendência é vir para cá os pecuaristas de São Paulo, Minas, Goiás, etc. mas vale lembrar que se nós não nos unirmos, o lucro sempre ficará nas mãos dos frigoríficos.
Nós produtores, temos que nos espelhar nessas ponderações do Dr Nelson Pineda, que contextualiza muito bem a atual situação da migração da carne e do leite para a produção de cana de açúcar.
Se esses setores que estão perdendo áreas para a cana, não modernizarem e intensificarem a produção, poderemos ter problemas sérios de abastecimento no futuro, e toda a sociedade poderá perder com essa seqüela.
Entretanto, cabe aí uma intervenção governamental para conciliar todas as produções de uma determinada região, levando em conta a assistência técnica, crédito viável, juros menores, câmbio favorável e logística. Assim o Brasil continuará sendo um dos maiores produtores mundiais de alimentos.
Olá Nelson,
Depois do Workshop em Rio Preto sobre Cana e Leite, você faz chegar com seu excelente artigo a vez do gado de corte e aí as coisas realmente se complicam. Sem dúvida nenhuma grande parte da pecuária de corte vai se deslocar para outras regiões até que cheguem alternativas mais rentáveis por lá também como por exemplo o produção do biodiesel através do pinhão manso.
A única defesa que temos é de resolver nossos problemas sanitários e da rastreabilidade, se o governo ajudar. Mas não podemos mais esperar, temos que fazer nós mesmos funcionar o Fundepec e Sisbov em escala nacional com o empenho de todos os elos da cadeia da carne bovina e principalmente dos frigoríficos.
Um abraço,
Louis
O artigo do Eng. Pineda é um alerta importante que precisa ser encarado com muita seriedade. O avanço da cultura da cana é de fato assustador, e não é só em São Paulo, vejam o que está acontecendo em Goiás, onde empresas investiram em infraestrutura de produção, abate e industrialização de suínos e aves, mas correm o risco de ficarem sem as suas matérias primas.
Do meu ponto de vista essa “corrida do ouro” vai perdurar por um bom tempo, uma ou duas décadas, possivelmente, até que novas fontes de energia se tornem viáveis, aí então teremos a derrocada da cultura canavieira, mas já não haverá mais cercas nas propriedades rurais, nem gente, nem árvores e, num cenário bem pessimista, nem nascentes ou riachos, porque não haverá mais cerrados no Centro-Oeste.
Creio que quem ficar na produção agroindustrial de alimentos terá enormes oportunidades de mercado e não ficará no prejuízo a médio e longo prazo; e a nós, que temos acesso aos meios de comunicação, cabe estimular a resistência, como está fazendo o Pineda.
Já as empresas do setor de abate e industrialização precisam rever seus projetos atuais de investimento em gigantescos frigoríficos. Não importa o que digam os economistas quanto ao número ideal de cabeças abatidas, é preciso ver os problemas sócio-econômicos das milhares de famílias que ficarão sem renda no entorno desses estabelecimentos enormes. Melhor seria construir matadouros-frigoríficos menores, que possam ser mudados de local sem grandes abalos sociais se faltar gado, suínos ou aves, e centralizar a industrialização em fábricas a serem localizadas onde já exista mão de obra disponível.
Minha solidariedade ao Pineda nessa luta.
Caro Pineda,
Mais uma vez o Senhor foi muito feliz em suas colocações, e neste cenário aonde a preservação ambiental diminui o Brasil pela Amazônia, e a Silvicultura e a Cana apertam por outro lado vejo o Oeste da Bahia como a nova fronteira da pecuária nacional. Região provida de índice pluviométrico compatível com a pecuária moderna, excelente oferta de subprodutos da agricultura, localização geográfica privilegiada, entre inúmeros outros fatores.
Estou certo de que essa região virá em curto prazo ser a nova fronteira pecuária do Brasil. Estamos com a costumeira hospitalidade baiana a espera dos pecuaristas do futuro, para juntos construirmos a Bahia de todos.
Isto é o reflexo do cartel dos frigoríficos que nunca repassam para o produtor parte dos lucros que a atividade recebe. Exportamos muito a preços bons, para a indústria mas o produtor é penalizado e não recebe parte disso, pois os frigoríficos confinam com prejuízo para regular, (segurar) os preços e aí nunca são repassados os ganhos no tempo de vacas gordas e sempre são repassados os prejuízos quando o mercado está difícil.
Devemos deixar de culpar o governo que nunca faz sua parte, o pecuarista não se une em cooperativas de vendas e por isso ficará a merce dos frigoríficos, ou mudará para cana onde todos ganham quando o mercado está favorável.
Olá amigos realmente a expansão do etanol já chega com toda força em Mato Grosso do Sul, uma saída que será viável economicamente para Mato Grosso do Sul, pois ainda no estado encontramos uma grande extensão de terras que dentro da pecuária se encontram em quadro precário ou seja pastagens em estado de degradação totalmente improdutivos em média 0,3 a 0,5 UA (unidade animal 450 Kg) por hectare.Podemos dizer que estas propriedades são um peso na economia estadual pois além de ocupar espaço não geram renda e nem empregos, alguns ambientalistas sem noção acreditam que este trará sérios prejuízos para o estado, podemos verificar que as leis ambientais a cada dia estão mais severas e o mesmo é muito difícil de acontecer pois produtor nenhum quer correr riscos, a pecuária do estado sofrerá realmente uma queda pois já estamos sofrendo hoje reflexos do abate de matrizes (bezerros a R$ 1,90 e R$ 2,10 Kg), além da região do bolsão onde estão abatendo todos os animais por questão da febre aftosa, acredito que com a diminuição do rebanho no estado e a expansão da cana tomando o espaço da pecuária atrasada, quem ficar no mercado poderá ter melhor rentabilidade pois o preço da @ concerteza irá melhorar assim mesmo como a economia local.
Edir Rocha
Zootecnista
Muito bem colocado o artigo, sou muito criterioso com relação ao que está construído e acho que as pessoas que perseveram dentro da realidade e condições de si mesmo sempre tem colhido bons frutos.
Tem muitos produtores tomando iniciativas precipitadas, temos que ter cuidado, eu sei o quanto está difícil continuar se mantendo na pecuária mas estou otimista. Até porque o dinheiro não é tudo na vida do homem. Ele compra quase tudo.
Prezado Nelson
Antes de mais nada peço-lhe desculpas pelo que vou escrever. Suas previsões são, perfeitamente, consistentes mas suas conclusões totalmente inconsistentes.
Admitido o funcionamento do mercado me parece mais razoável que, com o aumento do consumo, como você afirma, e com o qual concordo, basta aferir o aumento da renda per capta da China, e concluiremos que sem dúvida o consumo mundial de carne deverá crescer consideravelmente.
Considerando que os pastos sejam substituídos por cana, nossa produção de carne tenderá a diminuir, ou pelo menos crescer menos e como você mesmo disse, detemos um quinto do mercado mundial, o que deverá impactar o mercado mundial.
Disso posso concluir que a demanda aumentará e a oferta diminuirá, logo os preços internacionais deverão subir o que deve beneficiar o setor. Então porque deveremos reclamar? Entendo que o aumento da demanda do álcool deverá ser infinitamente maior que o aumento da demanda da carne bovina pois além do aumento da renda per capta dos chineses, todo o mundo deverá aumentar seu esforço para conter o avanço do efeito estufa, sem o que em muito pouco tempo além de não termos condições climáticas para plantar cana, também não a teremos para criar o nosso boi, e que os dois setores passarão por um bom período de bonanza, fato que deverá criar espaço para nós todos, afinal nossa produtividade pífia em nada deve nos orgulhar, não haverá, isto sim, espaço para os que denomino de “gigolos de boi”, e sim para pecuaristas profissionais que correm atrás de produtividade com aumento dos ganhos por área explorada, investindo nos bois e na terra de forma responsável, de forma cidadã e quiçá possamos com tais medidas irmos tranqüilos e deixarmos para nossos descendentes um mundo menos perigoso sob o aspecto ambiental, pois o que fizemos até agora se repetido nos levará ao fim.
Também o senhor Pedro Eduardo me parece amedrontado sem motivo. Não entendo seu temor quanto a monocultura da cana. Por que será a monocultura da cana, pior que a do capim? Se preservarmos nossas matas ciliares, o que nós pecuaristas teimamos em não fazer, se preservarmos nossas áreas de Preservação Permanente, evitando que nossos rios e córregos sejam assoreados, se mantivermos nossos pastos livres da compactação excessiva, propiciando uma maior infiltração das águas de chuva e evitando a erosão dos solos, cuidando deles como organismos vivos que o são, nenhuma de suas previões serão confirmadas. Além do mais a cultura da cana, me parece, gera muito mais empregos por área que a criação de gado de corte. E para finalizar, sonho com o dia que pudermos retirar da terra, com a criação de gado de corte, o que tira um agricultor com a cultura da cana, algo em torno de R$600,00 por hectare por ano, líquidos.
Portanto, prezados, não há porque nos preocuparmos, pelo menos com relação ao avanço da cultura da cana.
A transformação das pastagens em áreas de plantio para cana de açúcar nada mais é que o histórico “tiro no pé” que os frigoríficos estão se dando. Bem feito, pois eles fizeram de tudo por merecer.
Nós pecuaristas, estamos cansados de exploração. Os preços da arroba, graças ao conluio de alguns donos de frigoríficos, continuam remunerando o produtor muito abaixo dos custos reais de produção.
Acredito que para impedir a transformação das áreas de pastagem em canaviais os frigorificos terão de rever os valores cartelizados e tratar de reajustar o preço da arroba para um patamar que seja justo e compensador, para que o bom pecuarista não plante cana mas continue produzindo carne de qualidade.
É a minha opinião.
É muito difícil a criação de bezerros competir com a produção vegetal. E os bezerros são a matriz da carne. Sem eles não há confinamento nem frigoríficos. Esta realidade não é só nossa. Vide o que aconteceu nos EUA: um criatório de pequenos rebanhos em pastos onde a topografia dificulta a agricultura mecanizada. Esses rebanhos estão no Leste, em solo fértil, declivoso, onde a floresta foi aberta no século 19 para produção vegetal a tração animal. Daí os bezerros vão de trem rumo oeste para os grandes confinamentos do mid-west onde chove pouco e se produz milho irrigado. O boi gordo volta para os abatedouros que suprem os populosos centros urbanos da costa leste, bem como de outras localizações. Há muitos anos não existe mais boi verde engordado a pasto. Nós também estamos seguindo esse caminho toda a vez que a pastagem puder ser substituída pela agricultura. A cana ocupa hoje 6 milhões de ha e as pastagens, para as várias finalidades, mais de 100 milhões. Vai levar muito tempo para que venha a deslocar a pecuária, cujo futuro é assegurado pela procura da inigualável proteína animal bovina. Se e quando isso vier a acontecer, temos a Amazônia para abrir, pois lá chove e faz calor. Não se preocupem com a cana. Antes devemos nos regozijar pela riqueza que vem dando e dará ainda mais ao país uma vez transformada em açúcar e álcool.
Saudações
Prezado Pineda,
entendo a angústia dos pecuaristas (leite e carne) com o avanço agressivo dos canaviais em suas regiões tradicionais. Angústia que se amplifica quando se compara a rentabilidade de sua atividade por hectare com o que as usinas estão oferecendo nos contratos de arrendamento.
O que me surpreende é que não se consiga ver além deste impacto inicial. Qual quer setor do agronegócio nacional tem se caracterizado por uma constante concentração da lucratividade nas etapas de processamento agro-industrial em detrimento da produção primária. Não tenho ilusão de que com a cana será diferente (nunca foi, não é e nada indica que venha a ser) mas não há melhor notícia para o produtor primário do que o acirramento da competição entre os processadores.
Tente imaginar se as usinas ao invés de expandirem estivessem todas falindo e todo mundo resolvesse, para deleite dos frigoríficos, produzir carne.
O problema da pecuária nacional não é a cana, mas sim tudo aquilo que a muito se discute e aos poucos se enfrenta: difusão de tecnologia, relacionamento moderno entre os agentes, seriedade governamental, marketing, etc.
Saudações,
Andre Zeitlin
Concordo com o sr. Zeitlin. O que deve reger a decisão de empresários – sejam de que ramo forem – é o retorno financeiro a seus investimentos. E terra é investimento a ser remunerado.
Digo isso com dor no coração, pois de todas as atividades agropastoris a que me dediquei – cafeicultura, citricultura, reflorestamento, heveicultura, etc. – nenhuma me deu mais prazer e mais entusiasmo que a pecuária. Mas não maior lucro.
Atenciosamente,
Carlos Arthur Ortenblad
Prezado Pineda,
A cana é a salvação da pecuária. Primeiro que avança principalmente sobre pastagens degradas e baixíssimo rendimento. Segundo sinaliza ao governo a necessidade de políticas sérias para o agronegócio como um todo. Por último esta tirando o sono das Indústrias frigoríficas que a muito se comenta mantém uma relação predatória com os produtores deste país continental.
Com a alternativa da cana de açúcar, ficará na pecuária apenas os produtores que ainda estiverem estimulados a buscar maiores índices de produtividade, maior controle sobre seus custos de produção, portanto com mais informações na hora da comercialização.
Eficiência é a palavra de ordem para quem deseja conquistar e manter mercado. Para se equiparar a cana o pecuarista deverá investir em tecnologia e isso é salutar, movimenta o mercado, gera emprego e renda. É a terra cumprindo sua função social.
Ergamos pois uma estátua ao Dr. Roberto Rodrigues – ministro do etanol e nos congratulamos com o Sr. Hugo Chaves cujos atos antecipou o inevitável.
Não consigo ter a mesma preocupação do Sr Nelson Pineda, e nem da maioria dos companheiros que aqui opinaram, mais uma vez eu vejo a emoção superando a razão no nosso meio. Parabenizo o Sr. André Zeitlin pelo seu extraordinário ponto de vista.
Vejamos os pontos positivos; mais emprego, mais consumidores, valorização das terras que não tem perfil para cana, pela fertilidade clima ou altitude, respeito das indústrias frigoríficas por quem permanecer na pecuária, teremos mais condições de negociar sal mineral, vacinas, remédios e muito mais.
Pontos negativos; com mais dinheiro no bolso, o consumidor brasileiro vai consumir mais carne, mesmo que seja mais cara, e não teremos carne para exportar, a não ser que paguem para isto, péssimo para os exportadores, para os vendedores de sêmen, de reprodutores, de arames, sal mineral, sementes de capim, vacinas, rastreadoras, vendedores de brincos etc, também não vai ser bom.
Quem vai ficar chorando o leite derramado, eu não quero nem saber, uma coisa eu tenho certeza, o pecuarista brasileiro está muito próximo de dizer:”sofrimento é coisa do passado”. Em todos os seguimentos é assim, os fracos perecem e os fortes permanecem.
Que venha a cana, em forma de álcool, de açúcar ou de cachaça, mas que venha.
Nelson,
Parabéns pela clara colocação sobre as angústias que afligem o pecuarista.
No entanto prefiro ainda avaliar o nosso segmento da pecuária de corte, como sendo o dos produtores que vem de um longo período de fartura e segurança, que terminou com a estabilização monetária doze anos atrás, e que parcialmente ainda não se preparou para as mudanças econômicas que vieram em seguida. Esta situação ainda se reflete na nossa baixíssima produtividade/rentabilidade por área.
Não posso concordar em culpar a cultura canavieira pela nossa incapacidade de produzir mais por área, afinal estamos perdendo terreno, via arrendamento, não só para a cana mas também para a citricultura, o reflorestamento e os grãos – lembre-se do boom da soja poucos anos atrás, boom que vai se repetir em curto prazo -, e não porque eles pagam mais por área, mas sim porque nós continuamos a produzir menos. Apesar de todos avanços nós não melhoramos significativamente a nossa produtividade média.
Você como produtor de gado de qualidade sabe perfeitamente que as áreas que estamos perdendo para outras culturas são conseqüência da nossa incapacidade de sermos eficientes, já sabemos de longa data que é possível produzir mais do que 1,5 – 2 toneladas de peso vivo/ha ano, sem irrigação, mas continuamos a ter como média nacional de produtividade algo em torno de 100 kg/ha ano.
Evidentemente este quadro está agravado pelos baixos preços da arroba de hoje, e também pelo ainda não reconhecido mérito da pecuária nacional de produzir a carne vermelha mais barata do mundo para o consumidor final. Se somos acusados de extrativistas – com razão – o consumidor brasileiro não pode se negar a reconhecer que também se aproveita desta situação, em que se consome um alimento de altíssima qualidade, pelo menor preço do mundo. Basta comparar o preço final da carne vermelha para a população brasileira, em torno de R$ 6,00 – 10,00 /kg enquanto qualquer europeu, americano ou japonês paga dez a quinze vezes este valor.
Tanto é verdade que o consumo per capta interno é maior do que o europeu, isto para uma população com renda média dez vezes menor. Quanto mais tempo o pecuarista demorar para se conscientizar da sua defasagem de produtividade, mais descapitalizado ele estará para enfrentar a inevitável chegada de atividades mais rentáveis à sua porteira. Cabe a nós como técnicos, trabalhar nas duas frentes, junto ao produtor apresentando alternativas economicamente viáveis, e junto ao consumidor, via meios de comunicação, defendendo e divulgando a nossa atividade, demonstrando a qualidade do que produzimos, com respeito ao meio ambiente e à baixo custo. E por último com responsabilidade muito relativa sobre o desmatamento da Amazônia, afinal não precisamos de nenhum hectare novo de pastagem para aumentar a nossa produção pecuária, quem precisa é a população humana mundial, que não para de crescer, e que naturalmente tem demandas crescentes de alimentos, – todos alimentos e não apenas de carne vermelha.
Quando faço leitura sobre o questionamento (área de cana plantada prejudica agropecuária) isto me incomoda e muito. Vamos relembrar algumas coisas importantes, quem está arrendando áreas para as usinas são produtores que deram as costas para tecnologia e aqueles que arrendaram e não deram as costas para a tecnologia hoje são proprietários em outras regiões com um sucesso danado.
A 10 km da maior fabrica de captação de leite do estado de SP existe produtor com média de 3,5 litros de leite por animal e sabe qual o reprodutor ele usa em suas vacas produtoras de leite? Um touro Nelore cara limpa.
Vai conseguir se manter diante da oferda da usina?
Em gado de corte temos o mesmo panorama.
Abraço
O assunto da cana é complexo e dificilmente pode ser esgotado num artigo de uma página. Dito isto, é de louvar a iniciativa do Sr. Nelson Pineda de ter colocado o tema ´Cana ou Boi?´ no centro da discussão da comunidade ´BeefPointiana´.
Mudanças fundamentais precisam ser avaliadas tanto em seu contexto global como em sua dimensão dinâmica. Quanto menos tempero na discussão, melhor. Pois, diversos ciclos com amplitudes e efeitos distintos ocorrem ao mesmo tempo. E cada região possui suas particularidades, como demonstra a voz da Bahia, bem como a análise geográfica do circuito bovino nos Estados Unidos apresentada pelo decano da pecuária brasileira.
Ao estudar as 20 cartas de leitores, encontramos um arsenal quase completo para construir o SWAT da questão. Muitos dos pontos positivos e negativos, bem como as potencialidades e os desafios que se colocam para a bovinocultura nacional já foram mencionados. No entanto, o debate sobre o remanejamento do uso da terra em curso nos principais países da produção primária está apenas começando. Por este motivo, não podemos esperar respostas prontas, mas sim, temos que agradecer a todos os estímulos inteligentes para aperfeiçoar a discussão.
O que parece certo, neste momento, é que o Brasil deve acelerar o processo para ocupar seu lugar na nova ordem econômica mundial. Trata-se de avaliar com profissionalismo os impactos dos ´4 big Fs´, como os americanos rotularam a CONCORRÊNCIA pelo mesmo hectare de terra entre o ´food´ (alimentos), o ´feed´ (forragem), o ´fuel´ (energia) e a ´fiber´ (celulose). Com a sensibilidade humana que caracteriza a grande maioria dos Brasileiros, cabe incluir neste novo modelo a preocupação com o equilíbrio entre os ´3 important Ps´. Trata-se do EQUILÍBRIO entre o econômico (profit), o ambiental (planet) e o social (people).
Por outro lado, ao repensarmos nosso posicionamento competitivo no mercado global do agronegócio, convém desmistificar os demônios e planejar estrategicamente e, antes de tudo, com calma. Pois, apenas o Brasil possui condições de produção e reservas de crescimento para atender a demanda crescente. A existência de sol, terra e, nomeadamente, de água em proporções invejáveis garante a sustentabilidade de todos, seja na agricultura, na bioenergia ou na pecuária, isto é, de todos os que estão decididos a adaptar seus modelos de negócio, como foi bem lembrado na maioria dos comentários ao artigo.
O debate em curso já indica o caminho para a solução. A resposta encontra-se mais na percepção ´Cana E boi´ do que na discussão controversa e primordialmente emocional do ´Cana OU boi´. No futuro falaremos mais sobre integração (de sistemas produtivos) e convergência dos diversos elos da cadeia produtiva do que sobre a disputa por preços.
A grande maioria dos argumentos, inclusive desta carta, já são conhecidos entre os leitores deste portal. O BeefPoint, há anos, oferece uma plataforma de informação e discussão sobre o rumo da pecuária competitiva. Tudo, ou quase tudo, já foi escrito e comentado. Isto não significa que não seja preciso repetir com paciência os principais conceitos e técnicas para a modernização e intensificação da atividade bovina. Quem não ouve pode ter problemas; quem trabalha a produtividade com afinco, cada dia um pouco mais, terá a recompensa material e humana garantida. Não há motivos para reclamações, porém, o futuro quer ser conquistado. Deus já fez a sua parte, agora chegou a hora do produtor aproveitar.
Vamos levar este debate, também, como ponto central ao próximo Congresso da FEICORTE.
Francisco Vila
Caros amigos pecuaristas e consultores, o sucesso da cultura canavieira é inegável, mas não podemos culpar o setor pelos nossos problemas. Essa debandada de pecuaristas para os canaviais somente se dá por culpa nossa, pecuaristas. Sim, pois foi debatido aqui nas cartas dos amigos que quem entregou primeiramente suas terras em arrendamento para as usinas foram os pecuaristas que não se tecnificaram (que preferem fazer a pecuária do modo fácil do início do século passado, esperando o boi engordar e o touro cobrir a vaca).
Sim somos nós os culpados, por elegermos nossos representantes no Congresso e no Planalto que não deram a mínima para o cartel dos frigoríficos, pois de que outra maneira eles se fortificaram (são os únicos na cadeia da carne com tamanha força econômica). Agregaram valor a carne que nós produzimos, conseguindo cada vez mais espaço no mercado mundial firmando o Brasil como o maior exportador por anos seguidos. E ainda nos dizem que não tem como pagar mais pela arroba e inventam mil desculpas para conseguirem tirar mais 1 real. Isso é nossa culpa, pois não conseguimos nos unir em uma cooperativa, ou em alianças mercadológicas, isso sim é a solução da pecuária. Mas como disse um colega “pecuarista é singular e frigorífico é plural”.
Percebam que a indústria da carne é forte e o produtor é fraco, enquanto no setor sucroalcoleiro acontece diferente: a indústria forte que fortifica o produtor.
Asssim as usinas reaparecem agora não como a solução da pecuária, mas como a salvação do pecuarista.
Agora penso que a questão é outra: monocultura vale a pena? O Brasil sempre teve tendência à monocultura. Porém em todos os ciclos de monocultura vimos uma grande ascensão seguida de uma derrocada na mesma intensidade. Já tivemos ciclos de café, de cana, de café novamente e mais uma vez de cana. Sem esquecer da monocultura bovina que agora vive dias de derrocada. Nunca nos lembramos da carta de Pero Vaz de Caminha quando do descobrimento do Brasil: “Nessa terra em se plantando tudo dá”.
Ainda vamos nos lembrar dos pecuaristas que não se renderam à essa febre ou que se renderam em parte, entregando uma parcela de suas propriedades ao canavial, se mantendo firme à espera de dias melhores na pecuária.
Caro Nelson,
Parabéns pelo artigo!
Concordo com tudo o que você disse. Se o Governo, tanto estadual quanto federal, não intervir agora nessa “onda-verde”, o que veremos será um assustador aumento de preços, não só da carne, mas também de outros produtos oriundos de atividades pecuárias e de outros setores da agricultura.
Pessoas sem nenhuma vocação para agricultura, estão deixando de produzir carne para produzir cana.
Até que ponto isso é viável? Até quando os preços se manterão assim? Pesquisas e investimentos estão sendo feitos em torno de fontes renováveis de energias e que não prejudiquem o meio ambiente. Será que a longo prazo continuará sendo interessante produzir cana?
Apesar dessas dúvidas e do “marketing” que está sendo feito ao redor do etanol, acredito sim na pecuária brasileira e prova disso é esse maravilhoso evento, que ocorre todos os anos, aqui em Uberaba/MG.
Espero também que, com a visita do “nosso” presidente na feira, ele possa contemplar o quanto a Genética Bovina Brasileira evoluiu (e o quanto ainda tem pra crescer) e que coloque a mão na consciência e responda a seguinte pergunta: “Será que vale a pena deixar todo esse trabalho de lado e dar 100% de atenção para o etanol?”
Desculpem se falei alguma besteira.
Abraço a todos.
Penso que, na medida do possível, deve haver um equilíbrio entre os dois setores. Uma fazenda de gado no perímetro das usinas, deveria investir uma parte de suas terras em cana, mas manter uma escala na bovinocultura que permitisse o aperfoiçoamento do negócio.
Para mim, o investimento em cana serviria apenas para manter os custos operacionais totais da fazenda garantidos, dar uma folga para que o produtor tenha paz para concentrar seus esforços e equacionar os parâmetros de produção e produtividade, pois ao que eu saiba, o consumo de carne é um hábito cultural e necessário para a saúde, o que deverá manter os tanques cheios mas as barrigas também cheias caso contrário estaremos regredindo.
Monocultura nunca fez bem para ninguém, pena que os gênios que comandam a nossa economia, nunca produziram 1 kg de carne, ou arroz, ou feijão, ou seja lá o que for.
Luiz Henrique Leite Nogueira
A invasão das empresas sucroalcoleiras no estado do Mato Grosso do Sul é algo inevitável. Os produtores não devem se assustar com tal fato, o que deve ser feito é nos adaptarmos para utilizarmos, quem sabe, resíduos desta atividade na dieta dos animais.
Isso estimulará (na forma de obrigação), uma profunda modernização da atividade agropecuária em nossa região onde, com certeza, produtores com baixa capacidade de adequação, sentirão um grande entusiasmo em entregar suas áreas para a produção de cana em virtude dos lucros quando comparados à forma de produção atual em que ele está enquadrado.
Deve-se buscar junto ao governo recursos visando a melhoria do setor bem como uma solução para melhorar o preço pago por @. Quem sabe a formação de cooperativas, como as que já estão sendo desenvolvidas em alguns estados do nosso País.
Cada vez mais o produtor está na mão de indústrias que, de um lado sobem o preço do sal mineral e remédios e de outro de empresas que pagam o valor conveniente a eles por @ dos animais.
Essa classe é muito cobrada com relação a obrigações que devem ser cumpridas como rastrear e vacinar, porém, os lucros acabam por ficar em outros setores.
Melhorias, tecnificações e adaptações devem ser feitas mas ressarcimentos e incentivos devem ser proporcionados aos produtores como forma de incentivo à produção.
Será que o álcool ajudará tanto no PIB como o agronegócio ajuda? Ou será que mais uma vez o governo terá de intervir por este setor. Fator este que não ocorre, e se estiver ocorrendo, é de forma acanhada no setor agropecuário.
Sou veterinário e minha formação foi voltada para a pecuária de corte, o que me assusta não tem nada a ver com cana. Tem a ver com profissionalismo do setor pecuário. Quem conheceu os projetos da sudene, sudam, banco do nordeste, que conheci e acompanhei, parcerias criminosas que limparam o cofres públicos e não produziram nada, a não ser, apartamentos a beira mar e muita corrupção.
Mesmo assim continuo acreditando na pecuária de corte, apesar da cana e do pecuarista gigolo. Agora a cana está vindo ai, refazendo o mapa do campo, causando abertamente a redução do rebanho de corte do Brasil, quem sabe não sobra ai os verdadeiros produtores, que vacinam seus rebanhos, que não compram atestados, que respeitam os consumidores com carne de qualidade. E quem sabe as pequenas cidades brasileiras não deixam de oferecer carnes em decomposição a suas populações. Quem não conhece a frase: “Um bom pecuarista dificilmente será um bom agricultor, mas um bom agricultor pode se transformar num excelente pecuarista”. Agora o pecuarista vai ter que se enquadrar na produção, vai ser bom para todo mundo.