Na semana passada, foi divulgada a indicação do novo Diretor-Geral da Organização Mundial do Comércio (OMC). Trata-se do ex-Comissário da União Européia para o Comércio, Pascal Lamy. Na disputa pelo posto, Lamy derrotou o brasileiro Luiz Felipe Seixas Correia, Embaixador do Brasil junto à OMC, e o Embaixador Uruguaio Carlos Perez Del Castillo, que retirou sua candidatura. Lamy terá, a partir do segundo semestre deste ano, um mandato de quatro anos e muitos interesses em jogo para administrar.
A candidatura de Pascal Lamy foi um esforço articulado em torno de uma aliança tripartite entre Estados Unidos da América, França e Alemanha – e outros países-membros da União Européia. No jogo do poder estes países pretendem se utilizar da presença do novo Diretor-Geral da OMC para influenciar as negociações multilaterais, já em curso, desde a última Rodada de Doha, no Catar.
A esse respeito teço alguns comentários: Lamy, autoridade máxima de um organismo internacional, que congrega 148 países terá margens limitadas de manobra para defender os interesses dos países que o apoiaram durante o processo eletivo, tendo em vista que o seu principal papel, em caráter emergencial, de forma a se evitar um fracasso nas negociações em curso e garantir as perspectivas econômicas globais sobre a continuidade da cooperação internacional multilateral, é o de concluir a Rodada de Doha, em que todos os termos de referência e objetivos de negociações, bem como normas para orientar o trabalho de Comitês da OMC e Grupos de trabalho, já foram estabelecidos.
Em princípio, caberá a Lamy conduzir com muita sutileza e diplomacia as negociações do que já foi acordado em Doha, se necessário expandi-las, mas de forma alguma regredir nos pontos já consensuados, em novembro de 2001 por ocasião da Reunião no Catar.
Apesar de Lamy ser originário da França, um dos países mais protecionistas do mundo na área agrícola, devemos vê-lo com bons olhos, inclusive na defesa dos países em desenvolvimento e dos seus interesses agrícolas. Pascal Lamy é um profissional com alta experiência internacional e certamente muito contribuirá para o fortalecimento do sistema multilateral de comércio.
Ainda durante o Governo Fernando Henrique Cardoso, o então Comissário Europeu Pascal Lamy se mostrou uma pessoa franca e sempre aberta ao diálogo, mesmo quando tinha em suas mãos posições divergentes das brasileiras. Àquela época, o Brasil conseguiu construir um diálogo e um relacionamento estreito com o novo Diretor-Geral da OMC, que, espera-se, o atual Governo saiba dar continuidade – contando com a sempre hábil diplomacia brasileira.
À luz dos compromissos firmados no Catar, o papel do Governo brasileiro agora é o de lutar contra os chamados “três pilares”:
i) os subsídios à exportação que distorcem os preços e o comércio de produtos agrícolas
ii) as barreiras tarifárias (escalada tarifária, cotas e salvaguardas especiais) e as não-tarifárias – que atualmente representam o novo nome do protecionismo
iii) as medidas de apoio interno que distorcem o comércio.
O Governo brasileiro deve exigir a aplicação dos objetivos já acordados, ou seja, o de se criar um sistema de comércio agrícola justo e voltado para o mercado e iniciar negociações abrangentes para proporcionar melhorias substanciais acerca dos três pilares acima citados, que distorcem o comércio mundial.
Creio que o principal papel a ser desempenhado por Lamy e os demais 148 países-membros da OMC deva ser o de corrigir e prevenir restrições e distorções no mercado agrícola mundial.
Finalmente, deixo três mensagens para a reflexão dos meus caros e fieis leitores que se interessam pelo mundo agrícola:
1) Os países em desenvolvimento deverão beneficiar-se do programa de trabalho da OMC para o futuro, especialmente na abertura dos mercados agrícolas;
2) A maior liberalização do comércio é positiva não somente para os produtores, agricultores e consumidores do mundo, mas para todos os outros setores da economia mundial
3) A agricultura é o centro do desenvolvimento sustentável para a maior parte da população mundial.