MS: Prova de ganho de peso apresenta resultados no sábado
12 de maio de 2003
Mais deputados assinam pedido para abrir a CPI das Carnes no RS
14 de maio de 2003

O preto no branco

Andrea A. Ortenzi Garcia1

Temos observado atualmente que, o enfoque principal na área da pecuária bovina “produtiva” é a cor do gado, ou seja, se o cruzado é melhor que o puro, se a raça tal é melhor que a outra, se o branco é melhor que o preto… Conseguiu-se dispersar tanto que, ao invés dos pecuaristas se preocuparem com a função fundamental da cadeia produtiva da carne, que é a comercialização, a relação produtor – indústria frigorífica – varejo, o ato de vender e o pós-venda, ações tão comuns no mundo atualizado e globalizado, os mesmos travam discussões sem fins e fundamentos. A escolha pessoal predomina perante à pesquisa e tecnologias utilizadas e comprovadas durante anos.

Nesta disputa entre raças e cores, muitas inverdades são ditas, prejudicando não só o trabalho de anos, mas também toda a confiabilidade do produtor na pecuária de corte.

Mencionar que raças européias não suportam o calor ou não agüentam permanecer sob o sol é uma dessas suposições ou “mitos” que as pessoas divulgam com o intuito de repassar como conceito. É sabido que o desempenho das raças das sub-espécies taurus é prejudicado, devido ao estresse calórico. Entretanto, graças ao seu elevado potencial de produção aliado à qualidade de carcaça, pesquisadores se dedicam ao estudo desse efeito, e até que ponto isto prejudica os animais. Tal levantamento científico pode ser observado no trabalho realizado por um grupo de pesquisadores do Departamento de Zootecnia (FZEA), da Universidade de São Paulo, com o título de: Estudo da tolerância ao calor de touros jovens e matrizes da raça Limousin (TITTO, VIEIRA, LEME, VIEIRA, ESTEVES, PEREIRA, ABLAS, SILVA, GONÇALVES, TITTO – 2001).

O objetivo do referido trabalho é quantificar a adaptabilidade ao clima tropical de touros jovens e matrizes Limousin – raça de origem européia especializada na produção de carne – através da aplicação do teste de tolerância ao calor, desenvolvido pelo pesquisador Baccari e seus colaboradores, em 1986. Este estudo é fundamental para o uso expressivo de reprodutores Limousin nos cruzamentos com fêmeas zebuínas, em regime de monta natural a pasto, especialmente no Brasil Central.

Faz-se imprescindível informar que a tolerância ao calor varia de grau com as espécies, com as raças e entre os indivíduos. Segundo outro pesquisador (Silva, 1998), se a tolerância é um privilégio do gado tropical, não necessariamente é impossível de se manifestar no animal europeu, quando este for posto na tentativa de se aclimatar.

Entre as várias diferenças entre os taurinos e zebuínos, encontram-se a influência do comprimento dos pelos, mais do que da própria cor do pelame, sobre a homeotermia (capacidade do animal em manter a temperatura); a maior capacidade de sudação dos zebuínos em relação aos taurinos (tendo a termólise evaporativa cutânea grande influência no comprimento dos pelos e na espessura do pelame); a funcionalidade das glândulas sudoríparas, entre outras.

Finalizando, pode-se dizer que os testes realizados neste estudo, com a raça Limousin revelaram ITC (Índice de Tolerância ao calor) de 9,02 com desvio padrão de 0,24 para pelagem curta, significando alta tolerância ao calor, e 8,41 com desvio padrão de 0,32 para pelagem longa, o que representa média tolerância ao calor. Esses dados só comprovam que a ineficiência da produtividade dos animais decorrem de manejo inadequado, seleção incorreta de linhagens específicas para determinadas regiões do país e a falta de conscientização sobre a preservação ambiental.

Portanto, é inadmissível que o trabalho de melhoramento genético realizado há anos por pesquisadores, técnicos e pecuaristas, os quais se empenham em contribuir com o agronegócio brasileiro, seja ofuscado por uma única teoria: a simples escolha de criação dos animais pela pigmentação da pelagem.

___________________________
1Andrea A. Ortenzi Garcia é zootecnista, agropecuarista e superintendente técnica da Associação Brasileira dos Criadores de Limousin.

0 Comments

  1. Ricardo Almeida Cordeiro disse:

    Sou economista e pecuarista na região do Mato Grosso, e tenho visto o esforço das raças européias em conseguir seus espaços na pecuária brasileira, e pelo que entendi sobre o artigo, as raças estão mais preocupadas em saber quem aguenta mais o calor e estão deixando de lado o foco principal das raças européias, que é o fomento da carne de qualidade para o consumidor com menor tempo de abate para o pecuarista.

    Na minha propriedade usamos três raças européias para o cruzamento industrial: o limousin, o pardo-suiço e o marchigiana e estou muito satisfeito com as três.

  2. Cecília José Veríssimo disse:

    Gostaria de salientar que, além de ser muito importante para a adaptação dos animais às altas temperaturas das regiões tropicais, o pelo curto também contribui para diminuir a infestação de carrapatos.

    Trabalho realizado no Instituto de Zootecnia mostrou que raças com pelo mais curto (as zebuínas Gir e Nelore e a raça européia Jersey) tiveram menos carrapatos do que as raças européias de pelo longo, como a Holandesa e Pardo Suíça.

    Nos animais mestiços europeu x zebu houve alta correlação positiva entre comprimento do pelo e infestação por carrapatos, sendo a infestação maior em animais com pelos mais longos.

  3. Cecília José Veríssimo disse:

    Ainda, animais de pêlo comprido têm mais carrapato que os de pêlo curto!

    Cecília José Veríssimo