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O samba do Crioulo doido

Tomo emprestado do genial Stanislau Ponte Preta (Sérgio Porto) o título de um divertido samba que ele compôs há décadas. Era a história de um fictício samba-enredo do Carnaval do Rio de Janeiro, onde o compositor, sob o “stress” da tarefa, fica doido, e solta uma letra onde mistura épocas, fatos, e personagens históricos, formando uma salada divertida, porém sem qualquer nexo ou sentido.

A política social do Governo Federal, que era onde o povo brasileiro, mesmo os que não votaram no presidente Lula (eu, inclusive), depositava maior esperança, deixa muito a desejar. Infelizmente, os programas sociais do Governo Federal, não são divertidos, como o “Samba do crioulo doido”, mas não fazem qualquer nexo ou sentido. Vamos a dois exemplos:

Distribuição de Renda: este é um dos maiores entraves ao crescimento do Brasil. A marginalização de parte considerável da população brasileira não é apenas uma crueldade, é uma burrice: deixamos de fora um enorme contingente de pessoas que poderiam estar produzindo e consumindo bens e serviços. Todo político no Brasil brada contra a “iníqua distribuição de renda no Brasil, que é uma das mais desiguais do mundo, blá, blá, blá…”.

Mas onde o Estado1 poderia contribuir eficazmente para ao menos amenizar esta aberração, nada faz. Em 2003, o orçamento da União previa a assombrosa quantia de R$ 220 bilhões (sim, bilhões) em “políticas sociais”. Apesar desta montanha de dinheiro, que dá mais de R$ 1.300,00 / ano por pessoa, a pobreza no país cresce, ao invés de diminuir. Por quê? Pois cerca de 72% desta dinheirama vai para a Previdência Social, e maior parte é repassada, via aposentadorias e pensões, para os mais ricos – notadamente aposentadorias milionárias do próprio serviço público. Assim agindo, o Governo Federal é um poderoso agente de CONCENTRAÇÃO, e não de distribuição de renda.
1 Por “Estado” entenda-se Governo Federal, Legislativo e Judiciário

Isso vai mudar? Não creio, pois o corporativismo fala mais alto. Veja-se o edificante e recente exemplo de um casal (ele Desembargador, e ela Juíza), que, pilhados vendendo sentenças, e cometendo outros ilícitos penais, receberam a pena máxima: aposentadoria compulsória, mas com proventos integrais. Ele vai continuar a receber R$ 15.000,00 por mês, e ela R$ 6.800,00. Este casal de pombinhos poderá continuar arrulhando, pelo resto da vida deles, às nossas custas. Ah, eu ia me esquecendo: toda vez que houver reajuste salarial no Judiciário, eles também serão beneficiados, é claro.

Programa Fome Zero: este projeto, tem apanhado tanto desde que foi lançado, há quase um ano, que é quase uma covardia eu juntar-me ao coro. Faço-o, porém, apesar do respeito que tenho pelo ministro José Graziano Gomes da Silva (que é um homem decente e bem intencionado), porque quase não vi críticas a um aspecto que julgo essencial. O Fome Zero, tal como concebido, vai empobrecer ainda mais a economia das regiões que pretende beneficiar. Além disso, a logística e o frete desta distribuição física de produtos é cara, e absorverá boa parte do orçamento do programa.

Como? O articulista terá também sido contaminado pelo vírus do “Samba do Crioulo doido”? Uma região que recebe doação de bens empobrece, ao invés de enriquecer?

Não, ainda não enlouqueci. Pelo menos não a este respeito. Cada vez me arrependo mais de ter feito pós-graduação em Macro Economia, pois, por vício profissional, sou forçado a enxergar coisas que preferiria não ver.

A “área social” do Governo Federal não tem a mínima noção do que seja uma “política de rendas”. E, por esta fatal ignorância, comete, e vai cometer desatinos – mesmo que eivados das melhores intenções. Embora obtendo o pior dos resultados.

Mas voltemos à minha bombástica afirmação de que o Fome Zero, tal como concebido, vai empobrecer as regiões onde atuar. É simples entender. Um programa assistencialista, que distribui comida e outros bens, “mata” a incipiente e precária economia local. E quanto mais precária, pior. Os recipientes de “cestas básicas” deixam de comprar no pequeno comércio local, que quebra. Os pequenos produtores de bens e serviços que abasteciam o comércio local, idem. O que se tem então? Um contingente de dependentes da “caridade oficial”. E serão milhões de dependentes.

Os mais cínicos (ou mais perspicazes), dizem que esta “dependência” é programada. Ou seja, o PT estaria formando um imenso “curral eleitoral” nos grotões – onde sua influência política é pequena – com o dinheiro do contribuinte, ou seja, com o nosso dinheiro. Pode ser. Eu ainda prefiro achar que é incompetência (bem intencionada) mesmo.

Qual a solução para mitigar a fome crônica destes milhões de brasileiros, sem destruir as economias locais? Existem várias, de curto, médio e longo prazo. Como o “Fome Zero” é emergencial, vou cingir-me a uma solução de curto prazo, apenas.

Dar dinheiro. E de preferência às mães. Vai haver corrupção? Vai. Mas iria haver de qualquer jeito, apesar de concordar que corrupção com dinheiro, é mais fácil do que com farinha.

Mas ao menos haveria estímulo às economias locais pelo influxo de capital, o que não ocorreria com a entrada de bens produzidos em outras regiões do país (estas sim, beneficiadas). Dando dinheiro, a vendinha do Sr. José venderá mais, ele fará mais encomendas, empregará mais gente, e recolherá mais imposto. E a economia da cidadezinha começará a crescer, beneficiando a todos, cedo ou tarde. Claro que outras medidas pontuais devem ser tomadas, e de forma concomitante, mas isto é assunto que deixarei para o ano que vem, pois não quero alienar meus parcos leitores com uma enxurrada de “economês”. Aos que conseguiram chegar até o final deste artigo, meus parabéns pela persistência – exceto aqueles que dele valeram-se para curar insônia crônica.

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