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O uso de medidas de tamanho e escores visuais na seleção de gado zebu

Por Nelson Pineda1 e William Koury Filho2

“A zootecnia, nada mais é do que a exploração dos animais domésticos ou não, sob a condição mais rendosa possível através da ciência, a arte de criar, a industrialização, o mercado e o comércio. …existe muito maior número de agrônomos, veterinários e zootecnistas teóricos do que artífices práticos e objetivos de nossa exploração agro-pastoril. Daí os motivos pelos quais uma série enorme de problemas agrícolas e pecuários brasileiros, aguardam a ação desses técnicos para equacioná-los e resolvê-los e vão sendo, a parte, enfrentados pelo espírito prático, observador e realizador de nosso homem que explora a terra, dele tirando os seus proveitos, mas sem o seu melhor rendimento.”

Durval Garcia de Menezes. In Weiss, 1956

Introdução

Não são recentes nem o conceito de melhoramento animal atrelado a variáveis de impacto econômico, nem a necessidade de conceber a utilização de resultados numéricos e quantitativos relacionados à experiência de quem tem o convívio diário e íntimo com os animais.

Sempre pareceu evidente associar perspectivas de negócio à seleção animal, visando o biótipo de animal mais produtivo. Nem sempre este resultado foi atingido; atualmente visualizamos de maneira desmesurada a seleção de gado zebu, tanto de machos quanto de fêmeas, em termos de ganho de peso. Sem dúvida produção de carne e peso estão intimamente ligados, porém, programas de seleção que ignoram a composição do peso, ou seja, a relação músculos – ossos – gordura, não atendem hoje às demandas do mercado por novos padrões de qualidade de carne bovina.

A procura incessante pelo ganho médio diário de nossos animais está levando à seleção de animais de maior tamanho e, em conseqüência, ao aumento das exigências nutricionais para acompanhar este desempenho. Além deste incremento, existem outras implicações. SCARPATI et al. (1996), OLSON et al. (1998) mostraram que animais maiores são mais tardios sexualmente além de mais exigentes em termos nutricionais. Por isso parece ser imprescindível evitar a seleção de tipos extremos em peso, para não obter resposta correlacionada indesejável para outras características de importância econômica. O efeito do tamanho adulto da vaca sobre a eficiência reprodutiva tem se convertido em um fato preocupante durante os últimos anos devido à preferência que existe por animais de grande porte dentro dos rebanhos de seleção. Se o aumento de altura tem seus benefícios sobre as taxas de crescimento, este aumento tem impacto negativo sobre a idade à puberdade, a taxa de prenhez pós-parto e a taxa de sobrevivência do bezerro até a desmama.

Tamanho vs eficiência produtiva

OLSON et al. (1998), trabalhando com fêmeas da raça Brahman na Flórida, estabeleceram três rebanhos de cria segundo o tamanho corporal através da altura medida na garupa, sempre no momento da determinação da prenhez através de toque retal após a estação de monta. Classificaram o rebanho em três grupos: pequeno, médio e grande. As alturas médias observadas foram de 121,73 cm, 129,22 cm e 136,45 cm, respectivamente. Avaliaram-se escores de condição corporal através de notas de 1 a 9 utilizando a metodologia de RICHARDS et al. (1986) e foram verificados os efeitos do tamanho corporal sobre as características reprodutivas.

Os caracteres analisados incluíram idade à puberdade, taxa de nascimento, data de parto, taxa de sobrevivência do bezerro e taxa de desmama. O número de observações está reportado na Tabela 1.

TABELA 1. Número de observações em vacas da raça Brahman segundo o número de partos e o tamanho corporal.

As novilhas de maior tamanho foram significativamente mais tardias (672 dias) que as novilhas de porte médio (626 dias) e que as de tamanho pequeno (633 dias). A condição corporal aos 18 meses não teve efeito significativo à idade à puberdade, porém as novilhas classificadas com condição corporal 3 e 4 alcançaram a puberdade mais tardiamente que as novilhas de melhor condição corporal. Os resultados estão reportados na Tabela 2.

TABELA 2.- Médias de quadrados mínimos para idade à puberdade em novilhas da raça Brahman segundo a condição corporal (CC) e o tamanho (TC) aos 18 meses de idade. (a,b P<0.5)

Os resultados da taxa de desmama estão relacionados na Tabela 3 e mostram que as vacas de grande porte tiveram uma taxa de desmama menor e estatisticamente significativa quando comparadas às vacas de pequeno e médio porte e estas mesmas diferenças foram observadas também nas taxas menores de prenhez e de sobrevivência. A partir do terceiro parto não houve influência do tamanho nas taxas de desmama. A condição corporal 3 influenciou significativamente a taxa de desmama na segunda e na terceira cria, igualmente, as vacas de condição corporal 6 apresentaram uma diferença estatisticamente significativa. Estes resultados parecem indicar que para obter taxas de desmama satisfatórias é necessário trabalhar com vacas de tamanho moderado que estejam em condição corporal 4-5 no momento da apalpação pós-estação de monta.

TABELA 3. Médias de quadrados mínimos para taxa de desmama (TD) em relação à condição corporal (CC) e ao tamanho corporal (TC) em diferentes grupos etários de vacas da raça Brahman.

TABELA 4. Médias de quadrados mínimos para peso de desmama (PD) em relação à condição corporal (CC) e ao tamanho corporal (TC) em diferentes grupos etários de vacas da raça Brahman.

Os resultados de peso de desmama reportados na Tabela 4 mostram que a condição corporal da vaca não afetou o peso de desmama do bezerro. O peso de desmama dos bezerros de vacas de grande porte foi significativamente maior que aquele das vacas de pequeno porte. A idade dos bezerros na desmama não variou grandemente, o que permitiu afirmar que as diferenças no potencial de crescimento destes animais poderiam ser expressas pelos pesos de desmama.

Quilos de bezerro desmamado por vaca exposta à cobertura pode ser considerada uma medida de produtividade total, que inclui os efeitos combinados de fertilidade da vaca, da capacidade de sobrevivência do bezerro e da taxa de crescimento do bezerro até a desmama, que é influenciada pela habilidade materna da vaca. Estes resultados estão reportados na Tabela 5.

TABELA 5. Médias de quadrados mínimos para produção da vaca (PV) em relação à condição corporal (CC) e ao tamanho corporal (TC) em diferentes grupos etários de vacas da raça Brahman.

Os resultados da Tabela 5 mostram que vacas de grande porte produziram menor quantidade de quilos de bezerro por vaca exposta à cobertura e este resultado é conseqüência das menores taxas de prenhez e de sobrevivência encontradas em vacas de grande porte. As diferenças em kg de bezerro desmamado não foram significativas entre vacas de tamanho corporal pequeno e médio, entretanto as novilhas de porte médio desmamaram mais quilos por vaca exposta. Esta vantagem foi conseqüência de que os bezerros desmamados por vacas de porte médio foram sensivelmente mais pesados. As vacas de três partos de porte grande foram mais produtivas, porém estas diferenças não foram estatisticamente significativas.

Estes resultados indicam os efeitos críticos dos extremos de tamanho corporal sobre as características reprodutivas e produtivas de rebanhos zebuínos. As novilhas de grande porte alcançam a puberdade mais tarde e, se isto não causa problemas quando gestantes aos 24 meses, causa enorme prejuízo sobre a taxa de prenhez no início da estação de monta.

De uma forma geral, os autores concluíram que o tamanho da vaca afeta a taxa de prenhez de novilhas e vacas jovens quando o nível nutricional não é suficiente para permitir a ocorrência da puberdade ou permitir que a fêmea lactante mantenha uma condição corporal adequada para conceber durante o período em que está crescendo e lactando.

Estes resultados são similares aos obtidos por JENKINS & WILLIAMS (1994) que mediram o desempenho de diferentes tipos biológicos em vários níveis de disponibilidade de alimentos. Nove raças taurinas com diferentes méritos genéticos para peso maduro, taxas de ganho de peso pós-desmama, produção de leite e relação músculo/gordura na vaca foram avaliadas durante um ciclo de produção completo de cinco anos. Observou-se que ocorreu uma interação genótipo-ambiente marcante, pois a classificação das raças por eficiência se alterou com o aumento do consumo de alimentos. Com baixo consumo de alimento, as raças caracterizadas como moderadas em tamanho e produção leiteira foram mais eficientes. À medida que o nível de alimentação aumentou, a eficiência entre as diferentes raças se estabilizou. Em níveis elevados de alimentação, as raças de grande porte se mostraram mais eficientes em produção leiteira.

Conseqüências sobre a eficiência reprodutiva e a lucratividade podem ser inferidas a partir destes resultados e ocorrerão toda vez que o processo seletivo seja exercido por tempo suficiente e o sistema produtivo mantido constante.

GUITOU & MONTI (1998) também sugerem que se procure o tamanho corporal adequado para cada sistema de produção através da estimativa do tamanho adulto, calculado pela medida do frame size de cada animal (B.I.F. 1996) e que dentre animais de mesmo frame size se escolha os de melhores DEPs para determinadas características.

Frame size em Nelore

Ao analisar um sumário de touros o produtor geralmente opta por usar aqueles touros com as maiores DEPs e sistematicamente ignora os reprodutores cujo tamanho se ajusta melhor ao sistema de produção onde se está trabalhando e que seja capaz de produzir o tipo de carcaça que o mercado está querendo. Vários trabalhos de pesquisa sugerem que animais de tamanho grande têm uma tendência de ser animais de maior peso adulto e maturidade mais tardia e animais de tamanho pequeno tendem a ter menores pesos adultos e a depositar gordura com maior velocidade. Mas, tamanho ideal será invariavelmente dependente de recursos, sistema de produção e exigências de mercado. O grande desafio é encontrar uma medida que nos permita projetar o tamanho adulto dos indivíduos e padronizar o tamanho dos indivíduos dentro de nosso rebanho em função da disponibilidade nutricional, de variáveis econômicas e preferências do consumidor final.

O que é tamanho grande, médio ou pequeno em bovinos? A noção de tamanho tem gerado inúmeras discussões entre criadores, jurados e pesquisadores. Ela não é absoluta, é sempre relativa dentro do rebanho e comparativa entre animais contemporâneos do mesmo grupo de manejo. Um animal grande em condições de pastejo, pode ser considerado pequeno num grupo de animais super-alimentados. Por isso deve-se tomar muito cuidado ao fazer comparações.

Frame size é uma forma conveniente para descrever numericamente o tamanho do esqueleto dos animais, estimar o potencial de crescimento, as necessidades nutricionais futuras e o seu tamanho maduro. Originário da Universidade de Missouri/USA, este conceito está sendo utilizado como medida complementar em muitos programas de melhoramento. A medida de frame foi padronizada (BIF – Guidelines,1996), através de uma equação matemática, que descreve o crescimento e toma em consideração a altura na garupa e a idade do animal no momento da medida. O frame é expresso por valores simples que vão de 1 a 10. Desta forma, dentro de um rebanho poderíamos afirmar que animais de maior frame (8/9/10) produzem carcaças mais pesadas, precisam de mais recursos alimentares e requerem mais tempo para chegar ao equilíbrio entre peso de comercialização e terminação adequada de gordura. Enquanto que animais de frame médio (5/6/7) apresentam carcaças mais leves, porém com acabamento mais rápido de gordura. O frame é uma medida simples, não para encontrar o tamanho ideal e sim para adequar o tamanho do animal ao sistema de exploração. “Quando o criador conhece o frame desejado para seu sistema de exploração, dentre um grupo de animais com o mesmo frame, escolherá aquele de maiores DEPs para as outras características de acordo com o seu mercado.” (GUITOU & MONTI, 1998)

A equação recomendada utiliza a altura medida em polegadas na garupa e a idade em dias. Estas equações estão relacionadas na Tabela 6.

TABELA 6. Fórmulas para estabelecer escores de tamanho a partir das medidas de altura medida na garupa.

Estas fórmulas quando utilizadas para animais da raça Nelore, corrigindo a altura pelos mesmos fatores usados para as correções de peso, como idade de parição da mãe, data juliana de nascimento e época do ano, nunca apresentaram valores abaixo de 5,5 para as medidas de frame size. Este é um claro indicativo de que será necessário encontrar equações que descrevam melhor as curvas de crescimento de animais da raça Nelore.

Trabalhando com machos de raça Nelore, separados visualmente dentro do mesmo grupo contemporâneo e de manejo, pelo mesmo avaliador, em três lotes classificados como pequenos, médios e grandes nas idades de 4, 8, 12, 18 e 24 meses, estabelecemos as seguintes curvas de crescimento reportadas no Gráfico 1.

GRÁFICO 1.- Estimativas de curvas de crescimento para machos da raça Nelore, criados a pasto na Fazenda Paredão – Oriente – SP.

Estas curvas de crescimento representam uma primeira abordagem na procura de uma ferramenta que permita estimar o tamanho adulto dos animais da raça Nelore, mas somente através da inclusão de medidas de altura nos programas de melhoramento genético poderemos estabelecer um banco de dados necessário para encontrar os parâmetros e os fatores de correção para as curvas de crescimento da raça Nelore.

Escores visuais

As exigências do mercado por qualidade de carne exigem uma definição correta do biótipo dos animais num determinado sistema de produção. Touros que produzem garrotes com precocidade de acabamento são responsáveis pela geração de vacas que se mantêm em melhor condição corporal. Esta precocidade, aliada a animais de frame médio, ou seja, de peso maduro intermediário, permite que as vacas possam acumular algumas reservas no final das águas, passando assim o período de seca e voltem a ciclar normalmente após a parição, como descrito por KUNKLE et al., (1994).

A palavra conformação refere-se ao desenvolvimento da massa muscular, ou seja, à quantidade, proporção e distribuição da carne nas diversas regiões corporais do animal em pé e de seus cortes. Mais precisamente, a conformação representa a relação músculo/osso. Os músculos e ossos formam uma unidade funcional, sendo que uma maior quantidade de músculo necessita uma maior estrutura óssea. Formas arredondadas ou cheias que se devem à gordura subcutânea responsável pela fase de terminação das carcaças, se confundem com o conceito de boa conformação. Inversamente, formas angulosas ou retas se confundem com má conformação, quando de fato significam magreza ou pouco acabamento. Uma mesma quantidade de músculos pode apresentar-se com formas curtas e redondas ou compridas e retas. É importante que estas classificações sejam feitas de forma comparativa, dentro de grupos contemporâneos.

A palavra acabamento refere-se ao desenvolvimento da gordura, ou tecido adiposo, quantidade e distribuição nas regiões corporais do animal em pé e de seus cortes. Existem quatro tipos de gordura, que vistos a partir do interior do animal, podem ser descritos da seguinte maneira: depósitos internos ou viscerais, intramuscular que se deposita entre as fibras musculares dos músculos anatômicos, intermuscular que se deposita entre as grandes massas musculares separando-as, e, finalmente, a gordura subcutânea que se localiza sob o couro e sobre a superfície da carcaça. Acabamento refere-se essencialmente a este último tipo de gordura. Existem algumas partes do corpo que evidenciam a deposição da gordura subcutânea: a região do períneo, virilha e entre-pernas, a inserção do rabo, a ponta da anca, a cobertura do peito e as costelas. (Revista Hereford, Nº. 607, p. 72 -76. Buenos Aires, Argentina. 1996).

A musculosidade, que se refere à evidência das massas musculares, é avaliada pelo desenvolvimento dos músculos na garupa (patinho, lagarto e alcatra), no terço final do lombo, na paleta e no antebraço. O animal de musculatura forte e evidente é em geral largo na base do cupim que se encontra bem implantado.

Os escores de avaliação visual de animais vivos são utilizados por vários programas de melhoramento genético no mundo, sendo que a maioria apresenta modificações do sistema Ankony (Long, 1973) que preconiza a utilização do esqueleto como um excelente ponto de referência para determinar o desenvolvimento muscular. Vários trabalhos no Brasil (PONS, 1998; ROSO & FRIES 1995; ELER et al., 1995, Koury Fo, 2001) mostram resultados que indicam herdabilidades e variabilidades genéticas similares às descritas para características de crescimento e devem, por este motivo, ser susceptíveis de seleção. PITA et al., (1998) também relatam a influência dos escores visuais de conformação em taxas de prenhez de novilhas Nelore aos 18 meses de idade, o que é um indicativo de possíveis relações entre os complexos precocidade sexual/reprodução e desenvolvimento muscular/acabamento. ROCHA (1999), analisou os dados de 1853 animais da raça Nelore sendo 692 machos inteiros, 618 machos castrados e 543 fêmeas, com avaliações visuais para conformação, musculosidade e acabamento feitas na desmama por avaliadores treinados. Estes animais foram abatidos com uma idade média de 28 meses e com um peso de carcaça quente de 237,99 kg (15,9@). O autor concluiu que o uso dos escores visuais mostrou-se efetivo ao agregar valores econômicos às carcaças.

Escores visuais e características de carcaça

Em 1998 a Associação Brasileira dos Criadores de Zebu organizou um seminário para revisão dos critérios de julgamento. Adquiriu especificamente para este fim 512 machos inteiros de várias raças zebuínas, com idade média de 24 meses, morfologicamente distintos, o que conferiu ao lote de animais heterogeneidade de tipos e conformação. Estes animais foram avaliados por 126 técnicos duas vezes gerando 12.582 escores visuais nos seguintes itens:

1. Estrutura (ossatura, tamanho e comprimento)
2. Harmonia (relação de linhas e formas do animal)
3. Musculosidade (desenvolvimento muscular do animal)
4. Precocidade (acabamento de gordura subcutânea)
5. Aspectos raciais

Os animais foram abatidos após as avaliações visuais e anotados os seguintes dados: peso no embarque, peso da carcaça quente (PCQ), rendimento da carcaça, maturidade a partir da dentição, escores de acabamento (escala de 1 a 5, onde 1=gordura ausente; 3=gordura mediana; 5=gordura excessiva) e conformação (escala de 1 a 5, onde 1=musculatura pobre, perfil côncavo; 3=bom perfil retilíneo ; 5=muito bom perfil convexo). Após resfriamento, mediu-se a área de olho lombo (AOL, cm2) e espessura de gordura (EG, mm) na seção transversal do contrafilé na 12a costela. De posse destes dados procedeu-se às estimativas de carne aproveitável total (carne limpa) e de kg de carne limpa por 100kg de peso vivo.

Com base nas análises estatísticas das avaliações visuais pontuadas pelos técnicos e pelas estimativas e medições feitas nas carcaças, foi possível obter correlações, algumas das quais são apresentadas na Tabela 7.

Os escores de avaliação visual, sobretudo os escores de musculosidade e estrutura, tiveram correlações altas e estatisticamente significativas com área de olho de lombo que estima a porção comestível de carne na carcaça. Os escores de acabamento também apresentaram uma correlação positiva e estatisticamente significativa com a medida da espessura de gordura. De uma forma geral, as correlações entre os escores visuais, peso vivo e peso de carcaça, foram altas e significativas. Estes resultados mostram que os escores de conformação podem ser uma poderosa ferramenta complementar na seleção para características de qualidade de carcaça.

Tabela 7. Correlações simples entre características objeto de avaliações visuais e características de carcaça.

Resultados recentes

KOURY Fo et al., 2002 utilizaram dados de dez safras de bezerros Nelore criados em regime de pasto na Fazenda Paredão, município de Oriente, Estado de São Paulo, contendo 3479 pesos à desmama (PD), 2452 pesos ao sobre-ano (P550) e 17.168 escores de avaliações visuais de oito diferentes características realizadas à desmama.

Na metodologia utilizada nas avaliações visuais os animais a ser desmamados, depois de identificados, são postos em grupos de três a quatro em um curral onde o avaliador único atribui um escore variando de 1 a 5 dentro do grupo de contemporâneos, sendo 1 para os animais inferiores, 3 para os indivíduos na média e 5 para os superiores, individualmente para cada uma das características. Este sistema de notas relativas ao grupo de contemporâneos foi baseado nas observações de FRIES (1996), que relata que sistemas de notas absolutas tendem a constranger os avaliadores e resultam em conjuntos de dados extremamente concentrados em torno de um valor médio, considerado/conceituado como bom. Foram avaliadas as seguintes características:

1. Aspectos raciais de forma global dentro das definições do padrão racial da raça Nelore, definido pelas normas da Associação Brasileira dos Criadores de Zebu (ABCZ).
2. Carcaça definida pela proporção, distribuição das massas musculares em relação ao esqueleto e capacidade de deposição de gordura subcutânea.
3. Aprumos, direção e angulações dos membros, comprimento das costelas e abertura torácica.
4. Sexualidade ou dimorfismo sexual.
5. Estrutura óssea onde se levava em consideração o tamanho do indivíduo em relação a sua idade, assim como a proporção entre o comprimento das costelas em relação ao comprimento dos membros.
6. Linha dorso-lombar avaliada pelo seu comprimento e pelo desenvolvimento dos músculos no seu terço final.
7. Inserção da cauda ou osso sacro avaliado pelo seu comprimento ou aspectos estéticos.
8. Pelagem e pigmentação da pele.

Para as avaliações visuais e peso à desmama, o modelo estatístico utilizado incluiu os efeitos aleatórios genéticos direto e materno e permanente de ambiente, além dos efeitos fixos de grupo de contemporâneos e, para peso ao sobre-ano, o modelo incluiu também os efeitos aleatórios genéticos diretos do animal, além dos efeitos fixos de grupo de contemporâneos. Os parâmetros genéticos foram estimados em análise bi-característica por máxima verossimilhança restrita, com utilização do MTDFREML – Multiple Trait Derivative Free Restricted Maximum Likelihood (BOLDMAN & VAN VLECK., 1991). O critério de convergência foi considerado como atingido quando essa variância era igual ou menor que 10-9; várias reinicializações foram executadas no sentido de se assegurar a convergência no máximo global da função de verossimilhança.

Na Tabela 8 estão reportadas as estimativas dos coeficientes de herdabilidade para efeito genético direto para todas as variáveis (na diagonal) e os valores das correlações genéticas (apresentadas abaixo da diagonal).

Estes resultados encontram pouco suporte para comparação na literatura, pois além da mesma ser escassa, os poucos trabalhos existentes utilizaram-se de diferentes metodologias, mas, tal como LIMA et al. (1989), Razook et al. (1990), indicam a mesma tendência esperada de que as características ligadas à estética apresentam menores correlações com desempenho do que aquelas ligadas à produção.

As correlações dos escores de avaliações visuais com as características de desempenho ponderal no rebanho analisado indicam que a melhora da conformação também promove melhora no desempenho e as características ligadas à estética racial demonstraram não ter relação importante com a produção dos animais.

Tabela 8. Coeficientes de herdabilidade (na diagonal) e correlação genética (abaixo da diagonal) entre as características estudadas.

Os resultados obtidos no presente estudo mostram que a seleção das raças zebuínas não deve ser pensada exclusivamente na balança, mas sim na composição do peso, que é a resultante de músculos, vísceras, ossos e tecido adiposo e, neste sentido, as avaliações visuais por escores são uma grande ferramenta de trabalho para se chegar a melhores proporções. Como FRIES (1996), é possível concluir que escores de avaliações visuais podem ser a melhor ou a única forma, economicamente viável, de medir diferenças entre indivíduos de igual peso corporal. Se bem os escores visuais constituem uma excelente ferramenta para complementar os programas de melhoramento, outras alternativas para melhorar a qualidade das carcaças deverão ser implementadas, como, por exemplo, a ultra-sonografia real-time.

Escores visuais dentro do programa nacional de melhoramento genético de zebuínos

A partir da redefinição de algumas características já utilizadas e da inclusão de outras inéditas, o departamento técnico da ABCZ propõe uma metodologia de avaliação visual que deverá ser incorporada em seu programa de melhoramento genético e provas de ganho de peso. Estas avaliações serão feitas pelos técnicos de campo da ABCZ e as características que estão sendo discutidas para serem implantadas são as seguintes:

Estrutura Corporal (E): Prediz visualmente a área que o animal abrange visto de lado, olhando-se basicamente para o comprimento corporal e a profundidade de costelas.
Precocidade (P): A avaliação do biótipo mais precoce será realizada com base na deposição de gordura subcutânea, buscando animais de melhores proporções de profundidade de costelas em relação à altura de membros.
Musculosidade (M): A musculosidade será avaliada através da convexidade e da distribuição das massas musculares, dando ênfase ao posterior e à linha dorso-lombar, regiões onde estão situados os cortes nobres.
Umbigo (U): Será avaliada a partir da proporção entre tamanho e comprimento do umbigo e seu posicionamento.
Aptidão ao controle (AC): No momento da concessão do registro genealógico de nascimento (RGN), automaticamente os animais serão classificados em aptos ou inaptos. Esta característica, será importante em programas de melhoramento de animais puros, uma vez que os criadores poderão identificar os reprodutores que produzem mais ou menos filhos que sejam aptos ao registro com evidentes conseqüências econômicas.
Aptidão ao registro (AR): Esta característica segue exatamente o mesmo roteiro descrito na AC, só que os dados serão coletados no momento da concessão do registro genealógico definitivo (RGD), permitindo a identificação de reprodutores que transmitem defeitos desclassificantes.
Sexualidade ou dimorfismo sexual (S): Busca-se masculinidade nos machos e feminilidade nas fêmeas, sendo que estas características deverão ser tanto mais acentuadas quanto maior a idade dos animais avaliados. Além da cabeça, serão considerados os genitais externos, tamanho/proporção da cabeça, definição e conformação das massas musculares assim como proporção dianteiro/traseiro. Características sexuais do exterior do animal parecem estar diretamente ligadas à eficiência reprodutiva.
Aprumos (A): Serão avaliados através das proporções, direções, angulações e articulações dos membros anteriores e posteriores.
Características raciais (R): Todos os itens previstos nos padrões raciais zebuínos serão considerados.

A ABCZ, ciente da importância do uso de escores visuais em seleção, estará no ano 2003 editando manual prático para avaliação destas características e treinando seu corpo técnico, em todo o Brasil, para incorporar estas variáveis no seu Programa de Melhoramento Genético (PMGZ).

Considerações finais

Atualmente dados sobre altura de gado zebu são praticamente inexistentes e dificilmente poderíamos definir o que é um zebuíno de tamanho pequeno ou grande. Vários tamanhos e diversos biótipos necessariamente terão que ser criados em um País como o Brasil com ambientes variados e a biodiversidade existente, com sistemas de produção diferenciados mas que apresentam em maior ou menor grau limitações sazonais de forrageiras e nutrientes. Estes sistemas de produção de pastagens se mostram cada vez mais competitivos, sobretudo quando se cria um tamanho de bovino em consonância com o seu ambiente e que têm condições de oferecer produtos de maior valor agregado, não somente pelos seus custos de produção, como também pelas possibilidades de oferecer uma carne verde, transformando forrageiras em proteína animal, valorizando a preservação ambiental e o bem-estar social e animal.

Existe, portanto, a necessidade de oferecer ao mercado animais capazes de melhorar a rentabilidade da pecuária em ambientes com limitações nutricionais e estes mercados estão cada vez mais ávidos por indivíduos precoces, de carcaças musculosas e com bom acabamento de gordura subcutânea.

Os novos cenários mundiais criam para o Brasil oportunidades ímpares para o crescimento e a modernização da nossa pecuária com claras conseqüências para o mercado interno. O processo de produção da carne bovina precisa atingir um produto de qualidade percebida pelo consumidor final e com rentabilidade para toda a cadeia produtiva. Características econômicas e de qualidade de carcaça deverão ser introduzidas nos programas de melhoramento.

Dentro destas perspectivas as variáveis que equacionam tamanho com referência ao sistema de produção, escores de condição corporal e escores visuais de qualidade de carcaça passam a ser prioritárias em um Brasil que se prepara para assumir a liderança mundial da carne bovina até o ano 2020.

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17. RAZOOK, A. G.; LIMA, F. P.; BONILHA, L. M.; PACOLA, L. J.; FIGUEREDO, L. A.; Respostas correlacionadas à seleção para peso pós-desmama sobre características morfológicas em bovinos Nelore. Bol. Indust. Animal. v. 47, nº 1, p. 11-18. 1990.
18. ROSO, V. M.; FRIES, L. A.; Componentes principais em bovinos da raça Hereford a desmama e sobre-ano. Rev. Soc. Bra. Zoot., v.24, n.5, p.728-735, 1995.
19. RICHARDS, M. W.; SPITZER, J. C.; WARNER, M. B.; Effect of varying levels of postpartum nutrition and body conditions at calving on subsequent reproductive performance in beef cattle. J. Anim. Sci. v. 62 p. 300 – 306. 1986.
20. ROCHA, C. E.; Estudo de fatores que podem influenciar o valor da carcaça em bovinos da raça Nelore. UNESP, Jaboticabal. SP. Dissertação de Mestrado. 77 p. 1999.
21. SCARPATI, M. T. V.; MAGNABOSCO, C. U.; JOSAHKIAN, L. A. et al.; Estudos de medidas corporais e peso vivo em animais jovens da raça Nelore. In: REUNIÃO ANUAL DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE ZOOTECNIA, 33., Fortaleza, 1996. Anais.. Fortaleza. CE. Brasil. SBZ, 1996. v. 1, p. 110-112.
22. WEISS, A.; Os grandes reprodutores indianos do Brasil. Editora Revista Zebu. Uberaba. MG. 1956 p. 543.

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1 Nelson Pineda, Diretor de Informatica da ABCZ
2 William Koury Filho, Doutorando UNESP – Jaboticabal – SP

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  1. MARIA CECÍLIA CABRAL RAMPE disse:

    Parabenizo pelo pensamento inicial, a idéia é justamente essa, “praticidade”. O artigo é de suma importância para pecuária de corte, e a ala acadêmica agradeçe pelo aporte de informações.