O chanceler Celso Amorim considera que o maior acesso dos produtos brasileiros aos mercados internacionais resulte num aumento no comércio de cerca de US$ 10 bilhões, em conseqüência da reunião em Genebra, da Organização Mundial do Comércio (OMC), encerrada no sábado. Segundo Amorim, foi uma vitória do governo brasileiro.
O chanceler admite que ainda não há data marcada para a eliminação dos subsídios concedidos pela União Européia (UE) e Estados Unidos aos produtores agrícolas. “Mas não pode ser 15 ou 20 anos. Precisa ser um prazo com credibilidade. Talvez não seja um ou dois anos, mas isso vai ser definido numa segunda fase”, disse Amorim, após reunir-se com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no Palácio do Planalto.
A definição quanto a prazos deve ser feita no final de 2005. Amorim comentou que analistas econômicos têm alertado os agricultores para que não contem com os subsídios para além de 2010. Questionado sobre quem garantiria o cumprimento de um eventual acordo, Amorim respondeu: “Quem garante é só Deus ou o Sistema de Controvérsias da OMC, que tem respondido positivamente em muitos casos”.
O ministro da Agricultura francês, Hervê Gaymard, aposta que a discussão sobre prazos poderá se estender pelo menos por mais dez anos. Entre os países da União Européia (UE), a França foi o país que mais resistiu a um acordo sobre agricultura. A discussão sobre prazo foi a justificativa dada por Gaymard para a mudança de posição. “Penso que o ritmo será o horizonte de 2015 ou 2017, o que nos dará tempo mais do que suficiente para uma adaptação”.
O acordo assinado no sábado definiu diretrizes para a negociação da Rodada Doha e estabeleceu que os subsídios concedidos à exportação de produtos agrícolas terão de ser eliminados.
Segundo cálculos apresentados pelo chanceler, o total de recursos que poderiam vir para os países em desenvolvimento, com o fim dos subsídios, pode ultrapassar US$ 200 bilhões. “O Brasil ficaria com cerca de 4% disso”.
Amorim ressaltou que essas medidas vão beneficiar, principalmente, Brasil e Argentina, que são competitivos na agricultura. No caso do Brasil, entre os produtos que seriam beneficiados estão carne, algodão, açúcar e soja.
Essa rodada significou, no seu entender, “o começo do fim do subsídio”. “O jogo não precisa ser um a um. No comércio todos podem ganhar. Só não dá para ser seis a zero como foi no jogo (de futebol, anteontem) do Santos contra o Paysandu”, disse.
Para o ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, é possível que o acordo da OMC reflita em outras negociações comerciais, principalmente na Área de Livre Comércio das Américas (Alca), mesmo que essa movimentação não seja imediata. “Os americanos diziam que só discutiriam medidas de apoio interno na Alca se houvesse um acordo na OMC. O documento ratificado no sábado sinaliza isso”, completou.
Na avaliação do vice-presidente para assuntos internacionais da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Gilman Viana Rodrigues, o acordo assinado na noite de sábado foi “um avanço que não deixou frustrar as discussões da Rodada Doha”. Ele disse, no entanto, que é necessário consolidar os princípios estabelecidos pelo acordo base ratificado por 147 países membros da OMC. “Ou seja, é preciso batalhar para que sejam estabelecidas datas e condições para por em prática o que prevê o acordo”.
Fonte: O Estado de S.Paulo (por Tânia Monteiro, com colaboração de Fabíola Salvador e Reali Júnior), adaptado por Equipe BeefPoint
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Textos jornalísticos como estes que discutem a situação do comércio internacional são sempre esclarecedores, além de leitura prazerosa. Mas eu também gostaria de, se possível, fazer uma espécie de sugestão de pauta. Gostaria de ler artigos que procurassem explicitar os possíveis caminhos que os países nossos amigos mas contundentes na OMC, na Rodada Doha e na ALCA – poderiam tomar em função das decisões feitas pela diplomacia brasileira em defesa dos nossos- brasileiros – interesses.
Isto é, talvez fosse possível olhar o contexto em que se dá o comércio internacional realizando uma espécie de revisão, como se faz nos trabalhos científicos das áreas biológicas e exatas. Se isso não puder ocorrer, não me entristecerei pois é fato sabido que tal trabalho de contextualização é de difícil realização em Ciências Humanas.
No entanto, também é conhecido que “quanto mais alto subimos, mais conseguimos distinguir o passado e também o futuro”, como já dizia Winston Churchill, o homem a quem o Ocidente deve, entre tantos homens, a derrota de Hitler. Quanto mais estudamos História, mais compreendemos o passado e melhor prevemos o futuro.
Assim, à maneira de agradecimento por tantos insigths proporcionados por artigos como este, recomendo – fortemente – a leitura do ensaio introdutório “The United States Demands that Japan Open Its Ports to Trade”, excerto do livro Contemporary Japan: A Teaching Workbook da Columbia University, dentro do East Asian Curriculum Project , disponível em
http://afe.easia.columbia.edu/japan/japanworkbook/modernhist/perry.html
Graças às maravilhas da Internet e ao fato dos Estados Unidos da América serem um país em que os documentos públicos devem ser tornados públicos por lei, mas todos os companheiros amigos e colegas interessados em história do comércio internacional poderão se deliciar, e se instruir ao mesmo tempo, com o texto de duas cartas. Primeiro, a carta, escrita em 13 de novembro de 1852, pelo então Presidente americano Millard Fillmore, entregue pelo Comodoro Perry, comandante da esquadra americana no Pacífico ao Imperador japonês, pedindo que portos japoneses fossem abertos ao comércio com os americanos. Segundo, a carta de 7 de julho de 1853, do próprio Comodoro Perry ao Imperador japonês , o portador da carta do presidente, explicando o que aconteceria se isso não acontecesse.
Às vezes, o contexto das coisas – o todo da coisa – é às vezes mais importante que a parte da coisa. Talvez fossem sábios aqueles que diziam que o comércio internacional talvez fosse apenas a continuação da diplomacia. E a diplomacia, a mera continuação da arte de Marte, a arte cultivada por Aquiles, Sun Tzu, Sócrates, Aníbal, Júlio César, Clausewitts, Napoleão Bonaparte, Robert MacNamara e tantos outros grandes representantes mais atuais e, diga-se de passagem, em atividade – da espécie Homo sapiens.
Por falar em Robert MacNamara, um dos criadores da Pesquisa Operacional nos tempos da Segunda Guerra Mundial, está em cartaz um excelente filme-documentário chamado Por Dentro das Brumas da Guerra (In the War Fog, se não me engano). Também é muito recomendável num sábado à noite ir buscá-lo na locadora.
Acredito que um trabalho sobre o Comércio Exterior – digamos assim, mais contextualizador – poderia explicar as coisas com maior poder de previsão – um atributo das ciências físicas e biológicas . Por exemplo, por qual razão as políticas agrícolas das duas das maiores potências econômicas e militares atuais dotadas de estratégias nacionais (os EUA e a União Européia) continuarão sem mudanças – nem mesmo as cosméticas .
É bom sempre manter em mente que a terceira potência – a coalizão formada pela capacidade científica e tecnológica japonesa somada à capacidade de trabalho e estratégia chinesa – além de se tornarem o maior produtor e vendedor de produtos manufaturados do planeta, está se transformando no maior mercado de consumo de alimento do mundo. Um negócio da China.