Por Ana Carolina Espasandin1 e Adriana Luize Bocchi2
Uma das principais dúvidas que o produtor normalmente enfrenta na hora de escolher um sistema de produção, é o recurso genético a utilizar, dito de outra forma, qual raça ou qual combinação racial seria a mais apropriada.
Para começar, não podemos nunca esquecer que não existe nenhum recurso genético que independa do ambiente em que ele será criado, fenômeno conhecido como interação genótipo x ambiente. Os efeitos desta interação têm sido reportados em trabalhos realizados com várias raças bovinas de corte criadas em diferentes ambientes do Brasil.
Analisando o que deveria ser considerado na hora de escolher a vaca mais eficiente para cada sistema de produção, os pesquisadores T.G. Jenkins e C.L. Ferrel publicaram uma revisão onde são discutidos os desempenhos que diversos genótipos apresentam em diferentes ofertas de alimento.
Sendo a análise referida à fase da cria, os autores definem eficiência como a conversão da energia consumida em produto comercializável (kg de bezerro desmamado/kg de alimento consumido por vaca).
O consumo de energia da mãe durante esta fase irá diferir de acordo com: o potencial genético do bezerro para o crescimento pós-desmama, o peso adulto e a produção de leite da vaca. Estes processos são responsáveis por aproximadamente 72% da energia metabolizável utilizada no ciclo total da vida dos bovinos (desde a concepção até o abate).
Para avaliar a eficiência de conversão de diferentes raças bovinas para produção de carne, foi conduzido no MARC (Meat Animal Research Center), em Nebraska (USA), um experimento envolvendo 9 raças que diferiam no seu potencial genético para: peso maduro (quando atinge um 25% de gordura corporal), produção de leite observada no momento do pico, ganho de peso pós-desmama e potencial de deposição de gordura.
A eficiência de produção (kg de bezerro desmamado/kg de matéria seca consumida/vaca exposta) foi medida em nove raças (Angus, Braunvieh, Charolais, Gelbvieh, Hereford, Limousin, Pinzgauer, Red Poll e Simmental) e o consumo de matéria seca em diferentes níveis de oferta (58, 76, 93 e 111g MS/PV0.75) assim como as variáveis de produção.
Como resultado deste experimento, foi demonstrado que existe variação na eficiência de produção. A eficiência de produção de acordo com a matéria seca consumida pode ser observada na Figura 1 para as nove raças bovinas estudadas, que podem ser visualizadas na Figura 2.
Dentro de cada raça, a maior eficiência ocorreu em níveis de consumo em que a reprodução das fêmeas não foi ressentida, e onde a energia disponível foi o suficiente para atingir produções de leite que permitiram os desenvolvimentos potenciais dos bezerros.
Em níveis baixos de consumo, as raças regiram de maneira diferente, refletindo isto em diferenças na eficiência de cada raça. Estas diferenças foram expressas principalmente pela energia destinada à mantença, a que varia com o nível de consumo ao qual a raça é exposta.
Os animais com maiores potenciais genéticos para produção (ex. Charolais, Limousin) mostraram serem os menos hábeis para reduzir os seus requerimentos de mantença em situações de restrição alimentar.
Um exemplo que podemos citar é quando a alimentação é restrita durante a fase pós-desmama, em que a raça Simental comporta-se menos eficientemente que a raça Hereford. Entretanto, quando o consumo permitido é ad libitum a Simental mostra maiores resultados produtivos.
As raças grandes também apresentaram maiores gastos de energia para produção de calor em ambientes com baixa disponibilidade de alimento, em relação a uma raça de menor frame. Mas assim que a taxa de consumo aumenta, a tendência é revertida entre os dois biotipos.
Se a utilização do alimento é melhorada, parece uma boa opção tentar reduzir a quantidade de energia destinada à manutenção, mas sem reduzir o apetite dos animais, sobrando portanto o maior consumo para a produção.
Tem sido observado que a energia de mantença e a produção de calor parecem ser moderadamente herdáveis (0,25 a 0,30), sendo uma característica passível de seleção. A utilização destas medidas permitiria ranquear os touros pelos requerimentos de manutenção dos filhos que eles irão produzir.
E a melhora genética para eficiência?
Um enfoque recente em que tentam serem detectados animais mais eficientes, surge com o chamado residual feed intake. Esta variável é obtida como a diferença entre o consumo real de um indivíduo e o consumo estimado para esse indivíduo. Quanto menor seja esta diferença, mais eficiente o animal será.
A seleção de animais em busca da redução do residual feed intake resultará em progênies que, comendo menos, obterão ganhos iguais ou superiores aos outros. A seleção por este caráter (medido no período pós-desmama) tem produzido resultados favoráveis nos desempenho das progênies tanto machos quanto fêmeas.
Considerações finais
Estes trabalhos permitiram visualizar que as raças bovinas respondem diferentemente na conversão das fontes de alimento em peso do bezerro a desmama e que essas diferenças são devidas aos consumos diferenciais de alimento nas vacas das diferentes raças. Frente a variações na oferta de nutrientes, os recursos genéticos reagem diferencialmente (interação genótipo x nutrição), sendo esta a chave na determinação da eficiência de cada raça, ou animal dentro dela.
Em pesquisas atuais está sendo testado o residual feed intake, variável de moderada herdabilidade que mede o consumo real realizado pelos animais. A pronta disponibilização de variáveis como esta possibilitará avaliar a eficiência com que as nossas raças estão produzindo nos diferentes ambientes do país, assim como a possibilidade de praticar a melhora genética do rebanho levando em conta a eficiência (custo/benefício) de cada um na produção.
Referências
JENKINS, T.G., FERREL, C.L. Beef Cow efficiency – Revisted. Beef Improvement Federation. Proceedings. Disponível em: http://beefimprovement.org. Consultado em: 10/03/2006.
JENKINS, T.G., FERREL, C.L. Productivity through weaning of nine breeds of cattle under varying feed availabilities: I. Inicial Evaluation. Journal of Animal Science, v. 72, n. 11, p. 2787-2797, 1994.
PAZZANESE, D. L.; ALMEIDA, R. Residual Feed Intake: Um Novo Critério de Seleção? IN: Simpósio da Sociedade Brasileira de Melhoramento Animal, 5. Disponível em: http://www.sbmaonline.org.br/anais/v/palestras/palest04.pdf. Consultado em:10/03/2006.
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1Ana Carolina Espasandin, Profa. Dra. do Departamento de Producción Animal y Pasturas – Facultad de Agronomía – Universidad de la República Oriental del Uruguay
2Adriana Luize Bocchi, Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Zootecnia – FMVZ – Unesp / Botucatu
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Prezados autores, ótimo artigo.
Toda essa discussão que envolve eficiência produtiva ou reprodutiva aliada a interação genótipo-ambiente nos leva a uma grande reflexão dentro de nosso processo de seleção no Nelore que vem sendo realizada por muitos programas de melhoramento de melhoramento genético.
Qual o impacto econômico, principalmente na seleção do Nelore, em buscar animais com alta performance para habilidade materna? Será que estes rebanhos ao obter ganhos genético para animais de maior habilidade materna por alimentar melhor o seu bezerro não vão indiretamente selecionar por animais de maior exigência nutricional?
Pois devemos lembrar que exploramos pecuária em um país que tem como vocação uma pecuária competitiva de baixo custo, explorada em sua maior parte com o alicerce nutricional em cima de brachiarias, e que ainda existe sazonalidade na ofertas de forragens. Será que na seleção por esta característica não causará um desequilíbrio entre a oferta e a exigência dessas vacas? Será que nossas vacas vão parir um bezerro todo ano? Será que não vamos aumentar o número de fêmeas adultas ociosas em nosso rebanho e piorar nossas taxas de desfrute?
Ana,
As preocupações e questionamentos levantadas pelo Danilo são muito oportunos. Além do que já foi mencionado de Ind. de seleção, talvez seja válido comentar sobre o conceito de “curve bender” utilizado nos EUA onde se procura animais de baixo peso ao nascer, elevado potencial de crescimento e peso adulto moderado.
Ou seja, identificar os indivíduos que ” quebram” a curva e fogem as regras das correlações genéticas (mais peso, mais ganho, mais mantença..etc). São poucos indivíduos assim mas existem e a única maneira de identificá-los é através de programas de melhoramento genético.
O touro Red Angus mais comercializado dos EUA nos últimos três anos tem um frame de 5.3 (longe dos frame 7 ou 7.5 do passado) e isso não comprometeu desenvolvimento, peso de carcaça nem trouxe fêmeas extremamente grandes.
Vasco