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Os marcadores moleculares chegaram para aumentar a eficiência da seleção

Marcadores moleculares são frações do DNA, que estão próximas a genes que condicionam características de interesse zootécnico ou econômico. Essas frações se tornam "marcadores" quando suas associações com essas características são comprovadas, num processo conhecido como "validação". Ao contrário do que ocorre com as DEPs, o conhecimento desses marcadores nos permite conhecer, com grande precisão, o potencial genético de determinado indivíduo ou mesmo rebanho para a característica em questão e assim anteciparmos as tomadas de decisão sob os pontos de vista de seleção e manejo, ganhando tempo e acelerando o ganho genético.

Introdução

Uma pergunta recorrente que sempre está na cabeça dos criadores: como selecionar reprodutores e matrizes? Como aumentar a rentabilidade dos rebanhos? Recentemente o Miguel Cavalcanti escreveu no BeefPoint um artigo sobre as restrições inglesas à carne brasileira. Como reagir a essas restrições, produzindo carne de melhor qualidade? Para se responder a essa pergunta, é necessário, antes de qualquer outra consideração, responder a uma pergunta crítica para o agro-negócio da pecuária de corte: para que servem reprodutores e matrizes?

Os reprodutores e matrizes são nossas máquinas e valem pelo número de produtos que elas produzem: os nossos bezerros. Se nossas máquinas valem pelos seus produtos e, para produzir esses animais, machos e fêmeas, contribuem com partes iguais na genética dos produtos, através de seus gametas (espermatozóides e óvulos), reprodutores e matrizes valem exatamente o valor de seus gametas. Essa resposta é essencial para que saibamos dar o valor correto ao material genético que adquirimos para nossas propriedades. Mas como fazemos para conhecer esse valor?

As avaliações genéticas

Infelizmente não é possível conhecer com precisão o valor genético dos animais. O problema é muito simples: o desempenho dos animais, também denominado de fenótipo é resultado do patrimônio genético que o animal possui, o chamado genótipo e dos efeitos de meio ambiente, existindo ainda uma interação entre os efeitos de genótipo e de meio ambiente, já que alguns animais são superiores a outros em alguns ambientes, mas se tornam inferiores àqueles em ambientes diferentes.

Para facilitar o entendimento, podemos simbolizar o fenótipo com a letra F, o genótipo com a letra G, o meio ambiente com a letra E e a interação entre o genótipo e o ambiente com as letras GE, o desempenho dos nossos animais, seja qual for a característica estudada (peso à desmama, peso ao ano, produção de leite, circunferência escrotal, etc.) poderá ser colocado numa equação muito simples:

F = G + E + GE

Esta equação nos mostra que, infelizmente, o fenótipo que medimos nos animais não demonstra diretamente sua qualidade ou potencialidade genética. Essa produção ou medida F estará sempre influenciada pelo meio ambiente E e pela interação genótipo-ambiente GE.

Para complicar mais um pouco, a fração G pode ser dividida em três componentes: o valor aditivo dos genes, A, que todo gene tem, o desvio da ação individual dos genes, devido aos efeitos de dominância, D, que depende dos gametas que vêm do pai e de mãe, e dos efeitos de interação entre genes de loci diferentes, I. Nossa equação, ficaria:

F = A + D + I + E + GE

No entanto, o único termo previsível dessa equação é o A, o que exige o uso de modelos estatísticos bastante complexos para, dado um conjunto de observações e informações de pedigree dos animais, podermos estimar esse valor de A.

Avaliar a qualidade genética de um animal nada mais é do que estimar o seu valor genético aditivo, ou seja o A de nossa equação. Jamais conheceremos com precisão o valor que um animal tem como reprodutor, mas, através de metodologias diversas, é possível estimar esse valor. É, entretanto, necessário que a estimativa seja livre dos efeitos de meio ambiente e da interação genótipo-ambiente.

O valor genético dos animais depende da ação dos genes envolvidos na determinação das características, do número de informações a respeito dos animais avaliados (quanto maior este número, melhor a estimativa do valor genético), do parentesco entre os animais avaliados e as fontes de informação (quanto mais próximo o parentesco, maior a ênfase que a informação deve ter), além dos chamados efeitos permanentes de ambiente.

Por definição, o valor genético aditivo esperado (Expected Breeding Value ou EBV) de um animal é o valor que ele teria como reprodutor. Em última análise o valor genético aditivo (lembra-se do A de nossa equação?) é o que os rebanhos selecionadores vendem, pois expressa o potencial genético dos animais vendidos. Este valor mostra o quanto os filhos de um animal seriam desviados em relação à média de todos os reprodutores em utilização, ou seja, produziriam “a mais” ou “a menos” que a média dos filhos dos outros reprodutores.As DEP (diferenças esperadas de progênie) são por definição a fração de uma superioridade de progênie devidas aos efeitos dos genes do reprodutor, na realidade, a metade do EBV.

Uma conta muito útil para entender a aplicação prática das DEPs: imagine que um touro A tem DEP de +10,0 kg para ganho de peso ao sobreano e outro touro B tem DEP de -5,0 kg para a mesma característica. Os filhos do touro A serão 15 kg mais pesados que os do touro B, se ambos forem acasalados com vacas semelhantes. Multiplique esta arroba extra de peso vivo por filho por 30 filhos/ano e por 5 anos (vida útil do touro) e por 52% de rendimento de carcaça. O resultado é de cerca de 80 arrobas de peso no gancho, equivalente, a preços de julho/2007, a cerca de R$5.600,00, que é o valor da diferença, no bolso do criador, entre os valores de abate dos filhos dos touros A e B.

Este conceito de DEP é usado em geral pelos criadores de gado de corte, ao passo que os de gado de leite utilizam-se dos termos PTA (predicted transmiting ability ou habilidade prevista de transmissão),TA (transmiting ability, ou habilidade de transmissão), ou ainda PD (predicted difference) ou SC (sire comparison ou comparação entre reprodutores). Em essência, todos estes termos estimam a metade do valor genético de um reprodutor.

As DEP são uma potente ferramenta para auxiliar as decisões de seleção por parte dos pecuaristas. Utilizar-se dessa ferramenta no momento de decidir qual touro, ou sêmen, será adquirido, deve aumentar de maneira acentuada o progresso genético dos rebanhos.

Marcadores moleculares ou marcadores genéticos

Marcadores moleculares são frações do DNA – o ácido desoxirribonucléico, a molécula que armazena as informações genéticas de todos os indivíduos – que estão próximas a genes que condicionam características de interesse zootécnico ou econômico. Essas frações se tornam “marcadores” quando suas associações com essas características são comprovadas, num processo conhecido como “validação”.

Ao contrário do que ocorre com as DEPs, o conhecimento desses marcadores nos permite conhecer, com grande precisão, o potencial genético de determinado indivíduo ou mesmo rebanho para a característica em questão e assim anteciparmos as tomadas de decisão sob os pontos de vista de seleção e manejo, ganhando tempo e acelerando o ganho genético.

Enquanto as DEPs apresentam valor inestimável para características de alta herdabilidade e de fácil mensuração (peso ao nascimento, à desmama ou ao sobreano, por exemplo), os marcadores moleculares nos permitem atuar com muita antecedência em características de baixa herdabilidade e de difícil e/ou onerosa mensuração. Exemplos disso são a maciez da carne (um dos problemas descritos pelos ingleses para colocarem restrições à nossa carne), rendimento de carcaça, peso de carcaça, precocidade sexual, percentagem de proteína ou gordura do leite, etc.

O uso dos marcadores moleculares é muito grande. Eles, basicamente, servem para:

• Aumento de eficiência produtiva;
• Teste de paternidade em pastagens que se utilizam de múltiplos touros; ajudando no descarte de touros menos produtivos;
• Seleção Assistida por Marcadores;
• Auxílio nos acasalamentos e descartes;
• Manejo Assistido por Marcadores;
• Decisão de estratégia de compra e venda;
• Decisão de estratégia de ordenha;
• Uniformidade/homogeneidade de lotes;
• Bônus por sólidos totais no leite;
• Acasalamentos dirigidos;
• Agregação de valor ao produto final;
• Ferramenta de rastreabilidade e certificação de origem.

Os marcadores moleculares são ferramentas adicionais para melhorar a eficiência dos processos de seleção. Sua utilização nos permitirá ter mais segurança na escolha dos reprodutores. Ao ter que escolher entre reprodutores com DEPs semelhantes, escolheremos aqueles que têm em seu conjunto de genes, aquelas formas gênicas, os marcadores, que têm associação com aumentos de produtividade. Isso será muito útil, ainda, nos casos em que a medição das características é difícil, como as medições de carcaça e qualidade de carne.

No caso do manejo, os marcadores moleculares poderão ser úteis ajudando a separar animais de grande potencial de crescimento, por terem marcadores favoráveis, daqueles com potencial mais limitado e para os quais deveremos ministrar dietas mais baratas, já que eles não têm potencial genético para ganhar tanto peso quanto os anteriores. Experimentos com mais de 50.000 animais nos USA mostraram grandes diferenças, de quase uma arroba, entre grupos com genótipos favoráveis e desfavoráveis, para ganho de peso em confinamento, com dietas semelhantes. Os marcadores certamente trarão um importante aumento de velocidade de ganho genético.

Recentemente, a Merial Saúde Animal, iniciou suas atividades com marcadores genéticos através de sua nova unidade de negócios denominada IGENITY, dedicada à aplicação de marcadores moleculares em pecuária bovina. Dessa atividade, chegam ao mercado brasileiro painéis de marcadores moleculares para gado de leite e gado de corte, para Bos taurus e Bos indicus.

Sabedora da fundamental importância de um processo consistente, sério, confiável e isento de validação de seus marcadores em sistemas locais de produção e genética zebuína, a Merial fez duas parcerias no Brasil. Uma com o Grupo de Melhoramento Animal e Biotecnologia da Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos da Universidade de São Paulo, de Pirassununga, para que fossem validados marcadores moleculares em características de crescimento e qualidade de carcaça e carne de bovinos da raça Nelore, utilizando, para isso, mais de 5.000 animais avaliados. A outra, com a Embrapa Gado de Leite, de Juiz de Fora, MG, para, validação de marcadores para bovinos leiteiros das raças Gir Leiteiro e Girolanda. Esse processo de validação utilizou mais de 3.000 vacas dessas duas raças e milhares de lactações das mesmas

A maior dificuldade de um processo de validação é colher dados fenotípicos, de produtividade, confiáveis, além da necessidade de colher amostras para extração de DNA. É um enorme esforço e, para isso, as parcerias foram de extrema valia.

Agora, ao fim do processo de validação, foram desenvolvidos painéis de marcadores moleculares validados em milhares de animais, criados nos sistemas de produção brasileiros, com raças utilizadas no Brasil. Dentro de algumas semanas esses produtos serão lançados e os criadores e técnicos precisam ficar preparados para interpretar seus resultados, usando essa mais nova ferramenta de maneira adequada, aumentando a velocidade dos ganhos genéticos.

Conclusões

Os marcadores moleculares chegaram para ficar. Eles se constituem num conjunto de ferramentas de enorme valor para o criador aumentar a velocidade de ganho, pois ele conseguirá escolher com maior precisão os animais que servirão como reprodutores. Os marcadores moleculares se tornarão, rapidamente, importante fonte de apoio ao manejo, quer pela identificação de paternidade, quer pela identificação de animais mais adequados aos diferentes tipos de manejo, ajudando a uniformizar os lotes.

Finalizando, os marcadores genéticos poderão ser utilizados num sem número de novas aplicações, que agregam valor ao produto e poderão causar um grande impacto na pecuária brasileira, colocando a pecuária brasileira num patamar tecnológico semelhante ao dos nossos concorrentes no mercado de carne.

Com o uso dos marcadores moleculares para assistir os processos de seleção, poderemos selecionar animais que produzem carne mais macia, mais saborosa, com mais gordura entremeada e, com isso, começar a atingir mercados que pagam melhores preços pela nossa carne. E isso, usando nossas maiores vantagens, ou seja, a carne natural, produzida a pasto ou com confinamento à base de gramíneas e não de grãos, sem possibilidade de doenças como a vaca louca e produzindo animais com grande respeito pelo seu bem estar. Carne saudável, com alta qualidade sensorial, com padronização, regularidade e rastreabilidade: a única resposta que o Brasil pode dar às restrições como as que a Inglaterra nos quer impor.

0 Comments

  1. Cledyson Kyldary disse:

    Sou muito fã dos avanços biotecnológicos que se podem ser utilizados de forma dinâmica na pecuária, concordo que os marcadores moleculares permitam estes avanços e que devemos avançar cada vez mais nestes estudos, não só visando a produção mas como também animais mais resistentes a doenças e alguns principais parasitas que muitos prejuízos causam aos nossos produtores.

  2. Lucas Machado Figueira disse:

    Agora cabe aos técnicos utilizarem com sabedoria essa nova ferramenta que certamente contribuirá para o melhoramento animal e o status da pecuária nacional.

    E a que custo esta nova tecnologia chegará aos produtores.

  3. Pedro Hespanha disse:

    Sem dúvida os marcadores vieram para acelerar o processo de padronização da qualidade da carne bovina brasileira. Cabe aos técnicos e produtores que já tiveram acesso a esta tecnologia, disseminá-la, orientando que é mais uma ferramenta que agregará velocidade, antecipação e perícia no trabalho de melhoramento genético dos rebanhos.