Os países pobres passaram a ser os maiores compradores de produtos agrícolas do Brasil. Historicamente, o Brasil foi um fornecedor de commodities para a União Européia e Estados Unidos, mas agora o país tem como principais clientes países como a China, a Rússia e nações do Oriente Médio.
Em 1989, os países ricos compravam quase 80% de todos os produtos agrícolas exportados pelo Brasil, enquanto as nações em desenvolvimento ficavam com pouco mais de 20%. Em 2004, da exportação agrícola de US$ 28 bilhões em 2004, os países em desenvolvimento absorveram 51% e os países desenvolvidos, 49%. E a tendência é que a participação dos países pobres cresça ainda mais.
Isso é o que mostra o estudo “Inserção do Brasil no comércio internacional agrícola e expansão dos fluxos sul-sul”, do pesquisador do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone), Mario Jales. China e a Rússia foram os principais responsáveis por essa virada. Com seu consumo voraz de soja e derivados, a China importa 20% do total de produtos agrícolas que o Brasil vende para países em desenvolvimento. A Rússia vem em segundo lugar, importando 14%, principalmente em carnes e açúcar.
Segundo o presidente do Icone, Marcos Jank, essa mudança se deve ao crescimento extraordinário da demanda dos países em desenvolvimento por produtos agrícolas. “A virada não foi por causa de um aumento de protecionismo nos países ricos, nem foi resultado da política comercial do governo de aproximação com os países do hemisfério sul”, diz.
“Houve é um aumento de renda per capita e urbanização nos países em desenvolvimento, além da chamada graduação, substituição da proteína vegetal por proteína animal e outros alimentos mais nutritivos por causa do ganho de renda. Na prática, o chinês está comendo menos arroz e mais carne bovina, leite e frutas”, resumiu.
Enquanto as exportações para países desenvolvidos cresceram a uma taxa média anual de 1,2% entre 1995 e 2004, as vendas de produtos agrícolas para países em desenvolvimento cresceram a uma taxa anual de 7,9% no mesmo período. Para China, Coréia do Sul, Índia e Indonésia, as exportações cresceram a taxas médias anuais de 30% a 45% entre 2000 e 2004.
Mas Jank afirma que um dos mecanismos que está sendo discutido no âmbito da OMC, as salvaguardas especiais, ameaça o sucesso do Brasil nos mercados emergentes. Esse mecanismo está sendo proposto pelo G-33, grupo que reúne países pobres protecionistas na área agrícola, encabeçado por Indonésia, Coréia do Sul e países do Caribe, além de ter a participação menos ativa de China e Índia. O G- 33 pede a implementação do mecanismo, que permitiria aos países em desenvolvimento a adoção de salvaguardas (na forma de tarifas adicionais) automáticas para produtos agrícolas.
Para Jank, esse mecanismo vai contra os interesses do Brasil, que poderia perder participação ou margem de lucro nesses mercados. No governo, o Ministério do Desenvolvimento Agrário defende esse mecanismo para proteger alguns produtos agrícolas. “O Brasil vem lutando apenas pela derrubada das barreiras nos países desenvolvidos, mas é importante evitar que sejam adotadas medidas protecionistas nos países mais pobres, que são nosso principal mercado agrícola”, diz Jales.
Fonte: O Estado de S.Paulo (por Patrícia Campos Mello), adaptado por Equipe BeefPoint