A atual crise que o País enfrenta devido ao ressurgimento da febre aftosa em território nacional e as mudanças de comportamento da economia nacional, dos frigoríficos e pecuaristas abrem uma janela de discussão em torno de qual realmente é o interesse do Estado de Goiás, em um mundo globalizado, em se fazer cada vez mais presente nas estatísticas oficiais do Governo Federal, gerar mais empregos, renda para sua população, maior arrecadação e, consequentemente, aplicá-las em investimentos que beneficiem sua população.
Quais são as ações governamentais que podem ser tomadas para se alcançar um significativo crescimento econômico – de forma sustentável ao longo do tempo – e que gere o que todos nós brasileiros almejamos: melhores condições de vida para as futuras gerações.
De acordo com dados oficiais do Governo do Estado, no ano de 2003, o Produto Interno Bruto (PIB) de Goiás alcançou o montante de R$ 36,835 bilhões, o que equivale a 2,37% do PIB nacional. Os principais segmentos responsáveis pelo avanço da economia goiana foram a agropecuária, a indústria de transformação e extrativista mineral, entre outros.
A agropecuária goiana se reveste da maior importância para a economia do Estado, tendo em vista sua facilidade em produzir matérias-primas para as agroindústrias, impulsionar a balança comercial e de gerar empregos. Em 2003, o setor cresceu 11,22% e contribuiu com R$ 7,434 bilhões à economia goiana.
A participação do setor no PIB goiano, em 2003, foi de 21,94%. A atividade da bovinocultura foi a que mais colaborou com a consolidação dos referidos dados (4,93% do total).
A questão central, após avaliar os números estatísticos da pecuária goiana é se a economia pecuária do Estado de Goiás é ou pode ser competitiva em bases permanentes e se está sujeita às turbulências da era do conhecimento.
Para se ter uma base que nos permita melhor visualizar a situação da pecuária goiana, é imprescindível comparar o desempenho da pecuária nacional com a do Estado.
Até o mês de outubro de 2005, o Brasil já exportou o montante de US$ 2.575 bilhões em carne bovina, ou seja, já ultrapassou as exportações totais do ano anterior inteiro. Desse valor, 22% tem como destino a União Européia, onde São Paulo é responsável por 63% das exportações, Mato Grosso do Sul 14%, Mato Grosso 6% e Goiás 5%.
Se tomarmos por base o maior mercado importador individual do Brasil – a Federação Russa – as estatísticas demonstram que do total exportado pelo Brasil, 17% foi destinado àquele mercado, onde São Paulo participou com 61% desse total, Mato Grosso do Sul com 16% e Goiás com 8%. Além disso, a inserção do Estado de Goiás em novos mercados como Egito, Argélia e Bulgária, se mostra marginal, se comparado com outros Estados da Federação, 11%, 5%, e 8%, respectivamente.
Tendo em vista o embargo de 44 países para a carne bovina brasileira produzida nos Estados do Mato Grosso do Sul, Paraná e São Paulo, Goiás se tornou o foco das atenções dos frigoríficos brasileiros. É fato que os principais frigoríficos não se instalaram em Goiás nos últimos anos sem planejamento e de forma indiscriminada. Vários fatores os levaram a investir massiçamente no Estado.
O parque industrial de abate de bovinos do Estado de Goiás é considerado hoje o melhor e mais moderno do País, senão do mundo. Estão instalados no território goiano frigoríficos como o Bertin, Friboi, Minerva, Frigoestrela e Goiás Carne, este último pioneiro na pecuária de Goiás e que conta com um dos melhores executivos do setor em todo o Brasil, Rodrigo Siqueira.
Fica claro, portanto, que não se justifica o fato de Goiás – que conta com o terceiro maior rebanho bovino do Brasil – apresentar estatísticas tão díspares quando comparadas com o restante do País.
O setor privado já fez a sua parte, investiu em novas e modernas unidades e no seu capital humano e intelectual. Não se pode também relevar o fato de que o Governo do Estado ensaiou algumas medidas de apoio ao setor, mas que se mostraram insuficientes, ainda.
Para que Goiás não dependa de crises enfrentadas pelos demais estados – como a atual -, para aumentar a sua fatia no bolo, e para que possa se tornar uma grande potência neste setor – de forma sustentada – é de fundamental importância que:
(i) distorções na legislação tributária sejam revistas;
(ii) a qualidade da matéria-prima (boi) seja mais consistente, de forma a atingir os padrões internacionais; e
(iii) a conscientização dos pecuaristas seja feita para atender este último item.
Sobre o item (i), acima, com efeito, um dos grandes gargalos enfrentados, hoje, pelos exportadores é a “Guerra Fiscal” entre os Estados, que acaba influenciando negativamente sobre as exportações.
Sabe-se, por exemplo, que o ICMS incidente sobre as exportações incide no Estado em que houve o último beneficiamento do produto, sendo, normalmente, o Estado em que a mercadoria é exportada. Com isso, nos Estados em que, por questões de planejamento fiscal, a alíquota do ICMS é mais baixa para as exportações, acabam se tornando mais atrativos.
Cumpre, ainda, fazer referência ao mecanismo criado pela Lei Kandir no intuito de desonerar a incidência tributária sobre as exportações e que, hoje, corre o risco de desaparecer se não postergada sua vigência em definitivo ou aprovada nova lei. A referida lei desonerava o exportador do pagamento do ICMS, que seria suportado e repassado aos Estados pela União. Tal mecanismo de política tributária é indispensável para o crescimento do setor e deve ser mantido, senão aperfeiçoado.
A correção destes obstáculos poderia contribuir para o enriquecimento do Estado, do setor pecuário e, em última instância, corrigir uma distorção numerológica e real que se verifica. A consecução de um plano de trabalho econômico e social pelo Governo estadual deve ser, a meu ver, uma das prioridades para a sua economia interna e externa.
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Sendo pecuarista em Goiás, vejo mais problemas na parte industrial. Aí é que o preço é achatado.
Os frigoríficos que aqui se instalam praticam um preço não compatível com o mercado brasileiro.
Sempre pagando menor preço que as praças vizinhas, SP, MG, MS, por exemplo. Desestimulam a atividade e isto sem falar na “limpeza” ou “toalete”, onde cada vez a faca tira mais. Não falemos das balanças onde o rendimento/carcaça é lamentável.
Um cuidado, uma atenção, talvez um respeito aquele que é seu fornecedor ou quem sabe um dia reconhecido como parceiro, seria um primeiro passo de um relacionamento sadio e duradouro.
Alberto Andreotti Junior
Meu caro Alberto Júnior,
Obrigado pelos comentários acerca do meu último artigo.
Em primeiro lugar gostaria de esclarecer que não foquei os pecuaristas goianos como responsáveis ou não pelo tema escrito. Tratei da cadeia como um todo, de uma forma bem objetiva e sem críticas.
Minha principal preocupação levantada foi a da guerra fiscal entre os Estados e a necessidade de o Estado de Goiás fazer uma reforma tributária que viabilize melhor o segmento como um todo.
Infelizmente, não trato de questões de preço, não me sinto capaz ou mesmo habilitado para abordar este tema e não tenho conhecimento de causa, portanto, não posso e não devo debater este assunto com o Senhor.
Concordo, porém que o relacionamento entre frigoríficos e pecuaristas deve ser visto dentro de uma visão estratégica de mercado como parceiros, sempre. O Senhor tem toda razão nesse ponto.
Um forte abraço do,
Otávio Hermont Cançado
Creio que o artigo veiculado merece alguns comentários:
1- para se falar em qualidade do boi de Goiás deve-se primeiramente conversar com quem os produz, ou seja, Goiás, a exemplo dos principais Estados produtores tem excelentes produtos convivendo com animais inferiores.
2- a reclamação mais frequente quanto aos bois produzidos no Estado de Goiás, por parte dos frigoríficos, é a proporção de animais inteiros (não castrados) que são ofertados.
3- pois bem, como ainda não se conseguiu fazer com que os frigoríficos classifiquem as carcaças para os pecuaristas, e consequentemente, o critério de compra é PESO, quem tem balança e é do ramo, e além disso, produz boi de pasto (capim) sabe que os animais inteiros atingem o peso de abate mais cedo;
4- quanto às estatísticas apresentadas, deve-se atentar de que essa ciência não é a mais forte dos brasileiros, e a título de exemplo, não se sabe ao certo sequer a capacidade instalada para abate no Estado (o estabelecimento com SIF dispõe de dados mais confiáveis, os demais sequer os tem).
5- São Paulo deve importar muitos animais de outros Estados (Goiás, Rondônia, Para, Mato Grosso do Sul e Mato Grosso) e o peso do Estado no setor, bem como o seu nível de competitividade deve ser ponderado corretamente.
6- de resto, creio que os pecuaristas têm investido e procurado evoluir nos processos de comercialização tanto quanto os demais elos, faltam melhor e maior diálogo e disposição para negociar em bases transparentes e alicerçadas em premissas tecnicamente consistentes.
Marcio Sena
Engenheiro agrônomo – ESALQ/USP
Produtor rural e Presidente da Comissão de Pecuária Corte da FAEG