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Paraná fecha acordo com universidade de Parma para diferenciar sua carne

O Paraná fechou formalmente no dia 25 de novembro um convênio tecnológico com a Universidade de Parma da Itália. Os órgãos que representam o Estado do Paraná neste acordo são a Secretária da Agricultura e o TECPAR (Instituto de Tecnologia do Paraná). Este convênio será uma cooperação na área de carne e leite, integrando todos os elos da cadeia, com o intuito de fornecer um produto diferenciado e de qualidade para nichos de mercado.

A Coordenadora de Projetos do Agronegócio do TECPAR Roberta Mara Zugë, médica veterinária formada pela Universidade de São Paulo, com mestrado e doutorado na área de produção animal, concedeu a seguinte entrevista ao BeefPoint:

BeefPoint: O que levou o Paraná a fechar este acordo com a Universidade de Parma?

Dra Mara Züge: O Paraná não tem como competir em volume de produção do Mato Grosso ou do Mato Grosso do Sul porque é um Estado bastante ocupado, são 399 municípios. O Paraná tem que se voltar para o diferencial de qualidade de seus produtos. Não temos com avançar significativamente em números de cabeças, mas temos como produzir um produto que pode ser vendido com um over, principalmente para o mercado externo ou para um mercado diferenciado dentro do Brasil.

O projeto com Parma surgiu através de uma visita técnica ao Brasil de membros do governo desta região da Itália. Ele será iniciado com a vinda de um técnico de lá. Em cima disto nós vamos balizar padrões de qualidade para criar um diferencial para os nossos produtos, atendendo as necessidades de um potencial cliente, tanto em carne bovina como no leite.

Inicialmente quem está gerenciando este projeto é a Secretaria de Agricultura com o apoio do TECPAR. A Secretaria não pode interferir em negociações, o que ela pretende é dar base e sustentabilidade para que o produto do Paraná seja qualificado e que isso facilite uma negociação posterior, quando este produto tiver um valor agregado ou tiver uma qualidade identificada.

BeefPoint: Existe a idéia de se criar uma marca de carne paranaense?

Dra Mara Züge: Existe a idéia de se criar um selo Paraná, não necessariamente em cima deste projeto. Mas essa idéia já vem sendo fomentada e alimentada para que se tenha um produto com um diferencial. O Paraná pode produzir uma carne com padrões de sangue mais europeu, utilizando fêmeas de raças européias por características de temperatura, e padrões de manejo, voltados a propriedades menores. Já existem alianças mercadológicas que demonstram que isso é viável no Paraná como modelo para produção e comercialização.

A idéia não é fechar apenas com Parma, que é um mercado restrito. A idéia é ter a tecnologia e a padronização que existe em Parma, que fornece para o mercado italiano, principalmente na parte de industrialização de produtos. Trazer para o Paraná a tecnologia de produção de embutidos de Parma, onde você tem uma agregação de valor sobre a carne in natura.

BeefPoint: O Paraná possui outros projetos na área de carne bovina?

Dra Mara Züge: Há quase dois anos O TECPAR fez um convênio com a Espanha, com uma certificadora de carnes de lá, para fazer um processo de certificação de carne, que seria padronizar uma marca ou algum diferencial, onde você feche determinadas características ou requisitos para aquele produto. O Paraná está com iniciativas, mas esse é um processo lento para você implementar, pois é um processo semelhante a uma ISO. Você tem que seguir muitos critérios, ter muitos registros e conhecer muito bem a produção. Estes processos estão em fase de implementação, com a ajuda do Estado, da EMATER, que é o órgão de extensão estadual. Acreditamos que pelo menos dois selos certificados deverão estar saindo no começo do ano que vem.

O TECPAR também pediu o que chamamos de ampliação de escopo para o Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial), que é o nosso acreditador, e o Inmetro está fazendo a avaliação de nossa documentação há bastante tempo. Por ser um produto totalmente diferente do que o Inmetro está acostumado a trabalhar, como parte de avaliação da conformidade de produtos industriais, como brinquedos, fósforos ou preservativos, o Inmetro ainda está em fase de adaptação. Em breve nós poderemos ter a acreditação Inmetro para a certificação do produto carne bovina.

BeefPoint: Como você definiria conformidade no agronegócio?

Dra Mara Züge: Conformidade seria atender a determinados quesitos. Existem normas para determinados produtos onde você já fixou o que seria uma conformidade. Imagine se no aço, por exemplo, não existisse uma norma que determinasse a conformidade, se cada um produzisse aço sem que critérios fossem exigidos. A edificação das obras seria um desastre. O mesmo vale para isqueiros e extintores, por exemplo. Então você tem requisitos fixados em regulamentos ou normas. No agronegócio nós ainda não temos isso estruturado, é uma cadeia que está começando a ter a parte metrológica e a parte de validação agora. Apesar estarmos no setor primário, nós caminhamos atrás da indústria.

Conformidade é o conjunto de padrões. Certificação é um termo genérico. Para produtos usa-se o termo avaliação da conformidade, que é a verificação daqueles requisitos que dão conformidade a um produto. Se você for ao Inmetro você verá que as certificadoras são organismos de avaliação da conformidade.

BeefPoint: Como você relaciona rastreabilidade e certificação?

Dra Mara Züge: A rastreabilidade de bovinos, que tem sido muito discutida, é algo muito comum nas indústrias. Nas indústrias automobilísticas você consegue ter um recall graças à rastreabilidade. Se determinada peça deu problema, você sabe quais foram os carros, de qual linha de produção que eles saíram. A rastreabilidade tem que existir em todos os produtos que tem sistema de gerenciamento de produto, para que sejam feitos os recalls, e identificar onde ocorreu o problema. A rastreabilidade é um pré-requisito numa avaliação da conformidade para uma certificação.

É um conflito de interesses você implementar uma rastreabilidade e depois vir certificar em cima. Se eu tenho algum envolvimento com a organização que eu vou certificar, há um conflito de interesses. Eu não posso certificar, fazer uma avaliação da conformidade, uma auditoria, assinar embaixo que atende aos requisitos se eu tenho um envolvimento no processo, pois de modo geral você vai dizer que está bem feito, não é?

Se você entrar no site do Inmetro ou do IAF, que é o fórum internacional de acreditação, está lá bem descrito, que quem implementa não pode certificar.

Fonte: Equipe BeefPoint

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