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Pecuária 2009: entre a incerteza econômica e a instabilidade do SISBOV

O ano de 2009 começa com forte incerteza e grande desânimo. Até onde os preços cairão? Será que o preço da arroba pode aumentar? Quais serão os reflexos da crise mundial na pecuária? Qual o câmbio ótimo para a nossa carne? São perguntas que nenhum analista está querendo arriscar-se a responder. O SISBOV será extinto pela nova lei que aguarda inclusão na pauta de votação ou as novas propostas de ajuste serão admitidas pela Comunidade Européia? O que pensar para 2009?

Os resultados do mês de outubro de 2008 deram o maior sinal de alerta. Pela primeira vez nos últimos anos, o agronegócio brasileiro decresceu, refletindo mais intensamente o impacto da crise financeira sobre o setor. Segundo o CEPEA-USP, o segmento primário (dentro da porteira) sofreu a maior queda (0,95% no mês), puxado pela acentuada retração da agricultura (-2,2%).

Apesar de também enfrentar dificuldades, o segmento primário da pecuária ainda cresceu 0,44% no mês. O ano de 2008, apesar deste aviso, foi positivo para o Brasil: o comércio internacional do agronegócio totalizou a marca histórica de US$ 71,9 bilhões em exportações, um acréscimo de US$ 13,4 bilhões em relação a 2007, o que corresponde a 23% de crescimento.

O superávit da balança comercial também registrou recorde histórico, alcançando a cifra de US$ 60 bilhões. Este bom desempenho em 2008 foi resultado do aumento da receita com a venda dos principais produtos do agronegócio, destacando-se entre eles, o setor de carnes com um crescimento de 29%.

A pecuária brasileira tem se caracterizado pelos recordes tanto negativos como positivos de forma alternada. Mesmo exportando 14,3% a menos, o faturamento de carne bovina industrializada foi de US$ 5,325 bilhões e o preço médio da carne brasileira foi de US$ 3.848/tonelada o que representa um aumento de 40,5% com relação ao preço de 2007.

O ano de 2009 começa com forte incerteza e grande desânimo. Até onde os preços cairão? Será que o preço da arroba pode aumentar? Quais serão os reflexos da crise mundial na pecuária? Qual o câmbio ótimo para a nossa carne? São perguntas que nenhum analista está querendo arriscar-se a responder. O SISBOV será extinto pela nova lei que aguarda inclusão na pauta de votação ou as novas propostas de ajuste serão admitidas pela Comunidade Européia? O que pensar para 2009?

2009 nasce com um agravamento do cenário internacional, especialmente para o exportador. A inércia do governo, que começou com uma série de medidas efetivas, não voltou ainda do recesso do ano novo. As medidas que precisam ser tomadas agora influenciarão a competitividade com que a pecuária brasileira retomará o crescimento em volume.

Os acontecimentos dos últimos dias apontam para um possível agravamento da crise que poderá resultar em maior desvalorização cambial, com impactos sobre os custos de produção e o crédito para produtores e exportadores. Nesse cenário, é fundamental a adoção de medidas no sentido de ampliar o crédito disponível, desonerar tributos de insumos, fortalecer os sistemas de saúde animal e ampliar a negociação para a abertura de novos mercados para a carne brasileira, abertura condicionada a terminar de implantar o processo de rastreabilidade da carne bovina brasileira.

A crise mundial afetará o mundo inteiro, porém cada país e cada segmento de forma diferente. O ano de 2008 que começou com preocupações decorrentes das novas restrições impostas pela União Européia à importação de carne bovina in natura, mas Rússia, Hong Kong, Irã e Venezuela absorveram parte da carne bovina in natura brasileira, o que minimizou os impactos causados pelo embargo da EU, levando políticos, dirigentes e pecuaristas a desprezar o mercado europeu e suas exigências, aliás exigências prometidas por nós mesmos. Terminamos o ano com a incerteza de nosso maior comprador: a Rússia.

Hoje não podemos nos permitir de deixar a União Européia para nossos concorrentes. Em 2008 deixamos de exportar mais de duzentas mil toneladas de carne in natura, o que representou uma perda de mais de um bilhão de reais, deixando de abater aproximadamente 600.000 bois de 18 arrobas.

Ainda existem incrédulos que falam que o Brasil não precisa de rastreabilidade. Realmente não precisamos do emaranhado SISBOV que conseguimos criar – onde me incluo também – mas precisamos sim, do Sistema Brasileiro de Rastrebilidade Bovina.

Mesmo assumindo que o mercado interno é responsável por 78% do consumo da carne bovina produzida no país, enquanto as exportações representam 22% da produção e mesmo sendo os maiores exportadores mundiais de carne bovina, o setor da produção tem participação reduzida no mercado externo. Dirigentes do setor afirmam que por estes motivos estamos menos expostos à crise financeira internacional o que não é totalmente verdade. O preço da arroba a nível Brasil é fruto de um mix de fatores onde a venda para o exterior é um vetor importante para equacionar o mercado do boi e do bezerro.

Admitindo também que o Brasil mantenha um ritmo de crescimento mais moderado em 2009, em torno de 3%, e que não entremos em recessão, o que favorece o aumento do consumo do produto no mercado interno, o mercado internacional é fundamental para a carne brasileira.

O importante é que o governo acorde com as pilas recarregadas pela praia e os neurônios com níveis de fósforo em verde, pois após as recessões, emergem geralmente períodos de forte crescimento das economias e a pecuária precisa em conjunto fazer o dever de casa. Medidas econômicas e políticas públicas serão necessárias para retomar o crescimento da pecuária no ano 2009.

O SISBOV cometeu erros básicos no seu processo. Precisava ser MODULAR e não o foi no seu lançamento, impondo a obrigatoriedade sem começar com um programa piloto. Deveria ser INTELIGENTE e não o foi, ignorando as estruturas de defesas estaduais que, mesmo sendo precárias, deviam ter sido modernizadas efetivando os convênios com os estados. Gostaríamos que fosse ROBUSTO, aproveitando os sistemas de comunicação e as entidades que tinham expertise e competência. Deveria ser LUCRATIVO para os diferentes elos, porém foi dado aos frigoríficos um instrumento para nivelar por baixo a arroba do boi. Não foi EFICIENTE, pois permitiu a fraude em todos os níveis da cadeia produtiva.

Finalmente deveria ser SIMPLES e não o foi, criando o sistema de rastreabilidade mais complicado e inoperante da pecuária mundial. Simplicidade não significa inconsistência técnica, significa capacidade de adaptação e aproveitamento daquilo que o Brasil conseguiu talvez por linhas tortas, mais com a intuição e a sabedoria do homem do campo, produzir carne a pasto. As novas inovações tecnológicas devem partir pela compreensão dos nossos sistemas de produção e pelas limitações estruturais que o Brasil enfrenta hoje como uma da suas principais fraquezas.

O Brasil adotou critérios rigorosos para a certificação das propriedades e esta cumprindo, o Serviço de Defesa Animal do MAPA está sendo rigoroso, mas o sistema é inoperante porque ele não tem agilidade de resposta em tempo real com a atual estrutura brasileira. Não basta treinar nossos funcionários e sim enxergar com clareza a realidade do nosso campo, suas deficiências e suas vantagens competitivas. Precisamos nos adaptar e promover as mudanças necessárias, a partir de nossos currais e do lado de fora dos gabinetes. Queremos aderir à modernidade, mas não queremos ser reféns da burocracia irracional.

0 Comments

  1. Joao Batista Haro de Almeida disse:

    Parabéns, ao autor, pela clareza, lucidez e abordagens de questões desta relevante magntude. Que Deus ilumine os homens que nos governam para entederem de vez estes assuntos relacionados a pecuaria e os solucionarem.

  2. Jorge L.M.C. Barbosa disse:

    A situação foi muito bem delineada pelo Sr. Pineda. O quadro atual do Sisbov é um emanharado de informações, lentas em sua recuperação e complicada para o homem do campo.

    O Sr. Pineda teria algum indicativo ou indicativos para aplicação de correções no Sisbov?

  3. walter meira cardoso junior disse:

    Parabenizo o Sr Nelson pela clareza com que tratou este assunto. É disso que a pecuaria precisa, de pessoas preocupadas com o rumo que as coisa estao tomando.

  4. Nelson Pineda disse:

    Prezado Sr. João,

    Muito obrigado pelas suas palavras. Os governantes tem chamado nossos dirigentes, eles também precisariam de coodernação para colocar nossos governates na trilha do bom senso.

    É lamatavel mas nossa cadeia produtiva esta cada dia mais longe de chegar a um acordo.

    Atenciosamente,
    Nelson Pineda

  5. Pablo Riet Correa disse:

    Excelente comentário de Nelson Pineda. Resumiu tudo em poucas palavras e expôs a realidade dos produtores brasileiros em relação ao SISBOV.

  6. Nelson Pineda disse:

    Prezado Sr. Jorge

    Muito obrigado pela suas palavras.

    Recentemente assisti a um congresso internacional onde varios representantes do Cone Sul apresetaram palestras sobre os sistemas de rastreabilidade. Estou esperando a respota da UE ao ultimo pedido de modificação do SISBOV, para tentar escrever alguma sugestão plausivel, dentro de um SISBOV que é hoje uma colcha de retalhos.

    Mas o maior problema que enfrentamos é o grau de complicações que conseguimos criar para nos mesmos.

    Um cordial abraço,
    Nelson Pineda

  7. Nelson Pineda disse:

    Preado Sr. Pablo,

    Muio obrigado, tomara no futuro encontremos o rumo certo.

    Atenciosamente,
    Nelson Pineda

  8. Nelson Pineda disse:

    Prezado Sr Walter,

    Espero no futuro dar uma contribuição maior.

    Atenciosamente,
    Nelson Pineda

  9. Nelson Pineda disse:

    Prezado Sr. Roberto,

    O senhor tem razão de que minha abordagem foi precisa e crítica sem apresentar soluções. Em breve este artigo terá continuação, o próximo será a comparação do SISBOV com sistemas implantados por outros países do Cone Sul.

    O senhor comete um injusto equívoco ao dizer que somente assisti e perdi oportunidades de mudar o rumo do SISBOV.

    Participei sim e intensamente, não desde a época do Orestinho, mas desde o dia em que foi assinado o SISBOV, que aliás na calada da noite passou de um proposta de adesão voluntária para um sistema obrigatório.

    Antes de ser assinado o SISBOV, apresentemos ao Dr. Pratini junto com o Dr. José Olavo uma proposta na qual a ABCZ passaria a ser o gerenciador do Banco de Dados, e colocamos à disposição a experiência da ABCZ para colaborar com o ministério.

    Formei parte de uma comissão que foi estudar o sistema de rastreabilidade na França, voltei e apresentei várias sugestões que na nossa opinião eram fundamentais para implantar o SISBOV, entre elas susbtituir o DIA por codificação eletrônica que seria enviada ao frigorífico via internet antes de sair o transporte da propriedade, fazer a leitura dos bricos não na propriedade e sim na calha de sangria dentro do frigorífico, etc.

    No ano 2003 debati publicamente com Dr. Luiz Carlos de Oliveira, então Secretário Nacional da Defesa Animal, várias sugestões.

    O Comitê Técnico Consultivo do SISBOV, único órgão onde os criadores são ouvidos sobre esta tema, foi iniciativa da ABCZ. Dentro deste comitê fui o representante da ABCZ durante vários anos e consta em ata os princípios que coloquei no meu artigo, mas todo comitê consultivo tem com finalidade sugerir políticas públicas e sem poder executivo.

    Ao longo dos últimos anos tenho escrito vários artigos com sugestões precisas, tomando posição e defendendo a classe de forma consciente. Na Câmara Setorial da Carne fui incisivo sobre as deficiências do SISBOV. Muitas vezes meus posicionamentos na minha curta passagem pela ABCZ, me causaram atritos e inimizades, mas tenho a tranqüilidade de quem tomou decisões pensando no bem da nossa classe.

    Lamento que depois de ter sacrificado minha família e meus afazeres, integrantes da própria classe emitam de forma gratuita e leviana uma opinião tão distante da realidade.

    Respeitosamente,

    Nelson Pineda

  10. Ruy Armelin disse:

    Caro Nelson,

    Vejo que seu artigo sempre desperta interesse e principalmente reflexão; como ninguém comentou sobre o acréscimo de valor recebido pelos frigoríficos apesar da queda de volume exportado, permito-me lembrar que os pecuaristas não usufruiram dessa performance. E como você. começa sua missiva falando sobre 2009, estamos de novo vendo manobras para derrubar o preço da arroba. Firmeza.

  11. Nelson Pineda disse:

    Prezado Sr Cleir,

    Me desculpe o atraso para responder-lhe. Acabei de publicar a segunda parte deste tema onde comparo o que tem consegido outros paises como o Paraguai.

    Tomara o Conselho Consultivo do SISBOV, pare para olhar o que esta acontecendo envolta de nos para encontar saida para trabalhar com milhares de cabeças.

    Atenciosamente,
    Nelson Pineda