Enquanto alguns Estados do país, sobretudo o Paraná, aceleram os trabalhos para suspender a imunização de seus rebanhos contra febre aftosa e se tornar áreas livres da doença sem vacinação, os laboratórios fabricantes de vacinas reforçam o lobby na tentativa de mostrar a importância do medicamento para evitar o surgimento de novos casos da doença.
Enquanto alguns Estados do país, sobretudo o Paraná, aceleram os trabalhos para suspender a imunização de seus rebanhos contra febre aftosa e se tornar áreas livres da doença sem vacinação, os laboratórios fabricantes de vacinas reforçam o lobby na tentativa de mostrar a importância do medicamento para evitar o surgimento de novos casos da doença.
“A decisão de suspender a vacinação e a criação de novas áreas livres como Santa Catarina envolvem os governos federal e estaduais e a OIE [Organização Mundial de Saúde Animal]. Obter um novo status é a tendência do processo. É possível de se conseguir, mas requer uma vigilância sanitária muito mais rigorosa”, diz Emílio Salani, presidente do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Saúde Animal (Sindan).
Em jogo está um mercado que deve movimentar este ano cerca de R$ 440 milhões. O valor referente à venda de vacinas corresponde a aproximadamente 15% de todo o faturamento da indústria veterinária no Brasil. Só a saída do Paraná desse mercado representaria uma queda de R$ 20 milhões na arrecadação.
O Paraná já pediu o novo status de livre de febre aftosa sem vacinação ao Ministério da Agricultura e deverá ser seguido por São Paulo e Minas Gerais, que também se esforçam para erradicar a doença.
Rondônia, com rebanho superior a 11 milhões de cabeças, é outro Estado que planeja pedir em 2011 o status de área livre de aftosa sem vacinação, colocando em xeque outros R$ 25 milhões. “Rondônia está muito avançado nesse processo e deve ser o próximo Estado a fazer o pedido ao ministério. Eles [Rondônia] têm hoje a melhor defesa sanitária do país”, diz Sebastião Costa Guedes, presidente do Conselho Nacional de Pecuária de Corte do Brasil (CNPC) e do Grupo Interamericano para Erradicação da Febre Aftosa (Giefa).
“Os Estados passam, de fato, por um momento de calmaria em relação à febre aftosa. O que não sabemos é se isso ocorre porque os rebanhos estão protegidos ou se porque não existe atividade viral nessas regiões”, disse ao Valor o uruguaio Hugo Zanocchi, presidente do Inova Saúde Animal, controlado pela Eurofarma e a Hertape Calier e que investiu R$ 80 milhões em uma fábrica de vacinas contra a doença.
O executivo do Inova afirma que em meados da década de 90, o Uruguai decidiu por “motivos políticos” suspender a vacinação contra aftosa e se tornar uma região livre da doença sem vacinação. O objetivo foi alcançado e durante cinco anos o Uruguai gozou dos benefícios de seu novo status.
“Quando o rebanho começou a ter sua renovação natural, os animais que nasceram estavam sem qualquer tipo de imunidade. O resultado foi que, 17 mil casos de febre aftosa foram identificados em todo o Uruguai em 2001, quando o país teve seu último surto”, conta Zanocchi. “Um rebanho sem imunidade é um rebanho em risco. A pergunta que deve ser feita é: vale a pena correr esse risco?”, questiona.
No mesmo caminho do Inova, a Ourofino investiu R$ 30 milhões na planta de Cravinhos (SP) e aguarda apenas a licença de comercialização do produto. Em nota, o diretor de biológicos da empresa, Fausto Terra, afirma acreditar que “vacinar o gado contra a febre aftosa é uma garantia para o pecuarista não correr o risco de grandes perdas econômicas. Assim como ainda vacinamos as nossas crianças contra a poliomielite, apesar da erradicação da doença, é importante evitar um possível prejuízo com o gado doente”.
Na lista dos riscos pode ser incluída a extensa fronteira do país com seus vizinhos sul-americanos. Saindo do Acre, passando por Rondônia, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul até chegar ao Paraná, são quatro países – Peru, Bolívia, Paraguai e Argentina – que fazem fronteira com o Brasil, o que dificulta a fiscalização do trânsito de animais.
A situação uruguaia daquela época, mencionada por Zanocchi, é parecida com a atual no Brasil. Às vésperas de uma eleição que envolve além da presidência da República, o Brasil substitui este ano governadores, senadores e deputados. Vale lembrar que tanto o secretário de Defesa Agropecuária – Inácio Kroetz -, quanto o próprio ministro da Agricultura – Reinhold Stephanes -, são do Estado que pleiteia o status de livre de aftosa sem vacinação, o Paraná.
Apesar de o Paraná, junto com o Mato Grosso do Sul, ter identificado casos febre aftosa no Brasil, em 2005, o governo do Estado defende que existem condições para que a vacinação seja suspensa e o status sanitário elevado para área livre sem vacinação. É por esse motivo que no início do segundo semestre deste ano o Ministério da Agricultura realizará auditoria no Estado para avaliar se as condições são ou não favoráveis.
“A situação é favorável para nós. Há uma predisposição política para dar sequência ao processo e todas as sorologias feitas para detectar a presença do vírus no ambiente deram negativas. Tecnicamente, o vírus não está circulando”, disse Marco Antônio Teixeira Pinto, chefe da divisão de fiscalização de sanidade animal da Secretaria Estadual de Agricultura e Abastecimento do Paraná. Segundo Teixeira Pinto, os candidatos ao governo do Paraná se mostraram favoráveis à ideia e se comprometeram a não interromper o processo para o fim da vacinação.
Ele defende que nenhum foco da doença com isolamento sanitário surgiu nos últimos 17 anos. O caso de 2005 foi considerado “vínculo epidemiológico”, ou seja, quando não ocorrem o isolamento da área e o sacrifício de animais dentro de um raio de abrangência.
Segundo Teixeira Pinto, o Estado investe por ano R$ 30 milhões na defesa agropecuária, valor que precisará ser reajustado caso o Paraná seja considerado área livre sem vacinação. “Temos que substituir a vacinação por um sistema de defesa maior. Já reequipamos nosso sistema, vamos aumentar a estrutura de vigilância para conseguir atender tudo o que o Ministério nos cobrará em sua auditoria”, afirma Teixeira Pinto.
O Paraná já está preparado para realizar a primeira etapa da campanha de vacinação, em maio, que pode ser a última. A expectativa é que a segunda etapa, de novembro, já não ocorra mais. Em defesa da manutenção da vacinação, uma fonte do mercado argumenta: “Suspender a vacinação e conseguir o status é fácil. Difícil é se manter nessa condição”.
A matéria é de Alexandre Inacio, publicada no Valor Econômico, resumida e adaptada pela Equipe BeefPoint.
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Tema polêmico, com viés técnico e político. A verdade é que a pecuária almeja erradicar a aftosa e suspender as vacinações. O status livre sem vacinação abre novas possibilidades comerciais / econômicas e envolve gerenciamento de riscos. Mas qual a melhor hora para mudar a estratágia envolve além dos aspetos técnicos uma decisão política. O lobby dos fabricantes de vacinas naturalmente tenta adiar a mudança, não poderia ser diferente. Espero que o governo do Paraná e os representantes dos pecuaristas tenha ponderado corretamente a questão.
Att,
Se os grandes laboratórios ficarem só no lobby, não é nada. Não esqueçam o que aconteceu com o Rio Grande do Sul a alguns anos atrás quando tentou passar ao status de livre de febre aftosa sem vacinação. Quem se lembra sabe do que estou falando!!