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Problemas relacionados com a coloração da carne

Carla M.S. Pedreira1

No animal, são encontrados dois pigmentos de extrema importância: a hemoglobina (pigmento do sangue) e a mioglobina (pigmento dos músculos).

A hemoglobina é responsável pelo transporte de O2 pelo sangue até a superfície dos músculos, enquanto que a mioglobina é responsável pelo transporte de O2 pelo músculo (constitui 80-90% dos músculos).

A mioglobina é formada por uma porção protéica (globina) e uma porção não-protéica (grupo ou anel heme). Neste grupo heme, o íon Fe está presente e apresenta um importante papel nas mudanças de coloração da carne. A quantidade de mioglobina varia com a espécie, idade, sexo, músculo e a atividade física.

mioglobina

Quando o íon Fe é oxidado (estado ferroso), ele não consegue mais reagir com outras moléculas, incluindo o O2. Quando o íon Fe é reduzido (estado férrico), ele pode reagir com outras moléculas, incluindo o O2 e a H2O. Assim, para se ter carne com coloração desejável, a mioglobina deve se apresentar na forma reduzida (estado férrico).

Na ausência de O2, a carne vai apresentar uma coloração púrpura denominada de mioglobina reduzida. Na presença de pequena quantidade de O2 ocorre uma oxidação do pigmento, resultando numa coloração marrom denominada de metamioglobina. Quando a quantidade de O2 é normal e suficiente, vai ocorrer oxigenação (redução) do íon Fe resultando em uma coloração vermelho brilhante, denominada de oximioglobina.

Em condições de alta temperatura e pH, terá também um aumento da atividade enzimática fazendo com que o O2 seja reduzido, resultando em coloração púrpura (mioglobina reduzida).

Fórmula

Alguns problemas de coloração da carne (carne pálida e carne escura) são o resultado de problemas ocorridos com relação ao pH final da carne, quando da conversão do músculo em carne ou problemas durante o desenvolvimento do rigor mortis. Entre esse problemas podemos citar a carne PSE e a carne DFD. Um outro tipo de problema de coloração encontrado na carne, é a carne com efeito arco-íris ou iridescência.

Carne PSE (pale, soft and exsudative muscle)

Carne PSE (pale, soft and exsudative) acontece quando os animais (de maior ocorrência em suínos) são submetidos a um estresse intenso, ocorrendo uma rápida redução do pH da carne (devido ao rápido consumo de glicogênio e rápida acumulação de ácido lático) e associado a problemas de dissipação de calor, resultando em carne pálida (devido a desnaturação das proteínas musculares), extremamente mole e exsudativa (baixa capacidade de retenção de água – CRA, e hidrólise do endomísio).

O gene halotano, responsável pelo aparecimento de PSE em suínos, foi muito estudo nesses últimos 30 anos. Este gene está associado com um aumento da susceptibilidade a morte relacionado ao estresse, efeito positivo sobre as características da carcaça (carne magra) e efeito negativo sobre efeito negativo sobre o desempenho reprodutivo e a qualidade da carne (PSE) de suínos.

Para a detecção desse gene é realizado o teste HAL-1843 DNA, que é um teste de DNA baseado no ponto de mutação no gene que causa o efeito, identificando com precisão os 3 genótipos do halotano (NN-negativo, Nn-carregador, nn-positivo).

Os fatores que desencadeiam esse problema são: a) predisposição genética (PSS – síndrome do estresse suíno); b) elevado metabolismo ou susceptibilidade ao estresse; c) estresse pré-abate (temperatura, som, umidade, pressão atmosférica, nutrição inadequada, choque, medo, luz fadiga, anoxia e outros); d) combinações de todos esses fatores.

Como uma das características desse gene é a produção de carcaças com menos gordura, estudos atuais relacionam o uso controlado desses animais visando produzir carne mais magra e carcaças com maiores rendimentos (vantagens para o consumidor que procura carne mais magra e para o produtor, que recebe mais devido ao melhor rendimento das carcaças).

Carne PSE apresenta um significado econômico importante, pois esta carne não apresenta aceitação pelo consumidor (devido à sua palidez, principalmente do lombo e do pernil e perdas por exsudação na carne fresca) e quando processada vai resultar em problemas de processamento e rendimento (aumento das perdas na cura, aumento das perdas por cozimento, aumento da proporção de gelatina em produtos enlatados) e aumento da mortalidade no transporte desses animais susceptíveis ao estresse.

Carne DFD (dry, firm and dark muscle)

Carne DFD (dry, firm and dark), também conhecida como dark cutting (carne escura) ocorre em animais (de maior ocorrência em bovinos e ovinos) submetidos a um estresse intenso, ocasionando uma rápida utilização das reservas de glicogênio o que reduz a formação de ácido lático e fazendo o pH final ficar elevado (pH( 6,0), resultando em uma carne seca, firme e escura (alta capacidade de retenção de água – CRA).

Como a carne com problema de PSE, a carne DFD também apresenta fatores negativos como a baixa aceitação pelo consumidor (baixa atratividade devido a cor e a textura), a falta de sabor e aroma (pior qualidade degustativa), redução da vida de prateleira, menor capacidade de difusão do sal durante a cura.

Apesar dos aspectos negativos a carne DFD apresenta pontos positivos como a maior capacidade de retenção de água, aumento da maciez e menores perda no cozimento.

Pigmentação Multicolorida (Iridescência)

A pigmentação multicolorida (iridescência ou efeito arco-íris) é conhecida como um efeito da decomposição da luz, sendo visualizado como um brilho colorido. Este fenômeno é causado pela refração da luz, ou seja, a luz que incide sobre a carne é refletida de forma subdividida em diversas cores, dando a impressão de um arco-íris.

Nas carnes frescas, produtos industrializados e carnes assadas este fenômeno pode ocorrer e depende da superfície da carne, do tipo de luz, da intensidade da luz, do grau de hidratação da carne, do ângulo de incidência do raio luminoso e do ângulo de visão do observador. Este fenômeno também ocorre quando, a superfície cortada é extremamente lisa, quando a carne é cortada de forma transversal às fibras, em carnes de carcaças estimuladas eletricamente com baixa voltagem (35 a 60 V) e carne de animais estressados (PSE).

A coloração mais comum provoca pelo fenômeno da iridescência é a carne de coloração esverdeada, podendo também aparecer a coloração vermelho-alaranjado, tons azulados e rosa, e amarelada.

Sendo a iridescência um fenômeno físico de distorção de cor, a qualidade da carne não é afetada. Entretanto, é evidenciada a rejeição dessa carne pelo o consumidor devido a essa mudança na coloração. Essa repulsa do consumidor a esta carne, se dá pelo motivo do consumidor associar sua coloração esverdeada com a deterioração bacteriana.

Tipos de Embalagem

As embalagens onde as carnes são acondicionadas também influenciam no aspecto da carne. Dois exemplos de embalagens são as de atmosfera modificada (com mistura de gases O2 e CO2) e a embalagem à vácuo.

Embalagem de atmosfera modificada

A embalagem de atmosfera modificada é uma embalagem com mistura de gases (O2 e CO2) para manter a qualidade do produto por mais tempo. Este tipo de embalagem faz com que a aparência da carne fique mais atraente, devido a oxigenação (redução) do íon Fe resultando em uma coloração vermelho brilhante denominada de oximioglobina, como conseqüência da presença de O2. O CO2 apresenta ação bacteriostática, prolongando a durabilidade do produto (em temperaturas de 0-2 oC, faz o produto durar até 14 dias).

Embalagem á vácuo

Na embalagem á vácuo há a eliminação de O2, impedindo o crescimento de microrganismos aeróbicos da carne. Neste caso ocorre a redução do íon Fe, onde todo o O2 é utilizado pela atividade enzimática, sobrando apenas H2O para o íon Fe reagir e resultando em uma coloração púrpura denominada de mioglobina reduzida. A durabilidade desse método de embalagem é de até 90 dias.

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1 Aluna de Pós-graduação (Doutorado) do Departamento de Produção Animal – USP-ESALQ – Piracicaba – SP. Bolsista FAPESP

1 Comment

  1. glades ribeiro disse:

    gostaria de saber o que é partes rosada na carne,por dentro nao por fora é alguma coisa contagiosa?