Os volumes recorde de produção de carne bovina, suína e avícola vêm corroendo o lucro das maiores processadoras de carnes dos Estados Unidos.
Empresas como Tyson Foods Inc., Pilgrim’s Pride Corp. e Sanderson Farms Inc. se deparam com quedas nos preços e incertezas na demanda, enquanto a alta na produção de carnes e as tarifas impostas por relevantes países importadores ameaçam impactar o que de outra forma seria um período próspero para a indústria americana de carnes.
“Uma oferta cada vez maior de carne suína e bovina a preços relativamente baixos está concorrendo com o frango, o que chega combinado à incerteza sobre as tarifas e políticas comerciais”, disse Tom Hayes, executivo-chefe da Tyson, em conferência telefônica com investidores na segunda-feira.
A Tyson, maior fornecedora de carne dos EUA, anunciou aumento de 21% nos lucros trimestrais na segunda-feira, mas a receita trimestral já foi impactada pelas tarifas. Além disso, na semana anterior, a empresa havia reduzido sua previsão de lucro para o ano.
Na semana passada, a Pilgrim’s Pride, segunda maior processadora de frango nos EUA e controlada pela brasileira JBS, divulgou declínio de 54% no lucro do segundo trimestre.
Analistas consultados pela Thomson Reuters preveem que o lucro trimestral da Sanderson vai cair quase 75% em relação ao mesmo período do ano anterior. A empresa divulga o balanço ainda neste mês.
À medida que cresce a oferta de carne, os investidores perdem o interesse por ações de empresas do ramo. Os papéis da Tyson caíram 27% desde janeiro, sendo 6% nesta semana depois da revisão para baixo da previsão de lucro comunicada em 30 de julho. As ações da Pilgrim’s Pride caíram 41% e as da Sanderson Farms, 25%. Já a Hormel Foods Corp., que tem poucas operações processamento de carnes, viu as ações subirem 2%.
O excesso de oferta de carne — que afeta desde as granjas de perus em Minnesota e de galinhas no sul dos EUA até as processadoras de carne suína no Iowa — é um cenário que vem sendo construído há anos.
Grãos baratos encorajaram os criadores e as empresas de carne nos EUA a se expandir para atender a demanda de consumidores locais e de outros países, como México e China.
Os criadores de bovinos e de perus correram para voltar a recompor os rebanhos e plantéis depois de doenças e da seca terem dizimado parte de suas populações no início da década. Os processadores de carne de suínos e aves, por sua vez, construíram algumas das maiores e mais eficientes unidades de processamento já feitas.
Agora, a carne chega ao mercado em toneladas e mais toneladas. Pressiona os preços para baixo e acirra a concorrência entre a carne vermelha e a de aves. Os processadores de carne vão produzir um recorde de 102,7 bilhões de libras-peso (46,58 milhões de toneladas) neste ano, segundo estimativas do Departamento de Agricultura dos EUA (USDA)
Paralelamente, as tarifas de outros países sobre a carne produzida nos EUA ameaçam minar a demanda. Os impostos adotados por México e China — dois grandes mercados para a carne suína dos EUA — obrigaram as empresas de carne a reduzir preços para que os produtos não se acumulem nos estoques.
“Precisamos ter esses mercados manifestamente abertos para nós”, diz Hayes, da Tyson. Ele estimou que os declínios nos preços da carne suína e bovina — caso não haja recuperação em relação aos níveis atuais — vão cortar cerca de US$ 1 bilhão da receita da Tyson neste ano, em grande medida como resultado das tarifas impostas pelo México.
O preço baixo do boi vivo e os fortes lucros do segmento de refeições prontas beneficiaram a Tyson. Hayes disse não ter como prever quando o quadro do comércio exterior vai melhorar.
“Simplesmente, não sabemos”, disse Hayes.
Os preços das carnes estão em queda para os varejistas, restaurantes e distribuidores de alimentos. A cotação da carne suína no atacado caiu 10% nos últimos 12 meses, de acordo com dados do USDA publicados em julho. A da carne bovina no atacado teve queda de 9%. Já a do frango esteve acima dos níveis de 2017 durante a maior parte deste ano, mas esses ganhos praticamente desapareceram em julho, segundo o USDA. Em alguns casos, isso permitiu que os consumidores pagassem menos pelos hambúrgueres e salsichas em seus churrascos de verão.
Nas gôndolas de carnes nos supermercados, os preços relativamente baixos vêm ajudando a carne bovina moída e as salsichas a ganhar mais espaço em relação ao peito de frango, disse o executivo-chefe da Pilgrim’s Pride, Bill Lovette, em teleconferência na semana passada. “Acreditamos que os varejistas em geral estavam exibindo menos frango em favor da carne bovina e suína”, disse Lovette.
Os varejistas podem começar a voltar a exibir a carne de frango da forma normal talvez já “a partir do fim do verão” americano, avaliou o executivo.
O diretor de finanças da processadora de carne de aves Sanderson Farms, Mike Cockrell, estimou que os preços do peito de frango do tipo “jumbo” sem osso e sem pele caíram cerca de 30% desde o pico em 2017, em parte porque os restaurantes têm promovido a carne suína e bovina, cujos preços também estão mais baixos.
“Preferimos competir com carnes de preços mais altos”, disse Cockrell.
O setor de carnes dos EUA não é rápido em se adaptar, já que consiste de bilhões de galinhas e dezenas de milhões de suínos e bois. Criadores de gado confinado estão com prejuízo, de forma que alguns já vêm encolhendo os rebanhos e deverão mandar mais animais para o abate e menos para as fazendas de confinamento ao longo do resto do ano, segundo a analista Heather Jones, do Vertical Group.
Se os preços do frango não se recuperarem até 2019, os criadores poderão começar a quebrar os ovos em vez de colocá-los nas chocadeiras industriais, o que é mais barato do que abater as matrizes. “O ciclo de queda não vais ser rápido nem indolor”, escreveu Jones em nota para investidores.
Fonte: Valor Econômico.