Era mês de maio quando perguntei a meu amigo, agricultor em Lucas do Rio Verde: “aliviado com o fim da safra?” (referia-me à safra de soja). Havia sido um ano de excelente produção, tudo sinalizava uma excelente safra. A reposta dele não poderia ter sido mais instrutiva: “tive sucesso apenas na primeira parte da safra, a colheita. A segunda parte, a comercialização, começará apenas agora. Dependendo dela, a safra poderá tanto confirmar-se como excelente como ser um completo fracasso.”
Segundo dados do Cepea (www.cepea.esalq.usp.br) entre agosto de 2003 e agosto de 2004, o preço da a soja variou entre R$ 55,30/sc e R$ 36,59/sc (33,83%), o do açúcar entre R$ 30,30/sc e 17,79/sc (41,28%), o do café entre R$ 255,81/sc e R$ 160,96/sc (37,01%). A variação do leite foi de 26,09% e do boi gordo de 6,36%. Analisando esses números há uma verdade inegável no que meu amigo dizia: “não adianta plantar e colher bem, é preciso comercializar bem. Uma safra bem colhida pode ser um desastre se mal comercializada.”
Como comercializar bem se não tenho o produto disponível nos momentos de melhor preço? Como segurar estoque quando meu caixa encontra-se pressionado? Enfim, como comercializar bem a safra?
Uma das alternativas disponíveis no mercado é fazer hedge (do inglês: resguardar-se, proteger-se). Operações de hedge podem ser feitas em diversas bolsas de mercadorias (commodities), incluindo a Bolsa de Mercadorias e Futuros de São Paulo (BM&F). Os hedges nas bolsas podem ser feitos através de operações de futuros ou de opções (opção de compra, chamada de call ou opção de venda, chamada de put).
Noto em muitos empresários rurais desconhecimento desses mecanismos e até mesmo um certo preconceito contra eles. Minha intenção neste artigo não é a de ensinar operações de hedge, apenas destacar para o leitor a importância de conhecer estes mecanismos. Para isso é importante ter em mente 2 fundamentos:
1. Há basicamente 3 tipos de aplicadores em bolsas: o especulador – que procura ganhar dinheiro especulando com os movimentos do mercado; o arbitrador – que procura ganhar dinheiro “arbitrando” o preço do mesmo ativo em dois mercados diferentes e finalmente aquele que busca proteção, normalmente alguém que opera o ativo no mercado físico. Este último, pode ser tanto um produtor de soja que precisa vender no maior preço possível, como um confinador de bovinos, que precisa comprar farelo de soja no menor preço possível.
2. O preço do ativo nas bolsas guarda sempre uma relação com o preço do ativo à vista.
Desta forma, este produtor de soja do nosso exemplo, poderá vender contratos futuros de soja, ainda que não tenha o produto disponível, quando o preço estiver em alta, garantindo assim uma proteção contra uma eventual queda nas cotações quando efetivamente for vender a safra colhida. Do outro lado, o confinador poderá comprar contratos futuros de farelo de soja quando o preço estiver em baixa, garantindo desta forma uma proteção contra a alta do produto quando efetivamente tiver que comprá-lo no mercado.
Depois de décadas ouvindo que a agricultura era uma atividade de futuro no Brasil, este futuro parece ter chegado. É bom lembrar no entanto, que o empresário rural é o elo mais fraco da cadeia do agronegócio. Desta forma, conhecer o mercado em que atua e os mecanismos de comercialização e proteção de preços, são tão essenciais hoje em dia quanto conhecer variedades e técnicas de produção. Se você, empresário rural, ainda não despertou para isso, faça-o sem demora.