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Qual o valor do esterco de confinamento de bovinos?

Por Rodrigo Paniago1

Muito se fala sobre a desvalorização da arroba e, por isso, do momento de baixa rentabilidade da pecuária de corte brasileira. Um grande vilão desta história é o crescente aumento dos custos de produção. Porém, poucos são os produtores que enxergam que este aumento de custo não é passageiro e, ao contrário da grande maioria que fica a espera de uma alta da arroba, mobilizam-se em buscar alternativas, para não só saírem da crise, como também se assegurar, de forma estratégica, da chegada de novos episódios de desequilíbrio econômico na pecuária de corte.

Hoje a intensificação da produção é a saída tecnológica mais utilizada pelos pecuaristas profissionais. Nesta circunstância, o confinamento de terminação quase sempre é “convocado” para garantir maior lotação das pastagens ao longo do ano.

Um resíduo do confinamento é a produção de esterco, que deve ser encarado na verdade como um subproduto desta atividade, pois o mesmo se apresenta como fonte fertilizante para o uso na própria propriedade, em áreas de produção de grãos ou de volumosos.

Entretanto, é raro encontrar uma unidade de confinamento que utiliza o esterco de forma eficiente. O mau uso deste se dá por falta de equipamentos adequados, tanto de coleta como de distribuição, e, ainda, por falta de adequação do terreno do piquete de confinamento para coleta, perdas de nutrientes pela demora na retirada do esterco, má distribuição, entre outras. Mas, principalmente, pelo desconhecimento de suas qualidades como fertilizante, pelos gestores do confinamento, o que gera pouco interesse no seu uso.

As vantagens do esterco de bovinos como fertilizantes são (Kiehl, 1985; Malavolta, 1989; Moreira & Siqueira, 2002; Pauletti & Motta, 2004 e Rosa, 2005):

– melhora da estrutura do solo (tanto para solos arenosos como para solos argilosos);

– diminuição dos processos de compactação do solo;

– melhora da aeração e da drenagem do solo;

– aumento da capacidade de armazenagem de água no solo;

– diminuição dos efeitos da erosão;

– fonte de macros e micronutrientes;

– elevação da CTC do solo;

– melhora da condição de crescimento de raízes;

– contribuição para o aumento de pH em solos ácidos;

– aumento do número de microorganismos úteis no solo, essenciais no combate de pragas;

– traz benefício por mais tempo, pois fornece lentamente nutrientes, prolongando os efeitos da adubação;

– evita as perdas de minerais por lixiviação.

Muitas destas qualidades não podem ser vistas a olho nu pelo produtor. Contudo, se o valorássemos apenas como fertilizante isso seria mais claro. Segundo revisão de Pauletti & Motta (2004), um bovino adulto excreta em média 23,5 kg de fezes e 9,1 kg de urina por dia. Ainda segundo a revisão dos mesmos autores, o valor em nutrientes de esterco bovino fresco seria: 1,5 % de nitrogênio, 1,4 % de P2O5, 1,5 % de K2O e 15 % de matéria seca. Já para micronutrientes: 7,6 mg.kg-1 de zinco, 21 mg.kg-1 de cobre, 105 mg.kg-1 de ferro e 2,3 mg.kg -1 de manganês.

Entretanto, a composição do estrume varia muito, e isto ocorre conforme o estado de decomposição do mesmo, manuseio, estocagem, espécie e idade do animal e do manejo e da alimentação que estes animais recebem. Animais alimentados com rações com altos níveis de concentrados produzem estercos mais ricos em nutrientes do que os animais criados a pasto. Os animais adultos eliminam cerca de 80% dos nutrientes que ingerem, enquanto que os animais jovens 50% deste total, produzindo, portanto, um esterco mais pobre em nutrientes (Kiehl, 1985).

Vejamos nos quadros abaixo (01, 02 e 03) a valorização do esterco de confinamento, através da comparação com o custo de nutrientes presentes em fertilizantes químicos:

Quadro 01. Análise química de uma amostra de esterco de bovinos:


Quadro 02. Valoração dos nutrientes presentes no esterco da amostra citada no quadro 01:


Quadro 03. Valor do esterco colhido pelo número de cabeças confinadas:


No quadro 03 estão os valores que podem ser economizados com fertilizantes químicos através do uso da adubação com o esterco do confinamento. Segundo Malavolta (1989), embora a fertilização com esterco de bovino propicie grandes aumentos de produção, este não pode ser usado como a única fonte de fertilizante, pois não é devidamente equilibrado quanto aos teores de nutrientes. Assim sendo, ainda há que se equilibrar a adubação com adubos minerais.

Devemos salientar que o valor em reais do esterco avaliado pode ser maior, caso seja utilizado a valorização também para micronutrientes.

Concluindo, somente pela qualidade como fertilizante o uso do esterco de confinamento já se justifica, pois pode diminuir consideravelmente os custos de produção de uma propriedade de pecuária intensiva.

Literatura citada

Kiehl, E. J. Fertilizantes Orgânicos. Editora Agronômica Ceres, 1985.

Malavolta, E. ABC da Adubação. Editora Ceres – 5a. Edição, 1989.

Moreira, F. M. S. & Siqueira, J. O. Microbiologia e Bioquímica do Solo. Editora UFLA, 2002.
Pauletti, V. & Motta, A. C. V. Fontes Alternativas de Nutrientes para Adubação de Pastagens. XXI Simpósio sobre Manejo da Pastagem. Fundação de Estudos Agrários “Luiz de Queiroz”, 2004.

Rosa, B.; Freitas, K. R; Pinheiro, E. P. Utilização de Resíduos Orgânicos de Origem Animal na Produção de Forragens. VII Simpósio Goiano sobre Manejo e Nutrição de Bovinos de Corte e Leite. Colégio Brasileiro de Nutrição Animal, 2005.

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1Rodrigo Paniago, Boviplan Consultoria Agropecuária Ltda

6 Comments

  1. Rodrigo Paniago disse:

    Olá Walter,

    A Brachiaria Decumbens não está entre as gramíneas forrageiras mais exigentes em fertilidade que temos à disposição. Por isso, meu palpite é de que você está fazendo uma boa adubação. Em especial por você ter enriquecido o adubo com fósforo, a partir do super simples.

    Agora, para te dar uma resposta mais precisa eu precisaria de outras informações relacionadas a fertilidade do solo, tais como: fósforo, cálcio, magnésio, potássio, enxofre, capacidade de troca de cátions e saturação de bases.

    Você pode estar fornecendo uma adubação deficiente, dependendo do nível de produção esperada ou, apesar de raro, uma adubação em excesso para a área que será trabalhada.

    Caso os níveis de fertilidade estejam ok e você deseja que a pastagem produza ainda mais, só a adubação com o esterco, somada com super simples, não será suficiente, pois as gramíneas ainda precisarão de adubação nitrogenada para proporcionar elevada produção de matéria seca por área.

    Outro fator importante é saber se o solo está corrigido (calcariado), pois em caso contrário a aplicação do super fosfato simples será ineficiente. Como você informa que o pH é de 6,8, acredito que isso não será problema para você.

    Entretanto, pH 6,8 já é um valor alto, você deve tomar cuidado para que este valor não aumente, pois caso contrário você poderá encontrar deficiência de micronutrientes.

    Saudações,
    Eng. Agr. Rodrigo Paniago

  2. Wallace Alves dos Santos disse:

    Parabéns!

    É bom saber que muitos colegas tem capacidade de enchergar além das “barreiras” que surgem no dia-a-dia do campo.
    Criadores, agricultores e profissionais do campo precisam cada vez mais buscar alternativas que revertam situações adversas em suas atividades. Mesmo que o apoio governamental seja pequeno, somos nós que precisamos nos unir e mudar.

    W. Santos

  3. Bernardo Garcia de Araujo Jorge disse:

    Qual seria a forma mais eficiente de se utilizar o esterco?

    Resposta do autor:

    Caro Bernardo Jorge,

    A melhor maneira de se utilizar o esterco é na forma “curtida”, ou seja, depois que o mesmo sofreu algum tipo de fermentação. Isto é ainda mais importante quando existe uma quantidade grande de material vegetal misturado ao esterco.

    O ideal é que você guarde o esterco passível de recolhimento em um local onde o mesmo possa ser acumulado, a fim de fornecer um volume suficiente para garantir uma distribuição eficiente do mesmo sobre o local desejado, geralmente área de produção de volumoso para a seca.

    É importante que o local não permita a lavagem do mesmo pela água da chuva ou de qualquer outra fonte.

    Quanto a distribuição, ela pode ser realizada na forma líqüida ou seca, na primeira é necessário a utilização de um tanque com bomba e na forma seca através de vagões específicos para este fim. Alguns modelos de distribuidor de calcário podem ser adaptados, porém a eficiência ainda será baixa, pois o esterco tem baixa densidade.

  4. Rafael Henrique Ruzzon Scarpetta disse:

    Olá Rodrigo, é viavel o uso de biodigestores para confinamento?

    Resposta do autor:
    Olá Rafael,

    Sim, é viável técnicamente a inclusão de um biodigestor agregado ao confinamento de gado de corte ou mesmo de vacas de leite.

    Porém a questão de viabilidade econômica deve ser avaliada caso a caso. Por exemplo, no confinamento de gado de corte, onde não se confina durante todo o ano é preciso estocar o esterco para que o biodigestor e demais itens que podem ser anexados (ex: gerador de energia elétrica) funcionem durante todo o ano.

    Neste tipo de projeto você deve inclusive considerar o custo/benefício do uso anterior do esterco, por exemplo como adubo de reposição nas áreas de produção de volumoso.

    Saudações,

    Rodrigo Paniago

  5. Eugenio Dill disse:

    Olá Rodrigo…

    Estou em busca de informações sobre aproveitamento de dejetos em lavoura… no meu caso, a urina e as fezes são encaminhadas juntas para uma esterqueira (poço), através de um sistema de tubulação. Ainda não comecei a utilizar na lavoura, mas lhe pergunto:

    Os subprodutos ali armazenados (todos na forma liquida desde o começo) sofreram perdas importantes quanto a qualidade? A forma de distribuição será com moto bomba!

    Se possível, gostaria que me enviastes material ou referencia bibliográfica a respeito do assunto.

    Grato, grande abraço.

  6. Daniel Bueno Dias disse:

    Boa tarde Rodrigo,

    Gostaria de saber as vantagens e desvantagens do esterco de confinamento gado de corte, em relação a cama de frango para hortaliças?

    Sei que a cama de frango e muito utilizada,mas o esterco de confinamento perde muito ou nao?

    Desde já agradeço a atenção.

    Obrigado.