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Que tenha a santa paciência e continue a ser orgânico

Como gostamos de enquadrar tudo em quadrinhos e rótulos bem conhecidos e identificáveis à longa distância e com uma ou duas palavras-chaves, creio que pouca gente foi inspirada para ler com mente aberta e espírito crítico o artigo na revista Exame depois de ver o título "O Mito dos Orgânicos".

De vez enquanto recebemos verdadeiros alertas que são, em primeira instância, considerados ameaçadores, como aconteceu recentemente numa reportagem sobre problemas de contaminação com a bactéria E. coli encontradas em alguns lotes de espinafre orgânico nos EUA.

Como gostamos de enquadrar tudo em quadrinhos e rótulos bem conhecidos e identificáveis à longa distância e com uma ou duas palavras-chaves, creio que pouca gente foi inspirada para ler com mente aberta e espírito crítico o artigo na revista Exame depois de ver o título “O Mito dos Orgânicos”.

Ser corintiano é ser sofredor, ser orgânico é não usar fertilizantes, agrotóxicos, hormônios, vitaminas etc, e pelo jeito ainda ser mais susceptível aos ataques microbiológicos e dos fungos do que os produtos produzidos da maneira convencional.

Norman Borlaug aponta a espada na direção dos orgânicos porque se todo mundo optasse pelos produtos orgânicos teríamos uma falta física de áreas produtivas e o desmatamento de matas virgens seria necessário para a produção dos “improdutivos” orgânicos que teriam uma produção até 35% menor do que aquela obtida no sistema convencional.

Nunca li tanto besteirol junto e ainda por cima disfarçado com uma manta que tem um forte cheiro pseudo-científico.

Quem não se lembra de casos seríssimos de contaminação com Salmonela sp. de leite, carne, ovos e até a própria E.coli já andou freqüentemente nas redondezas de produções convencionais.

Estes, no meu ver, são acidentes de percurso e resultado de falhas individuais na cadeia, apesar de que são muito mais fáceis de ocorrer com produtos convencionais do que com os orgânicos, e isto não é muito estranho porque está mais que provado que:

O período de validade (shelf life) de produtos orgânicos é muito maior; será por que têm uma proteção maior contra alguns microorganismos do que os convencionais?

O gosto é muito melhor, por que?

A percepção de qualidade pelo consumidor é muito maior nos orgânicos do que no convencional.

Justus von Liebig está presente também como âncora de nutrição vegetal através de minerais que podemos fornecer via fertilizantes em doses cada vez maiores fazendo assim parte do pacote de “revolução verde”.

A miséria e a fome continuam na grande parte da África e Ásia apesar da produção de alimentos ter incrementado e a AIDS dizimado grande parte da população na África; o problema não é tanto a produção, mas a política de distribuição destas e outras riquezas.

A separação da química orgânica e da química inorgânica é um erro estratégico enorme, porque nos sentimos o todo poderoso no campo da inorgânica, mas somos ainda aprendizes na orgânica e o bio-dinamismo entre os dois então é ainda quase desconhecido.

Lendo um livro sobre a fertilidade do solo escrito em 1910 e se tratando da hoje Indonésia, onde meu avô trabalhou como agrônomo de uma plantação industrial de chá, tive a surpresa de constatar que a maioria das grandes perguntas existentes naquele tempo ainda permanece sem respostas adequadas.

Um grande nome ausente é do Rudolf Steiner da antroposofia e agricultura biodinâmica; aquele que previu a cura do câncer através do corpo. Copiar um módulo-modelo de proteínas saudáveis e originais (Células tronco?) e também previu o surgimento das doenças como a da vaca-louca por causa do uso alimentos de origem animal na alimentação animal.

Para ser um produtor orgânico de verdade tem que ter muito conhecimento e coragem, mas acima de tudo realismo e bom senso.

A prática de rotação de culturas mesmo na horta tem que ser muito mais rigorosa do que no convencional para evitar problemas possíveis de contaminação e quedas de produção.

Principalmente algumas hortalíças se desenvolvem rente à terra, que pode facilitar a contaminação com microorganismos indesejáveis que podem vir da matéria orgânica mal curtida, e uma outra fonte pode ser a água contaminada de irrigação.

São pontos a serem lembrados e considerados na hora de controle de qualidade e da certificação.

O grande segredo é de deixar que a natureza trabalhe para o nosso bem-estar, em vez de agredi-la do jeito que conhecemos tão bem, e aproveitar os presentes que são dados na forma de fixação biológica do Nitrogênio, micorrizas que ocorrem num ambiente favorável.

O aumento explosivo da demanda pelos produtos orgânicos que cresce algo em torno de 25% ao ano fez com que muita gente se aproveitasse disto e entrasse no mercado, porém nem sempre podendo cumprir com as regras básicas e nem honrar a confiança dada pelo consumidor em forma de uma disposição de pagar mais pelos orgânicos.

A ganância é um mal companheiro em qualquer situação e pode estragar anos de trabalho em um estalo de dedos.

Tem ainda grande parte dos orgânicos produzidos sem certificação e /ou com um processo de certificação falho e até abusos fraudulentos ocorrem, mas mesmo assim estou convencido que produzir alimentos saudáveis sempre valerá a pena para quem tem condições para fazer isto.

Para mudar para o orgânico tem que ter uma análise e diagnóstico da fazenda com uma lista com fatores e pontos fracos que devem ser resolvidos, quase sempre de maneira convencional, antes da mudança. Esta é a chamada fase de transição e forma a verdadeira fundação sobre qual podemos construir os sistemas orgânicos. Qualquer falha nesta transição que não for corrigida adequadamente será responsável pelos problemas na frente.

Em nossas condições no Brasil temos teores de fósforo e de matéria orgânica na terra que ficam anos-luz dos desejados e estas deficiências terão que ser corrigidas antes de poder embarcar na viagem orgânica ou biodinâmica.

Uma vez no sistema é necessário manter o fluxo de nutrientes num tipo de ciclo mais fechado possível, onde se perde o mínimo e se aproveita o máximo, e isso implica na quase imposição de haver produção animal dentro da fazenda.

A vida biológica na terra aumenta muito com microorganismos e fungos para dar conta da enorme quantidade de matéria orgânica que substitui o adubo convencional.

Uma vez no sistema, a perda de produtividade quando comparada ao convencional se reduz muito, e em muitos casos ou se iguala ou até pode superar os resultados convencionais.

Tem muitos exemplos de sucesso com os orgânicos e com culturas difíceis como o café, cana de açúcar e grãos e até a bovinocultura, com o boi orgânico que já está atravessando fronteiras, com resultados de produtividade e retorno financeiros satisfatórios.

Infelizmente, esta parte da história pouca gente conta e por isso mesmo eu estou escrevendo estas linhas.

0 Comments

  1. Marcelo Tavares Pinheiro disse:

    Eu não seria propriamente um adepto do método orgânico de produção, mas sempre procurarei por um método de produção que seja o mais natural possível. Sendo assim, sou favorável à produção orgânica mesmo que pessoalmente não a adote.

    Estou certo de que o que houve (na reportagem da revista), foi uma campanha contra por questões de interesses econômicos divergentes. Há indústrias que ganham muito dinheiro com a produção, dita convencional. Desta forma, por que apoiariam métodos de produção menos dependentes de seus produtos?

    Por fim, acredito que o caso de contaminação relatado, não é problema de método, mas sim, do agente (ou talvez: a gente = homem) que manipulou ou conduziu os trabalhos de modo inadequado. Um grande abraço e parabéns pelo artigo.

  2. Anderson Carneiro Polles disse:

    Pascal, parabéns pelo artigo, muito sensato.

    Se quiser discutir sobre orgânicos, comecemos pelos entraves na comercialização e certificação. Primeiro o gargalo mercadológico, segundo, o gargalo tecnológico, terceiro, a aplicabilidade, a viabilidade e o retorno financeiro.

    Para tanto, faço uso de três artigos, originários de minha dissertação de mestrado. Queres começar?

  3. Andréa Amaral Alves disse:

    Quero parabenizá-lo Sr. Louis Pascal por seu artigo.

    Estive acompanhando essa discussão e sinceramente dava um “cansaço” louco, de ver opiniões reducionistas e não me manifestei. Hoje ao ler seu texto, encontrei eco ao que tenho estudado por mais de quatro anos e mais: o sr foi amplo ao citar Steiner, que apesar de ter vivido no início do século 20, e por conseguinte haviam limitações de novas descobertas na ciência, tentou construir o futuro, que é o nosso presente hoje…

    Será que quem ainda está por vir não terá direito a um presente também, que não deixa de ser o futuro que estamos nos preocupando hoje?

    Muito se fala sobre a agricultura. Pouco sobre produção animal. Foi excelente sua lembrança, e acrescento também outros produtos, como leite orgânico, suinocultura etc.

    Fico feliz ao ver que tem muita gente com a mente aberta e atenta com o futuro da nossa espécie nesse planeta!

    Andréa Amaral Alves
    Médica Veterinária MSc

    Resposta doa autor:

    Olá Andréa,

    Muito obrigado pela sua carta e importantes observações.

    Tem um ditado que eu gosto muito: ” Falar sobre o futuro podemos fazer amanhã, mas construir o futuro tem que ser feito hoje e agora “.

    Depois do “Silent Spring” da Rachel Carlson a produção animal ainda tem um longo caminho a percorrer e a médio e longo prazo não sei se vai haver um futuro porque as exigências sanitárias, ambientais e o consumo e demanda pela água podem se tornar impossíveis de serem atendidas.

    De qualquer maneira existem hoje maneiras de produção animal saudáveis que podem e devem contribuir para que se explore a agropecuária de maneira mais responsável.

    No Brasil estamos com a pecuária quase toda em regime de pasto e portanto em condições de fornecer além de alimentos saudáveis, meios de integrar a pecuária com a lavoura; basta querer.

    Um abraço,
    Louis.

  4. Paulo Roberto Silva disse:

    Parabéns Louis de Geer! Boas colocações e sustentações.

    Temos que repensar o mundo que queremos e tomar atitudes concretas já, para isso precisamos mais apoio de “los hermanos” do norte (principalmente na comentada distribuição).

    Creio que pelo rumo das coisas, seremos obrigados a fazer algo.

    Saudações e grande abraço!

    Paulo Roberto Silva

    Fiscal Federal Agropecuário e Ex- Coordenador de Pecuária da Agro-pecuária CFM Ltda.

    Resposta do autor:

    Olá Paulo Roberto,

    Muito obrigado pela a sua carta, realmente precisamos mais apoio de “los hermanos” do norte, mas também dos nossos irmãos aqui dentro de Brasil; cada um terá que fazer a sua parte.

    Bom ter notícias suas,
    Um grande abraço,

    Louis

  5. José Abel e Silva Júnior disse:

    Num mundo cada vez mais insalubre (super aglomerações, congestionamentos, vida sedentária, ambientes climatizados, estresse), é no mínimo hipócrita qualificar os alimentos convencionais como vilões.

    Resposta do autor:

    Olá José Abel,

    Muito obrigado pela sua carta e manifestação.

    A única vilão da história é o próprio homem que constrói o “maravilho” que você descreve e tem muita gente que acha que a alimentação saudável é um contraponto ao estresse e desgastes em geral.

    Eu entendo que esta alimentação saudável vem principalmente dos alimentos orgânicos.

    Um abraço,
    Louis.

  6. Euler Andres Ribeiro disse:

    Como dizia meu pai: Raio não cai em pé de couve.
    Quando existe uma campanha contra orgânicos é porque ele está incomodando.

    Com o aquecimento global as pessoas estão tomando consciência que há necessidade de se fazer alguma coisa. Entretanto países como os EUA não apoiaram o protocolo de Kioto porque teriam que abrir mão do American Way of life de consumo e desperdícios energéticos exagerados.

    O orgânico é uma das opções de diminuição deste desperdício. Os processos biológicos substituem em grande parte os gastos de energia na produção de adubos químicos. Bactérias e fungos do solo fazem o trabalho de fábricas para solubilizar os nutrientes na medida certa.

    A proteção do solo, proteção das nascentes e aumento da permeabilidade do solo são condições básicas para uma certificação.

    O produtor orgânico, além de outros benefícios que traz ao planeta deveria ter o título de produtor de água potável

  7. Marcus Vicente Petrosino disse:

    Que venham os orgânicos!

    Mas de certa forma, “pega mal” seu consumo ser elitizado, como hoje em dia.

    Produtores e empresas de comercialização dos orgânicos entram neste negócio por que ele é ecologicamente correto, é mais saudável ou por que paga-se pelo produto, 30%, 50% a mais do que o produto convencional?

    Talvez até seja pelos dois motivos, mas penso que a alimentação saudável deva ter a capacidade de ser difundida a todos, não apenas a uma elite, bem informada, bem nutrida e que, diga-se de passagem, “a que menos precisa…”

    O primeiro grande desafio para o crescimento justo da alimentação orgânica é ela conseguir ficar à parte das clássicas leis do capitalismo (pouca oferta com grande demanda = maiores preços, e vamos lucrar!!!) e nutrir com alimentos saudáveis, quem mais precisa e não apenas a elite.

    Seria isto possível?