Melhoras à frente para margens operacionais
Pelos últimos quatro anos, o ambiente operacional para os processadores de carne bovina do Brasil tem sido muito desafiador. Isso devido principalmente à queda nas ofertas de gado, mas também por influência das restrições às exportações impostas principalmente pela União Europeia (UE) e pela Rússia, bem como pela valorização do Real brasileiro.
Porém, os participantes do setor que sobreviveram podem agora se beneficiar de um aumento na oferta de gado, somado com uma forte demanda local, escassez de carne bovina em outras partes do mundo e, pelo menos em curto prazo, um Real um pouco mais fraco. Do lado da exportação, novas regulamentações referentes ao financiamento de exportação podem levar a mais consolidação dos volumes de exportação em benefício dos maiores players internacionais.
Introdução: uma indústria desafiada que deixou alguns membros para trás
As condições na indústria de carne bovina do Brasil têm sido muito difíceis para um número significante de membros nos últimos quatro anos. A primeira pressão que a indústria enfrentou foi a crise financeira em 2008 e a redução substancial consequente na disponibilidade de crédito. Essa situação apertou os termos de empréstimos (com relação às garantias e contratos) e reduziu as maturidades, deixando pouco crédito disponível para períodos de mais de cinco anos. Sob essas circunstâncias, companhias menos eficientes, ou aquelas com frágil estrutura de dívidas (altas exposições a dívidas de curto prazo) foram deixadas com severos problemas de liquidez. Essas dificuldades, combinadas com certa administração ruim de riscos com relação à utilização de moeda estrangeira criou desafios de fluxo de caixa.
Como resultado, algumas companhias bem conhecidas declararam falência em 2008/09; entre elas, estavam nomes tradicionais, como Frigorífico Estrela, Margen, Arantes, Independência, Quatro Marcos e Mercosul – representando aproximadamente 15.500 cabeças por dia de capacidade de abate ou cerca de 10% do total de números abatidos em 2009 e deixando uma série de produtores de gado sem pagamento.
Exacerbando a situação, no meio de 2008, as consequências de uma liquidação do rebanho bovino ocorrida entre 2005 e 2007 começaram a afetar a oferta de animais para abate, desencadeando um movimento de alta nos preços do gado e reduzindo a capacidade de utilização dos frigoríficos. Ainda, os aumentos dos preços do gado permaneceram brandos até 2009 devido ao impacto da crise financeira na demanda. Entretanto, à medida que as econômicas mundiais se recuperaram e a produção mundial de carne bovina permaneceu estagnada, os preços aumentaram bastante, alcançando recordes em 2010 e 2011 (Figura 1).
Além disso, as restrições às exportações impostas principalmente pela UE e, mais recentemente pela Rússia, junto com a valorização do Real, reduziram a lucratividade das exportações (Figuras 2 e 3). Isso, combinado com as escassas linhas de crédito que permaneceram, levou a uma segunda onda de companhias registrando falência, que inclui nomes como Mataboi, Frialto e Frigol, com uma capacidade combinada de abate de cerca de 10.000 cabeças por dia. E as companhias que sobreviveram se encontraram financeiramente enfraquecidas.
Essas companhias que foram capazes de enfrentar esses obstáculos e explorar a forte demanda doméstica por carne bovina durante esse período, que foi impulsionada pelo rápido crescimento econômico e pela expansão da classe média, obtiveram melhores margens operacionais do que as outras companhias e agora deverão se beneficiar do melhor cenário da indústria (Figuras 4 e 5).
Cenário para os sobreviventes
Apesar do cenário do lado do crédito permanecer relativamente escasso, os frigoríficos de carne bovina que sobreviveram às dificuldades dos últimos quatro anos podem agora estar se aproximando de um período de grande produtividade da indústria de carne bovina, direcionado principalmente pelo aumento previsto na oferta. De fato, após anos de escassez, o Brasil parece estar entrando em uma parte mais positiva do ciclo pecuário à medida que a oferta deverá continuar aumentando e deverá permanecer relativamente alta por pelo menos até 2014.
A reconstrução do rebanho que foi feita no Brasil em resposta às melhores margens para os criadores entre 2007 e 2010 é o pano de fundo dessa projeção. A proporção de fêmeas abatidas caiu com relação ao pico de 49% visto em 2006, para 46% em 2008/09, aumentando levemente para 48% em 2010 (Figura 6). Como resultado dessa retenção de vacas, entre 2009 e 2010 o número de bezerros começou a aumentar novamente. Esses bezerros provavelmente serão engordados e estarão disponíveis para abate dentro dos próximos três anos (Figura 7). Então, nosso cenário aponta para um crescimento médio na oferta de 3% nos próximos dois anos. Essa percepção também se refletiu nos preços futuros do gado no Brasil, que tem sido comercializado abaixo dos níveis do ano anterior.
O cenário parece estar montado para um ambiente melhor para as companhias de carne bovina do Brasil que superaram as barreiras dos últimos anos (Figura 8). Essa previsão é baseada no crescimento da economia, apesar do fraco crescimento no primeiro trimestre de 2012, da previsão de uma maior oferta de gado no Brasil, do fortalecimento esperado na demanda local, da escassez de carne bovina nos principais países competidores e de uma provável desvalorização da moeda (no momento em que esse relatório foi escrito, maio de 2012, o Real brasileiro estava 20% mais fraco do que a média vista em 2011) .
Esse promissor cenário positivo, junto com o grande número de companhias que ainda estão lutando para sobreviver, provavelmente gerará espaço para mais consolidação na indústria. Além disso, o provável crescimento irregular na oferta nos diferentes estados do Brasil poderá também influenciar nessa aceleração esperada no movimento de fusões e aquisições no setor. De fato, o JBS já agiu na expansão de suas operações dentro do Brasil, arrendando cinco plantas e adquirindo outras duas desde o começo do ano, levando a um aumento de cerca de 10% na capacidade total de abate da companhia (Figura 9).
Novas regulamentações para financiamento das exportações brasileiras – efeitos colaterais na carne bovina
Um sistema de pré-pagamento tem sido uma das formas mais importantes de financiamento para as exportações de carne bovina do Brasil. Uma das suas vantagens, em comparação com o empréstimo tradicional, está no fato de nenhum imposto de renda ser cobrado sobre juros e comissões relativos a adiantamentos dos pré-pagamentos de exportação. Nem o sistema de pré-pagamento está sujeito ao Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).
Entretanto, a partir de março de 2012, o Banco Central do Brasil impôs duas novas medidas visando parar com o fluxo de moeda estrangeira no país e interromper a valorização do Real. Em suma, essas medidas incluem as seguintes disposições:
– Toda moeda estrangeira vinda ao país por um período de menos de cinco anos está sujeita ao IOF de 6% sobre a quantidade total;
– As transações de pré-pagamento de exportação com maturidade de mais de 360 dias não são mais possíveis, significando que qualquer adiantamento no pagamento pelo importador agora será tratado como um empréstimo estrangeiro tradicional – com o imposto retido na fonte de 15% a 20% sobre os juros.
– Os adiantamentos dos pré-pagamentos de exportação, com prazo de reembolso de até 360 dias, podem exclusivamente ser desembolsados diretamente ao exportador pelo importador de bens. Outras partes que não o importador (por exemplo, um financiador), não estão mais autorizadas a financiar diretamente um exportador brasileiro pelo sistema de pré-pagamento de exportação.
Para a indústria como um todo, essas novas regras impulsionarão um aumento geral nos custos das dívidas em termos de dólares dos Estados Unidos; o IOF de 6% provavelmente será cobrado sobre a quantidade total de empréstimos com uma maturidade média de menos de cinco anos. Entretanto, companhias que tem escritórios no exterior podem evitar parte desse aumento previsto nos custos das dívidas, ficando em posição melhor do que as companhias que não têm escritórios no exterior.
De fato, através de suas filiais estrangeiras, as companhias podem emprestar dinheiro diretamente dos bancos internacionais (fora do Brasil), então fazendo o papel de um importador puro financiado a companhia matriz (exportadora) localizada no Brasil. Esse processo permite que esses frigoríficos continuem se beneficiando dos pré-pagamentos de exportação com prazos mais curtos que 365 dias e, dessa forma, minimizem o aumento previsto nos custos de dívidas relacionados às exportações.
Como o impacto nos custos de dívidas resultantes dessas novas medidas provavelmente será menor para essas companhias – notavelmente, JBS, Marfrig e Minerva -, elas deverão ter uma vantagem competitiva sobre as outras companhias no mercado internacional, o que pode levar a um crescimento mais rápido nas exportações. Vale destacar que esse trio de companhias representa cerca de 80% das exportações totais de carne bovina do Brasil.
Conclusões
O ambiente operacional para as companhias de carne bovina no Brasil tem sido muito desafiador nos últimos anos diante da queda nas ofertas de gado, das restrições às exportações, bem como da valorização do Real. No entanto, as companhias sobreviventes podem agora se beneficiar de um aumento na oferta de gado combinada com uma demanda local robusta, escassez de carne bovina em outras partes do mundo e uma provável desvalorização do Real, que deverá preparar o terreno para uma recuperação gradual nas margens. As mudanças também virão do lado da exportação, onde novas regulamentações referentes ao financiamento de exportação poderão levar a mais consolidação nos volumes de exportação em direção aos maiores players internacionais.
Fonte: Rabobank (mai/2012), traduzida e adaptada pela Equipe BeefPoint.
1 Comment
Com as mesmas informações cheguei a conclusões completamente diferentes:
Por que os frigoríficos quebraram afinal?
Porque a liquidação de bovinos acabou em 2007 e reduziu a oferta?
Na verdade começou em 2007 com a cana de açucar e prosseguiu até 2009 aumentando a oferta.
A redução de matrizes em 2010 e 2011 também aumentou a oferta.
Não deve ser a oferta.
Será o preço da arroba?
Os preços médios anuais ESALQ foram
2008 84,16
2009 78,85
2010 88,51
2011 101,78
2012 95,72(até maio)
Crescimento médio de 3% a.a.
Parece que não é o preço também!
Será a demanda?
A maior parte da produção vai para consumo interno e o país ainda não teve problema de renda.
Afinal o nível de emprego subiu e a classe C aumentou sua renda de forma significativa.
A exportação tem participação relativamente menor e caiu mais pelo efeito do câmbio do que qualquer outra coisa.
Assim a demanda parece que também não é a causa das quebras.
Alem disso o preço no varejo subiu bastante.
Será o nível de operação?
Neste caso seria só desativar as plantas ociosas que tudo se resolveria.
Ao contrário os grandes frigoríficos continuaram comprando os pequenos e aumentando a capacidade instalada.
Então também não deve ser isso.
Uma conclusão é que o fracasso dos frigoríficos se deveu a fatores de outra natureza e que a situação só não foi pior porque houve suprimento
regular de matéria prima a preços baixos que sustentou a cadeia toda.
Mas com tão poucos incentivos ao pecuarista isto não deve durar muito.
Portanto não há razões plausíveis para que a oferta aumente e sustente melhores resultados.