O tempo passa e o assunto rastreabilidade continua notícia constante e com opiniões as mais conflitantes possíveis. A principal desavença tem sido quem deve arcar com o custo da certificação. Um outro ponto importante tem sido a reivindicação das Associações de Criadores em também terem permissão para participar do processo de certificação.
Esse conflito é causado pelo fato de nessa fase inicial a exigência da certificação recair somente para bovinos destinados à exportação. Por ter um custo e de não ser exigida para animais destinados ao mercado interno, nos parece óbvio que animais com certificação devem ter um preço superior aos animais sem certificação, ou o reverso da medalha, animais sem certificação valerem menos no mercado do que os com certificação. Isso não ocorrendo, é esperado que os criadores não tenham interesse em cadastrarem seus animais para efeito de certificação. Se a certificação fosse exigida para todos os bovinos a serem abatidos, o que seria um absurdo no momento e mesmo no prazo estabelecido pelas atuais normas, a argumentação dos frigoríficos de que os gastos decorrentes com a certificação seriam de responsabilidade dos produtores seria válida. Não ocorrendo uma revisão e uma racionalização nas normas de cadastramento e certificação para fins de rastreabilidade na cadeia da carne bovina, essa discussão sobre quem deve bancar a conta nunca será resolvida e corremos o risco das exportações brasileiras de carne bovina serem afetadas negativamente com grandes prejuízos para todos.
Um aspecto que preocupa se refere a uma possível transferência de responsabilidade dos órgãos especializados do governo na área sanitária e de controle de resíduos para as empresas certificadoras. Certificar origem e processos, embora trabalhoso, é possível, mas certificar o não uso de produtos ilegais ou polêmicos e ausência de resíduos é muito arriscado sem um sistema de monitoramento adequado. As empresas de certificação estariam preparadas técnica e financeiramente para fazer esse monitoramento? A argumentação de que a responsabilidade dos problemas de não conformidade do produto final com a certificação recebida por empresa remunerada para essa tarefa seria só do produtor é no mínimo falaciosa, pois nesse caso qual seria a razão de despesas com certificação? Cuidar preventivamente da saúde pública nos parece dever e responsabilidade dos órgãos do estado. O governo tem obrigação de cuidar da segurança alimentar em termos de sanidade e de controle de resíduos independentemente de haver ou não certificação.
Um outro aspecto curioso das normas do SISBOV é o fato das empresas certificadoras serem também encarregadas do cadastramento dos animais. O cadastramento deveria ser feito através de programa único desenvolvido para esse fim com coordenação do Ministério da Agricultura através de convênios com órgãos municipais e estaduais. O lógico seria que as empresas certificadoras fossem desvinculadas tanto dos produtores como dos interessados na certificação para fins de comercialização, e atuassem como prestadoras de serviços. No caso de marcas específicas, Associações de Criadores também poderiam atuar na certificação, mas a credibilidade poderia não ser a mesma de certificadoras independentes e com bom conceito no mercado.