Reprodutores Panagpur e Bitelo destacam-se no ranking da ACNB
27 de outubro de 2003
Efeitos da somatotropina bovina (bst) sobre a produção de leite e desempenho de bezerros em vacas de corte
29 de outubro de 2003

Rastreabilidade, mercado de trabalho e o veterinário

Por Paulo Sérgio Telles da Cruz1

Alguns meses atrás levantamos uma polêmica sobre a inclusão do trabalho do Médico Veterinário no SISBOV (Sistema Brasileiro de Identificação e Certificação de Origem Bovina e Bubalina), com o artigo Mudanças Necessárias (Hora Veterinária n°134/jul/ago/2003). Ou melhor, tentamos levantar uma polêmica, mas na verdade, não houve, de fato, nenhum tipo de mobilização da classe e assim a polêmica ficou tão somente na vontade. O artigo ao qual nos referimos, versava sobre a momentosa questão de perguntar as nossas autoridades onde é que se incluía o trabalho do Veterinário na questão Rastreabilidade. As razões para a pergunta, além do objetivo mais óbvio, que era de gerar e manter mercado de trabalho para o veterinário são na verdade bem mais amplas. Em primeiro lugar há que não esquecer que por força de lei, existem áreas específicas, onde o exercício da atividade é exclusivo do veterinário, sendo sanidade animal uma delas.

Salvo mau entendimento, não conhecemos nenhuma outra categoria profissional capacitada para atestar sobre saúde animal. (Lei n°5517, de 23 de outubro de 1968).

Em segundo lugar, se analisarmos as Instruções Normativas, 1, 21 e 47, emitidas pelo MAPA, todas no decorrer de 2002, vamos constatar a presença de referências a programas e dados sanitários, tratamentos, alimentação, saúde pública e manejo reprodutivo entre outras. Ora, a própria IN n°47 trata de encaminhar a questão no item número 9, onde diz:

“9. O Responsável Técnico pela Certificadora será um Médico Veterinário devidamente registrado no CRMV”.

Se assim é, nos parece óbvio que os serviços que vão atestar estas qualidades, também tenham que ser prestados por profissionais habilitados. Não fosse assim, poderíamos desde já entender que seria possível criar uma firma de Responsabilidade Técnica, terceirizadora de serviços. Esta empresa contrataria profissionais de qualquer área e sairia por aí concedendo Responsabilidades Técnicas, sem sequer comparecer aos estabelecimentos.

Claro que não pode ser desta forma. Seria o caos. É fácil de perceber.

Porque então na certificação da rastreabilidade animal, seria possível conceder a profissionais não habilitados, o direito de exercer atividades exclusivas de veterinários?

Trata-se claramente uma afronta à lei.

Na IN n°47 está bem colocado que o responsável pela Certificadora, tem que ser um Médico Veterinário. Entretanto, a nosso ver, a instrução é incompleta, pois falha ao não enfatizar que os serviços de inspeção dos animais para conseqüente certificação, também deveriam ser realizados por veterinários.

Trata-se da questão da responsabilidade técnica que citamos acima, que é intransferível e, portanto o veterinário responsável pela certificadora somente poderia assumir a responsabilidade pelos dados transmitidos se eles tivessem sido coletados e checados por veterinários.

Apenas como lembrança, vejam-se abaixo, alguns itens pinçados das Instruções Normativas do MAPA.

“Instrução Normativa no 01

4. Registro de Animais e propriedades – Conjunto de procedimentos utilizados para a caracterização dos bovinos, bubalinos e das propriedades rurais no interesse da certificação de origem, do controle do trânsito interno/externo, dos programas sanitários e dos sistemas produtivos.
8.2.8. dados sanitários (vacinação, tratamentos e programas sanitários).

Instrução Normativa no 21

1.3. Garantir a segurança dos produtos de origem bovina e bubalina, particularmente dos alimentos para consumo humano, considerando os aspectos de saúde pública e a necessidade de suprimir as fraudes e as práticas desleais de comércio.

Registro – conjunto de procedimentos utilizados na caracterização de bovinos, bubalinos, propriedades rurais e agroindústrias, no interesse da certificação de origem, da vigilância sanitária, dos programas de saúde animal e do cadastro nacional do SISBOV.

Certificado de Conformidade – documento emitido pela entidade certificadora credenciada, atestando que o sistema de produção, os programas sanitários e a caracterização das propriedades rurais e das agroindústrias atendem às especificações de conformidade estabelecidas nas regras e requisitos do SISBOV;

Supervisão – procedimentos ou visitas técnicas realizadas pela entidade certificadora credenciada, para inspeção de animais e de propriedades rurais, com o objetivo de verificar a conformidade com as normas do SISBOV;

Supervisor – agente responsável pelas atividades de supervisão;

5.4. política de pessoal – As certificadoras devem demonstrar competência profissional baseada no treinamento, na reciclagem e na experiência de seus funcionários. Para tanto, devem possuir documentação referente aos requisitos necessários para a contratação de pessoal treinado, com referencial profissional, conhecimento técnico e experiência na área de prestação de serviço especializado;

Instrução Normativa no 47

3.1. registrar e controlar as movimentações e os manejos reprodutivo, alimentar e sanitário (vacinações, testes e tratamentos) de bovinos e bubalinos;

9. O Responsável Técnico pela Certificadora será um Médico Veterinário devidamente registrado no CRMV.”

Que tal? Depois de tudo isto, a única lógica possível é a de colocar o veterinário para executar estas tarefas e ponto final.

Mas, na prática, não é isto que está acontecendo. Temos hoje várias certificadoras habilitadas, dezessete até onde pudemos averiguar, onde os serviços de vistoria nas propriedades são prestados por profissionais das mais diversas áreas.

A falta de reação por parte da classe tem sido realmente uma constante. Entendemos que está na hora de acordarmos, antes que de forma totalmente indevida, outros profissionais tomem um espaço que é nosso, por conhecimento e por direito.

Sentimo-nos honrados, desde já pelo convite feito pelo nosso presidente para participarmos da reunião plenária do CRMV no dia 4/11, onde nos será dada a oportunidade de dissertar sobre o assunto e assim, quem sabe, criarmos suficiente massa crítica para levarmos o assunto ao CFMV. Portanto, retificando, não queremos causar nenhum tipo de polêmica, mas sim uma tomada de consciência por parte de todos aqueles que politicamente podem influir, para que unidos possamos conseguir que o MAPA exija que a vistoria dos animais seja feita por veterinários.

Segundo nosso ponto de vista, muitas outras melhorias poderiam ser implementadas no SISBOV.

Recentemente tivemos a oportunidade de conversar pessoalmente com o Secretário da Agricultura Senhor Massao Tadano e colocamo-nos inteiramente ao dispor do MAPA para colaborar, sem remuneração, com o aperfeiçoamento das normas até agora editadas sobre rastreabilidade. Nosso objetivo final é ajudar a estabelecer de forma contínua e duradoura o Sistema de Rastreabilidade Brasileiro (SISBOV) para que possa ser uma ferramenta efetiva de melhoria do produto “carne” pelo qual, nós os veterinários somos os guardiães. Ou deveríamos ser.
____________________________
1Paulo Sérgio Telles da Cruz é médico veterinário e membro da Consulvet – Consultoria Veterinária

0 Comments

  1. rodrigo rodrigues alves disse:

    Estando completamente de acordo com sua linha de raciocínio.

  2. Maria Celeste Gomes disse:

    Gostaria muito de parabenizar ao colega, Paulo Sergio Telles da Cruz, pelo seu pronunciamento.

    Infelizmente nós, Veterinários, estamos resignados e a maioria já não se posiciona para nada.

  3. Marcelo Ribeiro disse:

    Caro Leitor e colegas Veterinários,

    Concordo com a sua insatisfação sobre o tema da certificação de animais. Você foi claro e objetivo nas suas colocações.

    Como zootecnista e ex-proprietário de uma certifiacadora concordo como voçê com as inconformidades no processo de certificação como um todo, não só na certificação mas em todo o processo do rastreamento do animal.

    O que voçê parece não saber é que dentro de todo o processo de rastreamento a certificação, a sanidade é apenas um fator dentre os vários que devem ser certificados.

    Agora o que não nos estranha é a terrivel necessidade da classe medico veterinária querer gerar reserva de mercado em várias áreas profissionais, como transferência de embriões e etc. Para o seu entender certificar um procedimento operacional de vacinação, manejo e controles qualquer um com capacitação e conhecimento faz. Seria ótimo que realmente existisse uma quantidade de veterinários para estar de “corpo-presente” em todas as propriedades brasileiras no momento da realização destes procedimentos sanitários. Sua colocação neste caso é de alguem que infelizmente não tem noção do tamanho da pecuária nacional.

    No caso da necessidade de se ter um responsável técnico veterinário nas certificaddoras é para que este possa (merecidamente) padronizar os manejos sanitários, para os técnicos de campo assim poderem orientar e acompanhar os produtores rurais.

    Concordo também que a demanda de trabalho para o veterinário anda mal, mas impor funções oportunistas neste momento de desenvolvimento da pecuária é vergonhoso !

    Atenciosamente,

  4. PAULO DE TARSO SILVEIRA disse:

    Caros leitores,

    A proposta, de que os serviços de inspeção, para fins de rastreabilidade, fossem feitos por médicos veterinários, é absurda. Seria o mesmo que exigir a construçào de um prédio por engenheiros.

    Além do mais, o serviço executado por um doutor, com certeza custaría muito mais caro.

    E a pergunta que não quer calar é: Quem pagará a conta? Parece que já ví este filme!!

  5. Thaís Tomázia Simão disse:

    Concordo com o colega zootecnista Marcelo Ribeiro. A sanidade é apenas um fator a ser certificado dentro de todo o processo de rastreamento e para atestar quais vacinas e tratamentos medicamentosos os animais vêm sendo submetidos, qualquer profissional bem treinado da área de agrárias poderá fazê-lo.

    Em vez de discutirmos quem deveria fazer o quê, deveríamos nos unir para aperfeiçoar o SISBOV, pois sabemos que este é extremamente necessário para garantir a segurança alimentar do consumidor final e para que o Brasil continue presente no mercado exportador de carnes.

  6. Paulo Vinicius da Costa Mendes disse:

    Se outros profissionais estão ocupando um espaço que é restrito do Veterinário é porque a propria classe permite…..

    Onde estão os conselhos regionais e o proprio CFMV, a anuidade que todos nós Veterinários pagamos é para que de uma forma ou de outra os interesses da Profissão sejam defendidos e honrados.

  7. Priscila Sales de Barros disse:

    Eu sou aluna formanda do curso de zootecnia da Unesp Jaboticabal e acho uma falta de competência de vários veterinários em querer pegar uma fatia do mercado de trabalho pelo diploma do curso que fez que pela capacidade de trabalhar.

  8. Joerley Moreira disse:

    Acredito que não houve debate sobre o tema por que da maneira como está exposto, fica clara a tentativa de indução de que apenas o Veterinário é o profissional certo para o tipo de trabalho.

    Gostaria de lembrar ao autor, que se ele ler a Normativa 47 com os olhos da profissionalização e não como uma disputa para tornar o SISBOV exclusividade do Veterinário, verá que a normativa fala em profissional especializado.

    O Veterinário tem exclusividade apenas para montar e ser responsável pela certificadora e não pela certificação, o que inclusive é uma falha do SISBOV com outras categorias.

    Caso ele discorde que o Zootecnista e o Agronômo com especialização em Zootecnia ou Veterinária também deva ser considerado outros profissionais de qualquer área, então deveria mobilizar-se para a eliminação destas categorias profissionais, ou será que o seu texto não transpareceu nada disso?