Por Renato Vilela Cunha1
O ano que se passou foi marcado pela introdução do SISBOV (Sistema Brasileiro de Identificação e Certificação Bovina e Bubalina) na pecuária bovina brasileira.
Seu início foi tumultuado, com divergências sobre quem deveria arcar com o custo deste processo e se a adesão ao mesmo deveria ser obrigatória ou facultativa. Aliás, essas questões perduram até os dias atuais.
Em meio a tantas confusões, na época o MAPA (Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento) determinou que, após 30 de setembro, só poderia ser exportada carne de animais inscritos no SISBOV há no mínimo 15 dias.
A data chegou e o MAPA seguindo a pressão dos frigoríficos, alterou as regras por várias vezes. Atualmente, a regra vigente é que o animal pode ser vendido como rastreado desde que devidamente identificado e a propriedade inscrita no SISBOV.
É claramente compreensível que pelo prazo dado pelo MAPA, seria impossível conseguir tantos animais para atender o mercado externo em tão pouco tempo. O intolerável é ver animais que nunca receberam controle nenhum, receber uma numeração escrita à tinta sobre o lombo e serem embarcados ao frigorífico como rastreados.
Essa “rastreabilidade de mentira” tem provocando profundo descontentamento em pecuaristas que aderiram ao sistema e que procuram seguir as regras tal qual foram definidas. Além disso, inibe a adesão de novos pecuaristas, uma vez que estes podem vender seus animais como rastreados tendo a mão apenas um pincel de tinta.
O resultado é que funcionando desta maneira, o setor nunca será capaz de formar um estoque de bovinos devidamente rastreados para atender o mercado externo.
Para um país como o Brasil, onde a conquista do mercado externo para a carne bovina é de extrema importância, essa “rastreabilidade de mentira” só serve para criar descrédito ao sistema e desconfiança por parte dos mercados compradores, que podem até adotar este argumento para embargo de nossa carne.
É preciso parar com essa enganação e cair na realidade. Está na hora de todos os elos da cadeia produtiva da carne se unirem e fazer a sua parte. Só assim poderemos encher o peito e falar com orgulho que possuímos um sistema de rastreabilidade bovina decente.
Se 2002 foi o ano de expectativa com relação à implantação do SISBOV, 2003 precisa ser o ano de afirmação do sistema.
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1Renato Vilela Cunha é pecuarista e engenheiro agrônomo
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Concordo plenamente.
Como tudo no Brasil do “jeitinho”, se não houver pressão da sociedade, as coisas nunca acontecem como devem ser.
Se o Brasil pretende ser um país exportador de carne, tem que obrigatoriamente ter um programa sério de rastreabilidade, coordenado pelo órgão mais competente para isso.
Acho que a maneira como foi colocado o assunto, generalizou os maus hábitos de alguma ou algumas empresas e ou produtores, que os executam.
Trabalho no Frigorífico Mercosul Ltda., única empresa exportadora para o Mercado Comum Europeu do RS e não só cumprimos fielmente as determinações como, além de incentivar os produtores a rastrearem seus animais, observamos o cumprimento das determinações.
Como incentivo aos produtores este frigorífico atua da seguinte maneira:
– Mantém convênio com uma empresa certificadora, a Planejar Brasil, que tem a sua disposição uma sala com todo o equipamento necessário, para o desenvolvimento do trabalho de um Médico Veterinário (funcionário da Planejar Brasil), que fiscaliza o serviço dos técnicos e emite diáriamente os certificados de rastreabilidade, apenas dos animais que chegarem identificados pelos brincos com código de barras, os quais são lidos e é dado baixa no sistema, imediatamente após ao abate.
– O frigorífico está pagando dois terços do valor correspondente ao cadastro do produtor no SISBOV e metade do custo da rastreabilidade e do identificador, sendo que, da metade que corresponde ao produtor, somente é descontado o valor correspondente aos animais abatidos.
– Todo o animal que chega rastreado ao frigorífico, recebe um acréscimo de R$ 0,02 por Kg de carcaça.
Gostaria de informar que as práticas descritas na reportagem jamais foram permitidas pela empresa certificadora a qual mantemos convênio e nem pelo S.I.F. 232, que inspeciona tais produtos.
Concordo plenamente com o Sr. Renato , e acho que o MAPA deve interceder a negociação entre produtores, frigoríficos e mercado consumidor .
Corremos o risco de cair em um descrédito total perante os mercados consumidores, devido ao sistema de rastreabilidade que foi implantado, ou tentado implantar.
Realmente é uma vergonha o que têm-se feito com o nome de rastreabilidade.
Prezado Renato
Aplaudo com entusiasmo o artigo “Rastreabilidade? Quando?”.
É lastimável que ao completar um ano, a partir da primeira instrução normativa, ainda estejamos no nível atual. Sou veterinário há 30 anos e finalmente acreditava que havia chegado o momento da maioridade da pecuária brasileira. Mas a julgar pelo “andar da carruagem” ainda temos muitas discussões pela frente até que tenhamos, de verdade, uma cadeia da carne onde todos os setores puxem para o mesmo lado.
Um abraço e parabéns pelo artigo.
Paulo S.T.da Cruz
Med.Veterinário CRMV-RS 0937
Caro Renato, no meu ponto de vista, entendo que deve ser explicado para o pecuarista, o porque desta rastreabilidade de mentira, que na verdade se chama rastreabilidade parcial, e que acabará quando tiver boi rastreado com idade de abate.
Pergunto: Como o Brasil vai exportar carne rastreada se os animais rastreados são muito novos? Por isto ocorre a parcial, o pecuarista que tiver boi rastreado quando terminar a parcial, vai pedir o preço que quiser pelo seu boi gordo.
Parabéns pela explanação desse problema, pois os frigoríficos estão tratando do assunto com muito descaso e possivelmente vão pagar caro junto com os pecuaristas o preço da falta de seriedade.
Se atingirmos um novo mercado para a carne todos ganham, principalmente os frigoríficos.