Boas previsões para cadeia da carne da Austrália
26 de agosto de 2004
Brasil exportará de 26 milhões de peles em 2004
30 de agosto de 2004

Rastreabilidade X identificação individual – Parte 2

Por Mário Alves Garcia1

Um dia destes, eu estava visitando uma fazenda a cavalo e o vaqueiro comentou comigo: “Olha lá o que o fulano fez no plantio da pastagem, perdeu tudo. Bem feito, foi fazer sem saber…”. Então perguntei: “Mas você viu e não falou nada”. E ele respondeu que o vizinho é muito aborrecido e não iria gastar tempo com ele. Fiquei pensando um pouco sobre o comentário e mesmo sabendo das dificuldades tentei explicar a ele que, a riqueza de um país é construída a partir das economias de cada um de nós e, quando alguém perde dinheiro, todos nós brasileiros perdemos junto com este alguém.

Você deve estar pensando neste momento o que tem ver este fato com o tema proposto. Pois vamos lá, além das dificuldades de um processo em construção que estamos vivenciando, temos várias pessoas solicitando que seja utilizado o seu processo de identificação que já existia.

Porém, acredito que valeria a pena sermos patriotas neste momento para aceitarmos as diferenças. Um sistema único é extremamente benéfico, porque? Vamos imaginar uma comissão internacional chegando ao Brasil para conhecer um sistema de produção e depara com um sistema alfa numérico que traz a combinação do código da mãe do bezerro, o mês e ano de nascimento, o pai e fazenda onde o bezerro nasceu. Bom… Bom e nada mais, porque em primeiro lugar, os anos se passaram e hoje temos os bancos de dados relacionais para guardar todos os registros relativos aos animais, não precisamos mais utilizar o animal para este fim. Agora imaginemos que a mesma comissão chegue ao Brasil e depare com todas as propriedades utilizando um sistema único de identificação, com tamanho e cor padrão nos brincos, colocados na mesma orelha, em 160 milhões de cabeças, qual a situação causa admiração?

E quanto poderá ser valorizado o nosso rebanho como um todo? Acho que muita gente não sabe, mas o Brasil foi o maior exportador de carne em 2003 (em quantidade), mas os americanos faturaram 3x mais com uma quantidade menor, porque? É claro que não é porque têm o tal sistema mas pela seriedade como conduzem as empresas americanas.

Ainda temos outros problemas, os animais registrados em associações de raças. Cada associação tem o seu sistema, umas são muito grandes, outras mais importantes e cada uma delas tem o melhor sistema de identificação. Agora imaginem, se nossos egos permitissem uma padronização de sistema de identificação, todos os alunos das escolas agrárias sairiam da escola sabendo o básico: como identificar um animal. Seria um ganho para o País? Facilitaria a execução de tarefas e auxiliaria na geração de empregos? Talvez sim, mas que ficaria muito mais barato e causaria uma ótima impressão eu não tenho a menor dúvida.

Muitas sugestões, algumas brilhantes, não têm tido como serem acatadas e nem discutidas porque ainda estamos discutindo a base do sistema que é a identificação individual. E o que não falta é o “cabo de guerra” com cada um fazendo força para um lado e quem sai ganhando com isso? A concorrência, os subsídios, as outras opções de fornecimento de proteína para as pessoas, enfim, todos menos nós.

E vamos a mais uma questão, a identificação dupla. É claro que para quem nunca identificou individualmente, a identificação dupla é incoerente. Mas sem esta alternativa, os animais que perderem a identificação única e receberem outro código, ficarão como fantasmas nos nossos bancos de dados (privados ou públicos) e a pergunta é simples: Quantos animais vocês têm? Não saberemos, teremos que contar no pasto. E ano após ano, estes fantasmas aumentariam. Alguém acha que este é um sistema que pode ser apresentado para o mercado mundial como sério? Não temos como saber nem quantas cabeças temos rastreadas…

Toda mudança causa transtornos para todos nós, mas a questão agora é de visão de como o mercado nos enxergará logo à frente. Não adianta o meu sistema de identificação excepcional estar em vigor, porque eu preciso que meu vizinho também seja profissional, para usufruirmos juntos das nossas conquistas: sanitárias, produtivas, reprodutivas, tecnológicas etc. Muitas das oposições que vemos hoje a qualquer alternativa proposta são oposições para “ser do contra” simplesmente, o que nos faz lembrar uma turma que passou muito tempo ocupada em estar se opondo a tudo e todos e depois teve que lutar para conquistar posições pelas quais se opunha até bem pouco tempo.

Então, brasileiros, precisamos decidir qual o nosso objetivo, competir internamente (com despesas) ou externamente (com receitas).

____________________________
1Mário Alves Garcia, Consultor em Produção de Bovinos de Corte, Equipe Prodap Consultores Associados S/C

0 Comments

  1. rodrigo cervoni disse:

    O ultimo parágrafo diz devemos lutar internamente? Lógico que não, devemos nos unir internamente, expondo nossa tecnologia externamente.

    Assim iremos crescer muito mais no mercado externo, apresentando lá um produto de ótima qualidade, tão quanto ao produto deles ou melhor que o deles, pois o meio em estamos trabalhando com nossos animais(rastreando)é o meio mais certo de termos um produto de primeira qualidade e sem criticas nenhuma.

  2. Miguel Barbar disse:

    Eu já comentei aqui em ouras explanações sobre a rastreabilidade e volto a frisar:

    1o Não foi um sistema adotado com esta finalidade (melhor controle e apresentação do rebanho como coloca o autor) mas sim para atender a necessidade de uma parcela da cadeia da carne (frigoríficos exportadores) como estes não repassaram a vantagem obtida com o rastreamento o mercado passou a encarar o sistema como custo e não como ganho;

    2o Como o sistema comoçou de cima para baixo (frigoríficos e governo) para atender a suas necessidades de trabalho esta muito difícil convencer o produtor de bezerros a rastrea-los (ele não recebe vantagem) outro que o faça. Aí voce acaba só rastreando a ponta final, o que me perdoe se estiver sendo duro, só resolve o problemas dos frigoríficos e não há benefício para a pecuária como um todo ou para o consumidor.

  3. João Francisco Colombo disse:

    Parabéns Mário, você discorre neste artigo sobre as coisas mais importantes para o crescimento e solidificação da produção agrícola no Brasil, o corporativismo entre os produtores e principalmente o sentimento de organização e modernização dos fatores de produção.

    Precisamos urgentemente nos espelharmos nos americanos, pois é o povo que mais leva a sério as regras.

    Um abraço

    João Francisco Colombo

  4. George Danielides disse:

    Nos momentos de crises raras são as vozes de lucidez e sabedoria. Com clareza e exatidão, Mário Alves Garcia mostrou a todos a que se resume o embate do Sisbov hoje.

    A opção pela modernidade, a profissionalização e o desenvolvimento da pecuária de corte, que irá garantir a consolidação do espaço conquistado no mercado mundial ou então, ….ou então o quê? Sinceramente, até hoje estou esperando de quem não acredita no sisbov, uma resposta que possa ser levada a sério para essa pergunta.

  5. Jucelino dos Reis disse:

    Senhor Mario Alves Garcia, o senhor é produtor? Ou apenas está interessado em reserva de mercado ?

    A rastreabilidade para ter sucesso, terá que ser opcional.

    Assim o boi rastreado poderá ter algum valor a mais que o outro. Quando eu souber que o meu vizinho de fato esta ganhando mais pela arroba, também farei a rastreabilidade.

    O que vemos hoje é boi rastreado sobrando, e um verdadeiro massacre contra o produtor que não aderiu ao SISBOV. Afinal este ainda é um país livre, garantido pelas disposições constitucionais que assim o estabelece. E de mais a mais Instrução Normativa não é Lei.