Leilão de Produção Carpa volta a oferecer touros com Manual do Proprietário
13 de outubro de 2006
Seca: fazendeiros australianos recebem auxílio
17 de outubro de 2006

Reforma agrária: omissão, o nosso pecado mortal

Lendo um pouco da história agrícola do Brasil, fiquei espantado pela verdadeira bagunça que foi criada em torno da reforma agrária e a quase ausência de profissionalismo agrícola, administrativo gerencial e desenvolvimentista nas discussões e elaborações legislativas, onde um certo tempero de sonhos, sentimentos de mea culpa e utopias se misturam com erros primários de concepção sobre o que fazer, como fazer, onde fazer e quando fazer.

Lendo um pouco da história agrícola do Brasil, fiquei espantado pela verdadeira bagunça que foi criada em torno da reforma agrária e a quase ausência de profissionalismo agrícola, administrativo gerencial e desenvolvimentista nas discussões e elaborações legislativas, onde um certo tempero de sonhos, sentimentos de mea culpa e utopias se misturam com erros primários de concepção sobre o que fazer, como fazer, onde fazer e quando fazer.

Os pensamentos, ações e canais de comunicações da sociedade, do governo e do MST e similares estão entupidos com o barulho político e emocional, confusão legal e infelizmente tem uma predisposição generalizada para não falar ou ouvir o que está precisando ser falado e ouvido.

Quem não faz, deixa a porteira aberta para que os outros façam

É uma lição antiga, mas muito atual e bem conhecida no futebol, porque quando o governo e a sociedade não querem assumir os seus respectivos papéis, alguém vai preencher a lacuna, e neste caso da reforma agrária, foi o MST e similares que levantaram vôo porque tinha espaço para voar. Se tornaram verdadeiras organizações com estruturas e vínculos políticos bem elaborados e respeitáveis e com planos de ação contundentes e bem comandados, mesmo em situações de graves excessos de violência física ou material.

A conivência e consentimento dos movimentos sociais nestas situações é o que atualmente mais me preocupa que, me parece, também, é o caso do PCC e do Comando Vermelho.

Na história, o nacional socialismo alemão (nazismo) é o exemplo mais claro e detestável resultante desta omissão da sociedade em geral, e a alemã em particular, e os governos na época.

Enquanto não tem um comprometimento de todos com o bem-estar geral da sociedade, sempre vai haver lacunas a serem preenchidas.

No caso do PCC e Comando Vermelho, me parece que se criou um poder paralelo na ineficiência, ou até ausência da sociedade e do governo no combate ao crime organizado, tráfico de drogas, armas, influência e poder (leia-se corrupção) e a impunidade; no outro lado, principalmente mirando a sociedade, a falta de compromisso em re-educar os infratores, de ter um tratamento digno nas prisões e instituições penais e de dar a chance de começar de novo depois de ter cumprido a pena.

Infelizmente hoje podemos falar que já estamos quase reféns destas organizações, o que é terminantemente inadmissível e prejudicial a todos, e pior, nós todos somos culpados por isso.

Caso semelhante está acontecendo na reforma agrária com os conflitos de terra e agressões às empresas agrícolas.

Omissão, nosso pecado mortal, é a grande responsável pela injustiça social, a miséria e fome, a violência na cidade e no campo, as drogas, as armas, a impunidade, as famílias destruídas, as mortes.

O In(c?)ra

Felizmente são poucas as vezes na história do Brasil que se conseguiu criar um verdadeiro monstro tipo Frankenstein, como o famoso INCRA, e tanto é que este participou na dança das cadeiras desde a sua criação, uma vez extinto, outra vez mudando de nome (MIRAD) e finalmente conseguindo um ministério exclusivo, parece que o Ministério da Agricultura foi forçado a se divorciar do desenvolvimento agrícola e reforma agrária, e aí se criou no mínimo mais sete cabeças para quem já era um monstro respeitável antes.

Faz muito tempo que a inclusão da letra C de Colonização é um mero ornato porque o instituto carece por completo o mérito de colonizar qualquer coisa, e pior, tem gente que quer substituir o C pelo F da Favelização rural e infelizmente em muitos casos com razão.

Esta é a chave da questão e a razão principal por que a Reforma Agrária não decola e por que o INCRA não está funcionado. Tornou-se um Instituto de IRA, Ódio e Incompetência.

Um outro grande erro é de que o INCRA é também o inventariante e catalogadora das propriedades rurais brasileiras com base na qual é arrecadado o imposto ITR.

É o proponente e o julgador de índices de produtividade e é de fato o instrumento da execução da política da reforma agrária. É mais ou menos como se fosse os cartórios de registro de imóveis e o IBGE responsáveis pela arrecadação de impostos e decisões sobre a desapropriação de bens.

Talvez é o maior responsável pela evasão de renda no campo, os problemas em convencer os pecuaristas a aderir ao Sisbov, pelo surgimento da MST e similares e a UDR, os fracassos de muitos assentamentos, a falta de políticas agrárias contundentes e, para mim, apesar de não ser advogado, as atribuições e funcionamento da INCRA são questionáveis em termos legais e até constitucionais, porque ferem o direito a propriedade e confidencialidade de dados colhidos, e pior, esparrama o medo no meio produtivo atrapalhando o bem-estar no campo e o desenvolvimento do país.

Não sei se há uma Câmara Setorial para a Reforma Agrária. Caso exista, não está funcionando e, caso não exista, deveria existir.

A discussão sobre o assunto se limita em MST, UDR e a bancada ruralista em Brasília, quando no mesmo tempo, fica claro que muitos dos 5.000 assentamentos, os quais aparentemente existem, não estão se enquadrando nas metas que foram estabelecidas.

Não há nenhum tipo de cobrança efetiva para que a gestão dos assentamentos cumpra as metas que foram acordados entre o INCRA e os assentados. Que muita gente esquece, é o fato de que o INCRA deveria efetivamente representar a sociedade, e por isso deve ser cobrado pelos resultados, afinal é dinheiro público que está sendo usado.

A primeira e, para mim, mais importante lição, é que não adianta fazer nada sem envolver e ouvir os sem-terra e os fazendeiros, as cooperativas existentes, os sindicatos tanto de empregados rurais como os patronais, os municípios, os estados etc.

Tem que ter um projeto envolvendo todos, e o poder público nos nível federal, estadual e municipal precisa ficar presente a partir da elaboração do projeto.

Em vez de simplesmente dar a terra, poderia se pensar na permanência da União como dono da terra desapropriada e a criação de cooperativas que dão a terra em comodato para os assentados.

Desta maneira, se acaba com o comércio de terras no assentamento, assegura a presença do poder público como dono e fiscalizador e será muito mais fácil de ter acesso a infra-estrutura, orientação agrícola, financiamentos com termos favoráveis, cuidados com educação e saúde.

0 Comments

  1. Liodeir Rodrigues Carvalho disse:

    Muito válido o questionamento, a sugestão ao debate e posicionamento; sair da zona da omissão. As sugestões de procedimentos certamente carecem de maior debate.

    Os agentes ou organizações certamente têm que ter representatividade coletiva e uma condição intrínseca a qualquer organização: legalidade jurídica.

    Até Associações de Bairro têm estatuto e diretoria; são legais. E os ´representantes` rurais têm legalidade jurídica: estatuto e diretoria.

  2. Polan Lacki disse:

    Prezado Sr Geer

    Parabéns. Felicito-o pelo realismo do seu artigo. Necessitamos combater a demagogia, a irresponsabilidade e a incompetência pois elas estão destruindo o nosso país.

    Saudações

    Polan

  3. José Luiz Nelson Costaguta disse:

    Artigo fabuloso e por demais elucidativo. É um verdadeiro caos. O que se vê é um emaranhado de confusões, e nós todos assistimos este desenrolar sem fazer e não poder fazer nada. Temos exemplos de Reforma Agrária em países bem ano nosso lado (ex. Uruguai), em que os envolvimentos se processam com a supervisão e execução de profissionais altamente classificados, e fazendo uma verdadeira justiça social.

    Qualquer venda de campo no Uruguai, passa 1º pelo INCA, e só e permitida a efetiva realização do negócio, se o mesmo não estiver interessado. As áreas quando distribuídas, não são doadas, e sim vendidas a longo prazo, e com uma extensão, de ha, que permita uma vida digna, além de promover emprego, se formarem propriedades, que efetivamente aumentarão a produção e a riqueza do país.

  4. Rodrigo Martins Ferreira disse:

    Realmente é necessário o envolvimento de todos, para que a reforma agrária seja uma realidade social bem conduzida, pois só assim conseguiremos esbarrar a favelização rural. Através de um bom planejamento, infraestrutura, orientação agrícola, financiamentos favoráveis para diversificar a agricultura familiar,com geração de emprego e renda e conseguirmos realmente uma melhor distribuição de renda e igualdade social, pois só assim a reforma agrária será viável. Não esquecendo do banco da terra para aqueles que querem comprar uma área para trabalhar a terra e não tem todo o valor que se faça por meios de créditos a longo prazo para realizar esse sonho.

  5. Lincoln Correia disse:

    No Brasil já foi feita a reforma agrária. Não precisamos de reforma agrária e sim de colonização, feita em parceria com o governo e a iniciativa privada. Incra fora, MST fora, não têm competência para fazer nada. Temos que despolitizar o tema.

    Irei recordar alguns exemplos de colonização, os quais tiveram a participação de agricultores e não pessoas utilizadas como massa de pressão ideológica, a saber:

    – Nova Mutum, Sinop, Matupá, Juruena, Alta Floresta, Lucas do Rio Verde;
    -Holambra, cidades do norte do estado Paraná (não vou citar o nome de todas pois não me lembro, mas quem não ouviu falar de Londrina, Maringá).

    Enfim, para quem conhece um pouco do Brasil sabe do que estou falando e para quem não conhece este lado da nossa história é só consultar internet, livros etc.

    Para quem mora nas grandes cidades e não percebeu ainda, a agropecuária sempre esteve na fundação das mesmas.

    Não é omissão da sociedade o problema da terra, mas de visão de vários governos que não tiveram nenhuma política responsável para o setor. A parte que coube ao agropecuarista foi feita e é feita hoje com muito sacrifício físico e psicológico.

    Resposta do autor

    Olá Lincoln,

    Muito obrigado pela sua carta. É sempre bom ter reações e opiniões diferente sobre este assunto da reforma agrária. Eu entendo que é um processo contínuo enquanto o Estatuto da Terra está em vigor, e ainda tem também muita terra ociosa na mão de poder público e também tem muita gente querendo trabalhar estas terras.

    Claro que todo mundo precisa estar envolvido e participar, continuo achando que a cooperativa e o comodato das terras serão a melhor solução.

    A sociedade tem que cobrar resultados porque é gasto o dinheiro público.

    Um abraço,
    Louis

  6. Mario Antonio Zanutto disse:

    Creio que as idéias apresentadas encontrarão eco!

    Peço até desculpas pelo lugar comum, mas sempre pensei da mesma maneira, inclusive já expus o mesmo tipo de idéia em sindicato; porém me fizeram calar porque a “idéia” seria “institucionalizar o comunismo – propriedade do Estado”.

    Creio que é um assunto que precisamos enfrentar, pois o Ministerio da reforma Agraria, recebeu no orçamento verba quase 4 vezes maior que o Ministério da Agricultura e Pecuária, isto tanto para extensão rural, sanidade animal, e tantos outras atribuições; menos de 1 bilhão de reais, para quase 4 bilhões.

    É o nosso dinheiro; é preciso até concordar com a reforma, mas principalmente com a seriedade com os investimentos que parecem ser sempre a fundo perdido, e põe dinheiro perdido.

    Aliás quanto foi gasto com a tal Reforma Agrária nos últimos 20 anos? Qual o resultado deste gasto?

    É preciso que toda sociedade saiba deste custo, comparando mesmo com Educação, Saúde e Segurança, e principalmente com a Agricultura, e comparar para o Brasil, para balança comercial brasileira, para os empregos dos brasileiros, quanto cada Real investido resultou.

    Parabéns pela clareza de suas idéias.

    Mario Antonio Zanutto

  7. Moacy Guilherme Botelho Coelho disse:

    Geer, parabéns pela matéria, muito oportuna pela qualidade e sugestões de como deveria ser a nossa tão sonhada e útil reforma agrária.

    Hoje, quando se fala em MST, o que primeiro surge em nossas mentes é confusão: luta armada, invasões, roubos. Em nossa região, tem alguns assentamentos sem nenhum propósito. Por culpa dos assentados? Não! Por culpa de um sistema viciado em corrupção, que não é de Hoje ou Ontem, mas de um sistema viciado.

    A troca do C pelo F, é uma constante, infelizmente em todos os amontoamentos de minha região, existe muito amontoado, com boas intenções! Famílias querendo produzir, trabalhar, mas sem nenhuma condição técnica financeira, ou seja em nome , de uma “reforma social” mandam esmolas, como alimento para para famílias famintas e desesperadas querendo produzir sem a menor condição técnica e esquecida a sua própria sorte.

    Hoje, acreditamos que para termos uma verdadeira reforma necessária e urgente para que possamos ser o celeiro do mundo como acreditamos que vamos ser, precisamos de imediato fazer um assentamento político dentro das administrações de todos os poderes, inclusive judiciário, com acompanhamento técnico, para que possamos aí sim, dá direção a nossa tão sonhada reforma social agrária. Onde todos temos o direito de cumprir missão de produzir, e termos a certeza de estarmos contribuindo para o Fome Zero e para o celeiro do mundo que com certeza seremos.

    Resposta do autor:

    Olá Moacy Guilherme,

    Muito obrigado pelo a sua carta e comentários que colocam o dedo no ferido e mostram de uma maneira clara que as famílias de “assentados” são as que sofrem mais com o descaso dos poderes públicos que acham que com esmolas e cestas básicas o problema é contornado.

    Brasil vai ser o celeiro do mundo e uma política agrícola moderna e abrangente é um requisito principal.

    Reforma agrária tem que fazer parte integral desta política numa maneira democrática e principalmente desenvolvimentista, que requer planejamento plurianual nos níveis municipal, estadual e federal e com uma reformulação total da Incra e a cobrança de resultados para onde foi gasto o dinheiro público.

    A sociedade tem que acordar para estas cobranças sem medo e cobrar serviços bem planejados e feitos pelo governo e suas instituições.

    Um abraço,
    Louis