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Retomada agrícola passa por melhor gestão de gastos do governo

Constatamos que o governo tem sim boa parcela de responsabilidade no tocante à crise que se abateu sobre importantes setores agrícolas. Ao cortar recursos de áreas que formam o alicerce do setor, ao demorar na liberação de verbas para auxiliar na comercialização e ao não compreender que somente tendo condições para produzir é que o agricultor saldará suas dívidas, o governo desmantelou a agricultura.

Muito tem se dito sobre a retomada da agricultura em 2007. Estima-se um cenário menos nebuloso, com previsão de recuperação gradual da renda. Estudo da Tendências Consultoria projeta alta de 15% na rentabilidade do agricultor. Por sua vez, dados da RC Consultores, apontam que a receita com os produtos agrícolas deve saltar dos R$ 101 bilhões em 2006 para R$ 112 bilhões neste ano.

O quadro formado por clima favorável nos principais pólos agrícolas, recuperação do preço dos grãos, manutenção da conjuntura positiva para culturas como café, citros e cana-de-açúcar, perspectivas para o fim de embargos relacionados às carnes, em especial bovina, e uma taxa de câmbio mais estável entre plantio e colheita sustenta as boas expectativas.

As cotações da soja estão, em média, 12% acima dos valores de janeiro de 2006. Já o milho atingiu recorde histórico de preços da última década. Segundo a Céleres Consultoria, a demanda mundial pela oleaginosa deve permanecer aquecida. Para o milho, as perspectivas são ainda melhores, haja vista o forte uso do cereal agora nos Estados Unidos, antes destinado apenas para alimentação humana e animal, também para produção de etanol, novidade que vem afetando rapidamente oferta e demanda, provocando impactos na formação de preços.

Com relação ao dólar, projeções indicam que a moeda deve encerrar 2007 perto de R$ 2,2. Como o plantio da atual safra de verão foi feito com o dólar na casa dos R$ 2,15, a tendência é que nesta temporada não haja descompasso nas cotações no período de comercialização. A estabilização do câmbio também fez o preço dos adubos cair cerca de 20% e dos defensivos recuar aproximadamente 30%.

Além disso, o produtor a cada dia aprimora a gestão da sua atividade, com estratégias de redução de custos, maior eficiência operacional e nas negociações. Exemplos são os “pools” para compra de insumos, onde se consegue barganhar melhores condições de pagamento, bem como o aumento das operações no mercado futuro, o que contribui para melhor proteção de preços.

Melhorar gastos

Entretanto, uma retomada sólida da agricultura, que coloque o setor na rota de um crescimento mais perene e sustentável, exige uma atuação mais rápida e assertiva também por parte do governo federal, especialmente, com relação ao destino dos recursos orçamentários.

A bem da verdade, muito dos principais limitadores da competitividade agrícola estão fora do segmento, embora tenham relação direta com seu desempenho, como é o caso dos fundamentos macroeconômicos relacionados à taxa de juros, câmbio e tributação. Porém, pregar mudanças nesta tríade é, por hora, cair no lugar-comum.

O mesmo não se pode dizer, por exemplo, da infra-estrutura logística, defesa sanitária e pesquisa rural, áreas cruciais para o êxito do setor, mas que se encontram em situação extremamente aquém do mínimo considerado satisfatório. São segmentos que com um direcionamento de verbas públicas mais cuidadoso e adequado poderiam apresentar melhores resultados, fortalecendo a competitividade e diminuindo vulnerabilidades da agricultura.

No caso da infra-estrutura, os investimentos governamentais somam apenas 0,15% do PIB, enquanto países como China e Índia investem de 3% a 4% na área, informa a CNA. Já no que diz respeito à defesa sanitária, o Brasil gastou em 2005 US$ 44 milhões, enquanto que Austrália, Nova Zelândia e França, por exemplo, desembolsaram US$ 140, US$ 47 e US$ 90 milhões, respectivamente, diz o estudo “Repensando as Políticas Agrícola e Agrária do Brasil”, de Fábio Chaddad, Marcos Jank e Sidney Nakahodo.

Além disso, os recursos originalmente dirigidos à defesa sanitária sofreram um corte médio anual de 12% entre 2000 e 2005. Por sua vez, o mesmo relatório diz que o orçamento da Embrapa diminuiu em 30% caindo de R$ 1,4 bilhão para R$ 1 bilhão de 1996 a 2005. Em contrapartida ao arrocho imposto a setores-chave da agricultura, programas sem acompanhamento de resultados, como Pronaf e assentamentos de reforma agrária tiveram aumento de verbas.

Para se ter idéia da diferença de tratamento, segundo levantamento feito pelo jornal “Valor”, a partir de dados do Siafi (Sistema de Acompanhamento de Gastos Federais), o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) contou com R$ 3,6 bilhões em 2006 frente a R$ 828 milhões destinados ao Ministério da Agricultura. O Pronaf, que fica sob a tutela do MDA, recebeu mais de R$ 11 bilhões entre 2000 e 2005. Vale ressaltar que o setor produtivo rural é obviamente favorável a políticas de inserção às cadeias produtivas agrícolas, mas desde que haja acompanhamento dos gastos, que viabilizem a medição do retorno do dinheiro aplicado.

Com a análise destes dados, constatamos que o governo tem sim boa parcela de responsabilidade no tocante à crise que se abateu sobre importantes setores agrícolas. Ao cortar recursos de áreas que formam o alicerce do setor, ao demorar na liberação de verbas para auxiliar na comercialização e ao não compreender que somente tendo condições para produzir é que o agricultor saldará suas dívidas, o governo desmantelou a agricultura.

A febre aftosa voltou, os problemas de escoamento se agravaram, a pesquisa ficou paralisada. Mercados se fecharam, o frete aumentou e o fantasma da estagnação tecnológica apareceu. É imperativo que o governo reveja seu planejamento de gastos priorizando agora investimentos, como, por exemplo, o seguro rural, que beneficiem a agricultura como um todo, ela sim o agente multiplicador de oportunidades, renda e desenvolvimento para o País, deixando de lado o assistencialismo a grupos específicos.

Artigo originalmente publicado na edição de janeiro/2007 da revista Agroanalysis, publicado mediante autorização do autor.

0 Comments

  1. Vantuil Caneiro Sobrinho disse:

    Volto a ler este artigo do Dr. Cesário, já publicado anteriormente, o qual mais uma vez alerta o Governo Federal para as suas responsabilidades para com o setor, conforme o estilo educado mas aguerrido que é característica dessa liderança.

    Infelizmente não estamos vendo, conforme tem afirmado o autor, maiores providencias no sentido de reverter ou pelo menos minimizar os estragos ocorridos pela Febre Aftosa.

    É lamentável abrir jornais e deparar com fotografias de nossos postos de fronteira, sem portas, crivados de balas, funcionários carregando bujões de gás para iluminação etc. etc.

    Não se trata de mau agouro mas a continuar assim sem que os responsáveis pela condução da pecuária no pais demonstrem maior preocupação (após o incêndio ter sido apagado) que não surja, Deus que não permita, um novo problema nas fronteiras secas do Centro – Oeste.

    Diante de tanta indiferença só nos resta orar para que vozes como a do Dr. Cesário cheguem antes de novo desastre aos ouvidos das autoridades.

  2. Antonio Pereira Lima disse:

    Quando eu leio a palavra retomar, me lembro de uma conversa que tive com um dos meus peões, o Gonzaga.

    Estava eu no alpendre da fazenda, à tarde tomando uma cachaça e batendo um papo, falei para o Gonzaga:

    – Este ano nós vamos retomar Gonzaga.

    Foi quando ele me respondeu…
    – “Deus me livre, faiz treis ano que nóis só toma, vamo tomá de novo?”