Nova Zelândia: USDA prevê crescimento das exportações
3 de novembro de 2006
Grupo Gerdau lança Manual Prático de Montagem de Cercas na internet
7 de novembro de 2006

RML: em busca de touros “femeiros”

A eficiência produtiva das fêmeas tem grande impacto sobre a pressão de seleção a ser exercida, a taxa de desfrute e a rentabilidade dos programas. O índice proposto e descrito a seguir foi desenvolvido com enfoque na eficiência produtiva de vacas Nelore criadas a pasto.

Por Fernanda Varnieri Brito, Vânia Cardoso, Roberto Carvalheiro, Luiz Alberto Fries, Carlos Dario Ortiz Peña, Mario Luiz Piccoli, Vanerlei M. Roso, Flávio Schenkel e Jorge Luiz Paiva Severo¹

Inúmeros trabalhos apontam a importância e viabilidade de contemplar, em programas de melhoramento de bovinos de corte, critérios de seleção relacionados à eficiência produtiva das fêmeas (Barwick et al. 1995; Atencio, 2000; Garrick, 2006; entre outros). A eficiência produtiva das fêmeas tem grande impacto sobre a pressão de seleção a ser exercida, a taxa de desfrute e a rentabilidade dos programas.

Características relacionadas à precocidade sexual, longevidade produtiva, habilidade em desmamar bezerros sadios e de elevado desempenho, entre outras, determinam a eficiência produtiva das vacas. A decisão sobre quais características considerar e a importância a ser atribuída a cada uma delas é fortemente influenciada pelo sistema de produção e o genótipo a ser trabalhado. Para vacas Nelore, por exemplo, não há interesse normalmente em enfatizar a característica facilidade de parto no processo de seleção pois, no geral, a mesma não se constitui em problema.

O índice proposto e descrito a seguir foi desenvolvido com enfoque na eficiência produtiva de vacas Nelore criadas a pasto.

Quais características contemplar no Índice?

Ao se falar em eficiência produtiva de vacas Nelore é importante ter em mente que estamos tratando de um biotipo extremamente adaptado ao nosso clima e às nossas condições predominantes de criação, caracterizadas por pastagens de baixo valor nutritivo, por longos períodos de seca e de restrição alimentar, pela presença de parasitas e de outros fatores que ocasionam ambientes desafiadores.

Além de adaptadas/resistentes, as vacas Nelore são: longevas – não é raro o caso de vacas que, sob monta natural, geram mais de 10 bezerros em sua vida produtiva; apresentam peso adulto moderado, o que lhes confere menor custo de mantença e maior eficiência produtiva em condições de restrição alimentar, em comparação com vacas de maior porte (Jenkins e Ferrell, 1994); e possuem boa habilidade materna, conforme evidenciado, por exemplo, por Cardoso (2004) que observou efeito aditivo materno positivo sobre o desempenho de bezerros cruzados (Braford) criados a pasto quanto maior a proporção de genes da raça Nelore de suas mães.

Torna-se fundamental, portanto, que o estudo e a proposição de índices que visam aumentar a eficiência produtiva de vacas Nelore contemplem características que sejam economicamente relevantes aos nossos sistemas, não deixando de considerar, entretanto, as qualidades que já lhe são inerentes.

As características que compoem o índice proposto no presente trabalho são: permanência produtiva, precocidade sexual, produtividade (desempenho da progênie) e custo estimado de mantença. A seguir, mais detalhes e o motivo da inclusão de cada um dos componentes são fornecidos.

1) Permanência produtiva: longevidade produtiva não é uma característica preocupante para fêmeas Nelore que concebem a primeira cria até os 3 anos de idade e reconcebem quando primíparas aos 4 anos. Entretanto, muitas fêmeas nascidas no rebanho não chegam a essa fase por falha reprodutiva. Diante disso, optou-se por considerar como permanência produtiva no índice o número de partos até os 4 anos de idade. Além de contemplar o período crítico de reconcepção das primíparas, a avaliação da permanência produtiva até os 4 anos também permite a antecipação da avaliação genética dos touros baseada em dados da sua progênie, em comparação com outras características de permanência como a “stayability” aos 6 anos.

2) Precocidade sexual: ao considerar toda a variabilidade genética existente por incluir na avaliação todas as fêmeas nascidas no rebanho, resultados de pesquisas (ex.: Atencio, 2000 e Eler et al., 2002) evidenciam que características associadas a precocidade sexual apresentam herdabilidade expressiva e, consequentemente, responderiam bem a seleção. No presente índice, um ponderador econômico calculado como uma função da idade da vaca ao parto foi utilizado como característica associada a precocidade sexual. Um ganho de 1% ao mês foi atribuído aos produtos de fêmeas precoces em relação a fêmeas “padrão” (vacas com o primeiro parto aos 36 meses e o segundo aos 48 meses).

3) Produtividade: considerada no índice como o desempenho predito da progênie calculado como uma função das DEPs para Ganho de Peso, Conformação, Precocidade e Musculatura. As DEPs das vacas foram utilizadas ao invés do próprio desempenho dos bezerros para que o mesmo fosse corrigido para efeitos ambientais, e não dependesse do mérito do touro com que a vaca foi acasalada. Objetivou-se com a inclusão desse item identificar vacas que produzem bezerros com maior ganho de peso e melhor composição da carcaça.

4) Custo estimado de mantença: o custo de mantença das vacas, responsável por grande parte dos custos totais envolvidos no sistema de cria, é considerado no índice como uma função do peso adulto e do consumo estimado de matéria seca. A inclusão deste componente justifica-se pela busca de aumento da produtividade sem o aumento de custos e sem uma possível resposta correlacionada negativa na fertilidade das vacas em decorrência de um peso adulto elevado – em desequilíbrio com o sistema de produção.

A expressão do índice proposto é uma medida aproximada do retorno mensal “líquido” (RML) estimado em kg de peso vivo produzido por fêmea. O retorno estimado é avaliado não apenas quanto ao peso, mas também quanto à composição deste peso, uma vez que as DEPs das características conformação, precocidade e musculatura são contempladas no cálculo do índice. Optou-se por expressar o índice numa base mensal no intuito de fornecer um valor que possa ser utilizado como critério inicial/rudimentar de avaliação da viabilidade econômica da atividade, podendo ser comparado com outros investimentos. Mais detalhes sobre a composição e o cálculo do (RML) podem ser encontrados em Carvalheiro et al. (2005a,b) e Pimentel et al. (2006).

Alguns resultados do Índice proposto

Dados de aproximadamente 80.000 fêmeas da raça Nelore, de fazendas participantes do programa Conexão Delta G, foram utilizados para avaliação da adequação do índice em diferenciar as fêmeas quanto às características de interesse. Na Tabela 1, são apresentados os valores de RML para fêmeas de diferentes classes, conforme o número de partos até os 4 anos de idade, a idade ao primeiro parto e o desempenho da progênie.

Tabela 1. Valores médios de RML para fêmeas de diferentes classes.


* Foi considerada como precoce a fêmea com idade ao primeiro parto menor que 31 meses.
** Para as fêmeas nascidas no programa que não se tornaram vacas (nº de partos=0), a classificação como inferior ou superior é referente ao seu próprio desempenho predito.

Contrastando as classes, é possível observar que fêmeas com maior número de partos apresentaram maiores médias de RML, sendo o mesmo resultado observado para as fêmeas com parição precoce e com bezerros com maior desempenho predito.

Numa base anual, o retorno estimado de vacas da classe “2n+”, por exemplo, seria de 97,2 kg (±R$190,00/ano), após descontado o custo estimado de mantença.

Apesar de não proferir a oportunidade de continuidade do sistema de cria e de prejudicar a pressão de seleção a ser exercida, as fêmeas que não geraram produtos tiveram RML médio positivo (em torno de 3,5 kg), decorrente de seus próprios ganhos de peso e descarte/abate. Se demais custos do sistema de produção, além daquele associado à mantença, fossem considerados no cálculo do índice, as fêmeas falhadas possivelmente apresentariam RML negativo.

O resultado do contraste entre as classes “1p+” e “2n-” indica que não basta a fêmea ser precoce e produzir bezerro com mérito superior se ela não apresentar permanência produtiva. Comparando as médias de RML entre as classes “2n+” e “2p-“, é possível observar que vacas precoces com progênie de mérito inferior apresentaram retorno semelhante ao de vacas não precoces com progênie de mérito superior.

O RML das fêmeas que produziram 3 produtos até os 4 anos de idade aponta vantagem considerável de aumentar um ciclo de produção reduzindo a idade ao primeiro parto para em torno de 2 anos. Cabe salientar que, no conjunto de dados analisado, as poucas fêmeas que se enquadraram nessa classe não foram suplementadas ou receberam tratamento preferencial. No caso de custos adicionais para o desafio das fêmeas em idade jovem, o RML deveria ser recalculado e o contraste entre o ótimo biológico e o ótimo econômico deveria ser apropriadamente avaliado.

Com relação à avaliação genética dos touros, ao contrastar os touros deca 1 (10% superiores) com os touros deca 10 (10% inferiores) para a DEP RML, observou-se que:

1) touros deca 1 apresentaram filhas com maior permanência produtiva do que os touros deca 10. As proporções de filhas com 0, 1, 2 e 3 partos (até os 4 anos de idade) foram, respectivamente, iguais a 33,1, 22,7, 44,1 e 0,1% para os touros deca 1, e iguais a 93,5, 4,4, 2,1 e 0,0% para os touros deca 10;

2) touros deca 1 apresentaram maior proporção de filhas sexualmente precoces (24,3% das filhas com idade ao primeiro parto menor que 31 meses) em comparação com os touros deca 10 (0,1%);

3) as filhas dos touros deca 1 apresentaram performance predita da progênie 3% superior em contraste com as filhas dos touros deca 10.

Em decorrência dos resultados anteriores, os touros deca 1 apresentaram filhas com retorno mensal “líquido” estimado (6,7 kg/mês) 81% superior em relação ao retorno estimado das filhas dos touros deca 10 (3,7 kg/mês), com diferença esperada nas futuras filhas igual a 3,0 kg/mês. Considerando @=R$60,00, essa diferença esperada seria de aproximadamente R$72,00/filha/ano. Mais resultados referentes à DEP RML podem ser obtidos nos Sumários de Touros Conexão Delta G e Aliança Nelore 2006.

Aplicação do índice

Na prática, o grande fator responsável pelo descarte de fêmeas são as falhas reprodutivas (e este também é o maior componente do RML). A DEP para RML não teria, portanto, como principal finalidade a seleção de fêmeas. Seu uso é recomendado para: selecionar/identificar touros que deixam uma contribuição genética expressiva para o rebanho (grande proporção das filhas nascidas permanecem produzindo -e bem- por vários anos), como informação auxiliar no direcionamento de acasalamentos, e na identificação de vacas para fazer parte de programas MOET.

Touros com maiores valores de DEP RML são desejáveis pois tendem a produzir filhas com menor idade ao 1º parto, maior permanência produtiva no rebanho, menor custo de mantença e que produzem bezerros com maior ganho de peso e melhor composição da carcaça em termos de conformação, precocidade e musculatura. São os chamados touros “Femeiros”, que constroem o “casco” dos rebanhos.

Referências citadas

Atencio, A. M. Predicción genética de la fertilidad en la hembra cebu. In: Congreso Internacional CEA, 20., 2000, Asunción, Anales… Asunción: 2000, p.29-42.

Barwick, S. A., Henzell, A. L., Goddard, M. E. Beef breeding for cow fertility: when is it important? Proc. Australian Association of Animal Breeding and Genetics. 1995. 11:443.

Cardoso, V. Direcionando acasalamentos para maximizar a média do valor genotípico de uma futura safra. Tese Doutorado. FCAV-UNESP-Jaboticabal. 2004.

Carvalheiro, R., Severo, J. L. P., Queiroz, S. A., Fries, L. A. Protótipo de um critério de seleção visando aumentar a eficiência produtiva de vacas de corte: I – Índice proposto. In: reunião anual da SBZ, 42., 2005a.

Carvalheiro, R., Severo, J. L. P., Queiroz, S. A., Fries, L. A. Protótipo de um critério de seleção visando aumentar a eficiência produtiva de vacas de corte: II – Comparação de índices alternativos. In: reunião anual da SBZ, 42., 2005b.

Eler, J.P., Silva, J.A., Ferraz, J.B., Dias, F., Oliveira, H.N., Evans, J.L., Golden, B.L. Genetic evaluation of the probability of pregnancy at 14 months for Nellore heifers. Journal of Animal Science. 80: 951-954. 2002.

Garrick, D.J. Genetic Improvement – Assessing the ramifications of genetic change. 8th WCGALP, Belo Horizonte, MG, Brasil. 03-17. 2006.

Jenkins, T. G., Ferrell, C. L. Productivity through weaning of nine breeds of cattle under varying feed availabilities: I. Initial evaluation. Journal of Animal Science. 72:2787-2797. 1994.

Pimentel, E.C.G., Carvalheiro, R., Severo, J.L.P., Queiroz, S.A., Fries, L.A. Combining phenotypic and genetic information into a selection criterion to improve beef cow efficiency. 8th WCGALP, Belo Horizonte, MG, Brasil. 03-73. 2006.

_______________________________________
¹Equipe do GenSys

0 Comments

  1. Carlos Magno Pereira disse:

    Parabéns Equipe (Gensys) pelo trabalho, o qual vem desenvolvendo em prol da pecuária brasileira. Estou na expectativa c/ a Dep (RML), a qual está sendo implantada – também – dentro do Programa (PAINT) pelo Dr Fries do qual, faço parte com trabalhos junto ao Parceiro (Cond. Itaverá).

    Sucessos!!