Kidman confirma processo separado de venda de uma das maiores propriedades rurais da Austrália
14 de dezembro de 2015
Diferentes valores no mundo corporativo – Por Marcos Sawaya Jank
14 de dezembro de 2015

Sem BNDES, perderíamos bonde das exportações, diz Marfrig

Confira abaixo entrevista de Marcos Molina, fundador e presidente do conselho de administração do Grupo Marfrig, para a Folha de São Paulo.

Esta crise é mais política ou econômica?
Marcos Molina – Um misto dos dois. Mesmo sem a questão política, seria preciso haver o ajuste. O ajuste afetou a política, e a crise política gerou a falta de confiança. É um pouco de cada e a soma de tudo.

O desaquecimento veio até antes da crise política. O ajuste foi anunciado e todos o esperavam. O pior é que ele não foi feito. Aí, todas empresas seguraram o investimento e piorou a situação ainda mais.

E o que precisa ser feito?
Primeiro recuperar a parte política e, assim, a confiança. Precisa do ajuste para arrumar as contas do governo. É um trabalho de curto para longo prazo. Não tem como resolver hoje sem ajuste.

A presidente Dilma e o ministro Levy têm condição de tocar?
Está é a função do Levy. Ele tem competência e entende disso.

Por que a inflação não cai? Os juros já não dão resultado?
A taxa de juros está segurando a inflação. Com a economia do jeito que está, é questão de meses para a inflação voltar ao normal. Vamos ver como serão as vendas de final de ano. Não há o que segure mais a inflação do que o baixo consumo.

Qual é o impacto do câmbio nos negócios?
No Brasil, o setor em geral faz 80% para venda de mercado interno e 20% exportação. Nos últimos cinco anos, com o dólar fraco como estava e o mercado interno forte, era melhor vender no mercado interno do que exportar. Tirava um pouco da nossa competitividade internacional. Agora, com o dólar alto, isso se reverte. Nós, na Marfrig, chegamos a 35% de exportação contra 65% no mercado interno. Hoje invertemos.

E o preço dos ativos? O Brasil está em liquidação?
Em um período curto, o dólar saiu de R$ 2,40 para R$ 4. Toda vez que acontece uma alta dessas, o valor dos ativos em reais demora para se equalizar. Hoje tudo, ação, ativos, tudo o que está em reais fica atrativo para comprar em dólar. O ponto é o seguinte: pode ficar mais atrativo se a desvalorização do real aumentar? É o timing.

Está barato e ainda não tem um fluxo grande de compra de ativos por estrangeiros no Brasil, principalmente por causa da crise política. Mas, assim que passar a crise política, vai ter recuperação. Não sei se o dólar cai um pouco ou se os ativos sobem um pouco, mas acho que essa distância que existe hoje não vai ser duradoura.

Qual é o maior gargalo do Brasil?
Além da crise política e de confiança, a infraestrutura logística é muito ruim, de portos a estradas. Tem toda a parte burocrática também. E o problema da guerra fiscal entre Estados. Às vezes, parece que cada Estado é um país diferente, no caso do ICMS. Para fazer gestão, fica muito complexo.

Nós temos um custo de seguro e acompanhamento de carga que é uma conta muito grande. A Marfrig hoje opera em dez países, fora o Brasil, e neles esse custo é zero. Entre seguro e monitoramento, temos uma conta de quase R$ 10 milhões por ano. É custo Brasil.

Com tudo isso, a gente ainda sobrevive. Na hora que o Brasil conseguir resolver esses pontos, a gente fica muito mais competitivo, eficiente e atrativo para investimento externo. Mudanças deveriam ser feitas muito forte na questão de simplificar os impostos e a burocracia.

Como o empresário pode contribuir?
Tem que cobrar o governo e os órgãos. Mostrar, através das associações, e cobrar um compromisso para termos um custo Brasil menor.

Teremos mais um ano difícil?
Tudo vai depender de se vai vir o ajuste, se vai resolver a política. Se resolvesse tudo isso essa semana, poderia reequilibrar o consumo. A gente não sabe ainda qual vai ser o tamanho do ajuste. Se fizer todo o ajuste, será que vai ser tão duro que vai retrair ainda mais a economia? Não dá para medir nesse momento.

No cenário da empresa, por outro lado, temos um mercado interno mais fraco, mas nossas exportações estão mais competitivas e crescendo. Estamos crescendo na China, um mercado que abriu há pouco tempo. Temos uma base importante lá há 25 anos através da Keystone. E para o primeiro semestre de 2016 tem a abertura do mercado americano, onde nós temos toda uma estrutura para exportar para os EUA e onde temos oito fábricas processadoras. Estamos crescendo muito na Ásia e principalmente na China.

Sobre BNDES, o financiamento para processo de internacionalização secou neste ano.
Acho que faz parte do ajuste geral. E não é só o BNDES. A grande abertura e internacionalização não foi só através do BNDES. Basta ver o que veio de investidor e de bancos para o Brasil apoiando as empresas para entrar na Bolsa.

Muitas empresas que abriram capital, tiveram o apoio BNDES, que entrava com uma parte para incentivar o mercado. Nesse último ano, que IPO teve? O mercado está muito devagar.

A grande verdade é que as empresas brasileiras precisam sair para ser competitivas globalmente. As grandes empresas americanas e europeias cresceram para outros países e beneficiaram seus países de origem.

Pega a parte de grãos, que o Brasil produz muito: a parte comercial está toda na mão de empresas americanas, europeias ou chinesas. Na carne, o Brasil já tem a comercialização na mão. Temos unidades na China e nos EUA, onde a gente coloca valor agregado no produto. Não depende mais de uma trading estrangeira. As que faziam negócio de carne praticamente sumiram.

Imagine se não tivesse essa internacionalização do nosso setor, agora que a exportação vai ficar interessante. Imagine se tivessem vindo para cá essas empresas estrangeiras, que não vieram porque teve uma crise lá na mesma época Se tivessem vindo para cá e comprado ativos brasileiros, o Brasil não teria nada disso. Seria um simples produtor.

Tem muita crítica por causa da política, mas tem o lado positivo também que ninguém está falando. Não pode medir só o negativo.

Qual é o balanço que o sr. faz hoje da política de campeões nacionais no seu setor? Foi positiva?
No final, não tem essa história de campeão nacional. No nosso setor, a abertura de capital só três empresas tiveram a competência de fazer. Conseguiram captar dinheiro do exterior e fazer mais, saindo na frente dos outros e no timing correto. Depois, essa janela se fechou.

Hoje a Marfrig está em 11 países, tem 29 mil funcionários e possui 44 unidades de produção, exportando para mais de cem países.

Fonte: Folha de São Paulo.

Os comentários estão encerrados.