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Silagem de capim: mitos e verdades

Por Thiago Fernandes Bernardes1 e Gustavo Rezende Siqueira2

Recentemente a equipe do BeefPoint, coordenada pelo Miguel da Rocha Cavalcanti, publicou pesquisa sobre os 50 maiores confinamentos existente no Brasil e as características que os compõe, clique aqui para ler. Dentre os volumosos conservados destinados à alimentação dos animais, a silagem de capim esteve presente em 36% das propriedades.

Este fato pode ser comum para alguns, mas ele acaba nos surpreendendo pelo fato de tantas interpretações errôneas que essa opção de volumoso sofreu ao longo destes últimos anos, algumas maléficas e outras benéficas, podendo citar: elevada produção, perenidade, menor custo, baixo risco de perdas e maior flexibilidade na colheita. Desse modo, o texto a seguir fará inferências a alguns mitos e a algumas verdades que essa opção forrageira possui dentro dos sistemas de produção de carne e leite no nosso país.

Como começamos e onde estamos?

O uso da silagem de capim na alimentação de bovinos no Brasil não é recente, já que desde a década de 60 houve grande difusão do capim-Elefante como fonte de forragem, a principio, utilizado como capineira, e em seguida, utilizado para a ensilagem. Até o momento, esta espécie continua tendo espaço neste cenário, porém com a busca por outras espécies que apresentam manejo do pasto mais facilitado e por métodos de cultivo onde ocorra a implantação por sementes as espécies Brachiaria decumbens, Brachiaria brizantha cv. Marandu, Panicum maximum cv. Tanzânia e Panicum maximum cv. Mombaça vem ganhando espaço atualmente. Estes cultivares lançados mais recentemente apresentam algumas vantagens frente ao capim-Elefante em relação à fermentação, como o teor de matéria seca no momento da colheita mais elevado (22% versus 16%). Entretanto, o teor de carboidratos solúveis é inferior nas espécies de Brachiaria e de Panicum.

Em meados da década de 90, houve a retomada da ensilagem de capins tropicais dentro do sistema agrícola, pois até o momento havia falta de máquinas apropriadas para o corte das plantas de alto potencial de produção, onde até então o corte era realizado com equipamentos específicos para a colheita de milho e sorgo (máquinas de uma linha).

Algumas empresas nacionais passaram a desenvolver e produzir equipamentos de maior capacidade operacional (Tipo Tarup, sistema de “faca louca”), e conseqüentemente, diversas propriedades adotaram a ensilagem de capins tropicais como alternativa para suplementação volumosa dos animais no período seco do ano. Entretanto, alguns técnicos que optaram pelo uso de silagem de capim, foram desestimulados a continuarem com essa opção, pois o planejamento de produção de volumosos dentro da propriedade, dificilmente era obedecido, pelas dificuldades encontradas na manutenção dos conjuntos mecanizados. Além deste fato, estes modelos adaptados de máquinas provenientes do exterior promovem tamanho de partículas que são consideradas impróprias tanto na compactação da forragem como para o consumo dos animais.

A partir de 2002, as empresas nacionais fabricantes de colhedoras para ensilagem de capins objetivaram a associação positiva entre o uso de máquinas e a adequada formulação de dietas, no sentido de um alimento com menor tamanho de corte, com a idealização de máquinas com sistema de corte na forma de disco. Entretanto, as máquinas que passaram a desenvolver tamanho de partícula menor, apresentaram redução na capacidade de colheita, que em geral os números obtidos no campo, apontam para 1/3 do rendimento dos modelos que cortam partículas maiores (modelos antigos tipo Tarup), ou seja, se a capacidade de colheita era de 30 t/h, esse rendimento passou a ser de 10-12 t/h. Além dos aspectos enumerados, deve-se considerar que os modelos do tipo Tarup promovem maior dilaceração da porção remanescente no campo, podendo comprometer os mecanismos de rebrota dos capins, já que a renovação ou até mesmo a recuperação do pasto não é uma operação de baixo custo.

Uso de aditivos

Como a insuficiência de carboidratos solúveis e/ou umidade excessiva, podem conduzir a uma fermentação desfavorável, técnicas de elevação de matéria seca como a adição de substratos absorventes e supridores de carboidratos, foram e são utilizadas como a polpa cítrica peletizada. Entretanto, quando um grande número de animais deve ser alimentado devendo-se produzir grande quantidade de silagem, a inclusão destes aditivos fica dificultada operacionalmente, limitando-se na maioria das ocasiões a pequenas e médias propriedades.

Quanto aos inoculantes bacterianos, estes abrangem a classe de aditivos com mais rápido desenvolvimento e adoção em todo o mundo, e no Brasil isso não é diferente, devido principalmente à facilidade de manipulação, ausência de toxicidade para os mamíferos e grande disponibilidade no mercado. Entretanto, os benefícios da inclusão de bactérias exógenos têm se limitado apenas a fase fermentativa, não refletindo na maioria das vezes na performance animal (ganho de peso e produção de leite), pois entre estes dois parâmetros existe uma fase de transição, a qual denominamos deterioração aeróbia. Quando as silagens são expostas ao ar, microrganismos oportunistas iniciam atividade metabólica, produzindo calor e consumindo nutrientes, revelando o desabastecimento do silo e o fornecimento da silagem aos animais como um importante dreno de matéria seca e energia durante o processo de ensilagem. Dessa forma, os nutrientes que foram preservados (carboidratos solúveis) ou produzidos durante a fermentação (ácido lático) pela presença de bactérias láticas, são degradados quando o silo é aberto, indisponibilizando-os para os animais.

Custo de produção

Sobretudo por causa da necessidade da pecuária se tornar mais competitiva, com redução de custos e aumento da produtividade a silagem de capim foi interpretada como estrategicamente interessante como reserva de alimento devido ao seu menor custo quando comparada como outras opções de volumoso suplementar, como pode ser observado na Tabela.


Fonte: Nussio et al. (2002)

Contudo não devemos pensar isoladamente no custo de produção da silagem e sim de maneira conjunta entre os componentes da dieta. Um exemplo de forma empírica seria: quando a silagem de capim é inserida numa ração para haver um ganho de peso da ordem de 1,2 kg/dia sua participação está em torno de 40% (base matéria seca) ou para haver produção de leite de 30kg/dia esta inclusão é perto de 35%. Entretanto, quando contrastamos com a silagem de milho, a participação do volumoso na dieta para uma vaca produzir esta quantidade de leite passa a ser de 55%, ou seja, o custo da tonelada de silagem de capim pode ser menor, porém os dispêndios na alimentação acabam sendo superior, devido à significativa contribuição de ingredientes concentrados na dieta dos animais. Por outro lado, se pensarmos em economia de escala, visando lucro por área (R$/ha), principalmente em locais onde o custo da terra é alto a silagem de capim passa a ser uma alternativa interessante, pois tem reflexo direto na produtividade por hectare, onde volumosos com alta capacidade produtiva possuem a tendência de diluir custos de implementos, adubos e manejo em geral.

Conclusões

O risco de não se efetivar a conservação de uma gleba é maior para capins tropicais quando comparadas a cultura de milho e sorgo para silagem, devido exatamente a maior produção de massa por hectare, maior desgaste das máquinas, falta de equipamentos dimensionados para as culturas rústicas e susceptibilidades a intempéries climáticas durante a colheita.

O manejo agronômico da cultura, a fim de se obter valor nutritivo satisfatório e com glebas de alta produtividade são práticas que justificaria o uso dessa forrageira como volumoso conservado aliado sempre ao processo de intensificação da produção de carne e leite em pastagens.

O manejo insatisfatório durante o processo de ensilagem não deve ser compensado pelo uso de aditivos, como tem sido entendido e divulgado. Se a opção for por fazer uso destes componentes, deve haver avaliação econômica considerando principalmente o desempenho animal.

Para que as margens de lucro não sejam pequenas ou até mesma negativa quando a silagem de capim for empregada, seria importante investir em gerenciamento (conhecimentos técnicos e financeiros), principalmente na compra de ingredientes concentrados, devido ao alto uso desses na formulação da dieta.
_______________________________________

1Thiago Fernandes Bernardes é doutorando em Zootecnia, UNESP/Jaboticabal
2Gustavo Rezende Siqueira é doutorando em Zootecnia, UNESP/Jaboticabal e pesquisador do APTA, Pólo de Colina, SP

0 Comments

  1. Fernando Luis Paes Fonseca disse:

    Se levarmos em consideração que o capim já se encontra formado na fazenda que só vamos aduba-ló para justificar a produção da massa, eu sou a adepto a silagem de capim.

    Como por exemplo, nas regiões do nordeste em que as vezes é difícil de se implantar uma lavoura de milho ou sorgo, com as irregularidades das chuvas ai se torna muito mais aconselhável a silagem de capim com uma diminuição dos riscos na perca dessas lavouras. Podemos sim trabalharmos com capins de melhores valores nutritivos e procurarmos cada vez mais melhorar a qualidade dessa silagem.

  2. Patrick Schmidt disse:

    Em primeiro lugar, gostaria de parabenizá-los pelo artigo e pelo trabalho desenvolvido.

    Contudo, gostaria de colocar um contraponto a idéia expressa em relação ao uso de aditivos para silagens de capim.

    Embora tecnicamente viável, o uso de aditivos microbianos em silagens de capim tem apresentado pouco ou nenhum benefício, tanto fermentativo, quanto em valor nutritivo do produto final. Embora o uso de enzimas fibrolíticas pudesse trazer uma “luz no fim do túnel” para esses aditivos, seu custo se torna proibitivo.

    Os resultados de pesquisas experimentais são bem claros em comprovar que o reduzido teor de açúcares solúveis limita a eficiência das bactérias inoculadas, por melhor que for o produto! Falta “bóia” para as bactérias crescerem!

    Por outro lado, temos acompanhado grandes propriedades, com volume de produção de silagem de capim acima de 2000 toneladas/ano usando aditivos absorventes (sequestrantes de umidade), como a polpa cítrica ou a casquinha de soja, de forma totalmente viável técnica e operacionalmente! Ou seja, o produtor que optar pela ensilagem de capins deve estar ciente que deixar produzir efluente (caldo) no silo é o pior negócio a ser feito.

    Mais uma vez verificamos que o produtor que trabalha com profissionalismo, e cuida com atenção dos pontos críticos na conservação, pode ter na silagem de capim um volumosos bom e barato.

  3. Rodrigo Mendonça Nascimento disse:

    Caro Patrick, acho que você poderia rever o que comentou sobre o uso de inoculantes e sobre o uso de aditivos.

    1) O uso de inoculante tem sim, um efeito muito satisfatório sobre a fermentação de silagens de capim “A CAMPO”. Silos experimentais (feitos em laboratórios ou local fechado), com toda certeza não te mostraram a verdadeira eficiência do inoculante, pois você elimina chuva, barro, terra, tempo de fechamento, compactação, manejo errado, dentre outros.

    2) A polpa cítrica como curiosidade, absorve três vezes seu peso em água, seria excelente quando se espera diminuir a umidade da silagem de capim, só que no ato da compactação ela libera 2/3 da água absorvida.

    Existe inoculantes específicos para silagem de capim que trabalha com alta quantidade de um complexo de glicídios, a fim de alimentar as bactérias contidas no produto.

    Resposta do autor

    Prezado Rodrigo,

    Sobre o uso de inoculantes, creio que os fatores chuva, barro, terra, tempo de fechamento, compactação e manejo errado, não justificam a eficiência das bactérias que são inseridas ao capim no momento da ensilagem.

    Os microrganismos são extremamente sensíveis a fatores adversos a sua especificidade de ação. Se a bactéria não vai bem em silos experimentais com todos os fatores ambientais em seu favor, que dirá tomando chuva e barro, isso são princípios de microbiologia.

    Eu relato no artigo, que alguns inoculantes comercializados têm eficiência na fermentação, porém, após a abertura do silo o que foi preservado (carboidratos solúveis) e o que foi produzido (ácido lático), acaba sendo comida de fungos e leveduras, que degradam a silagem. Por este motivo, as respostas no desempenho animal na grande maioria das vezes não têm sido alcançadas. E quanto maior for à eficiência da bactéria em produzir ácido lático, maior será este efeito, principalmente quando os silos são mal manejados (situação comum no Brasil).

    Para finalizar, digo que eu e o Patrick afirmamos os nossos relatos fazendo uso de silos experimentais (baldes) e de silos de grande escala. Pois, na Esalq e na Unesp nós também trabalhamos com animais confinados (silagem 365 dias no ano), além de várias fazendas que são acompanhadas na forma de consultoria e extensão. Algumas produzindo silagem com inoculantes e outras não.

    Atenciosamente,

    Thiago Bernardes