Por Louis Pascal de Geer1
Está na hora de fazer uma avaliação critica do SISBOV e sugerir alternativas e medidas quais possam clarear e dar um piso concreto para o verdadeiro pântano em que se encontra este assunto tão importante para a pecuária brasileiro.
As vantagens de uma identificação individual dos bovinos, não são devidamente analisadas, esclarecidas e discutidas em todos os níveis da cadeia de carne, e pouco se sabe sobre o que está sendo discutido pelo Câmara Setorial do Carne Bovina.
Os pecuaristas, com exceções, se opõem a identificação individual porque acham isso desnecessário, trabalhoso e caro e não enxergam qualquer vantagem…
Os frigoríficos, com raras exceções, não fazem a linkagem entre a identidade individual do animal e a carcaça na sala de matança, por não achar que são obrigados a fazer isto e não são devidamente fiscalizadas.
O papel que o SIF está fazendo em relação ao SISBOV é em geral deficiente porque contrário de que acontece com o combate e fiscalização de febre aftosa, na criação do SISBOV e certificadoras, os serviços públicos de sanidade animal foram ignorados pelo então governo FHC e seu ministro Pratini de Moraes, hoje presidente do ABIEC, provavelmente porque acharem que estes serviços não estavam à altura do empreendimento SISBOV.
Em vez de valorizar as Casas da Lavoura, ou Postos do Ministério de Agricultura e Abastecimento, e ignorar por completo os serviços de Inspeção Federal, optaram pelas Certificadoras que entraram como elo principal do SISBOV, no meu ver um erro monumental e conceitual.
Para piorar a situação se criou um diferencial de preço para o boi “rastreado”, que na realidade é uma farsa porque só se refere a um papel, sem o qual o frigorífico não consegue permissão para exportação da carne deste animal, este diferencial não tem muito a ver com a qualidade do animal, e este é o ponto chave da questão.
O atual sucesso das exportações brasileiras de carne depende exclusivamente do grau de confiança dos consumidores lá fora e o SISBOV teria que ser a base para isto.
Um dos esteios de confiança é que os produtores e indústrias certificam os sistemas de produção e manuseio vigentes e permitem auditorias nestes assuntos tanto nas fazendas como nos frigoríficos.
Temos, portanto a certificação da propriedade agrícola com seus sistemas de produção e manuseio, a identificação individual dos animais pelo SISBOV, e a certificação dos frigoríficos com os seus sistemas de manuseio e industrialização.
Aonde ir agora?
O primeiro passo sem sombra de duvida é colocar os frigoríficos como responsáveis total e integral por todos os produtos que eles produzem e vendem tanto no mercado interno como externo.
Não tem cabimento o que ocorre hoje, onde as certificadoras são as responsáveis pela origem e sanidade animal e fazendas.
Os frigoríficos, com exceções, geralmente não tem especialistas de produção e fiscais visitando os fornecedores de animais; os maiores frigoríficos compram a totalidade do gado para abate via telefone e atualmente fazem o jogo do papel SISBOV, e se perde assim oportunidades para melhorar a qualidade de nossa carne e dar informações exatas para o consumidor final, mas também para os fornecedores do gado abatido.
A linkagem da identidade individual do animal com seu número de identificação individual da carcaça deve ser feita logo na entrada do animal morto na sala de matança.
Esta simples medida possibilita uma avaliação da carcaça, como por exemplo: comprimento, peso, cortes nobres etc, que podem formar um conjunto de “DEPs frigorífico” e assim dando dados importantes para os criadores de touros e os pecuaristas e principalmente para os frigoríficos que podem começar a avaliar o quanto necessária estes informações são para eles também.
A grande vantagem sobre avaliações feitas atualmente em animais vivos é que os dados da carcaça são muito mais exatos, principalmente quando são usados meios eletrônicos de medidas, cálculos etc, e o grande problema de maciez, a quantidade de marmoreio podem ser analisadas com mais segurança.
Os frigoríficos começarão a ter uma idéia sobre o valor real que pode ser pago pelo animal com base da estimativa de venda da carcaça e os criadores podem chegar a uma DEP $ dos animais.
Também é possível desta maneira rastrear o carne até o animal individual que permite a criação de um vínculo entre os consumidores finais, processadores e pecuaristas e incluir até os criadores dos animais.
No meu ver é este o ponto chave de questão: como conseguir resultados positivos sustentáveis para todos os componentes da cadeia de carne bovina.
Atualmente, uma grande parte dos produtos exportados passa infelizmente pela intermediação de importadores, mas com o rastreamento realmente funcionando, isto se tornará desnecessário porque podem ser criados vínculos diretos entre os processadores e os pontos finais da venda. Sem duvida teremos um adicional grande de preços.
A qualidade não tem custo, mas valor agregado, e a falta de qualidade têm custos enormes.
Está na hora de acordar e agir enquanto o mercado está ainda benevolente com nós aqui no Brasil.
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1Louis Pascal de Geer atualmente é consultor, trabalhou durante 28 anos para Agropecuária CFM Ltda, se aposentando como vice-presidente da empresa.
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O nosso sistema de defesa sanitária é precário, onde às vezes os veterinários não tem nem combustível para rodar e fazer uma fiscalização.
Contudo, ainda seguram as pontas e estamos em Goiás há nove anos sem nenhum caso de febre aftosa.
Não fazemos rastreabilidade e sim identificamos os animais dois meses antes do abate.
Realmente o mercado está sendo benevolente conosco.
Nos tornamos o primeiro exportador de carnes por competência ou por pura sorte de não aparecer um foco de febre aftosa ou “vaca louca”?
Concordo plenamente com o artigo do sr. Louis Pascal.
Hoje o produtor rural, em grande maioria, está enxergando a rastreabilidade como negócio, uma forma de ganhar dinheiro.
As contramedidas (tão comemoradas) que a CNA impôs ao processo de rastreabilidade, a queda da obrigatoriedade e a falta de visão a logo prazo poderão atrapalhar em muito o nosso projeto de exportação.
Na verdade hoje para se conquistar novos mercados, não basta mais ter qualidade e sim ter confiabilidade na informação, transparência e credibilidade junto às instituições internacionais.
A certificação de boas práticas de produção, segurança alimentar, responsabilidade social e principalmente os cuidados com o meio ambiente, hoje são tão importantes quanto a imagem e a qualidade inerente ao produto.
Um exemplo disso é o nosso vizinho Uruguai. Embora seu maior cliente não seja tão exigente quanto à rastreabilidade, já está tratando de aperfeiçoar seu sistema e investindo num ambicioso projeto de identificação individual por radiofrequência. Este esforço com certeza não será em vão, pois o Uruguai é sinônimo de segurança alimentar e este projeto indica que eles estão preocupados com o futuro e em manter essa imagem perante o mundo.
Será que estamos muito distantes de tal realidade? Quando será que o pecuarista brasileiro irá levantar os olhos e enxergar o cenário que está logo ali atrás do frigorífico?
Enquanto não pensarmos em tomar medidas que irão nos beneficiar à logo prazo, não iremos nos diferenciar junto a nossos clientes e com certeza estaremos condenados a participar de mercados de segunda classe.
Citando o texto:
“A linkagem da identidade individual do animal com seu número de identificação individual da carcaça deve ser feita logo na entrada do animal morto na sala de matança. Esta simples medida possibilita uma avaliação da carcaça, como por exemplo: comprimento, peso, cortes nobres etc…”
Talvez não seja tão simples assim, sendo a desossa um processo de desmontagem, levar a indentificação para todas as peças produzidas, é de uma complexidade prática, até hoje não resolvida no mundo, pricipalmente em plantas que abatem de 1000 a 2000 animais dia.
Parabéns pelo texto.
Muito interessante este artigo.
O que mais me deixa preocupado, é ver “líderes de classe” da atividade pecuária tentando montar e desmontar o processo de certificação a seu bel prazer.
O Brasil precisa aproveitar este momento para diminuir a diferença entre a qualidade exigida pelo fornecedor e a ofertada por nós. Pois hoje nossa qualidade é “garantida” apenas no papel, pois o animal que chegar com um Documento de Identificação do SISBOV, que foi cadastrado no sistema ha 60 dias, terá sua “qualidade” garantida baseada em que critérios?
A identificação individual dos animais se faz necessária, porém deve ser mesclada com a certificação do processo de produção da propriedade rural, pois hoje um animal que está inscrito no SISBOV pode conviver livremente com animais não inscritos, e um simples papel entre esses dois animais é suficiente para garantir-lhes ou retirar-lhes qualidade?
O artigo do Sr Louis Pascal é bastante interessante no sentido de suscitar comentários sobre as suas colocações.
Acredito que o foco de nossas discussões sobre o SISBOV não deva ser se a identificação tem que ser individual ou não, mas sim principiar de que a garantia da qualidade e a segurança do alimento produzido só poderá ser atingida se tivermos um sistema de rastreabilidade e certificação confiáveis. O SISBOV como qualquer sistema de processo complexo como o é precisa de ser amadurecido e para tanto fortalecido e então sofrer as modificações que o processo exige, porém, a discussão central do processo está na existência ou não do SISBOV.
Convenhamos, nenhum país do planeta será apto a exportar se o seu produto não estiver com a sua qualidade certificada.
Entretanto, no Brasil, proclama-se na mídia, a meu ver de uma forma irresponsável, sem avaliar as consequencias destes atos, que o SISBOV está errado e que rastrear é uma forma de arrancar o dinheiro do pecuarista brasileiro.
É lamentável esta atitude e a mentalidade de quem o faz desta forma, visto quando analizamos um dos “porques” do preço de nossa carne estar baixa neste momento conseguimos entender um pouco mais o processo, ou até mesmo se observarmos o que o mundo passou recentemente com os casos da ” Vaca Louca “. A questão sanitária está simplesmente sendo deixada de lado nestas discussões.
Será que se não acompanharmos as exigências do mercado externo (que é comprador), teremos espaço para vender toda a nossa carne excedente no mercado interno ? O povo Brasileiro tem condições financeiras para absorver este excesso de carne produzida no Brasil e pagar o valor justo ao pecuarista Brasileiro ? E nós, não temos direito de ter um produto interno de qualidade, como tem os europues, americanos, etc.. ?
Muito claro e objetivo o seu artigo.
Alguns leitores que o contradizem, com certeza, têm interesse econômico em jogo.
Para o pecuarista nehuma vantagem, até agora, apareceu. Ao contrario, só perdeu. O custo da rastreabilidade entrou para despesas sem retorno num horizonte próximo.
Jogo dos frigoríficos com as certificadoras? Dos frigoríficos com o Sisbov? Das certificadoras com o Sisbov? Essa é hoje a dúvida do pecuarista que rastreou seu gado e perdeu esse INVESTIMENTO.
Os grandes frigoríficos exportadores, poucos, atuam impondo o preço ao mercado do boi gordo e como consequência a toda cadeia produtiva animal e hoje estão lavando a égua e não sabem mais aonde aplicar seu lucro. Até estão investindo em outros setores da economia. E o produtor pecuarista perde o seu capital em gado, não consegue lucrar e começa a desistir de produzir qualidade, o que deixará de fazer do país o grande produtor de carne de alta qualidade do mundo. Ficaremos conhecidos como produtores de carne de segunda qualidade, sem quotas Hilton ou outras que porventura apareçam.
Mas se os poucos grandes exportadores de carne continiarem a ganhar assim mesmo, o que importaria para eles isso?
Parabéns pelo alerta! Já está chegando a hora dos pecuaristas que se interessam em crescer a se unirem em torno de uma idéia que poderá levá-los a concorrer no mercado por seus próprios meios.
Um abraço