Meus caros leitores, um dos assuntos relativos à defesa agropecuária nacional que mais me preocupa é o SISBOV.
Meus caros leitores, um dos assuntos relativos à defesa agropecuária nacional que mais me preocupa é o SISBOV. Trata-se “daquela” ferramenta de defesa agropecuária que nos permitiria “ter a capacidade de identificar o histórico da localização e a utilização de uma matéria-prima ou produto, por meio da identificação e dados registrados em uma base de dados central”.
Toda essa “novela” teve início logo antes – em 1998 – da contraditória, inconsistente e incoerente ação demeritória do Canadá contra o Brasil. Naquele exato momento se percebia o formato e o real motivo que viria, mais adiante, justificar a ação de outros países, além do Canadá, contra a pecuária nacional e as exportações de carne bovina brasileira.
Alguns vêem essa atitude deplorável com paixão ardente, chegando ao extremo do abalo afetivo e moral, eu entendo, mas não concordo! Nós brasileiros temos que deixar de nos fazer de vítimas; padecer de agonias de uma paixão inarticulada. Digo, sem rodeios: deixarmos de ser chorões confessos e assumir a postura de uma nação de respeito, que busca reserva moral e confiabilidade.
Infelizmente, o que assistimos durante todo o Governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi o contrário e o ridículo: a incapacidade do Ministério da Agricultura em gerir os interesses da ordem econômica e social do setor pecuário.
Em 1999, no que se refere à rastreabilidade, logo após o Comitê Científico da União Européia estabelecer uma lista de fatores que seriam considerados para a avaliação geográfica do risco para BSE, o Brasil foi arrolado como GBR III (provável, mas não confirmado, ou confirmado em baixos níveis).
Porém, mais à frente, com a intensificação dos trabalhos por uma equipe técnica altamente qualificada e conduzida por uma liderança inconteste, o quadro logo se reverteu. Já nos anos 2000 e 2001, o Brasil foi reavaliado e classificado como GBR II (improvável, mas não excluído) e GBR I (altamente improvável, negligenciável ou mínimo), respectivamente.
Daí em diante, sem a intenção de desmerecer os trabalhos dos diversos técnicos do Ministério da Agricultura – e bota diversos nisso – reféns de um processo político ganancioso e medíocre, que afasta todo e qualquer tipo de argumentação técnica, instalou-se o Programa de Desmantelamento do SISBOV. Um verdadeiro turismo interno nas instalações do Ministério.
O SISBOV, reconhecidamente uma ferramenta de defesa agropecuária, e agora de inspeção também, logo no início do Governo PT, foi retirado de onde nunca deveria ter saído: da sua origem, a Secretaria de Defesa Agropecuária.
Iniciou-se, assim mesmo a despeito de tudo e de todos, o “SISBOV Itinerante”: Entreteve-se na Secretaria-Executiva; em seguida, brindou a chefia-de-gabinete do Ministro com sua ilustre presença e, depois, foi instalada, onde até hoje se encontra, na SDC.
Da maneira como todo o processo se encaminhava, não seria nem um pouco anormal imaginar e prever que tamanha confusão levaria o Brasil a retroceder na consolidação do SISBOV e ser rebaixado, de forma vexatória, à classificação GBR II para BSE (vaca louca).
O ditado que espelhava os trabalhos dos funcionários do Ministério da Agricultura em um passado recente, onde se tinha a consciência de que: “o trabalho em geral nobilita, mas às vezes abate”, teve sua ordem invertida. Atualmente o abatimento é muito mais presente do que a grandiosidade.
Reconheço que esta questão é polêmica, porém mais polêmico ainda pode ser – em um futuro próximo – a tentativa de reversão de uma eventual medida restritiva contra produtos brasileiros pela Europa e demais mercados consumidores de produtos de origem animal do Brasil.
Temos que pautar nossas atividades em programas de médio e longo prazo e acabar, definitivamente, com essa cultura brasileira do imediatismo e da improvisação.
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Concordo em gênero, numero e grau, com o seu artigo. É uma vergonha a forma como um programa de tamanha importância para nossa pecuária foi tratado por nossas autoridades sanitárias. Esperamos que o “Novo” Sisbov seja tratado com mais seriedade.
Antes de tudo, quero cumprimentar o BeefPoint pelo espaço democrático que permite que artigos deste teor venham à luz. A não ser pelo suplemento agrícola do Estadão e de um curto parágrafo na DBO Nelore relatando recente desabafo do Laucídio Coelho Neto, o escândalo do Sisbov tem passado a anos-luz das pautas da nossa empobrecida imprensa rural.
Uma CPI algum dia desvendará a verdade em torno da farra do mensalão e dos sanguessugas do Sisbov, tudo em última análise custeado com o cada vez mais escasso dinheiro dos pecuaristas-brincadores.
Um fato novo é que o artigo é da lavra de um assessor do presidente da Abiec, Sr. Pratini de Morais. Como foi sobejamente mostrado aqui, e apenas aqui no BeefPoint, Pratini deu início, no governo FHC a um processo que no governo Lula, Dimarzio poderia ter abortado, mas ao qual deu continuidade com garra surpreendente. Quanto terá custado ao Mapa o road-show do Sisbov, que levou a dezenas de cidades de pecuária forte um congresso com palestras de diversos especialistas, cuja mensagem subliminar era “rastreie seu gado e seja moderno”. Lamentavelmente, tudo com o apoio logístico da CNA, que até hoje nos deve explicações.
Durante muitos anos a pecuária brasileira vai pagar caro pelo erro dos nossos negociadores, que gratuitamente, sem qualquer negociação, se comprometeram a fazer a rastreabilidade da carne não por propriedade de origem, mas animal por animal.
Parece que agora a Abiec sentiu que vai ter que numerar cada apara de carne de acordo com o boi de origem, e o prejuízo que terá com esta determinação maluca será maior que o lucro obsceno que vem obtendo ao depreciar o boi e a vaca sem brincos.
Vamos aguardar com atenção os desdobramentos, parece que vem novidade por aí…
Caro Humberto,
Agradeço sua manifestação acerca do artigo que o BeefPoint gentilmente publicou. Como apontei ao final do texto, eu entendo que este assunto é muito complexo e sensível para se discutir. Em momento algum eu defendi a extinção do Sisbov, tampouco sugeri explicitamente novas regras ou propostas para o Sisbov. Fiz somente um relato (breve histórico) crítico sobre os caminhos do Sisbov dentro do Mapa.
Devo registrar que à época da criação do Sisbov eu era Assessor Internacional do Secretário Nacional de Defesa Agropecuária do Mapa e pude acompanhar de perto seu nascimento. Não vou e não é o meu papel dizer se foi criado da melhor forma ou não, mas me manifesto: sou favorável ao Sisbov. Sem ele, hoje nós já teríamos perdido os principais mercados compradores, recuando nossas estatísticas. Acho que o lugar do Sisbov é na SDA, pois como disse, se trata, antes de mais nada, de um sistema defesa e inspeção animal.
Finalmente, registre-se, que minha opinião não reflete a posição da Abiec, menos ainda dos frigoríficos a ela associados. Trata-se da posição do Presidente da MGRS – Assessoria e Consultoria. Da mesma forma que sou Assessor Especial do Presidente da Abiec fui Consultor do Dep. Ronaldo Caiado, que de público manifestava sua inconformidade com o Sisbov. Ou seja, minhas opiniões não são vinculadas a ninguém ou a qualquer instituição, são pessoais, particulares e profissionais.
Um abraço e obrigado
Otávio Cançado
Parabéns Otávio pela elegância de sua manifestação. Pessoas como você engrandecem o debate das grandes questões da pecuária brasileira.
A questão não é apenas portarias ou leis. Além do aspecto sanitário, existe o comercial. Quem tiver oportunidade de tirar umas férias e visitar um país europeu, verá nos supermercados a importância do controle da qualidade, da origem e também da conservação do produto ofertado. Aqui existem as leis, mas é a concorrência e a solicitacão do povo que compra que pressiona o controle. Como vender leite, carnes sem controles sanitários? Como receber em Euros? Só nos resta a África.
Creio ser mediocridade discutir a necessidade do Sisbov ou não.
Qualquer pessoa um pouco inteligente que seja, sabe que o consumidor quer cada vez mais informações e segurança sobre o alimento que come.
A questão é viabilizá-lo. Em países europeus, a rastreabilidade é custeada pelo governo, que exige que os produtores rastreiem devidamente seu rebanho, caso contrário perdem os gordos subsídios a ele fornecidos.
No Brasil querem que os frigoríficos repassem para o produtor o maior lucro obtido com as vendas da carne para países mais exigentes. Como obrigar uma instituição privada a pagar mais pelo produto que ela compra manufaturado e revende? A lei de demanda e oferta é a única ferramenta que obriga uma empresa a pagar mais pelo seu insumo.
Temos que encontrar uma forma de custear a rastreabilidade, sem contar com o frigorífico, pois eles se conseguirem pagar barato, vão pagar barato.
A saída é ensinar o consumidor brasileiro a dar a mesma importância à segurança, como os europeus dão e aí sim vai faltar boi rastreado no mercado. A partir daí, o frigorífico vai ter que pagar mais caro por ele.
Parabéns Otávio pelo artigo e por “tocar novamente na ferida”…
A ” incapacidade do Ministério da Agricultura em gerir os interesses da ordem econômica e social do setor pecuário” reflete também no sistema de classificação de carcaças neste país.
Enquanto nossos concorrentes analisam carcaças com sistemas de vídeo imagens, permitindo avaliar maciez, coloração dos cortes, entre outros fatores, não conseguimos implementar seriamente um sistema, básico de classificação, quem dirá de tipificação de cortes…
Caminhamos lentamente, muito lentamente…