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SISBOV: temos 16 dígitos e 5 segundos para contar nossa história – por André Bartocci

André Bartocci, pecuarista no estado do Mato Grosso do Sul, foi um dos palestrantes do Workshop BeefPoint – Certificação e Rastreabilidade, realizado nos dias 07 e 08 de ago/12 em São Paulo. André faz a rastreabilidade de seus animais pelo SISBOV e também tem certificações em sua fazenda para aproveitar oportunidades de mercado. Sua palestra teve o objetivo de mostrar sua trajetória com o SISBOV e certificações, contando seus desafios, o que fez para superá-los e os benefícios destas práticas.

André é recriador e terminador em região agrícola do MS, e explica que permanece na pecuária por razões financeiras. Conforme diretrizes da empresa, a fazenda tem boa localização para aproveitar o baixo custo de insumos. Inicialmente seu sistema de produção era extensivo, explorava a fertilidade natural do solo e o nível de tecnologia adotada era baixo. A contabilidade também era levada de forma diferente, pelo levantamento de estoque e número de animais, e não por produtividade, em quilos produzidos por hectare. André confessa, a produtividade era baixa.

Por isso, André buscou por mudanças em seu sistema de produção para ficar mais eficiente, passando a controlar sua produção e rentabilidade por área. Na pecuária, “lotação não é produtividade. Uma lotação menor pode dar condições para se atingir maior produtividade em kg/ha/ano”, diz André. Ele compara a produção pecuária com atividades agrícolas, e questiona “o quanto a pecuária produz”. Ele mesmo responde que a atividade pecuária em geral não sabe responder, mas “a cana-de-açúcar sabe”. Assim, o segundo sistema ficou “melhor”, conclui André.

O pecuarista comentou também sobre o gerenciamento da produção pecuária, sobre a necessidade de se controlar o peso do rebanho, seu ganho, além de inúmeras outras variáveis. André também diz que “a pecuária envolve organismos animais e vegetais, o que é diferente da agricultura”. Ele ainda comenta que antes do início da mudança de gerenciamento, a produção era controlada por “achadores”, e não por indicadores. As medidas não eram quantificadas, “eram vagas”, como estimar o desempenho por meio do tipo racial dos animais e pela condição visual das pastagens.

Devido a este processo de mudança, em 2002 a fazenda começou a rastrear seus animais pelo protocolo SISBOV e continua rastreando atualmente. A identificação individual é feita por leitura óptica, com registro eletrônico e processamento de dados em tempo real. André conta que começou a ter acesso a números antes desconhecidos de sua atividade, e possibilitou o melhor controle de sua produção, inclusive em kg/ha/ano.

Ele conta um exemplo comparativo para mostrar como este controle é importante para sua rentabilidade. Na compra de animais de  reposição, comparando um animal comum (“vendido como barbeludo e comprido”, brinca André) com outro animal filho de touro melhorador (incluso em programa de melhoramento genético), pode-se visualizar a diferença de ganho. O primeiro, custando R$650,00 com oito meses de idade e abatido aos 36 meses, teria como receita R$1.210,00 e ganho de peso médio de 11kg/ano. O segundo, filho de touro melhorador, valendo R$750,00 aos oito meses de idade e abatido com 27 meses, teria como receita R$1.110,00 e ganho médio de 16kg/mês.

Analisando o suposto contexto, André comenta que o segundo animal ficaria uma seca a menos na fazenda e poderia ser abatido castrado, devido ao maior ganho. Assim ele justifica o porque do controle produtivo dentro da fazenda, mostrando que um animal de reposição pode ser mais caro isoladamente, porém sua produtividade resultará em melhor rentabilidade.

Em outro exemplo de como a análise dos dados coletados pode dar informações importantes, André conta que entre valores de uma média de ganho de peso, os extremos são muito distantes. Mostrando uma média real de 800g/dia de um lote de animais, havia ganhos tanto de 300g quanto de 1,4kg/dia. Desta forma, André ressalta novamente a importância de se comprar bons animais de reposição, ou “matéria-prima”, para o sistema produtivo não ser prejudicado pelos animais de baixa produtividade.

Desta forma, a rastreabilidade passa a ser peça fundamental para o gerenciamento, além da padronização de processos. André diz que utiliza as informações que tem disponíveis atualmente para efetuar diversos tipos de análise. Para o curto-prazo, avaliando a resposta produtiva de acordo com o manejo adotado; para o médio-prazo, avaliando a produtividade do sistema e para o longo-prazo, que será utilizada para avaliar e selecionar fornecedores ou avaliar o rendimento de carcaça por frigorífico. André lembra que possui um padrão para a pesagem dos animais, e por isso tem segurança em utilizar este rendimento como indicador.

Sobre custos, André enfatiza que é necessário investir em capacitação profissional e pessoal de todos que fazem parte do processo produtivo. Em sua fazenda existe uma “escola” própria gratuita, com informática e livros, e ele considera que o “peão” é a principal tecnologia da fazenda.

Concluindo, André acredita que a função da rastreabilidade é preparar a fazenda para aproveitar possíveis oportunidades, e não para resolver problemas internos. “Há diversos programas de certificação para agregar valor à produção. Cabe ao pecuarista tomar a decisão”. Sobre a Cota Hilton, André diz que existe espaço para produtores brasileiros, e a rastreabilidade é fundamental. “O prêmio é interessante e encaro este programa com um ‘serviço de bordo'”, referindo-se aos diversos benefícios ganhos com a rastreabilidade. De forma interessante, André deixa sua mensagem de que “a rastreabilidade é para contar nossa história e para conquistar mercados. E só temos 16 dígitos e 5 segundos para contá-la”.

Após sua palestra, na seção de perguntas, Alexandre Raffi (presidente da Associação de Criadores de Novilho Precoce – MS) comenta sobre a migração da pecuária para a cana-de-açúcar citada por André, e questiona qual a rentabilidade de André por hectare. O pecuarista responde que também faz agricultura, por meio da integração lavoura pecuária (ILP). Ele, de forma elegante, não informa o valor exato, porém diz que o “número de R$800,00/ha é possível”, e ele tem “mais de R$500,00/ha de rentabilidade com certeza”.

André ainda diz que a rastreabilidade é sua forma de medir e gerenciar, e relembra que está em região privilegiada, por ser de agricultura. Relembra também a comparação entre produções pecuária e agrícola: “a variabilidade de produção existe na pecuária, na agricultura não. É um fator complicador”.

Miguel Cavalcanti (BeefPoint) retoma o ponto de que as pessoas são a tecnologia mais importante. Ele também acredita nisso e pergunta a André o que a rastreabilidade mudou “nesta tecnologia” em sua fazenda. André comentou que sua mão-de-obra melhorou em todos os aspectos e que o envolvimento das pessoas no processo de rastreabilidade é essencial para o sucesso. “A tecnologia material melhora as tecnologia humana”, acredita André, e conta que hoje o interesse das pessoas é tanto, que ele instalou televisões de tela grande em lugares visíveis dentro do curral, para todos poderem enxergar os dados coletados imediatamente: quanto o animal pesou, seu ganho e se está apto para embarque, por exemplo.

Ezequiel do Valle (Embrapa – MS) pergunta ao André se ele adota a política de bonificação de funcionários de acordo com os resultados. André diz ter um bônus semestral, com metas para todos funcionários. Os dados coletados após o abate são os principais formadores das metas, além do ganho de peso e taxas de lotação. “É parte fundamental do negócio, as pessoas percebem sua importância, e não pensam exclusivamente no valor financeiro”.

Paulo Loureiro (pecuarista e consultor) parabeniza André pela palestra, por sua postura e comenta que também se importa com as pessoas “e isso é fundamental”. Depois questiona a opinião de André sobre irrigação de pastagens. André responde que é preciso avaliar quando começar a intensificação. Adubar os melhores pastos para ganhar eficiência e deixar os pastos inferiores para serem reformados com o tempo é uma boa estratégia antes da irrigação.

Miguel Cavalcanti pergunta novamente: qual seria a grande diferença da fazenda do início, em 2002, para a fazenda atual? André acredita que o manejo de pastagem é o principal ponto de melhoria, e é “mais complexo e lucrativo que o confinamento. A maneira que manejávamos era muito leiga. Hoje melhoramos muito”, disse André.

Luiz Orcírio (Embrapa Pantanal) diz que também é a favor da produção exclusiva a pasto e questiona como melhorar a compra de recria. André diz que simplesmente é comprar somente animais registrados, filhos de touros que estão em programa de melhoramento genético e acompanhar o desempenho após a compra.

Mateus Arantes (Boviplan) aproveita o assunto e pergunta o que fazer com “boi ladrão”, se referindo ao animal que prejudica o desempenho do lote, o “boi comprido e barbeludo”, brinca André novamente. O palestrante disse que principalmente procura não comprar este tipo de animal, e quando identifica animais com ganho abaixo de 300g/dia com peso vivo abaixo de 400kg, ele os vende. Caso tiver baixo ganho e peso maior que 400kg, André diz que termina o animal para abate.

Artigo escrito por Marcelo Whately, analista de mercado da Equipe BeefPoint.

7 Comments

  1. Sergio Raposo de Medeiros disse:

    Excelente a palestra, bem como o relato. Parabéns, André e Marcelo! Muito bom ver um exemplo que, com uma aplicada gestão e bom uso de tecnologia é possível fazer da pecuária uma atividade economicamente interessante. O exemplo dos animais com ganhos diários de peso extremos é real, todavia gostaria de alertar que, especialmente no exemplo que o ilustra, em função do período entre pesagens ser muito pequeno (15-16 dias), a maior fonte de variação no peso do animal é o enchimento do trato gastrintestinal. A análise em períodos maiores (60-90 dias) resolve o problema. Desejo ainda mais sucesso à Fazenda Nossa Senhora das Graças!

  2. Roberto Trigo Pires de Mesquita disse:

    Muito mais do que resultante da rastreabilidade, vejo o diferencial na fazenda de hoje como resultado de um eficaz modelo de gestão orientado por objetivos de lucratividade como nos apresenta o André.
    Neste aspecto tenho certeza de que um sistema de gestão cutomizado para cada fazenda, apresentará uma relação custo-benefício extremamente mais vantajosa do que a utilização do SISBOV, pois a minha inferência final sobre a excelente apresentação do André é de que se “a identificação individual não fosse feita por leitura óptica e com registro eletrônico e processamento de dados em tempo real, o SISBOV só ofereceria 16 dígitos e 5 segundos para contar a história” de cada animal enviado para o abate pela fazenda”.

  3. EDUARDO RAMALHO disse:

    Caro Sr. Andre , quero parabeniza-lo ,pois das fazendas que conheço realmente a sua em Caarapo, em relação a manejo, tecnologia, organização e tratamento ao ser humano que lhe prestam serviço é sem duvida a melhor .Espero que continue sempre ativo e animado produzindo pecuaria e agricultura de excelente qualidade .

  4. José Ricardo Skowronek Rezende disse:

    É isto mesmo André. É preciso bons softwares, leitores de código de barras e/ou radio frequencia, procedimentos bem definidos, uma boa certificadora e especialmente gente treinada e motivada. O homem ainda é quem faz a diferença.

  5. Murilo M. F. Bettarello disse:

    Parabéns pelo empreendedorismo André, é muito bom ver empresários que não são nascidos nas “terras de gado”, e sim do café (Franca-SP) contribuindo com a melhoria da pecuária nacional. Seu foco de pensar no uso de técnologia/inovação através de pessoas é realmente o diferêncial de qualquer empresa, tanto no campo quanto na cidade.

    A tendência hoje é cada vez mais a busca de ferramentas para agregação de valor e eficiência produtiva. Trabalho com certificação há 3 anos, e posso afirmar que mais do que agregar valor, a propriedade ganha eficiência em sua gestão e com isso vantagem competitiva.

    Parabêns pela palestra e sucesso.

    Abraços

  6. Jason Arantes Pereira Neto disse:

    Caro amigo André, parabéns pelo trabalho que desenvolve, pois só pessoas com visão futuras e trabalho firmes tornarão a pecuária brasileira produtiva e não deixara a pecuária perder espaço para a cana e outros.

  7. Oswaldo Ribeiro disse:

    Parabéns pelas constatações, essas vivências ajudam muito no caminho das pedras, não são somente teorias, dá mais sustentação às ações que devemos levar a termo nas propriedades sob a nossa responsabilidade. Fica claro que o SISBOV traz uma aura de profissionalização, de amadurecimento na pecuária de corte. Acredito que os maiores ganhos em curto prazo são os intangíveis, os ligados à gestão da propriedade. Em longo prazo, a diminuição no tempo da engorda e a consequentemente a antecipação da receita, será a razão do sucesso da rastreabilidade. Se for conseguida ainda operações com a UE, esses ganhos serão maiores ainda, o Premium Price torna-se outro grande diferencial mas, enfatizo, ele é decorrente, ele é consequência.