Por Wander M. C. Dias1
SISBOV. Comecei a escrever esse artigo pensando: será que alguém vai querer lê-lo? Afinal, já foram publicados outros tantos sobre esse assunto e o produtor, em geral, não quer nem ouvir mais falar no nome SISBOV. Mas por que então escrever um texto sobre o SISBOV? Porque percebi que os outros tantos, na maioria das vezes, criticam-no ou defendem-no; mas são raros os que apenas explicam-no. E acho muito oportuno explicá-lo, pois tanto nas críticas como nas defesas, há muitos enganos, precipitações, opiniões tendenciosas e emocionais, opiniões pessoais, etc.
Nem criticar, nem defender. Tentarei ser imparcial para apenas explicar e mostrar os fatos.
Começaremos com a questão: o animal é certificado ou rastreado? A resposta é: nenhum dos dois. A justificativa disso será apresentada a partir daqui até o final do texto. Mas primeiro, vamos entender o conceito dessas palavras.
Certificar é o ato de garantir, dar por certo, alguma coisa. No caso do SISBOV, essa alguma coisa é a norma do SISBOV. Ou seja, um animal verdadeiramente certificado seria aquele que tem a garantia (das certificadoras) de que cumpre ou cumpriu o que determina a norma.
Rastrear é “seguir os passos” de algo. Pode-se rastrear para saber onde algo está hoje ou para saber por onde esteve. No caso de SISBOV, seria a segunda opção; através das informações fornecidas pelo(s) proprietário(s) do animal, saberia-se por onde ele “andou” e o que aconteceu durante sua vida.
Sendo assim, pode-se dizer que os animais inclusos no SISBOV não são certificados (sei que há exceções, mas, quando falamos em milhões de animais em um sistema como um todo, são apenas exceções). Isso porque não cumprem as normas. Para “certificar” essa afirmação, explicarei as normas do SISBOV de forma completa, porém de maneira simples e topificada, na ordem cronológica que devem ocorrer:
1. Produtor contrata um “X” de uma certificadora, que faz um pedido de “X” numerações para a coordenação do SISBOV.
2. A certificadora recebe esses números e os passa para o fabricante de brincos, o qual envia os brincos para o produtor.
3. O produtor coloca os brincos nos animais e preenche as fichas de identificação destes animais, enviando-as para a certificadora.
4. Um profissional credenciado pela certificadora vai até a propriedade, verifica se todos os brincos estão colocados e se todas as fichas de identificação estão corretamente preenchidas, elaborando um relatório para a certificadora.
5. Estando tudo em ordem, é então impresso o DIA.
6. Mas as coisas não acabar por aí, pois o produtor deve enviar para a certificadora os registros dos manejos reprodutivo, sanitário e alimentar dos animais, das movimentações deles, da morte deles e de entrada de insumos na propriedade.
Ou seja, para um animal estar realmente certificado, todos esses pontos deveriam ser atendidos. Mas, “a campo”, quantos realmente são? O item 3, não é cumprido na maioria das vezes (relatos de profissionais da área e dos próprios produtores). Afinal, a técnica de colocação de brinco na hora do embarque é tão corriqueira, que deve ter muita gente achando que é assim que é o jeito certo que deve ser feito. Já os itens 4 e 6… Não vou nem comentar.
E com base nisto e no conceito de rastreabilidade apresentado, conclui-se que não há animal rastreado (novamente: exceções são apenas exceções), afinal, sem a identificação e o registro correto e completo do animal e dos eventos que ocorrem durante a sua vida, não há como saber tudo (dentro dos itens necessários) o que aconteceu durante a vida dele e nem por onde ele esteve.
Então, se um animal incluso no SISBOV não é rastreado e nem certificado, ele é o que então? Podemos dizer que ele é sisbovado. Inventemos essa palavra para representar os animais que “inventam” estar certificados.
A informação existe. A norma existe. E a informação de como cumpri-la também existe; basta buscá-la com pessoas e empresas idôneas. Se as coisas são feitas de forma errada, é porque o produtor assim o faz. Se não concorda com o SISBOV, de duas a uma: ou reclame, exigindo e cobrando mudanças, mas respeitando e fazendo as coisas certas como devem ser feitas; ou simplesmente não faça nada. E quando digo nada, significa não “rastreie” seus animais, afinal nem obrigado é. Por que fazer algo se não concorda e nem é obrigado a fazer? E mais; se deixar de fazer, não perderá nada. No máximo, deixará de ganhar.
Sem querer apelar para a ideologia, mas paremos de ser a terra da “gambiarra”, terra do que “para tudo dá-se um jeitinho”. Deixemos esse “jeitinho brasileiro” para quando não há outra opção. Tornemos a terra da competência.
Enchemos a boca para falar que somos a terra do “boi verde”. E somos mesmo. Mas apenas palavras não servem para o mundo. Provemos então isso a todo o mundo. Como? Com certeza, o SISBOV, funcionando corretamente e com certificação e rastreabilidade EFETIVAS, é uma resposta. Parem e realmente reflitam sobre isso. E mudem.
O futuro da pecuária brasileira agradece.
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1Wander M. C. Dias é médico veterinário, responsável técnico e gerente de auditoria da CertBeef (certificadora de bovinos pelo Sisbov) e especialista em auditoria.
10 Comments
Aí está um colega lúcido. Didaticamente explicando a questão da rastreabilidade. Ao fazê-lo expõe as enormes fragilidades do sistema, que da forma como foi implementado não tem a menor chance de sucesso.
Eu também, às vezes, penso em não me envolver mais com o assunto, tal o volume de coisas que já escrevi e defendi. Desde 2002 vem essa luta e que aos ouvidos insensíveis do colegas do MAPA, em Brasília, deve parecer Quixotesca.
Pois, meu caro Wander, saúdo teu artigo e fico feliz ao ver que não estou só nesta batalha. Quem sabe, a partir das últimas constatações da missão da UE, fazem-se as necessárias mudanças de rumo no SISBOV que a meu ver até deveria ser recriado com outro nome, tal o grau de desmoralização que é percebido pelos produtores.
Paulo Cruz – Médico veterinário
O artigo é muito claro e bastante oportuno, principalmente neste momento em que muitos reclamam do Sisbov e enquanto poucos se dão ao trabalho de seguir suas regras mais elementares.
Eduardo Miori
Parabéns pelo texto, concordo plenamente com o sr.!! Precisam parar de brincar de produzir, parar com manejos amadores. O Brasil é rico em profissionais das Ciências Agrárias!!!
Caro Dr. Wander,
Devo concordar com suas considerações a respeito do SISBOV, afinal essa é a realidade.
Mas discordo quanto à culpa do produtor.
Nós não começamos com essa bagunça, ela vem de berço (do ministério e dos frigoríficos exportadores) e a nós só sobrou o ônus de comprar os brincos e pagar a rastredora para que não sejamos punidos com dois reais a menos por @.
Prezado colega Wander,
Percebo que os únicos beneficiados com o rastreamento são os frigoríficos, pois recebem muito mais pela carne rastreada e exportada.
Penso que cabe a essas empresas compradoras de carne rastreada fiscalizar seus fornecedores e se realmente o animal passou por todas as etapas do rastreamento.
Caso, em algum momento, houver visita de importadores para observar a idoneidade desse rastreamento e perceberem que tudo é uma imensa gambiarra, esse mercado carne vai ser atingido muito negativamente.
Enquanto Governo, Frigoríficos e Pecuaristas não se entenderem, não haverá sucesso o rastreamento no País.
Obrigado, um abraço.
Mauro Luiz de Campos Cardoso
Médico veterinário e pecuarista
Concordo com as considerações feitas a respeito das falhas do produtor rural, mas gostaria que também fosse comentado o que acontece nos frigoríficos após o abate dos bois “rastreados”, pois quem já se interessou em saber, ou constatou in loco, sabe que não é feito quase nada, com honrosas exceções, para prosseguir o tal rastreamento internamente.
Com relação a não se fazer nada, seria um suicídio econômico ao produtor, que já está muito mal remunerado e, sendo de conhecimento geral que os frigoríficos usam esta desculpa para pagar menos aos não rastreados, não seria uma atitude viável a se seguir.
Quanto a deixar de ser a terra da “gambiarra”, seria ótimo, começando pelo que acontece no momento na política nacional, e não imputando ao produtor a culpa pelo que ele não foi consultado.
O que eu acredito com respeito à rastreabilidade é que é uma grande mentira.
O pecuarista brasileiro está disposto a ter o seu gado, vacinado de todos os tipos de doenças, dar suplemento mineral de boa qualidade. Porém é impossível controlar um a um com brinco.
É por isto que eu digo que é uma grande mentira. Porque o pecuarista finge que rastreia, o frigorífico finge que controla e o comprador finge que acredita que a carne está rastreada.
O ideal seria propriedade certificada com visitas periódicas de órgãos ligados a saúde bovina paga pelo próprio pecuarista tal como é feito por uma ABCZ ou um programa Qualitas.
Caro colega Dr. Wander M.C. Dias,
De fato o fator “SISBOV”, é um elemento de extrema complicação e desorganização. O caro colega como especialista no assunto, sabe quantas Instruções Normativas já foram publicadas. E tais publicações serviram mais uma vez para demonstrar a ineficácia do SISBOV. Imaginemos esta situação sendo colocada em prática na indústria aeronaútica, automobilista e outras tantas. Como ficariam?
Não existe, meu caro colega nenhuma Norma Técnica que respalde a Rastreabilidade Bovina e Bubalina. Tempos atrás foi cancelado um embarque de carne bovina para os Estados Unidos. Motivo: não estava dentro dos padrões exigidos pelas Normas Técnicas daquele país. Normas Técnicas que vão desde a parte sanitária até a forma de nutrição e alimentação.
No momento presente no Brasil praticamente inexistem certificadoras credenciadas junto ao INMETRO e acreditadas internacionalmente. Verificar se os brincos e ou identificadores foram aplicados nos bovinos é uma operação tão simples quanto verificar um romaneio de embarque. Mas Certificar Sistemas de Produção, de acordo com Protocolos Técnicos de Produção é outra coisa. Mesmo porque tais não existem.
A ABNT, o INMETRO são o fórum indicado para que a rastreabilidade passe a ser olhada com seriedade. O que atualmente existe de fato é o “jeitinho brasileiro”, que mais dia menos dia, nos colocará em uma situação semelhante à da soja enviada para a China.
Respeito o seu ponto de vista, mas o mais correto é a extinção pura e simples do SISBOV.
Mas fico com a posição do sr. Ministro do MAPA a respeito do SISBOV “fajuto e não-crível” (Revista AG Leilões/Setembro de 2005, pág. 22). Se o sr. Ministro assim o classifica, como seriam classificados todos os demais que estão credenciados pelo SISBOV? Exceções existem, mas são raridades.
Aceite estas críticas como uma forma de se buscar o melhor para a pecuária nacional.
Em tempo: quem garante que a carne bovina hoje tida como certificada é de origem nacional? Em especial quando as propriedades se localizam em fronteiras secas com o Paraguai, Argentina, Bolívia e Uruguai?
Atenciosamente
Romão Miranda Vidal
Médico Veterinário
CRMV-PR-0039
Concordo plenamente contigo. Pode ter certeza que os responsáveis farão a diferença.
Muito bom Wander,
Fico honrado de saber que estou fazendo parte desta equipe de vencedores, vamos lutar contra essa cultura que se criou e que com certeza é uma mola propulsora que está fomentando clientes que realmente não querem fazer parte desta maioria que tem seu referencial na lei de “Gerson” ou seja querem levar vantagem em tudo, independente de estarem ou não prejudicando o próximo.
Com certeza a proposta da “CERTBEEF” é estar usando da transparência nos seus negócios e levar o pecuarista brasileiro a ter consciência de não sermos somente o maior rebanho do mundo, mas principalmente termos a qualidade que o mundo pede hoje.
A “CERTBEEF” com seu diferencial esta mostrando para seus clientes que os concorrentes falharam em sua proposta e deixaram as portas abertas dos seus clientes.
E o sucesso da “CERTBEEF” e o seu crescimento com certeza é estar conquistando esses clientes que verdadeiramente querem fazer de sua propriedade, uma empresa pecuária de primeiro mundo, voltado para uma gestão de qualidade e se preparando para fazer parte do seleto grupo de fornecedores das grandes redes de supermercados da Europa, como por exemplo atender as normas da Eurep-gap.
Fico muito orgulhoso de ver um jovem empresário “Danilo Leão” estar conquistando junto a sua empresa “CERTBEEF” e seus parceiros, em tão breve tempo, uma perspectiva de ser uma das maiores empresas de certificação do Brasil,levando aos pecuaristas esta proposta de qualidade e transparência vamos lá equipe conte comigo.
Saudações
Afonso Peres