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Sistema de produção do futuro para a produção de gado de corte no Brasil

Por Celso Boin

O conteúdo desse artigo se refere à apresentação feita em 23/05/02 durante o 5o Encontro Terra Nova de Pecuária, realizado em São José do Rio Preto. O objetivo foi apresentar de uma maneira mais abrangente a evolução das normas ou sistemas de alimentação, a importância de modelos de simulação para o aprimoramento da pesquisa e para a avaliação e validação de sistemas de produção, e o manejo da alimentação.

Normas ou sistemas de alimentação

A nutrição de bovinos, no presente caso de bovinos de corte, evoluiu enormemente nos últimos 50 anos. Primeiro com o desenvolvimento de sistemas de análise para a avaliação do valor nutritivo dos alimentos disponíveis. Segundo com o avanço do conhecimento das exigências nutricionais das diferentes categorias de animais para as diferentes funções de produção. E terceiro, pelos novos conhecimentos adquiridos nas áreas de cinética da digestão e de metabolismo intermediário dos nutrientes absorvidos durante a passagem dos alimentos pelo trato digestivo.

A integração dos avanços do conhecimento sobre nutrição de bovinos de corte começou com as tentativas de estabelecimento dos sistemas ou normas de alimentação. Inicialmente, os esforços foram individuais, como a conhecida como normas de Morrison que surgiu nos Estados Unidos. Em seguida elas passaram a ser institucionais.

As mais conhecidas e usadas são as normas americanas publicadas periodicamente pelo NRC (National Research Council), as normas britânicas publicadas inicialmente pelo ARC (Agricultural Research Council) e mais recentemente pelo AFRC (Agricultural and Food Research Council), as normas francesas publicadas pelo INRA (Institut National de la Recherche Agronomique), e as normas australianas publicadas pela CSIRO (Commonwealth Scientific and Industrial Research Organization).

Embora existam normas publicadas em outros países, as citadas acima, especialmente a americana, foram e são as que mais tem influenciado as bases da alimentação de gado de corte no Brasil. Um ponto importante a ser observado, é que a publicação do ARC de 1965, pode ser considerada como um marco na evolução do conteúdo das normas de alimentação, com introdução dos principais conceitos básicos de nutrição e alimentação de ruminantes.

O avanço dos equipamentos e programas de computação, e dos conhecimentos adquiridos nas áreas de nutrição, reprodução e crescimento animal, possibilitaram o surgimento de sub modelos e modelos matemáticos para predizer o desempenho animal. A universalização dos conhecimentos e o fato do desenvolvimento de modelos estimular os pesquisadores a procurar as melhores informações onde elas existirem, tem causado uma tendência das normas de alimentação mais recentes usarem praticamente as mesmas bases de dados. Portanto, as diferentes normas tendem a ficar mais parecidas com o tempo.

Além disso, a incorporação de dados de pesquisa de regiões específicas pode ser feita com facilidade. Um exemplo foi o desenvolvimento do chamado Sistema de carboidrato e proteína líquida de Cornell (CNCPS – Cornell net carbohydrate and protein system). Este sistema está em constante evolução, tanto em termos de uso de novos desenvolvimentos na área de informática como nas de nutrição, crescimento e reprodução, usando informações disponíveis em todo o mundo.

As publicações mais recentes do NRC para gado de corte usam o sistema de Cornell no chamado nível 2. Portanto, a tendência que já está acontecendo e que aumentará bastante no futuro, é a adequação das normas já existentes para uso no Brasil com a introdução de informações locais.

Importância de modelos de simulação

Um aspecto importante a ser considerado é que só se consegue simular e prever com precisão quando se conhecem todos os mecanismos envolvidos na determinação do resultado final. O desenvolvimento de modelos de simulação e de previsão tem permitido a identificação de gargalos e o estabelecimento de projetos de pesquisa para resolve-los.

Do ponto de vista de produção, o desenvolvimento de modelos para predizer o desempenho animal é de fundamental importância para avaliar a combinação de diferentes alternativas para o estabelecimento de sistemas de produção mais adequados às diferentes condições regionais e de exigência dos consumidores quanto às características da carne bovina de sua preferência.

É sabido por todos que na média, os sistemas de produção de gado de corte no Brasil ou não estão usando ou estão fazendo combinações inadequadas das tecnologias disponíveis. Essa área de modelagem e simulação apresenta grande potencial para o futuro da produção de gado de corte no Brasil. Embora ainda no início, já estão surgindo modelos, e a tendência é de ocorrer um aumento tanto do número como da eficiência dos modelos em simular adequadamente diferentes alternativas de produção quantos aos aspectos técnicos e econômicos.

Manejo da alimentação

Do ponto de vista de alimentação, um dos aspectos mais evidentes é a falta de planejamento do uso de pastagens durante o ano. A baixa produtividade por animal, especialmente crescimento e eficiência reprodutiva no caso de gado de corte, está sem dúvida relacionada a erros de planejamento no manejo e uso das pastagens.

Um outro aspecto fundamental em termos de aumentar e manter a produtividade por animal em níveis adequados é a suplementação de animais em pastejo com minerais praticamente em todas as condições e com proteína e ou energia em determinadas condições específicas. O manejo racional das pastagens e a suplementação adequada de animais em pastejo são ferramentas importantes disponíveis para aumentar a produtividade das pastagens e dos animais (ver artigos anteriores sobre suplementação no BeefPoint).

As diferentes alternativas de suplementação de animais em pastejo associadas ao confinamento, a genótipos e a grau de estrutura corporal (frame), permitem planejar estratégias para produção de diferentes tipos de carcaças para atender tanto o mercado em geral como nichos de mercado durante o ano todo. O uso dessas ferramentas deverá aumentar bastantes nos sistemas de produção de carne bovina.

A integração lavoura pecuária, tanto dentro de fazendas como de regiões, já acontece e será cada vez mais importante no planejamento da alimentação dos sistemas de produção de gado de corte no futuro.

O processamento de grãos através de silagem de grãos de cereais úmidos (milho e sorgo) e de extrusão (milho, sorgo, soja, resíduos respectivos), deverá desempenhar papel crescente como ingredientes de rações, concentrados e suplementos protéicos.

Uréia protegida ou fontes de nitrogênio não protéico de degradação controlada (lenta) no rúmen também deverão desempenhar papel importante no futuro, principalmente para inclusão em suplementos protéicos destinados à suplementação de animais a pasto.

O uso de aditivos, que são ingredientes desprovidos de nutrientes, mas que podem ter um efeito positivo no desempenho animal e na eficiência de uso de nutrientes, já está sendo explorado e apresenta condições de vir a ser explorado com mais intensidade no futuro. A tendência é de substituição do uso sub terapêutico de antibióticos por probióticos visando evitar ou diminuir o risco de desenvolvimento de resistência em microorganismos patogênicos.

Além disso, em função de possível proibição em países importadores de carne bovina do Brasil, o uso de íonóforos (no caso do Brasil, Rumensin e Taurotec) poderá sofrer restrições no futuro. Enzimas específicas provavelmente terão seu lugar como aditivos, visando aumentar a disponibilidade de energia das rações e das forragens, incluindo aqui as pastagens.

O uso de minerais ligados a moléculas orgânicas poderá ser útil em situações específicas, em especial para complementar as exigências de algumas categorias de animais, bem como para estimular o sistema imunológico em condições de estresse.

Um ponto controverso é o uso de promotores de crescimento na forma de anabolizantes e repartidores de nutrientes. A disputa entre os Estados Unidos e a União Européia continua. No caso dos anabolizantes, aparentemente do ponto de vista científico, não foi comprovado nenhum efeito prejudicial direto quando os princípios ativos permitidos pelo FDA (Federation and Drug Administration) americano são usados seguindo as normas recomendadas.

O problema é que a proibição de fato não significa que não se usa, caso contrário não teríamos problemas com consumo de drogas no Brasil e no Mundo. Achamos que com o estabelecimento da rastreabilidade e a certificação da carne para consumo por entidades de alta credibilidade, seria mais seguro e mais democrático a liberação de pelo menos parte dos princípios ativos autorizados pelo FDA americano. No primeiro caso, evitaria ou pelo menos diminuiria o uso ilegal de anabolizantes comprovadamente perigosos, e no segundo permitiria a escolha por parte do consumidor de adquirir ou não carne produzida com o uso de anabolizantes legalmente permitidos.

Conclusões

A evolução da produção de gado de corte no Brasil está atrelada à implantação de sistemas de produção bem definidos, caracterizados pela integração adequada e planejada das alternativas tecnológicas disponíveis nas áreas de alimentação, reprodução, recursos genéticos e sanidade. Além disso, a gerenciamento eficiente é indispensável, pois sem ele nenhum sistema de produção terá chances de ser viável.

0 Comments

  1. Antonio João Lourenço disse:

    Mais uma vez parabenizo pela facilidade com que coloca suas idéias. Muitas contribuições para o desenvolvimento da pecuária são oriundas de trabalhos científicos conduzidos com seriedade.