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Sistemas de tipificação e classificação de carcaça

Diversos países têm estabelecido sistemas de avaliação e classificação de carcaça. Entre eles podemos citar Estados Unidos, Canadá, Austrália e Japão, sendo, os três primeiros, concorrentes no mercado externo, e o último atualmente um grande importador. Existem diversas diferenças entre os critérios adotados nos sistemas de classificação de carcaça de cada país, porém todos têm um objetivo em comum, que é selecionar carcaças com as melhores características exigidas por cada mercado em questão, sendo atribuída remuneração diferenciada ao produtor de acordo com a classificação. Neste radar serão rapidamente abordadas as principais características dos sistemas adotados nos EUA, Canadá, Austrália e Japão.

O sistema de classificação mais antigo é o americano, criado em 1927, e talvez o mais conhecido e comentado no Brasil. O sistema se baseia em classificação por qualidade (quality grade) e rendimento (yield grade), sendo que não são necessariamente feitas em conjunto. A classificação por qualidade se refere às condições sensoriais (palatabilidade, maciez, suculência) esperadas da carne quando consumida. O yield grade identifica carcaças em função do rendimento de cortes comerciais desossados e aparados. Revisões mais detalhadas sobre este sistema já foram apresentadas em radares na seção técnica Qualidade da Carne (Tipificação e classificação de carcaças bovinas (1/3) , 12/4/2002, Tipificação e classificação de carcaças bovinas (2/3), 19/4/2002 Tipificação e classificação de carcaças bovinas (3/3), 26/4/2002).

Quanto à qualidade, as carcaças são classificadas como Prime, Choice, Selected e Standard para carcaças de animais mais jovens, e Commercial, Utility e Cutter para carcaças de animais mais velhos. As principais características avaliadas são a maturidade e o grau de marmoreio. Os graus de maturidade podem ser dados por A (animal jovem), B, C, D e E (animais velhos), com base no grau de ossificação da espinha. O marmoreio, determinado no músculo longissimus dorsi, entre a 12a e 13a costelas, é dividido em abundante, moderadamente abundante, pouco abundante, moderado, modesto, pouco, leve, traços, e ausente.

Figura 1: Quadro de classificação de carcaça do USDA.

Fonte: USDA, Meat evaluation hand book.

A classificação para rendimento é numérica (1-5), sendo que, quanto menor o valor, maior o rendimento. Para a classificação quanto ao grau de rendimento são usadas informações de espessura de gordura (entre a 12a e 13a costelas), a área de olho-de-lombo, porcentagem estimada de gordura pélvica, cardíaca e dos rins (%KPH), e peso da carcaça quente, sendo aplicada a equação:

Yield grade= 2,5+2,5*esp. de. gord., polegadas + 0,20*%KPH + (0,0038 * peso de carcaça, libras) – (0,32*área de olho de lombo, polegadas2).

Geralmente, as carcaças americanas são classificadas por um dos dois critérios, ou ambos. Pode-se dizer que há uma contradição entre o “Quality grade” e o “Yield grade”, onde o primeiro classifica as melhores carcaças com o maior marmoreio, e a segunda desconta em função da maior quantidade de gordura. Relembrando de artigos anteriores, quanto maior o grau de marmoreio, maior a gordura corporal.

O sistema Canadense de classificação de carcaças foi baseado no Americano, sendo ambos bastante semelhantes quanto aos critérios de classificação. Os principais pontos deste sistema são a maturidade, musculosidade, grau de marmorização, coloração da carne e gordura, e espessura da gordura de cobertura. Animais jovens recebem classificação A ou B e carcaças de animais maduros são classificadas como D, e de touros como E. As carcaças no Canadá, assim como nos EUA, também recebem classificação de acordo com o rendimento de tecido magro, dado pela equação:

% rendimento carne aparada = 63,65 + 1,05(score de musculatura) -0,76(score de gordura).

Os escores de musculatura e gordura são determinados com auxílio de uma régua especial. Para receber a classificação “A”, a carne deve ter aspecto vermelho brilhante e a musculatura deve ser boa a excelente, sem deficiências, a gordura de cobertura deve ser firme e branca (ou ambar) e não apresentar menos que 4 mm de espessura. Dentro desta categoria há 4 subdivisões: A, AA, AAA e Canada Prime, que são determinadas de acordo com o grau de marmorização, que varia de traços (A) a abundante ou mais (Canada prime). A classe “B” é subdividida também em 4 categorias: B1 para as carcaças com boa musculatura, porém com gordura de cobertura inferior a 4 mm, a B2 para carcaças com gordura de coloração amarela, B3 para carcaças com musculatura deficiente, e B4 para carcaças com carne de coloração escura (dark meat color). A categoria “D”, para animais maduros é subdividida também em 4 categorias: D1 são carcaças com musculatura excelente e bem distribuída, a gordura é firme, branca e bem distribuída, com no máximo 15 mm de espessura; D2 para carcaças semelhantes à D1, mas com variação na coloração e distribuição da gordura; D3 para carcaças com musculatura deficiente, e D4 para carcaças que apresentam musculatura de excelente a deficiente, e com gordura acima dos 15 mm de espessura.

O sistema japonês de avaliação de carcaça, criado em 1975, foi modificado em 1988. No Japão, são feitas avaliações concomitantes para rendimento e qualidade, não sendo permitida a separação destas avaliações, ao contrário do que acontece nos EUA e Canadá. Em adição às avaliações de rendimento e qualidade, escores para lesões também podem ser atribuídos, dependendo das circunstâncias. As notas de rendimento são dadas como A, B e C, e as de qualidade variam de 1 (pobre) a 5 (excelente) (tabela 3). A nota final é feita combinando as duas, como B2, por exemplo. As avaliações são feitas a partir de cortes entre a 6a e a 7a costelas. Tanto as avaliações do sistema americano como do canadense são entre a 12a e a 13a costelas.

Para qualidade da carne são avaliados os seguintes itens (tabela 3): 1: marmoreio (1-12), coloração e brilho da carne (1-7), firmeza e textura da carne (1-7), coloração e qualidade da gordura (1-6). O valor final de qualidade da carne é dado pelo menor valor dos 4 atributos. Por exemplo, se as notas para uma carcaça forem: marmoreio 4, cor 4, textura 3 , e cor da gordura 4, então a nota para qualidade de carcaça será de 3.

A nota de rendimento é atribuída como uma estimativa dada em % através de uma equação onde são incluídas medidas diretas na carcaça para área de olho de lombo (AOL, cm2), espessura de costela (EC, cm), peso frio da carcaça esquerda (PCF, kg), e espessura de gordura (EG, cm):

% de rendimento = 67,37 + (0,130*AOL)+ (0,667*EC) + (0,025*PCF) + (0,896*EG).

A nota A é dada para carcaças que apresentam valore de rendimento acima de 72%, sendo consideradas acima da média, a B para carcaças com rendimento entre 69-72%, consideradas na média, e a C para valores inferiores a 69%, abaixo da média.

Neste ponto é interessante chamar a atenção para a principal diferença entre os sistemas Canadense e Americano com o Japonês. No sistema Japonês, para escore de rendimento é dada importância significativa para quantidade de gordura, sendo que, quando maior a espessura de gordura, melhor a nota para rendimento. Já os outros sistemas avaliam rendimento de carne desossada e aparada, sendo que, quanto mais gordura de cobertura, pior o escore para rendimento. É bem provável que esta diferença seja pelo mercado japonês exigir carnes com excessiva quantidade de gordura.

O sistema australiano é o mais novo. O Meat Standart of Australia (MSA) foi criado em 1997, sendo modificado e introduzido no mercado Australiano em 1999-2000. Este seja talvez um dos sistemas mais complexos e completos que existe em funcionamento. Segundo Strong (2001), o MSA parte do princípio que “todo pedaço de carne, preparado corretamente, terá as características descritas, em qualquer hora e qualquer lugar”. O MSA permite predizer, com relativa acurácia a qualidade de cada corte individual, de maneira simples e de fácil entendimento do consumidor. Ou seja, não mais a carcaça é classificada, mas sim cada corte, em função do modo de preparo. O sistema permite aconselhar qual a melhor maneira de preparar o corte em questão. O conceito do MSA parte do pressuposto que a qualidade da carne é dependente de todos os processos que ocorreram na produção pré e pós abate, envolvendo o processamento e cozimento até o bife chegar ao prato do consumidor (Thompson, 1988).

Para tal foram usados um extenso banco de dados (35 mil) para análise sensorial, que propiciou um conhecimento crítico da qualidade definida pelos consumidores. Também foram feitos trabalhos com mais de dois anos de duração com informações do animal e manejo pré e pós abate, além de informações relativas ao processamento da carne.

Subseqüentemente, o sistema de classificação foi desenvolvido usando-se o conhecimento de critérios que determinam qualidade da carne, sendo possível predizer com acurácia a qualidade do produto final. Thompson (1998) se refere a isto como PACCP (Palatability Analysis Critical Control Points), ou análise dos pontos críticos de palatabilidade. Segundo Strong (2001), o resultado disto foi a criação de um sistema que garanta ao consumidor a mesma experiência sempre que comer uma carne com a mesma classificação. Para esta acurácia em predizer o “eating quality” da carne, o sistema australiano necessita de um extenso, e caro, número de informações para cada carcaça, muito mais que o americano, canadense ou japonês.

Para padronização de carcaças de melhor qualidade, é necessário seguir algumas normas:

  • Os produtores devem ser registrados e seguir as condutas do MSA para manejo dos animais para minimizar o stress. A % de Bos indicus deve ser informada.
  • Os animais devem ser transportados direto para o abate, não sendo misturados no curral de espera, e abatidos no dia seguinte à chegada.
  • No abatedouro, a relação entre pH e a temperatura das carcaças deve ser controlada
  • A espessura de gordura deve ser superior a 3 mm
  • A carcaça deve ser de animais jovens, sendo este determinado pelo grau de ossificação.

    Para a classificação dos cortes da carcaça são feitos ajustes de acordo com as informações que devem incluir:

  • Peso de carcaça
  • % Bos indicus nos animais: pois o efeito da raça influi na qualidade e maciez dos cortes. Altura da anca em relação ao peso vivo: se a relação estiver acima da média específica para % de B. Indicus declarada, são feitos os ajustes maiores. Isto melhora a acurácia para raças adaptadas (ex.: Belmont Red)
  • Sexo: ajustes para sexo são aplicados para os diferentes músculos, assim como ajuste para ossificação. Os animais não devem apresentar características sexuais secundárias (tourinhos).
  • Maturidade: animais devem ter até 30 meses de idade, e score de ossificação abaixo de 300.
  • Animais criados com leite (Milk Fed Veal Calves): animais abatidos imediatamente após o desmame.
  • Método de pendurar a carcaça: este efeito varia conforme o músculo com alterações significativas;
  • Marmoreio: segue os critérios do USDA;
  • Espessura de gordura: efeitos positivos são observados para valores acima de 3 mm, e abaixo de 18 mm.
  • pH final: o pH da carcaça final deve estar entre 5,4 e 5,7;
  • Maturação: são feitos ajustes conforme o tempo de maturação da carne.
  • Método de cozimento: são ajustes feitos, conforme o tipo de corte com base no banco de dados, sendo dado notas para qual método de preparo o corte se adequa melhor.

    Acima estão os principais fatores que causam impacto na qualidade da carne. Porém, outras medidas que não tem influência na qualidade da carne podem ser feitas de acordo com exigências de cada mercado, como: coloração da carne, AOL e coloração da gordura.

    As informações tomadas do animal e da carcaça são computadas, e seus cortes classificados através de modelo SP2000 (layout na figura 2). A classificação para rotulagem e para fácil entendimento do consumidor é feita da seguinte forma: não classificado, 3, 4 ou 5 estrelas. Na tabela 4 são apresentados resultados de Thompson e Polkinghorne (2002) com relação à habilidade do modelo em classificar os cortes de acordo com a experiência do consumidor.

    Amostras de cada carcaça ainda são tomadas e armazenadas para determinação do DNA, caso seja necessário rastrear a origem da carcaça.

    O sistema australiano é o mais complexo de todos (tabela 5), envolvendo diversos parâmetros para avaliação, com a pretensão de apresentar maior acurácia. Porém o sucesso deste sistema envolve um minucioso sistema de identificação animal, que permite armazenar informações e rastrear o mesmo, além, é claro, de colaboração e comprometimento de todos os setores envolvidos na cadeia produtiva.

    Independente do método de classificação, no geral as carnes oriundas de carcaças selecionadas com qualidade superior, apresentam maior aceitação e satisfação do consumidor, que paga mais por isto. Por outro lado, os sistemas de classificação permitem remuneração diferenciada ao produtor.

    No Brasil existe um sistema de avaliação e classificação de carcaça, regulamentado pelo Ministério da Agricultura desde 1989. Porém, como todos sabemos não está em funcionamento, e, mesmo se aplicado, não seria capaz de separar as carcaças de qualidade realmente superior. Atualmente, empresas que criaram as chamadas carnes com “grife”, adotam sistemas próprios para “classificação” e padronização dos cortes, com o objetivo de nichos de mercado mais exigentes com maior poder aquisitivo e disposto a pagar um diferencial de preço.

    A criação e o uso regulamentado de um sistema Brasileiro de classificação de carcaça, que não precisa ser tão complexo como o australiano, mas que pelo menos possibilite selecionar as melhores carcaças quanto à maturidade, sexo e acabamento, nos parece imprescindível.

    Literatura Consultada

    Agriculture and Rural revitalization. Live cattle ultrasound and the Canadian beef Grading system. www.agr.gov.sk.ca.

    USDA Quality and Yield Grades. Beef Technical bulletin. Vita Plus Corporation. 2002

    Canadian beef grading system. www.taylormaderesearch.com/new_page_2.htm

    Meat evaluation Handbook. National Livestock and meat board. USDA.

    Strong, J. carcass grading schemes- USA/Japan/Australia How and why do they differ?. In: Marbling Symposium. www. beef. crc.org.au . 2001

    Thompson, J; Polkinghorne, R. Meat standars Australia- An overview. www.crc.org.au/Publications/latest_publications/feeder2002/session6/6b.html(2002)

    Thompson, J.M. (1998). Grading – The Meat Standards Australia (MSA) Experience.
    Armidale Feeder Steer School. February 1998, Armidale .

    Black gold Farms Making the Grades/Japanese Grading system. www.blackgoldfarms.com.au/grading.html

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