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Somos pecuaristas, mas na verdade, trabalhamos com a terra; produzimos plantas! – André Bartocci

O Workshop BeefPoint sobre Engorda a Pasto foi realizado no dia 17 de outubro, em São Paulo.

Reunimos quem melhor engorda boi a pasto, que é responsável por 90% do gado abatido no país. Conhecemos o trabalho dos melhores invernistas do Brasil, com apresentação de estudos de caso, troca de experiências e conhecimento, num ambiente de conversa e debate. Foi um encontro de discussões em alto nível, para conhecer quem tem feito um excelente trabalho no Brasil.

Para conhecer melhor quem tem se destacado na engorda a pasto no país, preparamos uma série de entrevistas com essas pessoas.

Confira a entrevista com André Bartocci, pecuarista e formado em Direito. Realiza recria e engorda com Integração Lavoura e Pecuária na Fazenda Nossa Senhora das Graças, em Caarapó – MS.

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André Bartocci é pecuarista e formado em Direito. Realiza recria e engorda com Integração Lavoura e Pecuária na Fazenda Nossa Senhora das Graças, em Caarapó – MS.

  • A produção é habilitada pela lista Trace e Cota Hilton.
  • Foi bi-campeã nacional do Circuito Boi Verde – Julgamento de Carcaça.
  • Destaque em sustentabilidade no prêmio Nelson Pineda em 2011, 2012 e 2013.
  • Possui protocolo BPA-Ouro da EMBRAPA.
  • Possui Compromisso Ambiental com a Aliança da Terra.
  • Compõe o conselho fiscal do GTPS (Grupo de Trabalho da Pecuária Sustentável)

A Fazenda Nossa Senhora das Graças fica em uma região de terras férteis, agrícola, altamente tecnificada e estrategicamente localizada na beira da BR 163, que escoa a produção para o Porto de Paranaguá.

“Apesar de nossos bois só enxergarem lavoura em sua vizinhança, nosso foco é a pecuária de recria e engorda. Produzimos em um sistema exclusivamente a pasto e utilizamos a integração com a lavoura (ILP) e o confinamento como ferramenta estratégica no inverno”.

Nossos animais são rastreados e medimos seu desempenho a cada 60 dias. Produzimos 4.000 novilhos precoces por ano habilitados pela lista Trace e Cota Hilton, além de soja e milho na integração.

A opção pela pecuária é financeira e não por paixão (apesar de ser apaixonado também). Isto aumenta nosso desafio, pois temos que ser competitivos com nossa melhor opção atual: a rentável soja!

BeefPoint: Quais os maiores desafios para o pecuarista que trabalha com engorda a pasto?

André Bartocci: Primeiro, entender que o sistema formado por uma vaca indiana zebuína e uma planta africana foi, é, e será a essência da pecuária brasileira.

Nossa pecuária não teria números tão expressivos, nosso parque industrial frigorífico não seria tão grande e nossa população não consumiria tanta proteína vermelha e seus derivados se não tivéssemos optado por este modelo de produção. Então, o caminho para ser competitivo é evoluir através dele e variações sobre o mesmo tema.

O segundo desafio é aceitar que a pecuária vai mudar muito nos próximos anos e decidir se quer participar desta mudança ou trocar de atividade.

BeefPoint: Você poderia nos contar sobre os acertos, o que fez e deu certo no seu sistema de produção a pasto?

André Bartocci: Uma mudança marcante foi quando percebemos que nossa célula de produção é o hectare e que lotação só mede estoque.

O que realmente paga a conta é a quantidade de quilos de boi que conseguimos produzir por hectare. A partir daí, criamos metas de produtividade baseadas em quilos de boi por hectare/ano.

Outro momento foi quando descobrimos que qualidade de pasto, manejo e genética vêm primeiro, o lucro vem depois.

BeefPoint: E o que deu errado, você poderia nos contar? O que você considera os erros mais comuns num projeto de engorda a pasto? 

André Bartocci: O gargalo de toda produção é a seca. No nosso caso, o inverno. Um grande erro, que cometemos várias vezes, foi subestimá-lo.

Este erro é recorrente em pecuárias tropicais, pois a fome (e o prejuízo financeiro) é uma doença sub-clínica em animais zebuínos e raramente mata. Então, em algum nível, este erro é cometido todos os anos nas produções brasileiras.

O problema da fome é agravado por outro: medir a produção a base de pasto é difícil, então a maioria dos produtores não mede. Imaginam que animais são iguais, rodízios produzem homogeneamente e verânicos só prejudicam a soja. Este é um grande erro.

Um divisor de águas para nossa produção foi quando começamos a medir o desempenho animal individualmente e percebemos que somente o olho, mesmo que do dono, não é um indicador eficiente.

BeefPoint: Quais as maiores dificuldades enfrentadas com a mão-de-obra nesse setor em específico? O que tem sido feito para solucionar esses problemas?

André Bartocci: A produção de bovinos a pasto não existe sem o vaqueiro. O homem que apeia de um cavalo para curar um bezerro, o que identifica um início de requeima ou um curso em tempo, o que afina uma boiada para passar em uma porteira, ou aquele que chega ao malhador sem que a boiada se incomode, é um profissional com habilidades especiais.

Dele, do vaqueiro, depende a pecuária. E ele está em franca extinção.

Com exceção de iniciativas pontuais, nada está sendo feito para a formação deste profissional. Sinceramente, não acredito que cursos de casqueamento ou doma racional do SENAR vão resolver este grave problema da atividade. Hoje, os que estão na lida, estão por paixão ou por falta de opção.

BeefPoint: O que você fez em 2012/2013 que te trouxe mais resultados?

André Bartocci: O que fizemos de melhor em 2013 foi aumentar os pastos de inverno via ILP. Isto aliviou o gargalo da seca, com o alívio das pastagens perenes.

Acredito que temos muito para aprender de integração e acho que é também um desafio para a pecuária nacional. Em 2014 vamos focar mais em estratégias de inverno. Porém, o melhor custo benefício em 2013 foram os cursos de manejo de pasto e de bois para todos da fazenda.

BeefPoint: O que é o mais importante para ter sucesso na engorda a pasto?

André Bartocci: Somos pecuaristas, mas na realidade, trabalhamos com a terra. Produzimos plantas. Somos agricultores. O grande problema é que nossas colhedeiras, as mandíbulas dos bovinos, não tem regulagem e para sermos eficientes, precisamos de um manejo de alta precisão.

Acho que o grande segredo é conseguir colher bem o pasto. Corrija esta deficiência (de colheita) e estará próximo do sucesso do seu empreendimento.

BeefPoint: Quais são seus planos para 2014?

André Bartocci: Pretendo entender mais de folhas, raízes, fósforo e nitrogênio e suas interações com os bois. Focar nossas metas em produtividade da carne e seus derivados por ha.

Também gostaria de participar de um ambiente, órgão ou entidade onde os elos da cadeia pudessem discutir e desenvolver soluções para a pecuária. Percebo que grandes dificuldades na produção poderiam ser resolvidas se a cadeia falasse o mesmo idioma.

BeefPoint: Você gostaria de participar de um programa de carne de qualidade, de gado criado a pasto, com certificação?

André Bartocci: Sim. Acredito que em função da pouca comunicação e visibilidade da nossa produção, há uma inversão de valores. O boi a pasto passa a impressão de uma mercadoria de pouco valor agregado, um boi comum. Quase uma mercadoria de segunda. Quando na realidade, é o nosso melhor produto. Eficiente, saudável e sustentável.

Além disto, o sistema de produção a pasto é credor de carbono, quer dizer, o sistema boi-pasto sequestra mais carbono do que emite e de quebra, o produto deste sistema tem risco zero para a vaca louca (encefalopatia espongiforme).

Isto é muito bom para o consumidor! Precisamos contar nossa verdadeira história.

BeefPoint: Que recado você deixaria para produtores de gado a pasto?

André Bartocci: Bom, pensar diferente do dito popular: dinheiro…é capim!

14 Comments

  1. CARLOS EDUARDO ROCHA DE LIMA disse:

    Caríssimo André Bartocci,
    Somos de uma geração que além da força para o trabalho no campo trazemos formação acadêmica, o que nos proporciona uma visão mais ampla, mais profissional após a porteira da fazenda. Parabéns por suas ponderações temos plena condições de equilibrar a pecuária extensiva com a sustentabilidade ambiental. Nosso rebanho tem base nas raças indianas e a nossa cultura de pasto nos capins africanos e nós temos condições gerenciais em adequar tudo isso na construção da melhor pecuária do mundo. Mais uma vez parabéns.
    Eduardo Chieira – Fazenda Asa Branca – Iaciara – GO.

  2. Ailton Matos disse:

    Meu amigo André Bartocci filho de um grande amigo Victório Aparecido Bartocci, homem sabido demais que muito me ensinou! A pecuária brasileira teria que aproveitar melhor este produtor de proteína para desenvolver projetos audaciosos e internacionalizada.

  3. Augusto Pedrazzi disse:

    Boa colocação no final!… “dinheiro é capim”… como dizia o renomado André Voisin, antes de aprender a criar boi, o pecuarista precisa saber a cultivar a pastagem. Daí o produtor tem duas alternativas, partir para sustentabilidade da pastagem contribuindo para a eficiência da exploração das forragens com um excelente manejo de pasto, animal e interação destes, ou então, praticar de investimentos que envolvam retorno de capital, porém não sustentaveis, como correção e adubação das pastagens, irrigação, silagem, fenação.

  4. Jose Ricardo Rezende disse:

    Parabéns! Engordar boi a pasto é, antes de tudo, gerenciar bem a produção e colheita de capim.

  5. Fábio de Souza Fonseca disse:

    Parabéns Sr. André! Fico extremamente feliz quando vejo que, finalmente a pecuária e a agricultura estão fazendo as pazes. A grande questão da pecuária e ter pastos excelentes, com a terra corrigida e o manejo bem direcionado, e isto só é possível com integração lavoura-pecuária, pois só a agricultura paga esta conta da correção do solo e precisa das pastagens como rotação, aeração do solo e cobertura vegetal para plantio direto. Se este cenário vier acompanhado com linhas de plantio de árvores com finalidade econômica e ainda trazendo enorme conforto térmico para o gado, então o equilíbrio e a sustentabilidade estão completos. É exatamente desta forma que encantaremos o mundo com nossas produtividades e mitigação de poluentes. Grande abraço, Fábio Fonseca – Araçatuba-SP.

  6. André Bartocci disse:

    Caro Ailton,
    Obrigado por mencionar esta importante personalidade.
    Todo meu conhecimento de vida vem do Professor TUTI.
    Um abraço
    André Bartocci

  7. leobacco disse:

    Prezado André,
    Excelente entrevista. Falou tudo que é óbvio, entretanto, como é difícil enxergar o óbvio!!!

  8. Alexandre Maschietto disse:

    Prezado André ,

    A competividade é a palavra chave em qualquer empreendimento.
    Para continuarmos eficientes, teremos que ser competitivos .

    Se tivermos pasto ou comida (barata) o ano todo , o nosso empreendimento não para de produzir , melhor para o gado, melhor também para o empreendimento .

    Muito interessante o seu comentário :
    O gargalo de toda produção é a seca. No nosso caso, o inverno. Um grande erro, que cometemos várias vezes, foi subestimá-lo.

    Na pecuária de corte , o pasto, quando bem trabalhado ( manejado corretamente , fertilizado ou preservado , ou mesmo integrados a lavouras ) , é fator de BARATEAMENTO para nossas vacas , para a nossa recria, ou mesmo na engorda .

    A era do ilusionismo , do extrativismo já acabou , e pasto degradado também.
    Agora teremos que recorrer à técnicas onde o fundamental é integrar novos sistemas de produção para produzirmos mais , com rapidez, mantendo a sustentabilidade .

    Um abraço,

    Alexandre Maschietto .
    Engenheiro Agrônomo

  9. Silvio Melchior disse:

    Precisamos de outros pensadores da agropecuária para divulgar suas experiencias positivas e certeiras, André.
    O pasto de qualidade na seca é o que necessitamos. As técnicas devem ser difundidas, melhorando os resultados de todos, com a competitividade alavancando nossos negócios agropecuários.

  10. Celso Magalhâes Coronel disse:

    “Ora, ora…Elementar…Afinal o bovino é um herbívoro!…kkkkkkkkkkk”

    Celso Magalhães Coronel
    Médico Veterinário

  11. elcio agnaldo duarte dos santos disse:

    André vi a reportagem e lembrei do tempo de criança quando morei em caarapó na fazenda do seu PEDRO pereira vargas, hoje moro em santa cruz do rio pardo sp, bateu uma saudade…parabéns boa sorte…ELCIO DUARTE.

  12. Izabel C. Rezende disse:

    Boa tarde!
    André, comecei a criar gado recentemente. Gostaria de conversar com você. Sou Dentista e sempre tive paixão por gado.
    Você com sua experiência poderia me nortear!
    Obrigada!

  13. jefferson de jesus prado disse:

    Bom dia, André.
    Antes de tudo, parabéns pela reportagem no globo rural.
    Gostaria de saber de você, o uso de açúcar mascavo no trato do gado; Quais os benefícios e vantagens que você vê nesse produto, estou perguntando isso pra você, pois vendo este produto para fazendas de cáceres, mais gostaria de mais informações para agregar as informações que ja tenho.
    Obrigado
    Jefferson de Jesus Prado

  14. JOSE PADY COELHO JUNIOR disse:

    Caro Sr André Bartocci, sou apenas um Tecnólogo em Radiologia, desde menino apaixonado pelo cultivo da terra, não tive muitas chances para continuar na lida de gado e cultivo de pastagens, mas digo que seu trabalho é digno de reconhecimento a nível até internacional, uma vez que o desenvolve com paixão e conhecimento de causa, sempre zelando por uma “empatia” perfeita na relação boi-pasto, onde um manejo correto com foco na produção de qualidade, feito com sustentabilidade, determinam o sucesso irrefutável que o Sr vem obtendo, afinal, colhemos exatamente o que plantamos. Parabéns. Seria um privilégio ser seu colaborador. Abraços.