A recente decisão do governo dos Estados Unidos, liderado por Donald Trump, de impor uma tarifa de 50% sobre as importações de carne bovina brasileira gerou uma reviravolta no mercado global de carnes, afetando desde os pecuaristas no Brasil até os preços do hambúrguer no varejo americano.
Segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), no Brasil, o mercado do boi gordo entrou em “compasso de espera” desde o anúncio. As indústrias frigoríficas reduziram drasticamente as compras, deixando as cotações paradas na última semana. O impacto foi imediato: com escalas de abate já alongadas, os frigoríficos praticamente interromperam a produção destinada aos EUA, que em 2024 havia representado 220 mil toneladas exportadas.
Roberto Perosa, presidente da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec), afirmou que os embarques previstos para este ano ficaram “inviáveis” economicamente. Os cortes do dianteiro bovino, usados principalmente para hambúrgueres nos EUA e que não têm consumo significativo no Brasil, agora precisarão ser redirecionados a outros mercados como China, Sudeste Asiático e Oriente Médio.
Nos EUA, a situação é crítica. O país enfrenta a menor oferta de gado em mais de 70 anos devido à estiagem e à suspensão de importações do México por causa da mosca da bicheira. As importações brasileiras, que haviam dobrado no início do ano, representavam 21% das compras americanas. Segundo Bob Chudy, consultor do setor, a nova tarifa “congela a negociação” e obriga os importadores a buscar carne mais cara na Argentina, Uruguai, Paraguai e Austrália.
O efeito no varejo americano pode ser sentido diretamente pelo consumidor. Thomas Gremillion, diretor de política alimentar da Consumer Federation of America, alerta para o impacto no preço de produtos básicos como carne, café e suco de laranja. Além disso, o aumento de preços vem em um momento delicado, quando o Congresso americano aprovou cortes em programas de assistência alimentar.
No Brasil, o cenário também é ambíguo. Especialistas apontam que, no curto prazo, a pressão sobre o preço da arroba do boi gordo (atualmente em torno de R$ 299,70) pode favorecer os frigoríficos, mas prejudicar os pecuaristas. A economista Lygia Pimentel, da AgriFatto, destaca que, com menos exportação, pode haver excedente no mercado interno, tornando a carne mais barata ao consumidor — embora o repasse final dependa do comportamento do varejo. “Possivelmente, a gente vai ver uma carne mais estável e baixa, mas não será imediato”, afirmou.
Thiago Bernardino, pesquisador do Cepea, ressalta que o grande destino da carne brasileira continua sendo a China, com US$ 6 bilhões em compras em 2024. “Com o tempo, haverá um equilíbrio entre compradores e vendedores do mercado internacional”, disse. O setor brasileiro também aposta na abertura de novos mercados, fortalecendo relações comerciais com países que possam absorver a carne rejeitada pelos EUA.
Além das questões econômicas, há tensão política. Segundo Perosa, a decisão americana foi motivada por pressões políticas e carece de fundamentos técnicos. Ele alertou para o impacto em empregos no Brasil e para o risco de o setor produtivo virar “alvo de disputa política” entre países.
Enquanto o governo brasileiro estuda medidas para mitigar os impactos, como a abertura de novos mercados e negociações diplomáticas, importadores americanos tentam pressionar Washington para reverter a medida. Até lá, tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos, consumidores e produtores vivem um momento de incerteza.
Fontes: Estadão, Forbes, Globo Rural e Forbes.