Por Liliane Suguisawa1
A enorme variação na maciez das carnes adquiridas nos supermercados, açougues ou até mesmo boutiques especializadas, é o principal fator de insatisfação dos consumidores no Brasil e no mundo. Mercados mais especializados, como a Austrália e Estados Unidos, consideram a maciez da carne como critério classificatório de suas carcaças, e lançam mão das mais recentes tecnologias para que os produtores possam produzir carne com qualidade adequada. Há inúmeros fatores que afetam a qualidade da carne bovina, sendo estes divididos em aspectos pré-abate, como grupo genético, manejo e nutrição, e aspectos pós-abate, tais como velocidade de resfriamento e quantidade de espessura de gordura subcutânea. Buscando o controle total dos aspectos que influem na qualidade da carne bovina, os australianos foram um pouco mais além, desenvolvendo testes genéticos utilizando marcadores moleculares baseados no DNA, para identificar precocemente animais com potencial para produção de carne macia ou marmorizada.
Características como a maciez e a marmorização da carne são difíceis e muito caras de mensurar, pois só se pronunciam em um animal na idade adulta. Ainda, são características avaliadas nas carcaças, sendo difíceis de serem preditas nos reprodutores de um rebanho. Com isto, a tecnologia dos marcadores de DNA se mostra muito interessante e aplicável, principalmente para fins de melhoramento genético em rebanhos comerciais. Os testes foram desenvolvidos em parceria com o CSIRO (Instituto de Pesquisa Australiano) e são os primeiros testes de DNA comercialmente aceitos para identificar animais superiores em caraterísticas de produção.
O teste para maciez da carne é baseado na detecção das variações do gene da calpastatina bovina que está localizado no cromossomo 7. A calpastatina faz parte do complexo enzimático que atua no tecido muscular após o abate do animal, sendo responsável pela inativação das enzimas calpaínas (amaciadoras da carne). Assim, a enzima calpastatina em sua plena atividade é uma inibidora da maciez da carne. A menor maciez observada no gado zebuíno, é devido à presença de grande quantidade de calpastatina, quando comparado aos animais de origem taurina. O teste detecta variações nas formas da calpastatina, sendo uma mais associada com a maciez e outra com a rigidez da mesma. Quando o animal testado apresenta “2 estrelas” a carne é considerada muito macia, “1 estrela” é mediana e “0 estrela” é considerada dura. Na Figura 1 pode-se verificar a frequência dos genótipos encontrados para cada grupo genético.
Figura 1. Frequência dos diferentes genótipos de maciez para cada grupo genético.
Porém, hoje já se sabe que as maiores diferenças na maciez da carne não são mais entre raças, mas sim dentro de uma mesma raça (Koohmaraie et al, 2003). Com isto o conhecimento dos animais com potencial de produção de carne mais macia nos forneceria ferramentas importantes para selecionar os reprodutores que possuem esta característica e usá-los no rebanho de modo a aumentar a maciez da carne do rebanho comercial. Assim estratégias de cruzamentos seriam idealizadas de acordo com a finalidade que se pretende atingir (Figura 2).
Figura 2. Possíveis proporções de genótipos de progênie como resultado de diferentes acasalamentos entre touros (SIRE) testados com diversas matrizes (DAM).
O teste para marmorização funciona da mesma maneira que o teste de maciez, identificando variações do gene mais relacionada à alta deposição de gordura intramuscular, ou entremeada nos músculos. No entanto, o gene estudado que parece apresentar a maior contribuição na marmorização é o gene da tiroglobulina, precursor molecular dos hormônios tireoidianos T3 e T4 que já foram anteriormente relacionados com crescimento e diferenciação do tecido adiposo, principalmente em gado Wagyu, caracterizado por alta deposição de marmoreio na carne (Barense et al., 2003).
Com isto, temos que as tecnologias de DNA poderão nos ser muito úteis e aplicáveis à campo, principalmente para fins de melhorias nas características de produção importantes, tais como ganho de peso, precocidade sexual e de acabamento, resistência à parasitas, e por fim na qualidade da carne bovina. Com respeito aos testes genéticos desenvolvidos e comercializados pela Austrália, muito pouco é conhecido e foi testado nas condições do Brasil. Assim, faz-se necessário alguns estudos que realmente comprovem a acurácia destes testes em detectar a maciez e a marmorização da carne bovina, principalmente na raça Nelore, base genética do rebanho comercial nacional. Ainda, como as pesquisas nesta área se mostram cada vez mais importantes para aumentar a velocidade de ganho do melhoramento genético do rebanho, estas devem ser cada vez mais incentivadas buscando melhorias na raça Nelore e nos seus cruzamentos.
Referências Bibliográficas
GeneNote4 – GeneStar Tenderness – Genetic Solutions Ltd – Austrália http://www.geneticsolutions.com.au
Barense, W.; Bunch, R,; Thomas, M.; Armitage, S.; Baud, S.; Donaldson, N. The TG5 DNA Marker Test for marbling capacity in Australian feeflot Cattle. CSIRO Molecular Genetics Centre Level 3 – Austrália
Koohmaraie, M.; Veiseth, E.; Kent, M. P.; Shackelford, S. D. Understanding and Managing Meat Tenderness. SBZ – 40o Reunião Anual da Sociedade Brasileira de Zootecnia (CD Room) – Santa Maria/RS – 2003.
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1Liliane Suguisawa é doutoranda em Nutrição e Produção Animal – UNESP/Botucatu
1 Comment
Excelente, a informação sobre marmorização