A União Europeia (UE) acaba de apontar deficiências no sistema de rastreabilidade de bovinos na Irlanda, num duro golpe para a pecuária desse país que mais faz campanha contra a carne bovina brasileira.
A União Europeia (UE) acaba de apontar deficiências no sistema de rastreabilidade de bovinos na Irlanda, num duro golpe para a pecuária desse país que mais faz campanha contra a carne bovina brasileira. Uma missão do FVO, Escritório Veterinário e de Alimentos europeu, visitou a Irlanda em setembro passado para avaliar os controles sobre a rastreabilidade dos animais e produtos, na cadeia que vai da fazenda até o consumidor.
O relatório revelado em Bruxelas constatou que a Irlanda não cumpria os critérios para a seleção de fazendas para controles cruzados dos animais. Ou seja, a rastreabilidade tem buracos. A missão europeia diz que o cumprimento dos requisitos cruzados “não é confiável” e que a verificação não requer controle sistemático de todos os animais na Irlanda. A missão cita ainda “sérias deficiências” na identificação e controle de movimento de animais, ou seja, a rastreabilidade não funciona em certos casos.
Além disso, o FVO considerou que a rotulagem voluntária de produtos animais “não é coberta pelo controle oficial”, também desrespeitando a legislação europeia. Na prática, os produtores irlandeses podem colocar o que quiserem no rótulo de seus produtos de origem animal.
Os inspetores contam que num frigorífico 1.625 caixas de produtos animais foram transferidas para outro local um dia antes da visita da missão, na tentativa de esconder as falhas.
O FVO, que tem sua sede central perto de Dublin, considerou que de maneira geral o sistema irlandês melhorou muito desde 2002. Mas, com base no que viu, faz nada menos que 10 recomendações às autoridades sanitárias irlandesas e pede investigações sobre deficiências constatadas na missão.
As autoridades irlandesas responderam ao relatório do FVO usando expressões como “não concordamos, não aceitamos, discordamos fortemente”, até que nas páginas finais prometem revisões nos processos.
Por exemplo, fazendeiros que fazem muita substituição de brincos de identificação de bovinos serão mais visitados para o cumprimento de requisitos, para assegurar a rastreabilidade da carne que vai para a mesa do consumidor.
A avaliação do FVO é dura para a Irlanda. Os produtores de carne bovina desse país são, há tempos, muito críticos em relação aos controles sanitários da pecuária brasileira, e não perdem uma ocasião de pressionar Bruxelas para frear a entrada da carne do Brasil em seu mercado. O país, aliás, já perdeu centenas de milhões de dólares com o que deixou de exportar em carne para a UE por conta de maior rigor em relação à rastreabilidade.
Analistas notam que, a se julgar pelos termos usados pelos inspetores europeus, as deficiências identificadas na pecuária irlandesa parecem mais sérias do que falhas apontadas pela mais recente missão do FVO no Brasil.
Enquanto eles falam de “sérias deficiências” em casos na Irlanda, o relatório sobre o Brasil considera que em sete das fazendas visitadas o desempenho dos auditores brasileiros foi “satisfatório” e nas duas outras fazendas havia apenas “falhas menores de natureza não sistêmica”. Um caso de desempenho dos certificadores numa fazenda não foi totalmente satisfatório.
A missão visitou seis abatedouros no Brasil e um frigorífico aprovados para exportação para a UE, e as avaliações sobre higiene, rastreabilidade e controle oficial foram consideradas “satisfatórias em todos os estabelecimentos visitados”. Só “falhas menores” foram identificadas em relação à manutenção. Também consideraram que a certificação de carne fresca para exportação para a UE e produtos introduzidos no território europeu em trânsito para terceiros países era satisfatória.
Mas a Associação dos Produtores Irlandeses (IFA, em inglês) não perde uma ocasião e mantém uma campanha contra a negociação de acordo de livre comércio UE-Mercosul, estimando que sua produção seria dizimada. A última ação do presidente da IFA, John Bryan, foi pedir para Bruxelas suspender a negociação depois que a Rússia embargou frigoríficos brasileiros em abril. As autoridades europeias ignoraram a demanda.
A matéria é de Assis Moreira, publicada no Valor Econômico, resumida e adaptada pela Equipe BeefPoint.
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Parabéns ao Beefpoint por trazer informações importantes a cadeia.
A verdade é que as regras a que somos submetidos são as mesmas que se aplicam aos produtores da UE. A grande diferença são as consequências a desvios. Aqui desembocaram em suspensão das exportações. Lá ficam em advertências.
Mas por conta disto avançamos muito e hoje temos um sistema de rastreabilidade sólido e que começa a ser melhor entendido pelo setor. Há, como eu, produtores que já veem os ganhos de controle como tão ou mais expressivos que o diferencial de preços.
Estamos avançando mais rápido que muito supões em direção a pecuária de precisão e nela os registros sistemático das ocorrências das propriedades e rebanhos são parte vital para o sucesso da empreitada.
Att,
This was an incident waiting to be discovered and it is very embarrasing for the Irish Farmers Union. There has been no publicity in the Irish Farming Press about the bad results of the SANCO mission.
One farmer whose farm selected the FVO team identified that the on-farm register had been updated by the keeper in co-operation with the CA a few days before the inspection visit. Two sets of ear tags were ordered a few days before the visit and applied to the animals. The keeper could not provide documented evidence of a correlation between both animals and the two sets of ear tags.
Another holding was selected on a risk basis by the FVO team: this holding had ordered an
increasing number of sets of ear tags in three consecutive years (5 sets in 2008, 11 sets in 2009 and 13 sets in 2010). In this holding, very serious deficiencies were identified. The main findings are summarised as follows:
1. A set (two) of replacement ear tags was ordered for a dead animal in the period between the death of the animal and the notification of the death to the computerised database.
2. Four original ear tags were registered in the computerised database for animals which are still alive. These ear tags were not applied to the animals. One of the four animals was
moved out of the holding and the next keeper requested a set of replacement tags for this
animal three months after arrival in his herd. The animal was moved on further via a market into its current herd. For the other three animals no replacement tags were ordered.
3. Discrepancies were found between the registration of cattle in the computerised database and the registration of cattle in the on-farm herd register.
In addition the following non-compliances were found:
one animal born in March 2010 was not registered in computerised database;
one animal without ear tags was present on the holding. The animal was freeze branded and its freeze brand is recorded on-farm for the purpose of milk recording with the correlation to the official tag number;
one animal was registered in the on-farm register, but not in the computerised database. The animal was rejected twice by the computerised database for giving the wrong information on the dam;
4
many animals were present on the holding with one ear tag only. No action had been taken by the keeper to order replacement tags;
animal movements were not registered in the on-farm register as long as the keeper remains the owner of the animal(s); and
the entries in the on-farm register were not done in a chronological order. A posteriori
corrections were made.
The FVO team requested the CA to carry out a detailed investigation concerning all animals in the holding.
What a mess!
Frank Yeo.
Um relatorio como esses ja teria gerado criticas de toda a especie para o Brasil, colocando o produto brasileiro em situacao de total descredito. Isso porque a maquina sensacionalista irlandesa trabalha incansavelmente para esse fim. Mas, o que ocorreu com as exportacoes para outros paises e com o comercio intra-comunitario da Irlanda a partir das conclusoes extremamente desfavoraveis desse relatorio?
Nada. Outro fator implicito nisso e de que os efeitos de falhas em sistema de rastreabilidade no Brasil significam possibilidade de nao se ter documentado precisamente que os animais abatidos para a UE cumpriram os 40 dias na ultima propriedade e os 90 dias na area habilitada (mesmo havendo o sistema de controle veterinario oficial, com a GTA, que funciona de forma paralela nesse processo de certificacao dessas garantias para a UE). Entretanto, considerando a Europa, com o single market, sem barreiras a comercializacao de mercadorias entre os seus Estados Membros, e tendo como pano de fundo a BSE, as consequencias de falha no sistema sao muito maiores e a amplitude do problema sequer chega a imprensa especializada europeia.
O consumidor europeu precisa atentar para o fato de que quem pode estar colocando em risco a saude publica e animal esta dentro da sua casa. O FVO fez a sua parte, ja o que foi feito com as suas conclusoes… Nao seria o caso de 100% de inspecoes oficiais nas propriedades irlandesas e uma lista de propriedades aptas ao mercado intracomunitario, com analises dos relatorios de auditoria, etc.? Ou o remedio seria amargo demais?
Casa de ferreiro, espeto de pau.
Marcio
Não devemos comemorar o fracasso dos nossos concorrêntes. Temos que ficar firmes no cumprimento das exigências para a exportação.
Estamos satisfatórios na avaliação da UE.
Podemos ser excelêntes exportadores como somos produtores.
Deveríamos fazer propaganda do nosso produto lá fora neste momento para fortalecer a nossa marca.
Att.
Caro Roberto,
sem duvida que o fortalecimento das garantias fornecidas pela GTA e uma acao necessaria e benefica para todo o sistema de certificacao e essa e a direcao em que os trabalhos seguem. Mas, paralelamente teriamos que ter implementado um sistema de identificacao animal mais preciso. Penso que com a liberdade que se pode conseguir com protocolos que nao nos deixem vulneraveis em questionamentos sobre a origem dos animais, esse tema possa evoluir com a busca de mais opcoes. Entretanto, o sistema previsto na Lei 12.097/2009 nao seria o suficiente para a UE. A certificacao nos parametros em que somos demandados (garantia solida de que os animais permaneceram 90 dias na area aprovada e 40 dias na ultima propriedade) tem o seu caminho no Art.4o., paragrafo 1o. da referida lei.
Quanto a Lei, em si, para a sua regulamentacao, algumas coisas precisam ser definidas, como por exemplo o fato de que a marca deve corresponder a uma propriedade e nao a um produtor. Como, normalmente, produtores com mais de uma propriedade tem a mesma marca em todas elas, e como consolidar na base de dados oficial as marcas de cada um, ja que o seu registro esta nos municipios e estados. Isso e importante quando se trata efetivamente de saber de onde veio um determinado animal.
Mas, concordo que a sinergia de sistemas (protocolos privados, inclusive), com o fortalecimento das garantias da GTA e o caminho.
Marcio
Roberto Ferreira,
Não vi nos comentários a esse artigo comemoração com as conclusões sobre o relatório do Fvo sobre a Irlanda. A contestação parte do fato de que o produto brasileiro tem aqui na Europa uma imagem na maior parte da vezes como "low standard" e isso tem relação com o ocorrido em 2008. Isso sem que tenha havido qualquer crise em 2008 quanto a saúde publica ou saúde animal envolvendo o produto brasileiro . Mas tenha em mente que o componente político foi o predominante nesse caso e não o técnico. De qualquer modo a evolução dos sistemas de identificação animal e rastreabilidade no Brasil tem que observar o objetivo dos mesmos e não temos que fazer apenas porque pediram ou porque temos que ter. Em qualquer assunto a diferença entre remédio e veneno esta na dose. Esse assunto é tratado como dogma por muitos e de forma muito displicente por outros. Mas acredito que chegaremos ao bom termo com algo racional e com razão tecnica bem estabelecida. Não penso também em retrocesso e sim em melhor compreensão do processo em si com pragmatismo, sem dogmatismo ou displicência.
Marcio
Caro Rodrigo,
Penso que a sua proposta se encaixe no paragrafo 1o. do Art 4o. da Lei 12.097/2009, sendo o protocolo usado pela ABCZ um possivel protocolo para a UE. Mas, lembremo-nos que o assunto identificacao animal e rastreabilidade tem que considerar as necessidades futuras de certificacao para diversas outros quesitos na pecuaria de corte e nao somente UE. De fato, considero que todas as propostas tem que ser consideradas, mas acho complicada a eliminacao da identificacao individual. A Comissao Europeia enfrentaria muita dificuldade pratica com as criticas dos Estados Membros e isso resultaria em vulnerabilidade para o Brasil novamente, conforme aconteceu em 2008.
Marcio