O Mercosul e a União Europeia (EU) concordaram num cronograma de trabalho para tentar resolver as pendencias e fechar até o final do primeiro semestre o acordo de livre comércio birregional.
Uma vez conseguindo fechar o pacote até julho, o documento será enviado para tradução a fim de ser assinado no segundo semestre durante a presidência rotativa da EU pela Espanha.
Na reunião dos negociadores dos dois blocos, ontem e hoje em Buenos Aires, os dois lados discutiram o documento de oito páginas apresentado pelos europeus como base para compromissos adicionais do Mercosul na área ambiental.
Em comunicado, a UE informou que as discussões se concentraram nas três dimensões do desenvolvimento sustentável (econômica, social e ambiental) ‘como um marco para aprofundar a parceria birregional’.
‘Diante do novo cenário político e econômico global, e conscientes da importância estratégica do relacionamento birregional, ambas as delegações concordaram sobre a importância de intensificar o diálogo a fim de finalizar um acordo mutuamente benéfico e equilibrado. Para isso, acordaram um cronograma de trabalho para o primeiro semestre de 2023’, acrescentou o comunicado.
O documento de oito páginas apresentado pela EU com as exigências ambientais precisa ser avaliado pelos 27 países membros do bloco comunitário, onde há racha sobre o tratado com o Mercosul. França, Austria, Holanda tem resistências envolvendo protecionismo agrícola e proteção ambiental.
O Mercosul de seu lado precisa continuar a absorver o que o europeus apresentaram.
Pelo que se indica da reunião de Buenos Aires, não haveria o estabelecimento de sanções no instrumento adicional. Mas não está claro se os europeus formalizam isso. Essa é a posição, em todo o caso, do Mercosul, que insiste num instrumento adicional basicamente interpretativo do capítulo de desenvolvimento sustentável.
O fato é que o interesse dos europeus parece claro de acelerar enfim a implementação do acordo com o Mercosul, em meio a enormes mudanças na cena internacional.
Uma indicação disso é o plano da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, de visitar o Brasil no mês que vem, o que pode dar um impulso nas barganhas finais.
Para a autonomia estratégica europeia, a ratificação do acordo com o Mercosul é ainda mais importante agora em termos geopolíticos. A China está cada vez mais ativa na região. Um observador europeu chama atenção para possível acordo comercial com o Uruguai; os argentinos aderiram recentemente à Iniciativa de Cinturão Chinês e da Rota; recente investimento chinês de US$ 1 bilhão na mina de lítio Bolívia. O presidente brasileiro Lula também mencionou potencial de um acordo de livre comércio “com nossos amigos chineses”. A China é o maior parceiro comercial do Brasil.
Os europeus não ignoram que um fiasco, ou mais atraso, no acordo UE-Mercosul significa que a influência da China na América do Sul continuará a se fortalecer. Diante das crescentes tensões comerciais em todo o mundo, a UE não pode se dar ao luxo de ficar de braços cruzados, concordam autoridades na região. Especialmente com uma guerra em solo europeu, é importante fazer aliados e fortalecer os laços existentes. O acordo comercial UE-Mercosul está vinculado a um acordo de associação política e já por essa razão é da maior importância, constatam fontes europeias.
O Mercosul pode desempenhar um papel importante nos esforços europeus para diversificar as fontes de abastecimento de matérias-primas essenciais. Um observador nota que o Brasil é um quase-monopolista em nióbio (usado em ligas de aço, supercondutores e mísseis, entre outras coisas) e possui a terceira maior reserva de terras raras. A Argentina representa 12% da produção mundial de lítio e a Bolívia, país candidato a membro do Mercosul, possui as maiores reservas mundiais de lítio. O acordo também inclui reduções nos impostos de exportação (da Argentina) sobre um amplo grupo de matérias primas.
O acordo prevê quotas (determinado volume com tarifa menor) para produtos do Mercosul como carnes bovina, de aves, suína, além de etanol, arroz, mel, milho, queijo, leite em pó e leite em pó para bebês; e para o açúcar do Brasil.
Por sua vez, o Mercosul introduz quotas tarifárias para a importação de queijo, leite em pó e leite em pó para bebês da UE.
Pelos cálculos da UE, seus exportadores vão economizar cerca de 4 bilhões de euros por ano graças a tarifa menor cobrada pelo Mercosul. Mas tudo isso virá após a implementação completa do acordo, que dura 15 anos.
Fonte: Valor Econômico.