A União Européia (UE) surpreende o Mercosul e, a menos de três meses da conclusão do prazo estabelecido para a assinatura de um acordo comercial, apresenta uma nova proposta que, na prática, dificulta uma aproximação no setor agrícola. Conforme prometido, Bruxelas apresentou ontem ao Mercosul um movimento nas negociações sobre a abertura de seu mercado aos produtos agrícolas dos países do bloco sul-americano.
A iniciativa, porém, foi considerada como um “passo atrás” por parte dos delegados do Mercosul, que ameaçaram reduzir as próprias ofertas feitas em outros setores se os europeus mantiverem essa proposta até outubro. Para os europeus, uma maior flexibilidade somente ocorreria quando o Mercosul melhorar suas ofertas, principalmente no setor de compras governamentais.
“Trata-se de uma proposta inaceitável”, afirmou o embaixador Régis Arslanian, chefe da delegação brasileira na reunião desta semana em Bruxelas. Para a Confederação Nacional da Agricultura, a proposta “não é uma boa notícia” e uma contra-oferta deve ser pensada.
Até agora, a UE propunha oferecer certas cotas para os produtos agrícolas do Mercosul. As cotas, porém, seriam divididas em duas fases. Na primeira, se dariam 50% do total das cotas de importações oferecidas para carnes, etanol e outros produtos. O volume de abertura da segunda fase, porém, somente seria decidido dependendo do que os europeus forem obrigados a abrir pelos acordos da Organização Mundial do Comércio (OMC) para o resto da comunidade internacional. Quanto mais forem obrigados a ceder na OMC, menos os europeus dariam para o Mercosul. Há poucas semanas, porém, o Brasil deixou claro que não aceitaria essa fórmula, já que o ganho para o País não estaria garantido.
Como resposta às criticas, os europeus apresentaram sua segunda oferta. Em vez de oferecer 50% na primeira fase, passaram a oferecer 60% das cotas. O problema é que condicionaram isso a um parcelamento das cotas em dez anos, o que de fato daria pouca abertura por ano ao Brasil.
No caso de carnes, por exemplos, a cota total de 100 mil toneladas oferecidas seria divida em 60 mil toneladas nos primeiros dez anos. Para o Brasil, isso significaria que a cota para exportar carne seria de apenas 2,3 mil toneladas no primeiro ano. Hoje, o País exporta cerca de 290 mil toneladas por ano, mesmo pagando uma taxa de 150%.
“Isso seria uma redução da oferta e não uma melhora”, afirmou Arslanian, que não deixou de alertar que fazer uma proposta como essa neste momento poderia ser delicado. Para ele, se a proposta for mantida, o Brasil terá de “reduzir sua oferta e dividí-la em duas etapas, sendo a segunda equivalente ao que os europeus oferecerem”.
Para o principal negociador europeu, Karl Falkenberg, o Mercosul já sabia que a cota seria parcelada em dez anos, mas reconheceu que os prazos poderiam ser negociados. “O Mercosul está dizendo que está descobrindo isso hoje. Mas já dissemos em março, em Buenos Aires”, afirmou o negociador, que classificou processo de “lento” e afirmou que não poderia ser o único a mostrar flexibilidade. “Não vimos nada de radical por parte do Mercosul”, disse, apontando que espera que até o final da semana os países tenham “mais coragem” para lidar com os temas delicados das negociações.
De fato, os europeus querem que o Mercosul formule sua proposta de compras governamentais e que apresente uma lista dos setores que estarão abertos para empresas européias. O Brasil está já com a proposta preparada, mas não quer submetê-la oficialmente até saber até que ponto os europeus podem ir em sua abertura agrícola. Os europeus afirmam ainda que aceitam que nem todos os setores estejam incluídos para respeitar as políticas industriais do Mercosul e até aceitaria que um setor oferecido fosse retirado mais tarde.
Fonte: O Estado de S.Paulo (por Jamil Chade), adaptado por Equipe BeefPoint